A decisão foi um sinal bem recebido pelos advogados de defesa e
defensores da inocência, que argumentaram que as táticas de interrogatório da
polícia podem fazer com que as pessoas admitam ter cometido crimes que não
cometeram.
O mais
alto tribunal de Nova York disse pela primeira vez, na última semana de março, que o
testemunho de especialistas em confissões falsas deve ser permitido num
julgamento se for relevante para os fatos de um caso.
Mas o
tribunal também pareceu estabelecer um critério rígido para determinar essa
relevância: numa decisão de 5 votos contra 2, os juízes confirmaram a
condenação de uma ré, Khemwatie Bedessie, pelo estupro de um menino de 4 anos
de idade, argumentando que o depoimento de seu especialista não foi relevante
para os detalhes de sua confissão.
Ainda
assim, a decisão do Tribunal de Apelação de Nova York foi um sinal bem recebido
pelos advogados de defesa e defensores da inocência, que argumentaram que as
táticas de interrogatório da polícia podem fazer com que as pessoas admitam ter
cometido crimes que não cometeram. Cerca de um quarto dos condenados exonerados
por testes de DNA em todo o país fizeram confissões falsas, deram declarações
que os incriminavam ou se admitiram culpados, de acordo com o Projeto
Inocência.
“O
fato de o fenômeno das confissões falsas ser genuíno deixou o reino da hipótese
para se tornar um conhecimento comum, se não um bom senso”, escreveu a juíza
Susan P. Read ao consolidar a opinião da maioria.
Vincent
M. Bonventre, um professor da Escola de Direito de Albany, disse que a decisão
foi “um grande passo”.
“No
passado, esse tipo de prova era considerada mais confiável do que qualquer
outra, agora o Tribunal de Apelação está dizendo: 'bem, entendemos que muitas
dessas confissões podem ser falsas'”, disse ele.
Em sua
opinião de 21 páginas, Read também reconheceu o que se tornou um tema explosivo
no Capitólio: a gravação de interrogatórios de polícia.
“Enquanto
gravar os interrogatórios deve facilitar a descoberta de confissões falsas e
está se tornando uma prática padrão da polícia, negligenciar a gravação não é
considerado um fator ou circunstância que pode induzir a uma confissão falsa”,
escreveu ela.
Peter
J. Neufeld, codiretor do Projeto Inocência, disse esperar que esse
reconhecimento incentive o Legislativo estadual a efetivar uma medida proposta
para exigir a gravação de todos os interrogatórios, uma parte fundamental da
lei para os advogados de defesa.
“Nós
nunca saberemos o que exatamente aconteceu, porque não havia uma gravação do
interrogatório”, disse Neufeld sobre o caso de Bedessie. (De fato, ela
confessou duas vezes, e a segunda foi gravada.)
Não é
uma surpresa que o juiz chefe Jonathan Lippman tenha se juntado ao juiz
Theodore T. Jones em sua discordância. Lippman há muito defende uma proteção
maior contra as condenações equivocadas através de métodos como gravar as
confissões e mudanças na forma como os reconhecimentos são feitos. Lippman
convocou uma força-tarefa, presidida em parte por Jones, que em janeiro
recomendou uma legislação para colocar essas medidas em vigor.
Embora
o tribunal tenha se recusado a derrubar a condenação de Bedessie, que está
cumprindo uma pena de 20 anos, “é uma decisão maravilhosa para os réus no
futuro”, disse Ronald L. Kuby, que representou-a na apelação.
Bedessie,
uma professora-assistente, foi acusada em 2006 de ter realizado atos sexuais
com um menino de 4 anos que estava sob sua supervisão.
Em seu
julgamento no ano seguinte, Bedessie testemunhou que não havia feito as coisas
que havia descrito, e as confessou só depois que um detetive de polícia disse
que ela podia ou falar a verdade e ir para casa ou “ir para a prisão de Rickers
Island, onde ela apanharia”, de acordo com a decisão de Read.
Antes
do início de seu julgamento, o advogado de Bedessie pediu ao tribunal para
permitir o testemunho do Dr. Richard J. Ofshe, um especialista em confissões
falsas que entrevistou a ré. O juiz negou o pedido, declarando, entre outras
coisas, que o testemunho de Ofshe não teria valor para o júri.
O
Tribunal de Apelação determinou que o testemunho de Ofshe não seria relevante
para este caso depois de examinar um relatório que ele submeteu em nome de
Bedessie. “O corpo do relatório estava cheio de discussões de questões
irrelevantes, especulações e conclusões baseadas em fatos que não eram
sustentados nem pela versão da ré sobre seu interrogatório”, escreveu Read.
Por
exemplo, escreveu Read, Ofshe forneceu uma análise sugerindo que o menino foi
coagido nas alegações, mas isso não teve nada a ver com o que Bedessie disse em
sua confissão falsa. E nenhuma ligação foi mostrada entre os estudos de
confissões falsas e as táticas que o detetive usou em Bedessie, escreveu a
juíza.
Jones,
em sua opinião divergente, chamou a conclusão da maioria de “curiosa”. O
relatório, escreveu ele, “envolveu a pesquisa de incidentes pertinentes que
levaram a confissões falsas e a táticas que neste caso podem ter comprometido a
confiabilidade da confissão.”
Reportagem
de John
Eligon para
o jornal norte-americano The New York Times
Tradutor: Eloise De Vylder
Foto:portalmaritimo.com
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