Esperar grandes resoluções da conferência ainda é prematuro, segundo representantes da organização brasileira e especialistas ouvidos pela Planeta Sustentável. Por outro lado, não são descartados acordos políticos, que possam readequar os rumos das ações atreladas aos principais documentos originados à época, tais como:
No caso das convenções, as repercussões a serem analisadas se estendem aos processos das COPs – Conferências das Partes, sendo que as mais recentes foram respectivamente a COP10, de Nagoya, em 2010 (Diversidade Biológica) e CO16 , no México, sobre o Clima. A Rio 92 foi um momento de conjunção política muito forte, com contexto que favoreceu os resultados alcançados. Embora haja dificuldade de se implementar as propostas, o evento é até hoje referência dos processos políticos e isso não está perdido. Os tratados e convenções são bons mas faltam ser cumpridos. A Rio+20 se propõe a fazer o balanço dessas lacunas”, destaca Fernando Lyrio, chefe da Assessoria de Assuntos Internacionais do MMA. Ele diz que, por um lado, há um certo ceticismo em torno da eficiência do sistema multilateral da ONU, devido a poucos resultados eficientes ao longo dos anos. Mas qual seria a alternativa a isso? “Não fazer nada seria inviável”, avalia.
Lyrio explica que a proposta da Rio+20 foi brasileira, com o objetivo de incorporar novos temas, além de se fazer um diagnóstico do que já foi realizado. “Na linha histórica, é importante recordar que antes, a primeira grande conferência foi em Estocolmo, em 72, e depois da Rio 92, houve a Rio+10 , em Johannesburgo, na África do Sul”.
A conferência, em 2012, tratará do tema desenvolvimento sustentável e terá duas prioridades. “Uma é a economia verde no contexto da erradicação da pobreza. Ainda há uma discussão conceitual a respeito, por causa de diferenças de percepção entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. Outro tema é o da governança internacional para o desenvolvimento sustentável”, ressalta.
Durante o encontro, governo e ONGS terão um espaço. “Devemos estabelecer em breve a comissão brasileira para Rio + 20, que terá a participação de ambos. Esse grupo que conduzirá os temas caros ao Brasil, com balanço e expectativas”.
Aron Belinky, do GAO – Grupo de Articulação das ONGs Brasileiras e integrante do Comitê Facilitador da Sociedade Civil para a Rio+20 , considera que a força do encontro dependerá do grau de apoio político. “Não terá caráter impositivo, de direcionamento, mas pode abrir processos importantes”. No Brasil, foi criado um espaço de interlocução, na internet, para discutir a pauta, coordenado pelo Instituto Vitae Civilis, com o apoio do PNUMA - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. É o Diálogos Nacionais sobre Economia Verde, Green Economy .
Segundo Lyrio, no contexto mundial, hoje, se discute, no sistema ONU, se seria viável a criação de uma nova organização nas Nações Unidas ou um conselho de desenvolvimento sustentável para tratar da questão da sustentabilidade em um dos braços da instituição, como acontece com o PNUMA e com o PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.
BASTIDORES DA PREPARAÇÃO
A resolução para a realização da RIO+20 foi aprovada em dezembro de 2009. O processo de preparação dá conta de reuniões oficiais e paralelas ou extra-oficiais. A primeira reunião preparatória ocorreu no ano passado e tratou mais de questões burocráticas e logísticas, entre outras, além da designação do secretário da Conferência, que é Sha Zukang, diplomata chinês que ocupa o cargo de subsecretário-geral para Assuntos Sociais e Econômicos da ONU.
Nos próximos dias 7 e 8 de março, será realizada a segunda reunião. A data da terceira ainda está em aberto. “Em janeiro último, aconteceu o primeiro encontro chamado intersessional (entre os encontros preparatórios), que avançou sobre os dois temas principais da conferência – economia verde e governança para a sustentabilidade. Em 14 e 15 de novembro, ocorrerá outro e o terceiro será agendado”.
