" Não há nada mais trágico neste mundo do que saber o que é certo e não fazê-lo. Que tal mudarmos o mundo começando por nós mesmos?" Martin Luther King
31/03/2014
Entre os torturadores da ditadura no Brasil, 40% eram civis
Sob a ditadura brasileira que passou à história como militar, quatro em
cada dez torturadores atuantes na repressão política eram civis -
integravam as polícias estaduais, a Polícia Federal ou algum outro órgão
não castrense. Levantamento feito pelo Estado na lista
oficial de torturadores do Projeto Brasil Nunca Mais mostra que, de 439
acusados de infligir torturas contra presos políticos que puderam ser
identificados por apelido, nome de guerra ou nome completo, pouco mais
da metade (229, equivalentes a 52,16%) integrava as Forças Armadas ou as
Polícias Militares; 174 (39,63%) eram civis; e 36 (8,2%) não tiveram
identificado seu vínculo.
Um exame mais restrito, focado apenas nos torturadores que puderam
ser plenamente identificados por nome completo e cargo, tem resultado
semelhante. Nessa amostra mais detalhada, com 238 identificados, os
militares são 130 (54,62%); os civis, 101 (42,43%); e os de vínculo
desconhecido, apenas 7 (2,94%). Nesse recorte, a corporação que mais
torturou foi o Exército: eram seus oficiais e praças 38,65% (92) dos
acusados por presos políticos de tortura (e 70,76% dos militares
acusados de torturadores). Em segundo lugar nessa contagem, ficaram as
Polícias Civis, com 74 acusados (31%). Outras instituições ficaram bem
atrás dos dois líderes nessa contagem de torturadores totalmente
identificados. As Polícias Militares, por exemplo, aparecem com 19
acusados.
"Competição gera tortura", diz a pesquisadora norte-americana Martha
Huggins, da University of Tulane e autora de trabalhos sobre os
torturadores brasileiros como Trabalhadores da Violência: Torturadores e Assassinos Brasileiros (Emp. UnB, 2002), e Polícia e Política: Estados Unidos/Brasil (Cortez,
1998). "Existia forte competição entre as forcas de segurança, como
Exército, Polícias Civis e Militares, Oban (Operação Bandeirante),
DOI-Codi, durante a ‘guerra suja’ brasileira. O ‘ganhador’ em tal
competição era a força que conseguia a informação rápida sobre o
‘terrorista’ e a localização dos seus associados. A Polícia Civil tinha
função burocrática e grande prática em conseguir informação rápida."
Antes da ditadura, já existiam no Brasil órgãos civis de vigilância
política, como os Departamentos (ou Delegacias) de Ordem Política e
Social, vinculados às polícias estaduais. O regime militar criou em 1967
a Polícia Federal, uma corporação civil fortemente voltada para a
repressão política. Depois do Ato Institucional Nº 5 (AI-5), em 13 de
dezembro de 1968, e com o recrudescimento das ações de guerrilha urbana,
porém, a repressão civil se subordinou mais fortemente ao comando dos
militares.
A partir de 1969, por meio da Operação Bandeirante, em São Paulo,
depois pelos Destacamentos de Operações de Informações-Centros de
Operações de Defesa Interna (DOI-Codis) - que centralizaram
regionalmente a repressão sob comando do Exército -, civis se
subordinaram mais diretamente à ditadura. A maior parte das denúncias
contra torturadores se concentrou na primeira metade dos anos 70,
durante o governo do general Emílio Garrastazu Médici, considerado o
mais fechado e sangrento do período ditatorial.
"Foi fácil usar as Polícias Civis para interrogar e torturar, porque
elas já tinham muita prática nessa área", afirma Martha. "Os policiais
civis tinham uma posição burocrática legitimada para fazer
interrogatórios e porque tiveram uma história de torturar."
Paralelamente ao envolvimento civil nas torturas, destaca-se na
análise do perfil dos torturadores brasileiros a alta proporção de
oficiais entre os militares. Pouco menos de um terço dos torturadores
ligados à Marinha, Exército, Aeronáutica e Polícias Militares, entre os
que foram identificados por nome completo (ou nome de guerra) e patente,
era praça (ocupava posto de soldado, cabo, sargento ou suboficial). Os
demais eram 125 oficiais. Desses, 85 (68%) ocupavam postos de capitão a
tenente-coronel ou seus equivalentes na Marinha (capitão-tenente,
capitão de corveta e capitão de fragata) e na Aeronáutica. São citados
como torturadores 12 coronéis (ou seu equivalente naval, capitães de mar
e guerra) e até dois oficiais generais.
Reportagem de Wilson Tosta
fonte:http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,entre-os-torturadores-40-eram-civis,1146345,0.htm
foto:http://mariadapenhaneles.blogspot.com.br/2013/10/a-ditadura-mascarada-e-violencia-dos.html
Ditadura brasileira matou 1.196 camponeses, mas Estado só reconhece 29
Financiada pelo latifúndio, a ditadura “terceirizou” prisões, torturas, mortes e desaparecimentos forçados de camponeses que se insurgiram contra o regime e contra as péssimas condições de trabalho no campo brasileiro. O resultado disso é uma enorme dificuldade de se comprovar a responsabilidade do Estado pelos crimes: 97,6% dos camponeses mortos e desparecidos na ditadura militar foram alijados da justiça de transição. “É uma exclusão brutal”, afirma o coordenador do Projeto Memória e Verdade da Secretaria de Direitos Humanos (SDH) da Presidência, Gilney Viana, autor de estudo inédito sobre o tema.
O estudo revela que pelo menos 1.196 camponeses e apoiadores foram mortos ou desaparecidos do período pré-ditadura ao final da transição democrática (1961-1988). Entretanto, os familiares de apenas 51 dessas vítimas requereram reparações à Comissão de Anistia. E, destes, somente os de 29 tiveram seus direitos reconhecidos. Justamente os dos 29 que, além de camponeses, exerceram uma militância político-partidária forte, o que foi determinante para que fossem reconhecidos como anistiados. “Os camponeses também têm direito à memória, à verdade e à reparação”, defende Viana.
