30/04/2015

Imagem do dia



Latino-americanos “de pele mais escura” têm menos oportunidades

Artigo de José Baig, editor on-line do Banco Mundial.

Para ter menos acesso à educação, mais possibilidades de morrer durante o parto ou nos primeiros meses de vida, ganhar menos dinheiro ou ter praticamente vetada a participação na política, na América Latina basta uma única condição: ter a pele mais escura.
Segundo dados das organizações internacionais, os afrodescendentes da América Latina têm uma probabilidade duas vezes menor de ter acesso a escolas secundárias que as pessoas de raça branca.
No Brasil, as mulheres afrodescendentes são o segmento com menor ingresso de toda a população. Sua participação na vida política é mínima, e só uma pequena fração foi escolhida alguma vez como representante no parlamento.
No Equador, a taxa de mortalidade infantil na cidade de Esmeraldas (de maioria afrodescendente) é o dobro da média nacional. Na costa do Pacífico da Colômbia, onde também é predominante a população de descendência africana, esta taxa é quatro vezes maior que a média nacional.
As mulheres afro-brasileiras têm uma probabilidade três vezes maior de morrer durante o parto que as de raça branca. Cerca de 57% dos bebês de mães afro-colombianas nascem de maneira prematura.
Estas estatísticas sempre existiram, mas agora organizações defensoras dos afrodescendentes voltaram a divulgá-las pelo início do Decênio Afrodescendente (2015-2024), uma iniciativa da Organização das Nações Unidas para que este coletivo seja considerado um grupo específico cujos direitos humanos devem ser promovidos e defendidos.

“Algo está mal”

“A América Latina é a região de maior paz, a de mais democracia, na qual mais se reconheceram os direitos dos povos originários nas constituições e nas leis, mas os afrodescendentes desfrutam muito pouco dessas vantagens, temos que reconhecer que algo está mal”, disse Romero Rodríguez, embaixador itinerante do governo do Uruguai para Assuntos Afrodescendentes.
Rodríguez e outros responsáveis de temas afrodescendentes em governos da América Latina estiveram em Washington para participar das atividades oficiais de início do Decênio Afrodescendente na região.
Durante um evento na sede do Banco Mundial, os participantes debateram como enfrentar a clara exclusão dos afrodescendentes na vida dos países, especialmente no que concerne ao trabalho da instituição anfitriã: o desenvolvimento e a erradicação da pobreza.
Pastor Murillo, assessor de Assuntos Afrodescendentes do vice-Ministério para a Participação e Igualdade de Direitos da Colômbia, destacou que um dos problemas são os censos da população, pois nem sempre as pessoas são contadas como afrodescendentes.
Destacou que, embora em seu país, o último censo oficial revela que há cerca de dois milhões de afrodescendentes na Colômbia, acha que a cifra pode ser seis vezes superior, quer dizer, quase 1/3 da população colombiana.
O pior, assegura, é que por não estarem contados como tais nos censos da população, os afrodescendentes ficaram foram dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e afirma que todos os envolvidos no tema precisam trabalhar juntos na solução. “O reconhecimento diferenciado dos direitos dos afrodescendentes é um desafio regional”, afirmou.

Racismo, um mal negócio

Além das políticas diferenciadas para os afrodescendentes, os governos da região já estão tomando algumas medidas específicas como no Uruguai, onde os organismos públicos devem cumprir uma cota de contratação de pessoas afrodescendentes e as culturas africanas tradicionais fazem parte do programa escolar.
Também na Colômbia se colocou em marcha uma das demandas mais velhas das comunidades afro-colombianas, que é o reconhecimento da propriedade coletiva das terras, um processo que foi apoiado pelo Banco Mundial.
Na Costa Rica – um país onde boa parte da população afrodescendente é, além disso, falante de inglês – trabalha agora para que a discriminação racial seja considerada delito, algo que agora é apenas uma contravenção cuja multa mais elevada equivale apenas ao custo de dois refrigerantes.
Os assistentes coincidiram que existe na sociedade latino-americana um “racismo estrutural” que deve ser combatido não apenas protegendo os afrodescendentes, mas também conscientizando o resto da sociedade sobre a existência desta discriminação baseada na cor da pele.
Combater o racismo, além disso, não é apenas questão de justiça, mas de simples lógica econômica, segundo Marisela Montiliu-Muñoz, diretora da Prática Global de Desenvolvimento Social, Urbano e Rural do Banco Mundial.
“Vamos imaginar que os 150 milhões de latino-americanos que hoje estão excluídos por sua cor de pele estivessem contribuindo aos mercados, que impacto teria isso na economia?”, se pergunta.

fonte:http://brasil.elpais.com/brasil/2015/04/28/internacional/1430242953_723350.html
foto:https://blogdaines.wordpress.com/2014/04/04/discriminacao-e-preconceito-contra-pessoas-de-pele-negra-no-brasil/

