Nova proposta para a reforma
ortográfica da língua portuguesa. Existem duas interpretações possíveis para
essa frase. A primeira, sobre uma nova sugestão em andamento para a reforma
ortográfica da língua portuguesa. A segunda, indicando que uma nova sugestão
emperrou a reforma ortográfica, paralisando um processo que não anda com passos
muito acelerados.
De acordo com a terceira reforma
ortográfica da língua portuguesa implementada no Brasil em 2009 (a primeira foi
em 1943 e a segunda, em 1971), o acento agudo permanece nas palavras oxítonas
como dói, mói, herói, pastéis e céu. A palavra “para”, que antes tinha uma
acento que diferenciava a terceira pessoa do presente do indicativo - pára - da
preposição - para - agora não é mais acentuada, criando um duplo sentido em
algumas sentenças, como o título que leva esta reportagem. Porém, como as novas
regras só passam a valer a partir de 2016, as duas versões ainda são
consideradas certas.
“A reforma ortográfica tem
problemas técnicos, como por exemplo, ter se assumido a aceitação de duas
grafias para palavras como ‘fato’, no Brasil, e ‘facto’ em Portugal”, diz o
professor e linguista brasileiro José Luiz Fiorin, sobre o acordo assinado há
cinco anos pelos países de língua portuguesa Angola, Brasil, Cabo-Verde,
Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal e São Tomé e Príncipe. Para ele, o ideal era
que nos dois países utilizasse uma mesma forma de escrita, ainda que a
pronúncia fosse distinta. “Porém, descontados esses problemas, eu acho que o
gesto político de reafirmação da unidade dos países de língua portuguesa era
importante”, completa Fiorin.
Enquanto as novas regras não são
obrigatórias, a seguinte frase poderia ser encontrada em uma manchete de
jornal: "Por causa de queda de energia, máquina pára por pelo menos uma
hora". O leitor tem todo o direito de interpretar que, em decorrência de
uma queda de energia, uma máquina de implante de pelos parou por uma hora. Isso
porque, além da palavra "para", a palavra pelo, que antes levava
acento circunflexo para diferenciar o substantivo - pêlo (cabelo, penugem), da
contração de por + o - pelo, também já não leva mais acento nenhum.
Se a ausência do acento culminou
em uma crise existencial das palavras, o que dizer do hífen, o eterno vilão do
campo léxico? Pé-de-meia, por exemplo, aquele que todo mundo deveria fazer para
economizar um dinheiro, leva hífen. Já o pé de moleque, o tradicional doce
brasileiro, não leva nada além do amendoim e açúcar. Ao pé da letra, significa
que não, essa palavra não leva hífen. Aliás, a razão pela qual hífen termina
com N, contrariando a regra de que nenhuma palavra em português termina com N,
apenas com M, também tem uma explicação. É uma palavra tardiamente pela língua
portuguesa, por isso manteve suas raízes de origem, do grego hyphén.
Desde que dezenas de grafias
foram mudadas, em 2009, a correria por dicionários e manuais das novas regras
ortográficas não foi suficiente para sanar as dúvidas. E se não bastassem novas
normas em uma língua que já não é muito fácil, um grupo de linguistas (palavra
esta que perdeu o trema, recentemente...) pede que outras mudanças sejam feitas
no acordo ortográfico. Liderado pelo professor Ernani Pimentel, as novas
sugestões poderiam causar um novo atraso na validação das regras, que já
deveriam ter sido colocadas como oficiais no final de 2012, mas o prazo acabou
sendo prorrogado pela presidenta Dilma Rousseff para o dia 31 de dezembro de
2015.
O argumento do movimento “Acordar
Melhor”, criado por Pimentel, é que a língua portuguesa deveria ser
simplificada “para que todos a dominem e se libertem de dicionários e manuais”.
Alguns senadores, entre eles Cristovam Buarque (PDT), Adelmir Santana (DEM),
Flavio Arns (PSDB), apoiam a ideia que já conta com um grupo de trabalho no
Senado para propor as simplificações da língua, coordenador pelo Pimentel.
A regra (não) é clara
Para entender o que pretende
Pimentel, imagine a sentença: “Enxa o copo com axocolatado e aumente a xama da
xaleira para o xá de mexerica”. Parece a letra de uma música da cantora Xuxa,
uma fã léxica de palavras com X, em referência - ou referenda - à dupla de letras
do seu próprio nome. Se dependesse de Pimentel, a regra da Xuxa poderia valer
oficialmente para qualquer livro da literatura brasileira. Em sua visão, passar
todas as palavras escritas com ch para a grafia com x facilitaria a leitura e
diminuiria a confusão.
Para o professor, essa ação em
conjunto com outras mudanças de normas poderia até fazer com que o brasileiro
tivesse que estudar menos para entender a gramática. A regra matemática de que
menos com menos é mais, segundo o professor também vale para a gramática: Menos
regras, menos horas de estudo, mais entendimento da norma. "A escola tem
uma média de 400 horas aula de gramática no total, entre ensino fundamental e
médio. Se a língua fosse mais simples, 150 horas seriam suficientes", diz
ele.
Mas essa conta feita por Pimentel
é alvo de severas críticas. "Ninguém sério nesse país propõe algo
parecido", diz Fiorin. "Se você fizer uma mudança radical da
ortografia, estará condenando um material histórico à obsolescência em uma
geração", explica. O editor da revista Língua Portuguesa, Luiz Costa,
concorda. “Já foram investidos muitos recursos numa mudança ortográfica
nacional. Ainda que não seja perfeita, seria desperdiçar todo esse esforço”,
diz Costa. De acordo com o Ministério da Educação, entre 2008 e 2012 foram
gastos mais de 2,2 bilhões de reais para atualização de obras didáticas.
Enquanto as regras e contradições
são discutidas e a nova norma não é obrigatória, as regras gramaticais viram
alvo de brincadeira. Em Belo Horizonte, a capital do Estado de Minas Gerais,
existe um bloco de carnaval chamado "Trema na Linguiça", brincando
com a palavra que perdeu o trema, aquele acento que ia em cima da letra U para
dar o som de "ui", e que agora só existe em nomes estrangeiros, como o
da top model brasileira Gisele Bündchen. Até 2016, o trema ainda pode surgir
nas palavras. Depois disso, só no carnaval.
Reportagem de Marina Rossi
fonte:http://brasil.elpais.com/brasil/2014/01/18/sociedad/1390083482_411227.html
foto:http://tecendootexto.blogspot.com.br/2009/04/reforma-ortografica-em-charges.html
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