Em janeiro, cerca de 400 pessoas participaram do encontro, segundo informa Aron Belinky. “Na reunião, foi possível verificar que muitos países já estão discutindo e adotando instrumentos, como a economia verde. São ajustes na atual economia, que ajudam a encaminhar a discussão para o desenvolvimento sustentável. Entre eles, está a reforma na legislação fiscal, para auxiliar na compra de produtos sustentáveis. O Brasil pretende apresentar resultados mais concretos possíveis. Já países, como França e EUA, estão mais resistentes quanto a essa pauta”, diz.
O ambientalista cita que há exemplos mundiais de políticas oficiais, que estão dando certo. “Esse é o caso do estado da Califórnia, nos EUA, por exemplo, com relação à energia alternativa. Por outro lado, Índia e China não têm avançado em políticas de sustentabilidade. Argumentam que não querem que sejam usadas como mecanismos protecionistas e que firam o direito ao desenvolvimento”.
Para Belinky, na preparação da RIO+20, é possível observar que o entendimento sobre economia verde está mais avançado: “Incorpora o lado social, sem sacrificar empregos. Já a questão da governança sustentável é um tema que está bem mais cru. O processo está aquém do que deveria, mas isso não quer dizer que a conferência não terá um bom resultado”.
O REAL PODER DA CONFERÊNCIA
A data da realização da Rio+20, no ano que vem, pode sofrer mudanças, como destacou Fernando Lyrio, do MMA. “Há várias propostas nesse sentido. Cogita-se datas entre abril e junho de 2012, mas a data deve ser referendada pela assembléia Geral das Nações Unidas, no segundo semestre deste ano”. Outro ponto a definir é o formato do evento: se será cúpula, ou seja, reunirá chefes de Estado, ou somente conferência. “O Brasil trabalha para que prevaleça a cúpula, que pode resultar em fortalecimento político”. Mas do ponto de vista prático, o assessor internacional do MMA explica que, com ou sem os chefes de Estado, as aprovações partem da figura institucional dos ‘países’.
Seja como for, qualquer decisão tomada na Rio+20 deverá ser baseada em consenso. “Apesar de ser uma coisa difícil, às vezes, é necessário, que se trabalhe no nível de ambições domésticas. Quando tem pressão da sociedade e da mídia, os países se sentem mais desejosos de ter resultados mais fortes e efetivos”, avalia o assessor internacional do MMA.
Não estão previstas novas convenções para a Rio +20 (como a da Diversidade Biológica e do Clima). Caso haja uma grande cúpula, espera-se a criação de um documento politicamente vinculante, que pode ser uma declaração, uma carta ou uma resolução. “No caso da Rio+10, por exemplo, foi estabelecido um plano. Em qualquer uma das circunstâncias, não se tira o peso do valor desses documentos”, ressalta Lyrio.
Mas, na verdade, pouco se conseguiu objetivamente desde a Rio-92, no tocante a reduzir os riscos futuros representados pelo aquecimento global de origem antropogênica, como conta Carlos Nobre, climatologista, Nobel da Paz, pelo IPCC – Painel Intergovernamental pelas Mudanças Climáticas, e conselheiro do Planeta, que assumiu, neste mês, o cargo de secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento, do MCT – Ministério de Ciência e Tecnologia.
“As emissões globais de gases de efeito cresceram em mais de 40% em relação àquelas de 1992 e não há ponto de inflexão à vista. A Rio+20 pode ser uma nova oportunidade para conseguir um acordo multilateral, legalmente vinculante, para redução rápida das emissões globais, mas há ainda muitas pedras no caminho”, avalia.
Já na área da diversidade biológica, os especialistas destacam uma conquista importante da COP10, realizada em outubro de 2010, no Japão: a criação do Protocolo de Nagoya para a proteção da diversidade das espécies e dos recursos genéticos do planeta, ou seja, contra a biopirataria.