PM reprime protesto de professores em Curitiba e mais de 200 se ferem


Mais de 200 pessoas ficaram feridas, sendo que oito em estado grave, durante mais um episódio de repressão da polícia do Paraná a professores da rede estadual de ensino, que estão em greve e acampados no Centro Cívico desde segunda-feira 27. Treze pessoas foram presas, segundo a Secretaria de Segurança Pública.
A ofensiva ocorre em frente à Assembleia Legislativa, onde, segundo o sindicatos dos professores,  20.000 pessoas protestavam contra as mudanças na previdência para os servidores do Estado. A Polícia Militar foi escalada pelo governador Carlos Alberto Richa (PSDB) para impedir a entrada dos manifestantes na Assembleia, onde ocorre a votação. Há informações de fontes extraoficiais de que mais de 50 policiais militares que participaram da ação teriam se recusado a disparar contra manifestantes. Esse grupo estaria passando por processo de exoneração. Durante a semana, vários policiais, anonimamente, expressaram indignação com o pedido do governador Beto Richa (PSDB) com relação ao contingente de 1.500 policiais deslocados para proteger a Assembleia, número maior do que o disponível na própria cidade habitualmente.
O cenário de guerra começou perto das 15 horas, quando manifestantes, aos gritos de “sem violência” e “ei, polícia, prende o Beto Richa” começaram a forçar grades que faziam o isolamento da Assembleia, enquanto os deputados estaduais começarm a a sessão para votar o projeto de lei que altera a Paraná Previdência, e que, segundo os professores, acarretaria perda de benefícios. Agressões com cacetete e jatos de spray de pimenta foram registrados. Alguns dos atingidos revidaram contra a polícia, atirando copos de água vazios. A resposta veio com uso de bombas e balas de borracha, que continuaram a ser lançados de forma ininterrupta durante mais de uma hora. Uma creche localizada na região foi atingida, e funcionários e crianças presentes precisaram ser retirados às pressas.
O prefeito de Curitiba, Gustavo Fruet (PDT), informou pelo Twitter, a prefeitura foi evacuada para atender aos feridos, que também estão recebendo os primeiros socorros no Tribunal de Justiça. Seis escolas que ficam na região suspenderam as aulas. "Parece uma praça de guerra!", escreveu Fruet, que faz oposição do Governo estadual, na rede social. Segundo ele, 34 pessoas foram encaminhadas ao hospital e mais de 100 foram atendidas. Ambulâncias não foram suficientes para o atendimento e a Guarda Municipal foi acionada para auxiliar os feridos.
Nem o clima belicoso na rua impediu que, do lado de dentro da Assembleia, deputados votassem pela aprovação das medidas. Houve bate-boca e a sessão chegou a ser interrompida por alguns minutos. Mas quando retomaram, o líder do governo Luiz Claudio Romanelli, do PMDB, conseguiu os votos necessários para aprovação de seu parecer. Foram 31 votos favoráveis contra 19.
O prefeito aproveitou para criticar a truculência da polícia do Estado: "Há dias a Prefeitura vem alertando da desproporcionalidade da força", disse a jornalistas durante o confronto.
O projeto de lei em votação na Assembleia Legislativa foi encaminhado pelo Executivo para alterar a previdência estadual. Pela proposta do Governo, mais de 33.000 beneficiários acima dos 73 anos de idade serão transferidos do fundo financeiro, bancado pelo Estado, para o previdenciário, composto por verbas dos contribuintes. A mudança na origem do custeio representaria uma economia de 125 milhões de reais por mês aos combalidos cofres do estado, segundo estimativas de especialistas.
A manobra do Governo visa minorar a crise financeira que assola o Estado. Por isso, vem tentando mudar a forma de custear a ParanaPrevidência, um regime próprio da previdência social dos servidores públicos do Paraná, composta por três fundos: o militar, o financeiro e o previdenciário.
A posição de servidores e do APP, sindicato que representa os profissionais da educação pública, alegam, porém, que a mudança comprometeria a saúde financeira da ParanáPrevidência, e que, no longo prazo, a instituição acabará com saldo devedor maior do que a receber.
O governo rebate dizendo que o fundo previdenciário está capitalizado em 8,5 bilhões de reais em investimentos e que o projeto determina ainda aporte de 1 bilhão de reais a partir de 2021, prevendo repasse ao Estado de royalties provenientes da Usina de Itaipu, o que garantiria a solvência do sistema por pelo menos 29 anos.
Em fevereiro deste ano, os professores já haviam realizado um acampamento no Centro Cívico de Curitiba contra o pacote de austeridade do governador Beto Richa, que cortava benefícios da categoria para aumentar o caixa deficitário do Governo.
Brecha política
Políticos de oposição se aproveitaram da situação para fazer palanque. Os senadores Roberto Requião (PMDB) e Gleisi Hoffman (PT) mostraram indignação, discursaram no carro de som do sindicato dos trabalhadores em educação pública e prometeram pedir explicações aos responsáveis pela operação no senado, além de intervenção federal no estado. "Viemos representando o senado, vou levar um relato, quero me pronunciar no plenário do senado para que a comissão de direitos humanos possa tomar providências”, disse Hoffman.
O Governo de Beto Richa, por sua vez, atribuiu a responsabilidade das agressões a “manifestantes estranhos ao movimento dos servidores estaduais que estavam concentrados em frente à Assembleia Legislativa.”  Ele culpou "militantes black blocs que, infiltrados no movimento, atacaram os soldados da Polícia Militar que protegiam a Assembleia Legislativa" durante a votação do projeto.
“A polícia estava lá por determinação do Poder Judiciário para proteger a sede do Poder Legislativo, uma instituição democrática que não pode ser afrontada no seu direito”, disse o governador, lembrando que em fevereiro a Assembleia havia sido invadida por manifestantes.
Num primeiro momento, circulou uma nota do Estado, relatando que as reiteradas tentativas desses manifestantes de invadir o espaço do Parlamento Estadual “culminaram com a ação de defesa das forças policiais, destacadas para cumprir a ordem judicial de proteção à Assembleia e ao seu livre exercício democrático”. O Governo, porém, só teria contabilizado, inicialmente, quatro manifestantes feridos, além de 20 policiais, embora as redes sociais viessem exibindo fotos de dezenas de pessoas sangrando em função dos ataques de bomba e cacetete da polícia.
A nota do governador Beto Richa, liberada no final do dia, não contava mais o número de feridos.

Reportagem de Germano Assad
fonte:http://brasil.elpais.com/brasil/2015/04/29/politica/1430337175_476628.html
foto:http://www.gamalivre.com.br/2015/04/acao-da-pm-foi-truculenta.html

Mais de 380 crianças com menos de 16 anos se casaram na Espanha desde 2000, diz agência

No país, está em andamento um projeto de lei para aumentar a idade mínima para 16; Unicef alerta que muitos desses matrimônios podem ser forçados.



Mais de 380 crianças com 15 anos ou menos se casaram na Espanha desde 2000, revelaram dados obtidos pela Europa Press na última terça-feira (28/04). Embora a idade mínima para casamento seja 14 anos no país europeu, um projeto de lei chamado Jurisdição Voluntária foi encaminhado ao Senado nesta semana com o intuito de elevar a idade mínima para 16 anos.

Entre o início dos anos 2000 e o primeiro semestre do ano passado, 89 crianças menores de 15 anos se casaram em Espanha, sendo 80 delas meninas. No mesmo período, ao menos 294 jovens de 15 anos se casaram, dos quais 271 são garotas. Se o novo projeto de lei for aprovado, haverá uma reforma no interior do Código Penal espanhol que já não poderá mais considerar como sexo consensual relações com menores de 16 anos.
Para a Unicef (Fundo das Nações Unidas para as Crianças), essas mudanças estão em conformidade com as recomendações do Comitê das Nações Unidas que supervisiona a Convenção sobre os Direitos da Criança. Há tempos, a agência da ONU vem exigindo que a Espanha eleve para 18 anos a idade mínima matrimonial, com a possibilidade de aceitar exceções aos jovens de 16 anos, em caso de autorização judicial.


