São histórias de imigração pouco conhecidas que a cada ano transitam pelas salas de audiência dos juizados de família, quando são feitos pedidos de mudança de nome. Como o caso de Youssef, que quis virar Jean-François. Yamina, que depois dos cinquenta anos preferiu se chamar Brigitte. Ou Guillaume, disposto a fazer qualquer coisa para se chamar Salah.
Há mais de um ano, um sociólogo da Universidade Paris 8-Vincennes-Saint-Denis obteve do Ministério da Justiça a autorização para mergulhar nessas deliberações que envolvem cerca de 3 mil pessoas por ano. Ele já reuniu cerca de 500 histórias e seu trabalho – que deve culminar em um relatório em novembro – revela toda uma faceta da mestiçagem da população francesa.
No decorrer de suas pesquisas, feitas em três tribunais da região de Île-de-France, Baptiste Coulmont, autor de "Sociologie des prénoms" ("Sociologia dos nomes", Ed. La Découverte, 2011), descobriu que mais de três quartos dos requerentes tinham no mínimo um dos pais nascidos no exterior. Historicamente, os primeiros a pedirem por mudanças de nomes na França foram os judeus da Europa Central nos anos 1950. Mas a sociologia dos requerentes nunca mais foi estudada desde então.
Embora os pedidos de mudança de nome sejam em sua maior parte iniciativa de pessoas oriundas da imigração, como pôde constatar o sociólogo, elas são motivadas tanto por uma "francesização" quanto por uma "desfrancesização". O que eles revelam, acima de tudo, segundo o pesquisador, "são todas as pequenas incompreensões intrínsecas à migração".
Entre os inúmeros casos que Coulmont encontrou, há pessoas que se arrependeram do nome que elas escolheram quando fizeram o pedido de nacionalidade francesa.
"Nos formulários de naturalização, a segunda casa que a administração pede para assinalar diz respeito à francesização do nome e do sobrenome. Muitos estrangeiros assinalam 'sim', pensando que isso aumenta suas chances", explica o sociólogo.
Napoleão ou Mauricette
Uma lista de "nomes franceses" que condiz, de forma geral, com a do calendário, é distribuída nas administrações. Nessa lista com mais de 400 nomes em ordem alfabética, o futuro naturalizado pode escolher como bem entender entre Amandine, Alix ou Antoinette para as meninas; Sylvain, Edmond ou até Constantin para os meninos.
Coulmont encontrou uma jovem de origem turca, cujos pais trocaram de nome quando se naturalizaram. Aysel tinha 10 anos quando de repente se tornou Aurélie. "Mas, já adulta, ela não aguentava mais esse nome francês e quis voltar para o turco", conta o pesquisador. "Durante a audiência, ela alegou que seus colegas de escola diziam que 'ela não tinha cara de Aurélie'".
Há também o caso de todos aqueles que sofreram por causa de "nomes antiquados ou ridículos devido ao pouco domínio do francês por parte de seus pais ou de incompreensões culturais", detalha Coulmont. Ele encontrou um chinês que foi batizado de Napoléon e moças que não aceitavam bem se chamar Josette ou Mauricette.
A preocupação de unificação familiar é também um dos motivos dos pedidos para mudança de nome. Sobretudo entre os convertidos – ainda que em pequeno número. "Se o marido e o os filhos têm um nome que soa magrebino ou judeu, as mulheres com nomes que soam 'franceses' podem querer um nome que se pareça com o do resto da família", aponta Coulmont. Como Noëlle, que quis virar Nawel depois de se casar com um Nabil de fé muçulmana e de ter batizado seus filhos de Youcef e Faiza.
Nesse caso, os requerentes muitas vezes precisam enfrentar "as suspeitas de 'desintegração' dos juristas", ressalta o pesquisador. Do ponto de vista jurídico, somente a "francesização", o "preconceito" ou a "integração a uma comunidade religiosa" são de fato reconhecidos, de maneira automática, como um "interesse legítimo" em mudar de nome.
Os pedidos de mudança de nome por discriminação são poucos, no entanto: um em cada seis pedidos. "Um resultado distorcido pelo fato de que eles são difíceis de provar", explica Coulmont. Os requerentes apresentam então "o uso prolongado" do nome requerido, reconhecido como outro interesse legítimo, mais fácil de demonstrar.
É o caso de Sihem, 30, nascida no Marrocos e naturalizada francesa em 2005, que queria se tornar Sarah. Para justificar seu pedido, ela juntou ao seu dossiê uma captura de tela de seu perfil no Facebook, onde ela usava esse nome há vários anos...
Por fim, Coulmont isolou certo número de pedidos de mudança de nome associados a uma condição de "síndrome da placa". Advogados, médicos, diretores de empresa mais conhecidos por seu nome de uso do que pelo que consta na certidão e que gostariam de colocar os dois em coerência.
Efeito perverso
Pode ser que isso se deva ao temor por efeitos perversos de seu nome, que soa estrangeiro em seus negócios. Como Samir, o representante comercial que se tornou Norbert, nome que ele colocou em todos seus cartões de visita. Mas também há pedidos feitos por açougueiros halal que querem retomar seus nomes magrebinos, abandonados quando foram naturalizados.
Há ainda os casos particulares. Como o de um afegão naturalizado que quis retomar um nome de sua tribo natal antes de voltar pela primeira vez ao país: ele temia represálias se seu nome francês fosse descoberto. Ou o de Jean-Michel, de origem magrebina, que quis se tornar Mohamed. Ele trabalhava em regime temporário e estava cansado das desconfianças das agências sobre a autenticidade de seus documentos.
Reportagem de Elise Vincent para o jornal francês Le Monde
foto:professorjuniorpaiva.com.br
Tradutor: Lana Lim
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