Segundo ele, dentre as 1.196 mortos e desaparecidos no campo, o estudo conseguiu reunir informações sobre 602 novos casos excluídos da justiça de transição, suficientes para caracterizá-los como “graves atentados aos direitos humanos”. Esta caracterização é condição primordial para que sejam investigados pela Comissão Nacional da Verdade (CNV). Segundo Gilney, o objetivo é alterar o quadro atual e permitir que essas vítimas usufruam dos mesmos direitos dos militantes urbanos, estabelecidos pela Lei 9.140, de 4/12/1995, que reconheceu como mortos 136 desaparecidos e criou a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), com mandato para reconhecer outros casos e promover reparações aos familiares que assim o requererem.
As novas vítimas que poderão entrar para a lista oficial de mortos e desaparecidos políticos do país são 75 sindicalistas, 14 advogados, sete religiosos, 463 lideranças de lutas coletivas e 43 trabalhadores que tombaram em conflitos individuais. “Os dados revelam a ponta de um iceberg de um conjunto bem amplo de perseguidos políticos pela ditadura militar até agora pouco estudado”, acrescenta Viana.
Terceirização dos crimes
Destes 602 casos, em apenas 25% é possível comprovar a efetivação de inquérito policial e, somente em 5%, desfecho judicial. Ainda assim, o estudo conseguiu comprovar a ação direta de agentes de estado em 131 casos, o que facilita o reconhecimento deles como vítimas da ditadura. O problema é que em 471, ou 85% dos casos, as evidências apontam para o fato de que os crimes foram cometidos por agentes privados, ainda que sob a anuência dos representantes da ditadura.
“O Estado se omitiu, encobertou e terceirizou a repressão política e social no campo, executada por jagunços, pistoleiros, capangas e capatazes, a serviço de alguns fazendeiros, madeireiros, empresas rurais, grileiros e senhores de engenhos, castanhais e seringais. Esta hipótese explicativa principal é compatível com o papel importante que a classe dos latifundiários, fazendeiros, senhores de engenho, castanhais e seringais tiveram no golpe, na sustentação da ditadura e na coligação de forças políticas que fizeram a transição”, diz o estudo.
Apesar da dificuldade, Viana avalia que a CNV tem poderes para incluí-los no escopo de investigados. Segundo ele, o Art. 1º da Resolução nº 2, de 20/8, define que caberá ao órgão “examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas (...) por agentes públicos, pessoas a seu serviço, com apoio ou no interesse do Estado”. “Isso incluiu os crimes realizados pelos agentes do latifúndio em concurso com os da ditadura”, observa.
Comissão Camponesa
Embora o estudo da SDH tenha sido concluído, as mortes e desaparecimentos dos demais camponeses já identificados pelo órgão continuarão sendo apuradas, agora pela Comissão Camponesa pela Anistia, Memória, Verdade e Justiça, criada durante o Encontro Unitário, que reuniu, em agosto deste ano, em Brasília, 37 entidades de camponeses, trabalhadores e militantes dos direitos humanos.
No documento final do encontro, as entidades assumiram o compromisso de “lutar pelo reconhecimento da responsabilidade do Estado sobre a morte e desaparecimento forçado de camponeses, bem como os direitos de reparação aos seus familiares, com a criação de uma comissão camponesa pela anistia, memória, verdade e justiça para incidir nos trabalhos da Comissão Especial sobre mortos e desaparecidos políticos, visando a inclusão de todos afetados pela repressão”.
A Comissão, que conta com o apoio da SDH, já se reuniu duas vezes para definir os eixos de luta, buscando, inclusive, conhecer a experiência na reparação de camponeses pelas comissões da verdade de outros países. “Nos encontramos, por exemplo, com o ativista Eduardo Gonzalez, que foi membro da Comissão da Verdade do Peru, onde muitos camponeses foram reconhecidos como vítimas da ditadura”, conta Viana.
A Comissão Camponesa já se reuniu também com membros da CNV, em especial a psicanalista Maria Rita Kehl, responsável pelo grupo de investigação dos crimes cometidos pela ditadura contra os camponeses.
fonte:http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Direitos-Humanos/Ditadura-matou-1-196-camponeses-mas-Estado-so-reconhece-29%0a/5/26031
foto:http://cenfopinclusaodigital.wordpress.com/2012/03/30/ditadura-militar/
Maior parte da população quer anular Lei da Anistia, aponta Datafolha
Uma pesquisa inédita do Datafolha sobre a Lei da Anistia mostra que a
maior parte da população, 46%, é a favor da anulação da norma tal qual
ela é aplicada hoje. Os que são contra somam 37%. Outros 17% não sabem
dizer. Hoje, exatos 50 anos após o golpe de 1964, também há mais brasileiros a
favor do que contra à proposta de punição dos que torturaram presos
políticos na ditadura.
Agora, 46% defendem castigo aos torturadores e 41% são contra.
Indiferentes e pessoas que não souberam opinar são 13%. Em 2010, quando o
Datafolha fez essa pergunta pela primeira vez, o resultado foi o
inverso: 45% eram contra, 40% a favor.
A pesquisa atual, com 2.614 entrevistas, foi feita em 19 e 20 de
fevereiro, antes da onda de eventos e reportagens sobre os 50 anos do
golpe. E antes da repercussão do depoimento do coronel reformado Paulo
Malhães à Comissão Nacional da Verdade.
No último dia 25, Malhães narrou como torturava, matava e dilacerava
corpos de opositores durante a ditadura. Disse não ter qualquer
arrependimento disso.
Para o diretor-geral do Datafolha, Mauro Paulino, os resultados mostram
uma sociedade dividida: "Considerando a margem de erro [2 pontos], as
taxas são parecidas".
Segundo ele, a efeméride e o depoimento de Malhães influenciariam pouco
nos resultados. "É um tipo de informação que atinge um segmento muito
específico da população, só os mais informados e escolarizados", diz.
Recortes por instrução e renda dão uma pista disso. Entre os que têm
nível superior e ganham mais de R$ 7.240, o apoio à punição de
torturadores sobe para 58%.
Atentados
O Datafolha também perguntou se é o caso de reexaminar atentados contra o
governo cometidos por militantes opositores da ditadura.
A proposta não tem força política ou jurídica. Autores de atentados já
foram julgados e penalizados com prisões, conforme legislação da época. E
muitos sofreram punições não previstas na lei, como tortura e morte.
Apesar disso, a ideia costuma ser repetida por alguns defensores da ditadura em resposta aos que pedem punição aos torturadores.
Resultado: 54% responderam que sim, esses casos merecem reexame. Quando o
instituto perguntou se todos deveriam ser julgados hoje, torturadores e
ex-militantes, 80% apoiaram.