"A Unicef reivindica este assunto há vários anos", afirmou o chefe de Políticas de Infância do órgão, Gabriel Gonzalez, à agência de notícias espanhola. "Isso [casamento prematuro] envolve muitas responsabilidades de emancipação aos 14 anos, não só pela capacidade de viver fora do círculo familiar, mas principalmente porque muitos desses casamentos podem ser forçados ou influenciados pela família, deixando de fora a decisão dos jovens”, destacou.
Nessa linha, a diretora de Sensibilização e de Políticas de Infância da ONG Save the Children, Ana Sastre, ressalta a importância de fazer com que as garotas compreendam com autonomia e maturidade que “o matrimônio implica muitas vezes uma série de responsabilidades que não são compatíveis com os processos formativos” do momento em que elas estão vivendo.



fonte:http://operamundi.uol.com.br/conteudo/noticias/40265/mais+de+380+criancas+com+menos+de+16+anos+se+casaram+na+espanha+desde+2000+diz+agencia.shtml
foto:https://www.youtube.com/watch?v=njxOsMX5yIQ

Congresso aprova projeto que acaba com rotulação de alimentos transgênicos

Os consumidores, que antes sabiam se um alimento era transgênico ou não, a partir da embalagem do produto, agora ficarão no escuro em relação ao tema. A Câmara dos Deputados aprovou o projeto que acaba com a exigência de rotular alimentos que utilizam produtos geneticamente modificados destinados a consumo humano. A decisão foi tomada na última terça-feira (28).
Foram 320 votos a favor e 120 contra em relação ao PL 4148/2008, do deputado ruralista Luiz Carlos Heinze (PP/RS). O aviso aos consumidores, antes presente na forma de um símbolo com um “T” amarelo e bem visível nas embalagens, será obrigatório apenas nos alimentos que apresentarem presença de organismos transgênicos “superior a 1% de sua composição final, detectada em análise especifica”.
De acordo com a proposta, deverá constar no rótulo as seguintes expressões: “(nome do produto) transgênico” ou “contém (nome do ingrediente) transgênico.”
“Acho que o Brasil pode adotar a legislação como outros países do mundo. O transgênico é um produto seguro”, afirmou Heinze.
“O projeto é excelente, garantimos o direito do consumidor de ser informado”, defendeu o deputado Domingos Sávio (PSDB-MG), membro da bancada ruralista. Segundo ele, 90% da soja e do milho comercializados no Brasil têm produtos transgênicos em sua composição.
“Nós não podemos, nós mesmos, criar obstáculos para o consumo dos nossos produtos. O agronegócio é que alimenta o país”, reiterou o deputado Valdir Colatto (PMDB-SC), relator da matéria na Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio.
Contradição
28 países adotam a rotulação de transgênicos, como Japão, Austrália, Rússia, China e países da União Europeia. Além disso, o projeto viola o artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor, que aponta que são direitos básicos do consumidor saber “a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”.
Alessando Molon, vice-líder do PT e contrário ao projeto, alegou que a iniciativa é contraditória. “Se todo mundo aqui diz que o transgênico é uma maravilha, porque quer retirar o símbolo [que identifica o produto] do rótulo? Isso é muito contraditório”.
O projeto da bancada ruralista atende aos interesses das grandes empresas transnacionais de alimentos. Numa recente entrevista à Adital, o sociólogo Rubem Siqueira, membro da Coordenação Nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), disse que existe uma estratégia do poder econômico global.
"Existem cerca de seis ou oito conglomerados da indústria de tecnologia de alimentos, que pretendem controlar a cadeia produtiva mundial. Essas empresas, que detêm essa tecnologia, querem fazer um grande oligopólio de alimentos no mundo, e bancam os deputados que estão propondo e votando esses projetos”.
Liberação total
A liberação de variedades transgênicas no Brasil é definida pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). A agência, no entanto, nunca recusou a aprovação de nenhuma variedade geneticamente modificada, muitas das quais não foram aprovadas em outros países, como o recém aprovado eucalipto transgênico.
Os estudos avaliados pela Comissão, a maioria produzidos pelas empresas que desejam a aprovação desses protudos, nunca alegam males à saúde; não há, contudo, a realização de estudos próprios da CTNBio para avaliar os impactos de um transgênico.
“Não existem estudos epidemiológicos comparando populações que comem transgênicos com populações livres de transgênicos. Se houvesse empenho, seria fácil avaliar populações de ratos, porcos, galinhas, comendo rações com e sem transgênicos. Vários estudos independentes, publicados em revistas cientificas especializadas, associam os pacotes tecnológicos das lavouras transgênicas e seus herbicidas ao aumento de câncer, a problemas neurológicos, a alterações na taxa de fertilidade e a alterações hormonais de diversos tipos”, afirma o engenheiro agrônomo e ex-membro da CTNBio, Leonardo Melgarejo.

fonte:http://www.brasildefato.com.br/node/31939
foto:http://observatorioambiental.com.br/2011/11/01/industria-ainda-nao-cumpre-obrigacao-de-rotulagem-de-transgenicos-fiquedeolho/layout-camiseta/