PONTO DE VISTA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL
Moema Viezzer, socióloga e educadora do Instituto de Educação Solidária e coordenadora da 2ª Jornada de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global , fala sobre a Rio+20 do ponto de vista da educação ambiental. Em evento paralelo à Rio 92 oficial, educadores e educadoras de vários países, participantes do Fórum Internacional de ONGs e Movimentos Sociais do Fórum Global Rio 92, criaram o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global..
“A educação ambiental geralmente foi mais trabalhada no âmbito escolar e conteudista, mas o Tratado trouxe algo inovador. Não teremos futuro sustentável, se não tivermos um presente responsável. A nossa formação acadêmica não tem nos levado a pensar de forma sustentável a relação humana com a natureza”.
A socióloga explica que o Tratado define que é preciso multiplicar novos mecanismos de educação formal, informal, não-formal, aos meios de comunicação, além de termos a consciência de que todos somos aprendizes diante da situação atual.
Segundo Moema, no Brasil, os gestores, comunicadores e legisladores precisam aprender a atuar com estes princípios. Ela considera que a vida no planeta exige essa nova forma de pensar. “Não chegamos à prática globalizada. A limitação é a força do poder econômico e a força de pensar a política. Não importa o tema (mudança climática, oceanos, biodiversidade, resíduos), todos perpassam a questão das mudanças climáticas. Tanta tecnologia já existe e já poderia, por exemplo, ser colocada em prática contra a desertificação. É preciso vontade política”.
AGENDA 21 NO BRASIL
Um dos documentos mais importantes da ECO 92, é a Agenda 21, constituída de 2,5 mil recomendações para a efetivação do desenvolvimento sustentável, e deverá ser destaque na Rio+20. De acordo com Geraldo Vitor de Abreu, diretor da área de Cidadania e Responsabilidade Socioambiental do MMA, no último Censo de Informações Municipais do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, mais de 1,6 mil municípios com população acima de 20 mil habitantes, declararam ter suas Agendas 21 locais. “A principal proposta do documento é que os municípios façam seu planejamento territorial com sustentabilidade e considerem o controle social”, diz.
A Agenda 21 brasileira foi concluída em 1999, a partir de consulta pública realizada no país presencialmente e por internet. “De 2003 a 2010, foram realizadas mais de 40 conferências setoriais de vários ministérios, que trataram dos temas como consumo sustentável, habitação, saneamento e cidades sustentáveis”.
De acordo com Abreu, três foram promovidas pelo MMA e envolveram 300 mil pessoas em todo Brasil, até 2008. “Durante os eventos, o Sisnama - Sistema Nacional de Meio Ambiente saiu fortalecido e a reunião de 2008 resultou na confecção da
Política Nacional sobre a Mudança do Clima”. Essas conferências trataram de políticas públicas referentes aos 21 temas da agenda brasileira.
Depois de 20 anos da instituição da Agenda 21 no mundo e 11 anos, da brasileira, Abreu destaca que é preciso ser feito o balanço das ações dos governos quanto às suas diretrizes. “A dinâmica da participação da sociedade ganhou outros contornos, sem perder a perspectiva. Acredito que devemos estudar um formato de acompanhamento dos planos desses fóruns locais. Talvez cheguemos à conclusão que há sobreposição de fóruns da sociedade civil. A democracia é relativamente nova e precisa de ajustes”.
Outros desafios, de acordo com o diretor, dizem respeito ao estabelecimento de diálogos das ações entre as políticas nacionais de Saneamento e de Habitação, de Resíduos Sólidos com o Estatuto da Cidade. “Temos comitês participativos, conselho municipal do meio ambiente e políticas urbanas, além de acompanhamento do Conselho de Desenvolvimento Sustentável, da ONU”.
Abreu considera que é preciso se encontrar uma forma de materializar a Agenda 21, para que não haja frustração dos integrantes ao verem que seus planos não puderam ser executados. “Às vezes, as ações já estão ocorrendo no âmbito das políticas públicas, mas precisam ser intensificadas, além de incorporar novos temas”.