O ex-ministro José Gregori (Justiça), presidente da Comissão de Direitos
Humanos da USP, diz que o apoio crescente à punição de torturadores "é
produto dos fatos aterrorizadores que têm vindo à baila na Comissão da
Verdade".
"Mas isso não modifica a minha posição de que a Lei da Anistia deve ser
mantida como está", diz. "Ela deu-se numa fase de muita complexidade. E
embora não seja perfeita, cumpriu um papel importante para a
redemocratização ser pacífica."
O historiador Marcelo Ridenti vê influência externa nos resultados da
pesquisa. "Em muitos países têm sido feitas comissões da verdade: África
do Sul, vários na América Latina, leste europeu. É uma consciência
internacional que tem sido incorporada por setores crescentes da opinião
pública brasileira."
POLÊMICA
Lei da Anistia e punição a torturadores são temas polêmicos nos meios
político e jurídico. Criada em 1979, a Lei 6.683 anistiou todos os que
haviam cometido "crimes políticos" entre 1961 e 1979.
Opositores foram perdoados, exilados puderam voltar.
Desde então, agentes do Estado acusados de sequestro, tortura,
assassinato e ocultação de cadáver também passaram a recorrer à Lei da
Anistia para evitar punições.
Eles alegam que se tratou de uma espécie de pacto nacional pelo
esquecimento recíproco das violências. Juridicamente, se agarram a um
trecho da lei segundo o qual a anistia também é válida para "crime
conexo".
A disputa está na interpretação dessa expressão. Para os acusados de
tortura, conexos seriam todos aqueles crimes praticados no contexto
geral da disputa política da época, independentemente do lado em que
estavam.
Para os defensores da revisão da lei, essa interpretação não faz sentido
jurídico, já que, na prática, representaria uma autoanistia.
Em 2010, o Supremo Tribunal Federal analisou o assunto e decidiu que a
Lei da Anistia também valia para os torturadores do regime militar.
Meses depois, a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o
Brasil num caso da Guerrilha do Araguaia justamente por causa dos
efeitos dessa interpretação da Lei da Anistia.
Reportagem de Ricardo Mendonça
fonte:http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/03/1433374-maior-parte-da-populacao-quer-anular-lei-da-anistia-aponta-datafolha.shtml
foto:http://radioamadorismocarioca.blogspot.com.br/2012/03/31-de-marco-de-1964-golpe-de-estado.html
29/03/2014
A cada 100 índios mortos no Brasil, 40 são crianças
Cerca de 40% de todas as mortes entre índios brasileiros registradas desde 2007 foram de crianças com até 4 anos. O índice é quase nove vezes maior que o percentual de mortes de crianças da mesma idade (4,5%) em relação ao total de óbitos no Brasil no mesmo período.
Um levantamento da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) obtido pela BBC Brasil por meio da Lei de Acesso à Informação revela que indicadores da qualidade do serviço de saúde prestado aos índios estão em patamar muito inferior aos do resto da população.
Os dados detalham todas as mortes de índios registradas desde 2007 em cada um dos 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI), que englobam uma população de cerca de 700 mil índios. As informações de 2013 estão incompletas.
O levantamento mostra que nos últimos sete anos 2.365 índios morreram por causas externas (acidentes ou violência), dos quais 833 foram vítimas de homicídio. Outras 228 mortes por lesões não tiveram sua intenção determinada. Não há informações sobre a autoria dos crimes.
O DSEI Mato Grosso do Sul responde pelo maior número de assassinatos de índios: 137 nos últimos sete anos. Na reserva de Dourados, área indígena visitada pela BBC Brasil, moradores evitam circular à noite por medo de ataques.
Delmira Cláudio, índia guarani kaiowá, teve três filhos assassinados dentro da reserva, todos com menos de 30 anos. Líderes da comunidade atribuem a violência à inoperância policial, ao aumento de moradores não índios e à venda de álcool dentro da reserva.
Os suicídios, por sua vez, foram a causa de 351 mortes de indígenas desde 2007. A região do Alto Solimões, no oeste do Amazonas, registrou mais casos, 104.
Um artigo recente da pesquisadora Regina Erthal apontou como principal causa para o fenômeno, comum entre o povo ticuna, o acirramento de conflitos que têm como base "o abandono a que tal população tem sido submetida pelos órgãos responsáveis pela definição e implementação das políticas públicas".
Caso fosse um país e levando em conta os dados de 2012, o DSEI Alto Solimões teria a segunda maior taxa de suicídios por habitante do mundo, 32,1 por 100 mil, atrás apenas da Groelândia. O índice entre os índios brasileiros é de 9 suicídios por 100 mil e, no país, 4,9.
Comparações entre os padrões de morte dos índios e dos demais brasileiros em 2011, último ano em que há dados gerais disponíveis, revelam outras grandes discrepâncias.
Enquanto entre os índios as mortes se concentram na infância e só 27,4% dos mortos têm mais de 60 anos, na população geral os com mais de 60 respondem por 62,8% dos óbitos.
Nas últimas décadas, avanços no sistema de saúde reduziram as mortes por doenças infecciosas e parasitárias entre os brasileiros para 4,5% do total. Entre os índios, o índice é de 8,2%.
Hoje quase a metade das mortes no Brasil se deve a doenças mais complexas e difíceis de tratar: problemas no aparelho circulatório (30,7%) e câncer (16,9%).
Já entre os índios doenças respiratórias, como gripes que evoluem para pneumonia, ainda são a principal causa de morte (15,3%). Cânceres respondem por apenas 2,9% dos óbitos entre indígenas.
Para o médico Douglas Rodrigues, especialista em saúde indígena da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a alta mortalidade entre crianças mostra que atendimento a índias gestantes e recém-nascidos ainda deixa muito a desejar.
Ele diz que as mortes de índios por doenças infecciosas têm duas razões principais: a maior vulnerabilidade de alguns grupos mais isolados a essas doenças e falhas na assistência médica.
"O mais grave é que essas doenças são evitáveis. Não dá para aceitar que em pleno século 21 tantos índios morram por doenças infecciosas."
O professor diz que, nas últimas décadas, houve grandes avanços nos serviços de saúde para os índios. Em 1999, a União assumiu a responsabilidade pela saúde indígena, que passou a ser gerenciada pela Funasa (Fundação Nacional de Saúde).