29/04/2015

Imagem do dia



Lei dos Direitos Fundamentais do Policial explica impunidade nos EUA


A revelação de que os policiais de Maryland — e de diversos estados americanos — têm uma lei estadual que lhes garante um devido processo mais do que especial, que praticamente lhes garante “imunidade qualificada”, agravou a revolta da população negra de Baltimore, cidade que, na última terça-feira (28/4), viveu um dia de caos.
Ninguém sabe o que aconteceu com o jovem negro Freddie Gray dentro do camburão da polícia. Sabe-se que ele entrou vivo e, meia hora depois, chegou em coma em um hospital. A não ser pelos policiais que estavam dentro do furgão, ninguém sabe e, provavelmente, nunca vai saber como foi provocada a lesão da espinha dorsal que resultou na morte de Gray.
A Lei dos Direitos Fundamentais do Policial (LEOBoR – Law Enforcement Officers' Bill of Rights) não é nova. Apenas era desconhecida da população. Até que a prefeita de Baltimore, Stephanie Rawlings-Blake, declarou que será muito difícil investigar, processar e punir os policiais responsáveis pela morte de Gray por causa dessa lei.
A lei é chamada, entre acadêmicos, de “lei da imunidade policial”, tal o grau de dificuldades que ela cria para as investigações de brutalidade policial, homicídios cometidos por policiais e qualquer outro tipo de má conduta. Ela sustenta o que a população vê como impunidade policial. Na contra mão, os manifestantes mais agressivos podem ser presos sob a acusação de “ameaça verossímil à Polícia”.
Esse tipo de lei não é exclusividade de Maryland. Na verdade, 14 estados americanos têm leis semelhantes. E outros 11 estados têm projetos de lei no forno. Muitos outros estados escreveram os mesmos direitos e privilégios básicos dos policiais em seus contratos com o sindicato da Polícia. Um projeto de lei tramita no Congresso Nacional, para adoção da “imunidade policial” em todo o país.
“Esse é o tipo de garantia de devido processo que todo o cidadão do mundo gostaria de ter”, disse o professor de Direito da Universidade Northwestern Steve Drizin ao jornal Huffington Post e a outras publicações. Especialista em direitos garantidos a suspeitos, durante interrogatórios, sejam policiais ou civis, ele disse que essas leis começaram a ser aprovadas nas décadas de 70 e 90, por esforço de lobistas da Ordem Fraternal da Polícia.
A lei de Maryland e dos demais estados incluem dispositivos tais como:
  •  Um policial não pode ser forçado a fazer quaisquer declarações em um período de 10 dias, a contar da data do incidente [teoricamente, prazo para ele conseguir um advogado. Essa regra, chamada de “período de esfriamento” (cooling-off period) garante um atraso suficiente nas investigações, para que os policiais possam “amarrar” suas histórias, dizem os críticos da lei].
  • No interrogatório, o policial tem direito a um advogado ou outro representante responsável do quadro da Polícia, que deve estar presente e disponível para consultas durante todo o tempo do procedimento. O policial pode requerer tempo para consultas com o advogado a qualquer momento, durante o interrogatório.
  • Um policial só pode ser interrogado por um período de tempo razoável, em um horário razoável, por apenas um ou dois investigadores, que façam parte do mesmo Departamento de Polícia (exceção quando a investigação é feita pelo Departamento de Justiça). O policial deve ser interrogado, preferencialmente, durante seu horário de trabalho.
  • -- Durante o interrogatório, o policial tem direito a tantos intervalos quanto necessários para comer, beber e ir ao banheiro, bem como a tempo de descanso.
  • -- Se o departamento decide fazer uma denúncia contra o policial, deve notificar o policial e seu sindicato.
  • -- O policial deve ser informado sobre o teor da denúncia contra ele e sobre as testemunhas contra ele, antes de ser interrogado.
  • -- Durante o interrogatório, os investigadores não podem molestar, ameaçar ou prometer vantagens ao policial [como os investigadores fazem frequentemente no caso de civis; não podem propor, por exemplo, delação premiada].
  • -- Ameaças de transferência, demissão ou ação disciplinar são proibidas.
  • -- Em Maryland, o policial pode apelar a um conselho de processo administrativo, cuja decisão é vinculante, antes que a decisão final seja tomada por seus superiores, para fins de disciplina. O conselho é formado por três policiais do mesmo Departamento [em Rhode Island, o policial pode escolher um dos três colegas para integrar o conselho].
[Os conselhos de processo de administrativo internos foram criados há alguns anos, quando movimentos de direitos civis começaram a exigir a criação de conselhos de controle externo da Polícia.]
  • -- Em alguns estados, o policial não pode ser disciplinado se um determinado prazo (frequentemente, 100 dias) decorrer após a data da má conduta alegada [o que limita o prazo de investigação].
  • -- Em Maryland, a denúncias e investigações podem ser extintas depois de três anos.
  • -- No caso de o policial ser suspenso, o departamento deve continuar pagando seu salário e seus benefícios, bem como os custos de seu advogado.
  • -- O policial pode acumular um certo número de denúncias, enquanto continua trabalhando normalmente, até que alguma coisa mais séria aconteça.
  • -- O Departamento de Polícia pode exigir que o policial investigado faça testes de sangue, de teor de álcool, de urina, de substâncias controladas e exames poligráficos. Se o policial se recusar, o departamento pode abrir um processo disciplinar. Se consentir, os resultados dos exames não podem ser submetidos como prova, para serem usados contra ele em processo criminal na Justiça.
O advogado Peter Neufeld disse ao jornal que o prazo de 10 dias para iniciar as investigações também permite aos policiais receber todo o material forense, antes de construírem uma narrativa dos fatos, de forma a não serem desmentidos mais tarde pelas provas.
“Se você pudesse interrogar os policiais envolvidos em algum caso, possivelmente criminal como o de Baltimore, é provável que não irá obter confissões, mas poderia obter declarações exculpatórias falsas, o que é muito importante”, disse Neufeld.
O escritor Mike Riggs, que pesquisa esse sistema, disse que investigar e processar um policial na maioria dos estados americanos é um procedimento tão complexo, frustrante e improdutivo que, em muitos casos, os Departamentos de Polícia preferem não se dar ao trabalho.

Reportagem de João Ozorio de Melo
fonte:http://www.conjur.com.br/2015-abr-29/lei-direitos-fundamentais-policial-explica-impunidade-eua
foto:http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/afp/2014/12/13/milhares-marcham-nos-eua-por-direitos-civis-e-contra-a-violencia-policial.htm

Em 2014, cada brasileiro consumiu 7,3 litros de agrotóxicos

Artigo de Alan Tygel, engenheiro, participa da coordenação nacional da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida.



