O presidente norte-americano, Barack Obama, participou ontem
(28/08) em Washington de evento comemorativo pelo aniversário de 50 anos do
emblemático discurso “Eu tenho um Sonho”, de Martin Luther King Jr.(foto acima) -
considerado um marco da igualdade de direitos civis aos afro-americanos.
Enquanto isso, entre becos e vielas dos EUA, os negros não vão ter muitos
motivos para celebrar ou "sonhar com a esperança", como bradou Luther
King em 1963.
De acordo com sociólogos e especialistas em estudos das
camadas populares na América do Norte, os índices sociais - que incluem emprego,
saúde e educação - entre os afrodescendentes norte-americanos são os piores em
25 anos. Por exemplo, um homem negro que não concluiu os estudos tem mais
chances de ir para prisão do que conseguir uma vaga no mercado de trabalho. Uma
criança negra tem hoje menos chances de ser criada pelos seus pais que um filho
de escravos no século XIX. E o dado mais assombroso: há mais negros na prisão
atualmente do que escravos nos EUA em 1850, de acordo com estudo da socióloga
da Universidade de Ohio, Michelle Alexander.
“Negar a cidadania aos negros norte-americanos foi a marca
da construção dos EUA. Centenas de anos mais tarde, ainda não temos uma
democracia igualitária. Os argumentos e racionalizações que foram pregadas em
apoio da exclusão racial e da discriminação em suas várias formas mudaram e
evoluíram, mas o resultado se manteve praticamente o mesmo da época da
escravidão”, argumenta Alexander em seu livro The New Jim Crow.
No dia em que médicos brasileiros chamaram médicos cubanos
de “escravos”, a situação real, comprovada por estudos de institutos como o
centro de pesquisas sociais da Universidade de Oxford e o African American
Reference Sources, mostra que os EUA têm mais características que lembram uma
senzala aos afrodescendentes que qualquer outro país do mundo.
Em entrevista a Opera Mundi, a professora da Universidade de
Washington e autora do livro “Invisible Men: Mass Incarceration and the Myth of
Black Progress”, Becky Pettit,argumenta que os progressos sociais alcançados
pelos negros nas últimas décadas são muito pequenos quando comparados à
sociedade norte-americana como um todo. É a “estagnação social” que acaba
trazendo as comparações com a época da escravidão.
“Quando Obama assumiu a Presidência, alguns jornalistas
falaram em “sociedade pós-racial” com a ascensão do primeiro presidente negro.
Veja bem, eles falaram na ocasião do sucesso profissional do presidente como
exemplo que existem hoje mais afrodescendentes nas universidades e em melhores
condições sociais. No entanto, esqueceram de dizer que a maioria esmagadora da
população carcerária dos EUA é negra. Quando se realizam pesquisas sobre o
aumento do número de jovens negros em melhores condições de vida se esquece que
mais que dobrou o número de presos e mortos diariamente. Esses não entram na
conta dos centros de pesquisas governamentais, promovendo o “mito do progresso
entre nos negros”, argumenta.
Segundo Becky Pettit, não há desde o começo da década de
1990 aumento no índice de negros que conseguem concluir o ensino médio. Além
disso, o padrão de vida também despencou. Além do aumento da pobreza, serviços
básicos como alimentação, saúde, gasolina (utilidade considerada fundamental
para os norte-americanos) e transportes público estão em preços inacessíveis
para muitos negros de baixa renda. Mais de 70% dos moradores de rua são
afrodescendentes.
Michelle Alexander, por sua vez, critica o sistema
judiciário do país e a truculência que envia em massa às prisões os negros. “Em
2013, vimos o fechamento de centenas de escolas de ensino fundamental em
bairros majoritariamente negros. Onde essas crianças vão estudar? É um círculo
vicioso que promove a pobreza, distribui leis que criminalizam a pobreza e
levam as comunidades de cor para prisão”, critica em entrevista ao jornal LA
Progresive.
Reportagem de Dodô Calixto
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