Em 2010, com a criação da Secretaria Especial da Saúde Indígena (Sesai), subordinada ao Ministério da Saúde, as ações passaram a ser geridas por um órgão exclusivamente voltado aos índios.
No entanto, segundo o professor, a acelerada melhora nos índices verificada até o início da última década praticamente se interrompeu.
Ele cita os dados de mortalidade infantil entre os índios. Segundo uma apresentação da Sesai, a taxa despencou de 74,6 para mil nascidos vivos, em 2000, para 47,4, em 2004. No entanto, de 2004 a 2011, o índice diminuiu em velocidade bem menor, para 41,9.
No Brasil, a mortalidade infantil em 2011 foi de 15,3. E diferentemente do histórico entre os índios, o índice nacional segue baixando em ritmo uniforme.
"Saiu-se de uma situação de quase desassistência aos índios e foi se aumentando o número de pessoas e lugares em que há profissionais, o que teve um impacto muito grande. Mas depois de 2005 houve uma estabilização, o que é preocupante", diz Rodrigues.
"Agora é o momento de fazer um ajuste fino, de melhorar a qualidade".
Reportagem João Fellet
fonte:http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/02/140221_sub_mortes_indios_pai_jf.shtml
foto:http://pibmirim.socioambiental.org/como-vivem/brincadeiras
Queda no Itaquerão eleva a 8 número de mortes em estádios da Copa
A morte do operário Fabio Hamilton da Cruz, nas obras da Arena Corinthians, em São Paulo, neste sábado, eleva para oito o número de trabalhadores mortos durante os trabalhos nos estádios da Copa do Mundo. Acredita-se que Cruz, de 23 anos, funcionário da empresa WDS Construções, tenha se desequilibrado e caído de uma altura de 8 metros enquanto instalava as estruturas temporárias nas arquibancadas do estádio, que deve sediar o jogo de abertura do Mundial, entre Brasil e Croácia.
Ele foi levado ao hospital Santa Marcelina, na zona leste de São Paulo, mas não resistiu aos ferimentos.
Segundo nota divulgada pelo Corinthians, o funcionário usava os equipamentos de segurança.
E, de acordo com a GloboNews, a Odebrecht, construtora do Itaquerão, afirmou que o acidente não prejudicará o andamento das obras.
O secretário-geral da Fifa, Jerôme Valcke, disse pelo Twitter que está "muito triste com a morte trágica do operário hoje (sábado) na Arena de São Paulo. Meus sentimentos à família e aos amigos".
Outros casos
Esta é a terceira morte ocorrida em incidentes durante a construção da Arena Corinthians. Em novembro do ano passado, dois homens morreram após o desabamento de um guindaste.
Outros estádios da Copa também foram marcados por tragédias durante suas obras.
Em junho de 2012, o funcionário José Afonso de Oliveira Rodrigues morreu após cair de uma altura de 30 metros no estádio Mané Garrincha, em Brasília.
Na Arena Amazônia, em Manaus, o operário Antônio José Pita Martins, de 55 anos, estava desmontando as peças de um guindaste quando uma delas caiu em sua cabeça, em fevereiro deste ano.
No mesmo estádio outros dois funcionários já haviam sofrido acidentes fatais. Marcleudo de Melo Ferreira, 22, caiu de uma altura de 35 metros nas obras do estádio e morreu no dia 14 de dezembro. Em março de 2013, Raimundo Nonato Lima da Costa, de 49 anos, também morreu após despencar de uma altura de 5 metros.
A oitava morte até agora em estádios da Copa não aconteceu em acidentes: o operário José Antônio da Silva Nascimento, de 49 anos, sofreu um mal súbito também enquanto trabalhava na Arena Amazônia. Acredita-se que ele tenha sido vítima de um infarto.
fonte:http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/03/140328_itaquerao_acidente_pai.shtml
foto:http://www1.valor.com.br/brasil/3357564/corinthians-assina-contrato-com-bndes-para-financiamento-do-itaquerao
México: As crianças que nascem no chão e acabam no YouTube
A foto de Irma López dando à luz seu bebê diante de um hospital foi o primeiro aviso. O México amanheceu em um sábado de outubro passado com a fotografia do recém-nascido sobre a grama, ainda unido à mãe pelo cordão umbilical. Redes sociais, jornais e televisões de todo o mundo retransmitiram a notícia. Os médicos que atenderam Irma, uma indígena mazateca do Estado mexicano de Oaxaca, se negaram a lhe dar entrada no hospital e a mulher se viu obrigada a parir sozinha na rua. Nos últimos seis meses outras sete mulheres tiveram os filhos em más condições, apesar de estarem em centros médicos desse Estado, no sul do país.
O padrão costuma se repetir. Trata-se de mulheres indígenas de comunidades distantes que chegam a hospitais ou centros de saúde de noite ou ao amanhecer. As respostas do pessoal médico são diversas: que não há camas, que não há médicos ou que devem ir para casa porque o nascimento da criança não é iminente. Há crianças que chegaram ao mundo no chão da sala de espera, no banheiro do hospital ou em um carro na entrada do setor de urgências. Parecem histórias de outro século, mas há um fato que recorda que estamos em 2014: em quase todos os casos havia um celular por perto. O afã atual por gravar ou fotografar tudo serviu como motor de denúncias, embora o resultado seja expor ao público um momento que deveria ter sido íntimo. Uma busca no portal de vídeos YouTube (parto em oaxaca) é a prova.
Várias ONGs interpelaram nesta quinta-feira uma delegação do Governo mexicano em uma audiência na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), com sede em Washington. Regina Tamés, diretora da organização GIRE (Grupo de Informação em Reprodução Escolhida), será uma das expoentes do tema. “Terão de nos escutar e responder. Utilizaremos o caso de Irma, cuja foto deu a volta ao mundo, para mostrar o resto”, disse Tamés a EL PAÍS. O escândalo chega a um órgão internacional depois do pipocar de casos registrados ao menos uma vez por mês na imprensa. De fato, foi preciso que se tomasse conhecimento de nove partos na rua para que começassem a surgir movimentos políticos. Este mês, com dois novos casos, o Senado mexicano exigiu do Governo de Oaxaca um informe sobre as políticas públicas e os programas para garantir às mulheres indígenas serviços de saúde adequados.