No início de 2011, a Campanha Contra os Agrotóxicos causou estardalhaço ao afirmar que cada brasileiro consumia 5,2 litros de agrotóxicos por ano. À época, o cálculo foi simples: a indústria dos venenos, orgulhosa do sucesso de seu mortífero negócio, alardeou aos quatro ventos que havia vendido 1 bilhão de litros de agrotóxicos. Divididos pelos então 192 milhões de habitantes, nos davam os 5,2 litros por pessoa. Ainda que este volume todo não chegue diretamente à nossa mesa, vai nos encontrar algum dia pela terra, pela água ou pelo ar. O veneno não desaparece, como querem fazer crer aqueles que enriquecem com ele.
Pois bem, depois do baque, as associações patronais agrotóxicas deixaram de divulgar a quantidade de litros vendidos por ano. E, dada a escassez de dados oficiais sobre a venda destes produtos no Brasil, ficamos quase sem alternativas para medir o nível geral de intoxicação no país.
Quase. Talvez para atrair mais “acionistas-vampiros”, a indústria continuou divulgando sua receita anual, que, em 2014, representou US$ 12,2 bilhões. Multiplicado por 3, chegamos aos exorbitantes R$ 36,6 bilhões.
Quanto custa um litro de agrotóxico?
Agrotóxico é um nome genérico para diversas substâncias utilizadas na agricultura e no controle de vetores urbanos. Em comum, uma característica: matam a vida. Poderiam, portanto, ser chamados de biocidas.
O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) publicou, em 2012, a quantidade de princípios ativos de agrotóxicos vendidos naquele ano. Os três entes reguladores – Ibama, Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e Ministério da Agricultura (MAPA) – deveriam receber estes dados das empresas e publicar. Contudo, apenas o primeiro o faz, e já com atraso de dois anos.
Por esta lista, vemos que os principais produtos são: glifosato, 2,4-D, atrazina, acefato, diurom, carbendazim, mancozebe, metomil e clorpirifós. Retirando-se os aditivos, eles representam 80% do total de agrotóxicos vendidos.
Uma busca pelos preços de agrotóxicos na internet revela um cenário assustador. Encontra-se, por exemplo, a atrazina (disruptor endócrino) a R$ 0,34 o litro, enquanto o mais caro, glifosato (cancerígeno), na promoção sai por R$ 35. Com uma média dos preços, ponderada pela participação no mercado, chegamos ao valor de R$ 24,68 por litro de agrotóxico.
A partir da população estimada pelo IBGE em 2013, de 201 milhões pessoas, temos R$ 36,6 bilhões / R$24,68 por litro de agrotóxico / 201 milhões de pessoas. O que resulta, então, em 7,36 litros de agrotóxico por pessoa.
E o povo com isso?
Os preços dos produtos variam, o dólar ora sobe, ora desce. Poderíamos ter alguns mililitros a mais ou a menos, mas o certo é que, de 2007 até hoje, 34.282 casos de intoxicação por agrotóxico foram notificados no Sistema Único de Saúde (SUS). Mesmo assim, qualquer um que viva no campo sabe o quão improvável é que uma pessoa reconheça os sintomas de intoxicação, consiga chegar ao atendimento e que o serviço notifique corretamente. Seja por desconhecimento ou por pressão de quem mandou aplicar os venenos.
Certo também é que, além de caros e perigosos, os venenos, assim como os transgênicos, são desnecessários. De Sul a Norte do país, a produção agroecológica ganha força na terra, nas feiras e na mesa da população. A não ser que algum fazendeiro ganancioso inviabilize a produção limpa jogando veneno na lavoura alheia. Infelizmente, acontece, e muito.
O povo precisa de informação
Anvisa, publique os dados sobre vendas de agrotóxicos. Ministério da Agricultura, faça o mesmo. Ibama, atualize seus dados. Conselhos Regionais de Engenharia e Agronomia, responsáveis pela emissão de receitas agronômicas, implantem sistemas informatizados em todos os estados, e divulguem quanto, como e onde se aplica veneno neste país. Que tipo de engenharia vocês fazem, que não se compromete socialmente e não fornece informação vital para a saúde do povo?
No entanto, mais do que contar os mortos, queremos plantar a vida. Governo Federal, implemente o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Planapo). E, sobretudo, inicie o Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos, que permitirá a criação de zonas livres de agrotóxicos e transgênicos, além de banir, também no Brasil, agrotóxicos que já foram banidos lá fora.
Entidades de pesquisa renomadas como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o Instituto Nacional do Câncer (Inca) e a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) já se juntaram a camponeses e camponesas, que são quem realmente nos alimentam.
E ainda precisamos de mais apoio da sociedade. Nossa luta diária contra o agronegócio, os agrotóxicos e os transgênicos só estará completa quando o alimento orgânico não for mais um privilégio e a agroecologia estiver ao alcance de toda a população.

fonte:http://www.brasildefato.com.br/node/31926
foto:https://mpacontraagrotoxicos.wordpress.com/

A história de uma mulher escrava por dois anos horroriza o México


O pesadelo da Ana (nome falso) durou dois anos. Só chegou ao fim há alguns dias, quando percebeu que a corrente que a mantinha atada ao ferro de passar roupa de uma tinturaria do sul da Cidade do México estava frouxa. Soltou-se e saiu à rua, onde foi encontrada por um policial. Depois de pedir ajuda foi levada ao Ministério Público para denunciar seus captores. Sua história surpreendeu os habitantes da capital do México, que ouviram um arrepiante relato de escravidão no século XXI.
Ana conheceu seus captores, a família Molina, há seis anos. Começou a trabalhar para eles engomando roupa quando era adolescente. O trato não era ruim, mas ela ficou pouco tempo trabalhando para eles porque se mudou durante certo tempo para a casa da mãe, que vivia em Tamaulipas, no nordeste do país. Em 2013, entretanto, retornou à casa da família Molina para trabalhar e ganhar um salário.
As irmãs Leticia e Fanny começaram a responsabilizá-la por roubos. Esse foi o início dos maus-tratos. Deixaram de pagar-lhe um salário e proibiram que deixasse a casa, localizada na rua de Izamal, no bairro de Tlalpan.
Ana declarou às autoridades que seus captores a alimentavam uma vez ao dia com caldo de frango com feijão e algumas tortillas. Para mitigar a fome o resto do dia mastigava o plástico que usava para cobrir as roupas da tinturaria. Para matar a sede bebia a água destilada dos ferros de passar. A má alimentação faz com que a vítima pareça uma pessoa muito menor. “A jovem tem um aspecto físico de 14 anos, mas seus órgãos e as funções dos mesmos são como os de uma pessoa de 81 anos, pelos danos deixados pelo cativeiro”, explicaram agentes da Procuradoria de Justiça da Cidade do México (PGJDF). Os médicos consideram que as sequelas pelos maus-tratos significam um risco para sua vida
As autoridades afirmaram que quando a mulher tentava descansar “era golpeada com uma chave mecânica” ou com um pilão. Suas costas também eram queimadas com o ferro. A família que a escravizava não permitia que suas feridas cicatrizassem, o que deixou marcas em todo o corpo parecidas com as da varicela. “Trata-se do primeiro caso desse tipo registrado na Cidade do México”, disseram estupefatos os agentes da procuradoria.
Cinco pessoas foram detidas. José de Jesus Sánchez Vera; as irmãs Leticia e Fani Molina Ochoa e Ivette e Janet Hernández Molina foram apreendidas na casa que serviu de prisão a Ana. A promotoria acusou-as do delito de tráfico de pessoas na modalidade de trabalhos forçados.
Manlio Fabio Beltrones, o líder do PRI na Câmara de deputados reprovou o fato. “Parece-me grave e vergonhoso que ainda em alguns espaços na República Mexicana exista a escravidão tradicional como essa”, afirmou. O Congresso trabalha uma lei contra o tráfico de pessoas, que ainda aguarda aprovação no Senado.
Na segunda-feira Ana voltou para a casa em que foi mantida em cativeiro. Lá descreveu aos agentes encarregados do caso as condições nas quais trabalhou durante dois anos. As marcas em suas costas e as cicatrizes em seu pescoço expressam melhor do que as palavras o horror ao que foi submetida.