Para o especialista em cidadania e responsabilidade social do MMA, a criação do Plano Nacional de Produção de Consumo Sustentável, no final de 2010, segundo ele, abriu agendas setoriais importantes para a Agenda 21. Na prática, isso significa que alguns setores da economia trazem impacto muito forte para o território, quanto a empregos e migração de pessoas em busca dessa oportunidade. “Por isso, é preciso se preparar para a demanda criada. Estamos trabalhando com experiências além do empreendimento, a fim de que nessas regiões não haja ocupações desordenadas, que acarretem problemas mais graves”.
Abreu alerta que ainda é necessário superar outros problemas, para conseguir implementar o tripé da sustentabilidade (ambiental, econômico e social). “Existem os fenômenos de ‘favelização’ e ocupações urbanas sem planejamento. Devemos trabalhar para que ocorra a mitigação (redução) dos danos causados por esse modelo, que durante muitos anos prevaleceu no país”.
Em convênio com o PNUD, o MMA contratou o Instituto Vitae Civilis, para realizar o projeto de atualização da Agenda 21 Brasileira e analisar a CPDS – Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável. Nesse trabalhos, estão programadas, ainda, a identificação e a análise de 100 processos exemplares, a realização de um seminário e atualização do documento nacional sobre a Agenda 21.
MOBILIZAÇÃO DO EMPRESARIADO
Marina Grossi, presidente do CEBDS – Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável , diz que a organização pretende mostrar compromissos e recomendações para a agenda seguir adiante, em espaço paralelo ao oficial, durante a Rio+20, e um dos instrumentos será a tradução e a ‘tropicalização do documento Visão 2050* (veja reportagem CEBDS apresenta Vision 2050)
realizada por 29 empresas globais associadas ao WBCSD - World Business Council for Sustainable Development, entre outros. A organização está replicando no país as diretrizes do Pacto Global.
Segundo ela, o documento é uma peça importante já utilizada pelas empresas para seus posicionamentos estratégicos. “Propõe também a erradicação da pobreza, negócios inclusivos, valores, economia verde e rearranjo institucional, com nove pilares estruturantes, para que possa até 2020 haver modificações, antecedendo a 2050. Estima o carbono precificado em 2020 e a não existência de aterros sanitários no mundo, mas o Brasil terá de desenvolver seu próprio caminho (mais árduo) para essas metas”.
A empresária considera que a iniciativa privada, antes da Rio 92, não tinha voz politicamente e hoje é reconhecida como um ator importante para se atingir as metas da sustentabilidade. Ainda há muito a fazer, mas houve um salto importante. “Vemos a RIO+20 como oportunidade para os países emergentes. Na Europa e EUA, há certa estagnação. Na conferência, há possibilidade de se propor novos parâmetros à sustentabilidade. Não coloca apenas a Agenda 21, mas desafios novos”.
De acordo com Marina Grossi, é indiscutível que se deve consumir menos e é necessária a mudança do tipo de consumo. “O movimento para sustentabilidade não é coisa esotérica, propõe fazer mais com menos. O lucro justo ou comércio justo pressupõe que as pessoas sejam devidamente remuneradas. As externalidades que não estão computadas nos custos, devem ser computadas. Os clientes estão mudando, são mais exigentes, e os valores mudam”.
Quanto à economia verde, na avaliação da presidente do CEBDS, já existe o consenso sobre o pressuposto de encaminhamento para o mundo de baixo carbono. “As condições de trabalho têm de ser contempladas. Não pode haver só o foco ambiental”.
Neste ano, o CEBDS realizará o evento Sustentável 2011, em setembro, no RJ, com apoio do PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, para difundir as propostas do documento Visão 2050. “São 37 diretrizes. Entre as propostas, está a redução do consumo de recursos naturais e da destruição ecossistêmica. Haverá dois workshops”.
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