Oaxaca é a terceira região mais pobre do país e tem 30% de população indígena. A maioria vive em comunidades muito dispersas ao longo dos quase 100.000 quilômetros quadrados que a região ocupa. “Em Oaxaca há zonas muito marginalizadas e de difícil acesso”, disse por telefone o doutor Genaro Villalobos, secretário do sindicato independente da saúde (Sityps).
Ele diz que os problemas de assistência são o resultado da “violação dos direitos trabalhistas” dos funcionários e da escassez de pessoal médico.
Segundo dados de seu sindicato, dos 20.000 profissionais de saúde existentes no Estado, 7.000 têm um tipo de contrato pelo qual só recebem metade de um salário completo. “As pessoas acabam se deprimindo e não prestam uma boa assistência”, afirma. O salário base de um médico na região é de 12.000 pesos (pouco mais de 2.070 reais). Os que recebem a metade às vezes se veem obrigados a cumprir dupla jornada em diferentes centros de saúde.
Às más condições de trabalho se soma a escassez de pessoal. Vários hospitais aos quais as mulheres grávidas chegaram à noite estavam fechados. “A autoridade limitou muito o número de funcionários dos hospitais. A desculpa é que não há dinheiro para cobrir o quadro completo. Mas se não há médicos nos turnos noturnos, obrigam as mulheres a parir fora do hospital”, argumenta o médico.
O Governo de Oaxaca, diante da enxurrada de críticas, anunciou investimento de 7,2 milhões de pesos (1,26 milhão de reais) na abertura de 50 salas de parto no Estado. A primeira foi inaugurada em Huajuapan de León, em fevereiro passado, apenas uma semana depois de Nancy Salgado, de 21 anos, ter seu bebê diante do hospital da localidade porque, segundo testemunhas, na recepção lhe disseram que não havia camas disponíveis. Assim que o vídeo do nascimento do bebê foi postado no YouTube, as autoridades sanitárias do Estado afastaram o diretor do centro.
Em outros casos, a falta de assistência nem sequer foi considerada uma falta. No hospital em que Irma López e Cristina López, indígena mazateca, que pariu na parte de fora em julho de 2013, o pessoal médico foi isentado de responsabilidade pela Comissão Estatal de Arbitragem Médica de Oaxaca, que concluiu que “não há negligência porque são eventos fortuitos que saem da sua competência”.
Mas não se trata apenas de Oaxaca. A organização GIRE dirá nesta quinta-feira perante a CIDH que desde o caso de Irma, em outubro, há registro de 16 partos em condições desumanas por falta de assistência médica em todo o país. O documento que apresentarão ante a Comissão questiona que “o Estado se limite a destituir os diretores e médicos em lugar de implementar medidas para que não haja a repetição desses fatos”. Medidas que impeçam que haja mais mulheres que vejam seus filhos nascerem como viram Ruth, Irma, Nancy, Oricel, Cinthia, Yeimi, Juana, Cristina e Laura em Oaxaca.
Reportagem de Inés Santaeulalia
fonte:http://brasil.elpais.com/brasil/2014/03/27/sociedad/1395884843_619775.html
foto:http://www.wradio690.com/noticias/sociedad/los-ninos-que-nacen-en-el-suelo-y-acaban-en-youtube/20140327/nota/2148741.aspx
Suécia admite que durante 100 anos marginalizou e esterilizou o povo cigano
Ao longo do último século, a Suécia esterilizou, perseguiu, retirou crianças de suas famílias e proibiu a entrada no país dos ciganos; e as pessoas dessa minoria étnica foram tratadas durante décadas pelo Estado como “incapacitados sociais”. Estes anúncios não foram feitos por uma ONG militante. Eles fazem parte do relato do Governo conservador sueco, que em um gesto inédito na Europa, tanto por sua honestidade intelectual como pela amplitude do respeito à verdade, decidiu olhar para o passado e a revirar seus arquivos mais obscuros.
A ideia é saldar as dívidas com o passado para procurar melhorar o presente: “A situação que vivem os ciganos hoje se devem à discriminação histórica a que ele foram submetidos”, afirma o chamado Livro Branco, que foi apresentado nesta semana em Estocolmo, e no qual se detalham os abusos cometidos com os ciganos a partir de 1900.
O ministro de Integração,Erik Ullenhag, definiu essas décadas de impunidade e racismo de Estado como “um período escuro e vergonhoso da história sueca”. Suas palavras coincidiram com um episódio que ilustra a situação atual: na quarta-feira, uma das mulheres ciganas convidadas a dar seu depoimento foi proibida pelos funcionários do hotel Sheraton de entrar na área do café da manhã.
Os abusos históricos, assinala o Livro Branco, seguiram um padrão criado há séculos pelas monarquias europeias: começaram com os censos que elaboraram organismos oficiais como o Instituto para Biologia Racial ou a Comissão para a Saúde e o Bem-estar, que identificaram os ciganos que viviam no país. Os primeiros documentos oficiais descreviam os ciganos como “grupos indesejáveis para a sociedade” e como “uma carga”. Entre 1934 e 1974, o Estado prescreveu às mulheres ciganas a esterilização apelando ao “interesse das políticas de população”, como fez Austrália com os aborígenes. Não há cifras de vítimas, mas no Ministério de Integração explicam que uma em cada quatro famílias consultadas conhece algum caso de abortos forçados e esterilização. Os órgãos oficiais ficaram com a custódia de crianças ciganas que foram arrancadas de suas famílias. O estudo também não oferece dados sobre este costume, mas Sophia Metelius, assessora política do ministério, explica que se tratava de “uma prática sistemática”, sobretudo no inverno.
Estocolmo admite que proibiu a entrada de ciganos na Suécia até 1964, apesar de se saber o destino que tinham as minorias em um cenários de expansão nazista: os especialistas calculam que ao menos 600.000 romas e sintis foram exterminados no Porrajmos (como é conhecido o holocausto cigano), nas mãos do regime hitleriano e outros similares.
O Livro Branco detalha as prefeituras suecas que proibiram que os ciganos se assentassem de forma permanente, e lembra que as crianças eram segregadas em sala de aulas especiais e que não podiam ser atendidas pelos serviços sociais. “A ideia era tornar a vida deles impossível para que fossem embora do país”, resume Metelius.
Algumas destas práticas acontecem ainda em diversos países europeus, e a gitanofobia permanece com força na França , Grã-Bretanha e Alemanha. Paris desalojou em 2013 mais de 20.000 ciganos. Berlim planeja uma lei para evitar que os migrantes romenos e búlgaros —a maioria, roma— sem trabalho fiquem mais de seis meses no país.