Reportagem de Luis Pablo Beauregard
fonte:http://brasil.elpais.com/brasil/2015/04/28/internacional/1430186084_948127.html

Contra-ofensiva à maioridade penal num ícone da resistência paulistana


Quando um ato público lota o Salão Nobre da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, é bom que se preste atenção: algo, no palco da democracia brasileira, pede mobilização social. Ontem (28), o motivo do encontro que reuniu juristas, acadêmicos, estudantes e integrantes de diversos órgãos da sociedade civil no centro da capital paulista foi uma esperada reação ao avanço da PEC 171/93 que propõe a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos na Câmara de Deputados. Junto com esse, outros temas defendidos pela facção mais conservadora do Congresso Nacional, como o estatuto do desarmamento, também vieram à tona.
Com a presença do ex-senador e secretário municipal de Direitos Humanos, Eduardo Suplicy e do secretário nacional de Juventude, entre outras personalidades ligadas à causa, o encontro foi coordenado pelo professor da USP Sérgio Salomão Shecaira, quem incitou o legado político da faculdade, resgatando a famosa ‘Carta aos brasileiros’. Trata-se de uma carta redigida pelo jurista Goffredo da Silva Telles Jr. em repúdio à ditadura militar e lida publicamente na São Francisco em 1977, marcando o início da redemocratização do país depois do Golpe de 64. “Chegou a hora de lermos uma nova ‘Carta aos brasileiros’ neste mesmo espaço marcado pela defesa da nossa democracia”, anunciou, antes que José Carlos Dias, ex-ministro da Justiça do Governo FHC, se pudesse a ler o documento em tom de luta.
O texto em questão é um manifesto contra a PEC, de autoria do grupo que organizou o evento – profissionais de Direito ao lado de representantes de instituições pela defesa dos Direitos Humanos – e que deverá ser enviado ao Congresso Nacional. Um de seus trechos brada: “Não aceitaremos o encarceramento da juventude brasileira”. E seu final propõe às vozes contrárias à redução da idade penal o compromisso de denunciar o Estado brasileiro perante a ONU, caso a emenda seja futuramente aprovada, primeiro pela Câmara e depois pelo Congresso.
A indignação marcou a fala de todos os que discursaram, inclusive a de outro ex-ministro da Justiça tucano, Miguel Reale Júnior, mostrando que atualmente são as figuras mais veteranas do PSDB as mais mobilizadas socialmente e, curiosamente, as menos conservadoras. “Por que esse assunto [da redução da maioridade penal] veio à tona agora, do nada? Por causa da reduzida popularidade da Câmara e do Congresso”, afirmou o ex-ministro, ex-aluno e ex-professor da casa, em alto volume e de punho em riste. Para ele, o que se vê é um “jogo de cena de Eduardo Cunha, que percebeu que era preciso criar uma ilusão penal” para resgatar a imagem da casa que preside. “Essa PEC é uma fraude, uma mentira longe de todos os dados disponíveis sobre menores de 18 anos que praticam crimes”, concluiu. Foi aplaudido de pé.
Também de pé foi recebida na tribuna montada para os discursos da sociedade civil a fundadora do grupo Mães de Maio, Débora da Silva. “A população deveria estar discutindo os grupos de extermínio que estão matando os nossos filhos. Não é justo jogar o problema em cima da população pobre, preta e periférica”, bradou, depois de marcar a posição contrária à redução de seu movimento, criado em 2006 com o intuito de pressionar o Estado a reconhecer os crimes que cometeu. Foi despedida aos gritos de “Não acabou... Tem que acabar... Eu quero o fim da Polícia Militar!”.
Não faltaram estatísticas, assim como no debate público que aconteceu no mesmo dia no Ministério Público de São Paulo, que comprovam o que os presentes chamaram de “irracionalidade da PEC 171”.

Reportagem de Camila Moraes
fonte:http://brasil.elpais.com/brasil/2015/04/29/politica/1430314007_636337.html
foto:http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2015/04/1622482-juristas-e-autoridades-fazem-em-sp-ato-contra-a-reducao-da-maioridade-penal.shtml

28/04/2015

Imagem do dia



Conflito no viveiro da elite argentina


Durante 152 anos tem sido a joia da educação pública gratuita argentina. A escola que todas as famílias de classe média sonham mandar seus filhos. O Colégio Nacional de Buenos Aires só recebe os mais brilhantes, em um duríssimo processo de seleção que a cada ano mais de 1.000 participam e 400 entram. “É uma ilha de excelência em meio à decadência da educação pública argentina”, diz seu reitor, Gustavo Zorzoli. Mas nem tudo é perfeito. Na semana passada, durante três dias e noites, seus alunos, de 13 a 18 anos, tomaram o colégio para combater uma reforma que implicava, entre outras coisas, tirar do colégio os alunos mais atrasados, quase 10%. Seu protesto, ao qual uniu-se outro colégio público de elite, o Carlos Pellegrini, teve ampla repercussão nos veículos de comunicação argentinos, por conta do prestígio do centro de ensino, e por enquanto conseguiu parar a reforma.
Entrar no Colégio Nacional é voltar por um momento à época de esplendor da Argentina, que atraía e assombrava os europeus que fugiam da fome. Um edifício neoclássico imponente no coração da cidade, com uma grande escadaria de mármore de Carrara e uma biblioteca única. Em 2013 esse viveiro da elite política e intelectual completou 150 anos, no qual estudaram três presidentes, dois prêmios Nobel e muitos políticos atuais, incluindo o ministro da Economia, Axel Kicillof, da turma de 1990.
No imenso e luminoso saguão, na terça-feira, 300 adolescentes sentados em assembleia discutiam sobre como continuar o protesto para reivindicar o modelo de seu colégio e a educação pública. “O colégio tem um nível impressionante, é muito exigente, mas o modelo é falho. Existem barreiras socioeconômicas: para entrar é preciso preparar-se em cursinhos privados, e agora querem retirar mais gente e acabar com as aulas de apoio”, diz Félix Samoilovich, de 16 anos, um dos porta-vozes do protesto. Julia Bozzalla, outra aluna, completa enquanto fica de guarda na porta: “Queremos evitar que aconteça como no Chile, a privatização. Nós queremos que toda a educação argentina seja como esse colégio, pública, gratuita, de bom nível”. Sol Gui, presidenta do grêmio de estudantes, vai mais longe e acredita que por trás da reforma existe “um regime privatizador, que quer acabar com a educação pública”.
O reitor Zorzoli nega radicalmente, mas parece quase contente com o protesto, que o levou também a dormir na escola para controlar de perto a situação. Acredita que é uma amostra de que esse colégio, referência da intelectualidade, está vivo. E que as novas gerações têm vontade de batalhar. “Os dois pilares deste centro são a excelência, que não se perdeu, e a participação política. Aqui são muito estudiosos, mas também muito militantes, agitados. Certo, muitos acabaram na política. A metade dos candidatos das eleições primárias de Buenos Aires (a votação foi domingo) estudaram aqui”, diz.
“A educação pública argentina deteriorou-se muito, é preocupante; os resultados da [avaliação] PISA são muito ruins, mesmo com o investimento de muito dinheiro, mas aqui conseguimos nos isolar”, assegura Zorzoli, que sustenta que também há em suas salas de aula pessoas de origem muito humilde, a quem às vezes oferecem alojamento. Os estudantes dizem que a história não é tão perfeita.
A política está por todos os lados no colégio, como acontece em toda Argentina. A militância dos jovens e adolescentes, habitual nos anos setenta, retornou no século XXI. Na batalha interna desse colégio de elite o vencedor é o Partido Obrero, minoritário do lado de fora, em votações muito divididas nas quais o kirchnerismo é o terceiro colocado.
A educação pública na Argentina sempre foi um assunto de Estado. Enquanto na Europa, no começo do século XXI, a Alemanha e a Inglaterra abandonaram a gratuidade da universidade, a Argentina a manteve a todo custo até mesmo depois da crise de 2001. Por isso não garante a qualidade.
“Todos que estamos nessa mesa somos filhos da universidade pública gratuita argentina”, disse a presidenta Cristina Kirchner nessa mesma semana em Moscou, indicando seus ministros. Seu Governo, admitem todos os especialistas, fez um enorme esforço orçamentário na educação. Mas os resultados não convencem. O relatório PISA de 2012 —o de 2015 está para ser divulgado— foi duríssimo para a moral argentina, acostumada a ter a melhor escola da América Latina e agora ficando na metade da tabela enquanto o Brasil, Chile, México e até mesmo o Equador e Peru fizeram grandes progressos. A Argentina perdeu a liderança que a tornou referência mundial, mas o Nacional de Buenos Aires luta para manter seu modelo.

