10/05/2013

Argentina aprova lei que ameaça autonomia do Judiciário


Criticada até pela ONU, medida implanta voto popular e indicação política para escolha de membros do Conselho de Magistratura, órgão que nomeia juízes.


O Senado argentino aprovou na última quarta-feira a lei que instaura a eleição direta para a escolha dos membros do Conselho de Magistratura, órgão judiciário fundamental no país pois é o responsável por nomear e destituir juízes. A aprovação da lei, que também amplia de 13 para 19 os integrantes do conselho, é uma vitória do governo da presidente Cristina Kirchner  e faz parte de um pacote de medidas destinado a avançar sobre a autonomia do Judiciário.
Depois de sete horas de debates, o kirchnerismo conseguiu a aprovação com uma maioria de 38 votos contra 30 da oposição. A nova norma, que já passou pela Câmara, é uma das principais bases da reforma judiciária proposta pelo governo, que inclui aos todo seis leis criadas para permitir ao Executivo politizar o Judiciário, elegendo juízes comprometidos com o oficialismo e ameaçando a independência das instituições. Com a nova regra, dos 19 integrantes do Conselho de Magistratura, 12  (três juízes, três advogados e seis acadêmicos) serão eleitos pelo voto popular e terão seus nomes indicados pelos partidos nas cédulas das eleições regulares, o que a oposição considera "uma partidarização da Justiça".  
Criticada também por advogados e juízes, a reforma do judiciário empreendida por Cristina Kirchner – que o governo chama de "democratização" – foi objeto de contestação até na ONU. Relatora especial das Nações Unidas sobre a independência dos magistrados e advogados, a brasileira Gabriela Knaul pediu semana passada ao governo argentino que reconsidere os projetos de lei da reforma do Conselho de Magistratura e da regulação de medidas cautelares contra o estado, outra medida que faz parte do pacote e limita o número de recursos judiciais contra o governo.
Independência – Knaul, designada pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU para investigar a independência dos juízes e advogados no mundo, disse que o estado tem o "compromisso de assegurar a independência do Judiciário através do respeito à sua legislação e aos padrões internacionais".

"Ao outorgar a possibilidade aos partidos políticos de propor e organizar as eleições dos conselheiros, coloca-se em risco a independência dos membros do Conselho de Magistratura, o que compromete seriamente os princípios de separação de poderes e a independência do Poder Judicial, elementos fundamentais de toda democracia e de todo estado de direito”, disse Gabriela. 

Segundo a especialista em Poder Judiciário, "a regulamentação sobre a eleição partidária dos membros do Conselho de Magistratura é contrária ao artigo 14 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e aos princípios básicos relativos à independência do Judiciário".

Nova exigência – Durante o debate em plenária a oposição questionou uma modificação introduzida na reforma do Conselho de Magistratura, que obriga os partidos políticos a apresentarem a lista sob o mesmo nome em pelo menos 18 distritos (de um total de 24) para participar da eleição de conselheiros, requisito que apenas o governo pode cumprir, segundo os adversários. O partido Frente Para a Vitória (FPV, da situação) se apresenta com esse nome em todos os distritos eleitorais do país, enquanto outras agremiações o fazem com denominação diferente para conseguir compor alianças eleitorais.

Com esse requisito, "o oficialismo é o único capaz de apresentar candidatos para o Conselho de Magistratura", disse o senador Gerardo Morales, da opositora União Cívica Radical, a segunda força no Senado. Já o chefe da bancada governista, Miguel Angel Pichetto, alegou que "nenhum juiz vai se subordinar a partido algum". "Deixem de ter um olhar hipócrita, estúpido, de não assumir que (o Judiciário) é um poder importante que tem um forte conteúdo de politização, um olhar mais conservador", atacou.

Do pacote de seis leis, quatro já foram aprovadas. As restantes serão debatidas pelo Senado. Uma delas ainda voltará para a Câmara dos Deputados, onde o governo também tem maioria. 


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigada pela visita e pelo comentário!