Na próxima semana, a União Europeia celebrará uma ciúpula especial para avaliar o caminho das políticas de integração da minoria roma. O panorama geral é desolador, com mostras de ódio racial na Hungria , Eslováquia e a República Tcheca.
Na Suécia, um país de cerca de nove milhões e meio de habitantes, vivem hoje mais de 50.000 ciganos. Por enquanto, as autoridades não contemplam a compensação aos familiares das vítimas de abusos, embora o Livro Branco abra porta para as demandas. O Governo estabeleceu a verdade histórica cruzando entrevistas pessoais de dúzias de ciganos com os arquivos oficiais. “Não são revelações novas. Os ciganos estão há anos contando estas histórias, mas ninguém dava atenção. Agora, simplesmente, reunimos os documentos oficiais e os cruzamos com depoimentos”, diz Sophia Metelius.
A coalizão de centro-direita enfrenta um forte crescimento nas pesquisas da extrema direita (10% das intenções de voto) e se propôs combater as mensagens xenófobas com uma firme defesa da tradição progressista sueca.
A aceitação em massa de refugiados sírios é uma das políticas com as quais liberais e conservadores querem demonstrar que o catastrofismo populista não deve irremediavelmente se converter em profecia autocumprida. O reconhecimento das selvagerias cometidas com os ciganos caminha nessa mesma direção. A ironia é que o civilizado e tolerante norte da Europa, ao final, não era tudo isso. A esperança se propaga com esse infrequente exercício de memória e respeito.
Reportagem de Ana Carbojosa e Miguel Mora
fonte:http://brasil.elpais.com/brasil/2014/03/28/internacional/1396032026_384483.html
foto:http://www.presseurop.eu/en/content/article/4182451-sweden-s-shameful-secret
28/03/2014
Estar abaixo do peso eleva risco de vida mais do que obesidade
Estar abaixo do peso ideal pode ser mais perigoso à saúde do que a obesidade, independentemente de outros fatores de risco, como tabagismo, consumo excessivo de álcool e drogas ou doenças terminais. É o que concluiu uma nova pesquisa do Hospital St. Michael’s, no Canadá, publicada nesta sexta-feira no periódico Journal of Epidemiology and Public Health.
Especialistas calculam se uma pessoa está abaixo ou acima de seu peso ideal a partir do índice de massa corporal (IMC), uma relação entre o peso e a altura de cada paciente. Pessoas com IMC menor do que 18,5 são consideradas como abaixo do peso ideal; com IMC de 25 a 30, com sobrepeso; e com IMC acima de 30, como obesas. O IMC estipulado como adequado é de 18,5 a 25.
No novo estudo, os pesquisadores revisaram 51 pesquisas que associaram o IMC e o risco de morte por qualquer causa. Segundo os resultados, estar abaixo do peso ideal aumentou em 80% o risco de morte em um período de cinco anos, em comparação com estar com o peso adequado. Já a obesidade elevou essa chance em 20% e a obesidade mórbida (IMC maior do que 35), em 30%.
De acordo com o estudo, alguns dos principais fatores associados ao baixo peso são desnutrição, consumo excessivo de álcool ou drogas, tabagismo e problemas de saúde mental. Os autores acreditam que os resultados servem como alerta a pessoas que restringem muito a alimentação ou que se exercitam exageradamente.
"O foco da nossa sociedade vem sendo em pessoas com sobrepeso ou obesidade. Não há nada de errado nisso, pois se trata de um grande problema de saúde pública. Porém, nesse processo, estamos negligenciando a influência do baixo peso sobre a mortalidade", diz Joel Ray, pesquisador Hospital St. Michael’s e coordenador da pesquisa.
fonte:http://veja.abril.com.br/noticia/saude/estar-abaixo-do-peso-eleva-risco-de-morte-mais-do-que-obesidade
foto:http://www.copacabanarunners.net/imc.html
O novo mapa da pobreza na Europa
Há mais de cinco anos do estouro financeiro de 2008 e do início da grande recessão mundial do século XXI, a Europa exibe um novo mapa da pobreza que, segundo a organização humanitária Oxfam International, pode levar 25 anos para ser revertido. As medidas de ajuste para equilibrar os mais de quatro trilhões de euros gastos no resgate de bancos e estados estão provocando uma explosão dos números da pobreza tanto no centro como na periferia.
Em Portugal, 18% da população vivem abaixo da linha de pobreza. Na Espanha, cerca de três milhões sobrevivem com menos de 307 euros por mês. Na Itália, duplicou o número de pobres nos últimos seis anos e, no mais rico dos europeus, a Alemanha, quase oito milhões de pessoas sobrevivem com 450 euros mensais graças aos pequenos trabalhos oriundos da flexibilização da legislação trabalhista.
A Carta Maior conversou com a diretora internacional da Oxfam, Natalia Alonso, sobre este novo panorama europeu.
Olhando desde a América Latina às vezes é difícil imaginar a pobreza em uma Europa desenvolvida e com sistemas de seguridade social de longa data. Qual é o panorama concreto que se vive hoje?
Natalia Alonso: Há um novo mapa da pobreza na Europa, provocado pelas medidas de austeridade que aumentaram não só a pobreza, mas também os níveis de desigualdade. O cálculo que fazemos é que, se os governos continuarem aplicando essas medidas, haverá entre 15 e 25 milhões de europeus a mais em risco de pobreza em 2025. Se somamos esse número com a população que já enfrenta este risco de pobreza hoje, segundo as cifras oficiais do Escritório de Estatísticas Europeu (Eurostat), em 2025 teremos cerca de 146 milhões de europeus (mais de um quarto da população) enfrentando esse risco.
Isso significa um aumento considerável em termos do que se chama pobreza relativa, medida em relação à renda média de um país, mas também em termos da pobreza absoluta, em que a própria sobrevivência está em jogo. Com a perda do emprego, perde-se a moradia, a fonte de renda, os direitos sociais. Se a isso acrescentamos o desmantelamento dos sistemas de proteção social pelas medidas de ajuste, o resultado é um enorme aumento do número de pessoas vulneráveis. E longe de resolver o problema da dívida ou de estimular o crescimento, estas medidas de ajuste estão piorando a situação em ambas as frentes.
É evidente que esta crise teve um impacto especialmente forte na chamada periferia da zona do Euro, em países como Grécia, Portugal e Espanha.