Reportagem Carlos. E. Cué
fonte:http://brasil.elpais.com/brasil/2015/04/27/internacional/1430093261_978920.html
foto:http://www.laradioamistad.com.ar/inicio/noticia/4269.html

Projeto que acaba com Estatuto do Desarmamento se baseia em erros

O projeto de lei 3722/2012, que acaba com o Estatuto do Desarmamento, se baseia em ao menos duas informações incorretas. De autoria do deputado federal Rogério Peninha Mendonça (PMDB-SC), o projeto libera o porte de armas para pessoas com mais de 21 anos que não tenham antecedentes criminais nem estejam sendo investigadas por crime doloso. No texto do projeto de lei, o deputado afirma que “em todo o ano de 2004 e nos dez meses de 2005 [com o Estatuto do Desarmamento já em vigência] os índices de homicídio não sofreram redução”. O parlamentar cita como fonte o Mapa da Violência 2011, estudo coordenado pelo sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz e considerado referência no assunto.
No entanto, o relatório citado desmente o deputado: no período em questão, houve redução de 796 homicídios, de 48.374 em 2004 para 47.578 no ano seguinte. Questionado sobre a disparidade na informação, Peninha afirmou que precisa “ver esses números aí”. Uma versão mais atualizada do Mapa, lançada em 2013, também vai contra os dados apresentados pelo deputado, e Jacobo já veio a público criticando o uso errôneo feito pelo parlamentar de seu estudo.
Mais à frente no projeto de lei, ainda citando o Mapa da Violência, o parlamentar diz que “em 2003 (...) ocorreram no Brasil mais de 50.000 homicídios, número semelhante ao verificado em 2004 e não divergente dos registrados nos anos seguintes”. Na realidade, o relatório citado aponta queda dos homicídios por dois anos consecutivos, em 2004 e 2005, a primeira redução no número de mortes desde 1996. Por email, Peninha afirmou que "as reduções apontadas no Mapa da Violência são pontuais, puxadas essencialmente pela Região Sudeste, mais especificamente São Paulo e Rio de Janeiro". O parlamentar diz ainda que os dados usados contradizem os dados do Ministério da Saúde. Na realidade, o estudo é feito com base nos dados da pasta, citado no pé da tabela como MS.
O deputado também cita em seu projeto um estudo da ONU, o Global Study on Homicide, para afirmar que a entidade “pela primeira vez na história reconheceu que não se pode estabelecer relação direta entre o acesso legal da população às armas de fogo e os índices de homicídio”. Na realidade, o documento afirma o contrário do alegado por Peninha: "o grande número de homicídios nas Américas mostra que, dependendo do contexto, o acesso facilitado às armas pode ter um efeito significativo no número de mortes". Mais à frente, o relatório da ONU insiste na tese de que quanto mais armas, mais mortes. Indagado sobre a nova incongruência entre os dados da justificativa do projeto de Lei, o deputado afirmou que “não existe isso". Posteriormente, ele enviou por email um longo trecho do documento da ONU, contendo uma frase que contradiz sua justificativa: "a relação entre o número de armas de fogo e o de crimes, incluindo os homicídios, parece ser um tipo de ciclo vicioso”.
Peninha afirmou também que "ninguém espera que a ONU, idealizadora da tese do desarmamento civil, vá abandonar de vez seu apego desarmamentista". Na opinião do deputado, "o  trecho destacado [pelo repórter] não traz a distinção entre armas legais e ilegais, o que é absolutamente essencial para se compreender o tema".
Ainda no projeto da lei que acaba com o Estatuto do Desarmamento, Peninha diz que “não é a arma legalizada a que comete crimes, mas a dos bandidos, para os quais a lei de nada importa”. A CPI do Tráfico de Armas da Câmara, de 2006, chegou a uma conclusão diversa. O relatório final da comissão diz que “55% das armas [encontradas com criminosos] rastreadas (…) foram legalmente vendidas, antes de caírem na ilegalidade. Destrói-se o mito de que as armas vendidas a cidadãos de bem nada têm a ver com as armas dos criminosos”. Peninha disse não conhecer o texto do relatório. Posteriormente, por email, ele desqualificou as conclusões da comissão, e afirmou que como não rastreou armas com numeração raspada, os resultados não podem ser confiáveis.
“Eu tenho dados. A partir do Estatuto do Desarmamento até hoje, houve aumento da criminalidade. A cada 100.000 pessoas hoje, houve um aumento de homicídios de 1,34%”, afirmou por telefone o deputado ao EL PAÍS. Ele não soube citar a fonte deste dado.
Os números sobre os homicídios no Brasil em comparação ao projeto de Desarmamento são polêmicos, até porque a redução do número de mortes não depende só da posse de arma, segundo especialistas. Mas, o papel do Estatuto foi decisivo para atenuar a violência. De 1980 a 2003 o número de homicídios por arma de fogo no país crescia a uma taxa média de 8% ao ano. Quase uma década depois da aprovação do Estatuto, esta taxa caiu para menos de 1% ao ano. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) estima que isso salvou 120.000 vidas. Ou seja, se em números absolutos tivemos em 2012 cerca de 56.000 mortes - mais do que as 51.000 registradas em 2003 -, é matematicamente comprovado que o cenário seria pior sem as medidas do Estatuto. Peninha classifica o levantamento do Instituto como sendo "absolutamente fantasioso, desprovido de qualquer critério técnico".
O deputado afirmou que estudos da universidade de Harvard comprovam que não há relação entre a proibição do porte de armas e o índice de homicídios. O relatório em questão, Would Banning Firearms Reduce Murder and Suicide? (Banir armas de fogo reduz homicídios e suicídios, em tradução livre) , dos professores Don B. Kates e Gary Mauser foi parcialmente financiado pela National Rifle Association, a maior entidade ligada aos fabricantes de armas do mundo.
O fato do projeto de Peninha ser baseado em informações incorretas, no entanto, não o invalida, já que se trata de um processo político, e não jurídico, dizem especialistas. O projeto será analisado por uma comissão especial da Câmara, cujo presidente e o relator, Marcos Montes (PSD-MG) e Laudívio Carvalho (PMDB-MG), respectivamente, são membros declarados da 'bancada da bala', que defende abertamente o fim do Estatuto e a redução da maioridade penal. Montes, inclusive, teve a campanha financiada pela Forjas Taurus, uma das maiores empresas do ramo de armamentos do país, e pela Companhia Brasileira de Cartuchos, fabricante de munições.

Reportagem de Gil Alessi
fonte:http://brasil.elpais.com/brasil/2015/04/20/politica/1429540410_832811.html
foto:https://twitter.com/desarmeja

A arte de passar horas em filas na Venezuela

A Venezuela enfrenta a falta de muitos produtos básicos. O governo culpa os Estados Unidos e a Europa, afirmando que eles tentam destruir a economia do país.Outros afirmam que o governo é o causador dos problemas. O correspondente da BBC Ian Pannell tenta desvendar como é a nova e surreal arte de ficar nas filas da capital, Caracas.

O mínimo que se espera de um correspondente em outro país é que ele ou ela consiga explicar a realidade de onde está. Na Venezuela isto pode ser mais difícil do que o normal.
A República Bolivariana da Venezuela tem um governo socialista que, em linhas gerais, usou - ou fez mau uso - das grandes riquezas petrolíferas para beneficiar algumas pessoas, durante algum tempo, e se manter no poder.
Mas, a combinação de um gerenciamento econômico lamentável e uma grande queda nos preços do petróleo deixou o governo com um problema sério. E a população da Venezuela acabou em filas, em todo o país, todos os dias, durante horas.
As pessoas até têm licenças de algumas horas no trabalho para poder ficar nas filas. Elas acordam muito cedo para enfrentar a maratona, enfrentam filas no horário de almoço, enviam mensagens umas para as outras com informações sobre as filas.
Então, não surpreende que elas tenham ficado muito boas na prática da fila.
Sendo inglês, gosto de uma boa fila – bem formada, em ordem, sem dúvidas sobre quem está na sua frente e quem está atrás.
Há muitos países que não respeitam estas boas e antigas tradições e preferem o sistema do "primeiro que passar", o que envolve empurrões e grunhidos.
Mas, em geral, a Venezuela é mais parecida com a Grã-Bretanha no que diz respeito a filas. A diferença é que, na Venezuela, eles não estão esperando por um ônibus: a espera é por leite, café, açúcar, farinha de milho, óleo de cozinha e até papel higiênico.
Todos estes produtos estão em falta.

Preços controlados

O governo regula o preço destas mercadorias. Não há subsídios para elas, o governo apenas diz aos produtores o que eles podem cobrar.
Isto pode fazer algum sentido em uma economia dinâmica, mas com a inflação ultrapassando os 60% e o valor da moeda local caindo, parece que os produtores não estão lucrando mas também operando com prejuízo.
Por outro lado, empresas que exportam alimentos para o país desistiram de esperar os pagamentos do governo e agora estão vendendo seus produtos em outro lugar.
Mas o governo e seus partidários contam outra história. Eles culpam os Estados Unidos, Europa, grandes companhias e contrabandistas por uma guerra econômica contra o país, de tentar prejudicar o presidente Nicolás Maduro e o legado de seu antecessor, Hugo Chávez, de tentar colocar o povo contra o governo.
O governo pediu para os comerciantes esconderem as filas, colocar as pessoas em porões ou estacionamentos subterrâneos, aparentemente para proteger os clientes do sol. Jornalistas são proibidos de filmar prateleiras vazias.
Os consumidores também receberam instruções: você pode comprar produtos em falta apenas em alguns dias da semana, dependendo do número final de seu documento de identidade.
Então, por exemplo, se o número de sua carteira de identidade acaba em zero ou um, então você pode ir para a fila na segunda-feira. Mas, isto não significa necessariamente que o leite ou o sabão estarão disponíveis na segunda-feira para você comprar.
Outra anomalia é que, frequentemente, as prateleiras não estão vazias. Apenas as mercadorias com preços regulados estão em falta. Então, se você quer outra coisa, e tem dinheiro para estes produtos com preços bem mais altos, então é possível ultrapassar a fila e entrar diretamente na loja.
Frequentemente as pessoas vão para a fila sem saber o que está à venda. Elas entram na fila e então perguntam para pessoa logo em frente o que está disponível.
É muito provável que a pessoa logo em frente tenha feito exatamente a mesma coisa.

Desistências

Vimos uma fila que avançava apenas porque as pessoas na frente desistiam da espera e iam procurar produtos em outros lugares. Mas, para quem estava mais atrás, não era possível ver isso, elas apenas tinham a ilusão do movimento e ficavam um pouco mais.
Nesta ocasião não havia nada para esperar. Havia um boato de que a loja poderia receber algo, ninguém sabia o quê, mas no final não havia produto nenhum.
E assim a vida continua. É um símbolo surreal de um sistema que não funciona e não faz sentido.
A frustração aumenta e, em algumas situações, tudo acaba em tumulto. Alguns consumidores até tiveram as compras roubadas enquanto iam para casa.
Se os consumidores continuarem acreditando nos motivos do governo, de que esta crise é causada pelos inimigos da Venezuela, então talvez o governo consiga contornar a insatisfação cada vez maior.
Mas, muitos venezuelanos não querem mais comprar esta ideia.

fonte:http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2015/04/150426_filas_venezuela_fn#orb-banner
foto:http://veja.abril.com.br/blog/rodrigo-constantino/socialismo/venezuela-filas-enormes-para-obter-comida-e-braco-marcado-feito-gado/