Natalia Alonso: Estes países, por pressão externa ou da própria União Europeia, adotaram medidas muito drásticas e, portanto, estão experimentando um importante salto nos níveis de pobreza. Estes níveis são vistos não só no aumento do desemprego, como também no desemprego de mais de dois anos, o que significa em muitos países europeus a perda da cobertura social e o aprofundamento de uma espiral de pobreza.
Cada país tem sua dinâmica particular. Na Espanha e na Irlanda vimos o fenômeno dos despejos de moradias, que impactam ainda mais a situação de extrema vulnerabilidade do desemprego, gerando párias virtuais e marginalizados sociais.
Em um determinado momento, na Espanha, chegou a se despejar 115 famílias por dia de suas casas. Essas pessoas não só foram expulsas de suas casas, como mantiveram a dívida porque não se admitiu o valor dos imóveis como pagamento.
Essa situação afetou também os fiadores desses imóveis, que, com frequência, são os pais ou familiares dos desalojados.
O empobrecimento também atingiu países centrais como a Alemanha, no interior da zona do euro, ou como o Reino Unido, fora dessa zona.
Natalia Alonso: No caso do Reino Unido, as medidas de austeridade adotadas pelo governo impactaram muito mais duramente os 10% mais pobres que os mais ricos. Estes 10% mais pobres viram uma redução de 38% em sua receita líquida desde 2007. É o impacto que tiveram os programas de ajuste no aumento da desigualdade na Europa em geral. Na Grécia, Irlanda, Itália, Portugal, Espanha e Reino Unido houve um crescimento dos níveis de desigualdade comparáveis com os 16% de aumento que experimentou a Bolívia nos seis anos que se seguiram ao programa de ajuste dos anos 90. Nestes países europeus, ou os 10% mais ricos ganham mais, ou os 10% mais pobres ganham menos, ou ambas as coisas. Hoje, o Reino Unido tem níveis de desigualdade maiores que os Estados Unidos. Se não se reverter a atual situação e se seguir com a atual política, o coeficiente Gini de desigualdade do Reino Unido e da Espanha ficará muito parecido com o do Paraguai.
A imagem da Europa na América Latina é de uma seguridade social que neutraliza os perigos da pobreza. Essa imagem segue sendo válida?
Natalia Alonso: A ação restauradora do equilíbrio que tinha a seguridade social já não está funcionando da mesma maneira, porque se retiraram ou se reduziram os apoios que existiam para pessoas descapacitadas ou desempregadas. Isso cria maior desigualdade, pobreza e crise social. E estão aumentando outras desigualdades, como a de gênero. As mulheres são as primeiras que perdem os postos de trabalho.
O modelo econômico europeu tinha como um de seus pilares um equilíbrio social que favorecia um forte consumo interno. Estamos diante de um novo modelo econômico?
Natalia Alonso: Estamos ante um modelo cada vez mais desequilibrado, no qual poucos têm muito e gozam de uma extraordinária proximidade ao poder político, o que gera problemas de legitimidade. Segundo as projeções, se prevê que haverá crescimento econômico em 2014 e 2015 na União Europeia, mas em caso dele efetivamente ocorrer, será muito desigual. A austeridade está assentando as bases de uma Europa de profundas divisões sociais e nacionais.
Reportagem de Marcelo Justo, tradução de Marco Aurélio Weissheimer, em Carta Maior
fonte:http://www.revistaforum.com.br/blog/2014/01/o-novo-mapa-da-pobreza-na-europa/
foto:http://www.libertar.in/2012/12/1929-pobreza-ameaca-um-quarto-da.html
Estado brasileiro é criticado na OEA por ainda usar lei de exceção da Ditadura Militar
Na semana em que o Brasil lembra os 50 anos do golpe de 1964, o Estado brasileiro foi questionado publicamente, nessa sexta-feira (28), na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA), em Washington (EUA), sobre o uso de uma lei que marcou a Ditadura Militar e que, hoje, vem atropelando os direitos constitucionais, em especial de populações indígenas e tradicionais e os relativos ao meio ambiente para defender grandes interesses econômicos.
Instados pelo governo e grandes empresas, presidentes de tribunais vêm lançando mão da chamada “suspensão de segurança”, pela qual podem suspender unilateralmente decisões de instâncias inferiores diante de um suposto risco de “ocorrência de grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas”. Em resumo, esse instrumento permite cassar decisões que esses presidentes julguem impertinentes, mesmo que elas não façam mais do que aplicar a lei em vigor no país. A suspensão de segurança foi usada, por exemplo, contra os direitos de comunidades afetadas pelas hidrelétricas de Belo Monte (PA) e do Teles Pires (MT) e pela estrada de ferro de Carajás (PA/MA).
O líder indígena Josias Munduruku (MT), Alaíde Silva, morador de Buriticupu (MA), município atravessado pela estrada de ferro de Carajás, e a juíza federal Célia Bernardes, da Associação Juízes pela Democracia, são alguns dos membros de organizações não governamentais e vítimas diretas da suspensão de segurança que estiveram na comissão para denunciar esse instrumento como um entulho autoritário e uma ameaça ao Estado de Direito no Brasil.
O pedido de audiência na OEA foi feito pela Justiça Global, Justiça nos Trilhos, Associação Interamericana para a Defesa do Meio Ambiente (AIDA), International Rivers, Terra de Direitos e Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos.
“Sofremos com as consequências das barragens que estão sendo construídas em cinco de nossos rios”, lembrou Josias Munduruku. “O Ministério Publico Federal apresentou uma ação na Justiça para parar as obras no Tapajós, mas o governo derruba tudo, usando a Suspensão de Segurança. As obras continuam. O governo não fez consulta previa aos índios”, completou.
“Tudo isso está acontecendo com a ausência do Estado e de seus órgãos públicos, que concedem licenças sem respeitar as comunidades”, disse Alaíde Silva.
“Com seus critérios amplos e subjetivos, a Suspensão de Segurança viola a Convenção Americana de Direitos Humanos e acaba com qualquer possibilidade de efetividade das medidas judiciais adequadas para a salvaguarda dos direitos humanos no sistema jurídico brasileiro”, analisou, durante a audiência, Alexandre Sampaio, da Associação Interamericana de Defesa Ambiental (Aida). “A Suspensão de Segurança está em frontal violação dos direitos ao devido processo legal e acesso à justiça, em desacordo com os artigos 8 e 25 da Convenção Americana”, concluiu.
“A suspensão de segurança é uma grave permanência da Ditadura militar e impede que o Judiciário aja de forma independente e imparcial”, critica Eduardo Baker, advogado da Justiça Global. “Quando se trata de megaprojetos de desenvolvimento que estão diretamente ligados à política estatal de crescimento econômico, o sistema judicial brasileiro tem sido utilizado de maneira a não garantir, ou mesmo desconsiderar, os direitos das populações afetadas” acrescenta.
Saiba mais sobre a Suspensão de Segurança
A Suspensão de Segurança foi criada no primeiro governo de Getúlio Vargas (1930-1945) e depois reformulada e ampliada na ditadura militar (1964-1985). Entre seus usos mais notórios hoje, está a suspensão de decisões dos tribunais sobre a ilegalidade de grandes empreendimentos, como hidrelétricas, rodovias e portos. Ela foi usada também no caso do complexo petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), contra os quilombolas da Restinga de Marambaia (RJ) e de Alcântara (MA) e na hidrelétrica de Barra Grande (SC).
Artigos da Constituição e tratados internacionais referendados pelo País têm sido descumpridos pelo uso desse instrumento. Um dos mais importantes deles é a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). De acordo com ela, qualquer medida administrativa ou empreendimento que afete territórios indígenas e tradicionais exige a consulta prévia, livre e informada às comunidades atingidas.
fonte:http://www.brasildefato.com.br/node/27935
foto:http://www.midiaindependente.org/pt/red/2010/04/470637.shtml
A ONU pede que o Brasil melhore a prevenção para garantir a segurança
Faltando apenas dois meses e meio para o início da Copa do Mundo no Brasil, a segurança continua sendo a grande preocupação ante a possibilidade de que se repitam os protestos sociais em massa de junho do ano passado ou que ocorram ataques de facções do narcotráfico. Há alguns dias, precisamente, o Exército brasileiro voltou a ocupar algumas favelas do Rio de Janeiro. O Governo brasileiro tenta garantir de todas as formas possíveis que haverá segurança para o torneio e os seus visitantes, mas é habitual ouvir vozes que acham que teria de fazer muito mais para isso, como as ouvidas nesta sexta-feira em Washington.
Em um colóquio no Instituto Brasil do Wilson Center, Érica Machado, responsável por projetos do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) no Brasil, pediu uma maior ênfase na prevenção para se melhorar a segurança e, por sua vez, conseguir fazer com que os cidadãos se sintam mais envolvidos com o evento mais importante do mundo do futebol, embora tenha sugerido que pode ser muito tarde para isso. "Nossa posição é a de que se dê prioridade à prevenção, mas isso deveria ter sido iniciado lá atrás. Agora não há", afirmou. Mas, querendo evitar soar alarmista, logo depois mostrou-se convencida de que será uma Copa segura, embora tenha admitido, de forma genérica, que há certamente um "cenário de incerteza" em algumas das cidades que receberão as partidas.
Segundo Machado, a prevenção é a "melhor forma" de reduzir os índices de violência, como, assegura, demonstram alguns projetos do PNUD no Brasil, os exemplos das cidades colombianas de Bogotá e Medellín, ou iniciativas de "participação social" nos Estados Unidos. No caso do Mundial, por exemplo, a analista considera que isso ajudaria a impulsionar muitos projetos sociais dentro das comunidades, em especial para mulheres e jovens, para melhorar suas condições de vida e evitar possíveis casos de insegurança, e ao mesmo tempo reforçar sua relação com as autoridades policiais e estabelecer uma relação de maior igualdade. "Se há uma relação melhor entre a comunidade e a polícia, a melhoria é incrível", sustentou. E tudo isso, em paralelo, ajudaria a fazer com que os cidadãos se envolvessem mais com a Copa e em seu sucesso, porque a sentiriam mais como algo seu. E assim se sentiriam mais responsáveis pela luta contra a violência.
Mas por enquanto isso não está ocorrendo. Paradoxalmente, em um dos países onde o futebol mais move paixões, segundo uma pesquisa recente do instituto Datafolha, o apoio dos brasileiros ao Mundial era, em fevereiro, de 52%, o seu nível mais baixo desde novembro de 2008, quando o respaldo chegou a 79%. Para a responsável do PNUD, tudo isso se deve ao chamado "padrão FIFA" e ao mal-estar -que foi a semente dos protestos de junho- de que se invista mais dinheiro nas instalações do torneio do que em educação e saúde, e não se combata a corrupção com mais vigor.
Falando sobre a experiência do PNUD na melhoria da segurança em partes do país, Machado fez questão de destacar a importância de se blindar os projetos dos ciclos eleitorais, de fazer políticos e cidadãos entenderem que "o protagonismo é de todos, e não só da polícia", de aumentar a participação das comunidades e dos governos, e de melhorar a situação econômica das prefeituras, que em ocasiões carecem de mão-de-obra.
Do colóquio no Wilson Center também participaram outros especialistas brasileiros. Dino Caprirolo, do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), lamentou que, apesar do aumento dos gastos públicos com segurança, a taxa de homicídios mal foi reduzida no Brasil -que é o nono país latino-americano em taxa de homicídios-, o que atribuiu em parte à falta de coordenação entre as diferentes esferas governamentais e à lentidão da Justiça.
Caprirolo também condenou a excessiva repressão policial, por exemplo, nos protestos sociais que aconteceram desde junho passado. Nesta sexta-feira, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) realizou em Washington sua primeira audiência sobre o assunto, com depoimentos de representantes de organizações de direitos humanos e das autoridades brasileiras.
José Luiz Ratton, professor da Faculdade de Sociologia da Universidade Federal de Pernambuco, destacou uma redução de mortes violentas, mas que esta foi desigual ao longo do país, e criticou que, apesar dos numerosos programas de assistência social impulsionados pelo ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva e mantidos por sua sucessora Dilma Rousseff, o Governo não aproveitou a preparação da Copa para fazer grandes investimentos em regiões mais pobres, o que também ajudaria a prevenir possíveis episódios de insegurança.
Reportagem de Joan Faus
fonte:http://brasil.elpais.com/brasil/2014/03/28/politica/1396041081_614497.html
foto:http://blog.tribunadonorte.com.br/abelhinha/bola-dos-campo/54202/copa-2014
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