13/03/2013

França debate assistência sexual para pessoas com deficiência



É possível que pessoas com deficiências graves recebam a ajuda de profissionais especializados para ter acesso ao prazer e à sua sexualidade?
Não. É o que acaba de responder o Comitê Consultivo Nacional de Ética (CCNE), em um parecer publicado na última segunda-feira (11), no qual se declarou desfavorável ao reconhecimento da profissão de assistente sexual para pessoas com deficiência.

"Não é possível fazer do auxílio sexual uma situação profissional como as outras, em razão do princípio da não utilização comercial do corpo humano", observa o CCNE, que analisou o caso submetido por Roselyne Bachelot, na época ministra da Solidariedade e da Coesão Social do governo Fillon.
Reconhecidos nos Estados Unidos e em diversos países europeus, os assistentes sexuais ajudam pessoas com deficiência --mental e física-- a descobrirem ou redescobrirem seus corpos como fonte de prazer, por meio de algumas sessões tarifadas.
A intervenção deles pode ir de um simples contato de pele e carícia até a masturbação ou mesmo a penetração. Na Suíça, é a associação Sexualité et Handicaps Pluriels (SEHP) que forma profissionais de saúde especializados na ajuda corporal do exercício da sexualidade.
Na França, a reivindicação do acesso à sexualidade foi incluída no movimento de reconhecimento dos direitos das pessoas com deficiência, que começou principalmente com a lei de 11 de fevereiro de 2005 sobre a igualdade de direitos e oportunidades.
Práticas de assistência sexual já acontecem hoje, mas sem um quadro jurídico. Marcel Nuss, que possui uma grave deficiência chamada amiotrofia espinhal, afirma ter recorrido a ela. "Essa ajuda devolve a sua confiança e autoestima", explica o autor de "Je veux faire l"amour" ["Quero fazer amor", Ed. Autrement, 2012]. "Ela me ajudou muito no nível físico e psicológico."
O CCNE, embora não negue o sofrimento e a solidão de muitas pessoas deficientes, se recusa a considerar qualquer quadro jurídico para a assistência sexual. Ele compara esse serviço à prostituição, "a menos que seja feito como uma atividade não remunerada".
Ao mesmo tempo em que reconhece que existem direitos associados à sexualidade, o CCNE considera que a assistência sexual aos deficientes não é de responsabilidade do Estado, mas de uma iniciativa privada: "Parece difícil admitir que ela seja um direito garantido como uma obrigação da sociedade." Portanto, a criação de um setor específico ou de uma especialização e, ainda por cima, a cobertura dessa assistência, estão descartadas. Ainda mais pelo fato de que "o risco de abusos é muito grande, tanto para os assistentes quanto para os beneficiários", afirma Anne-Marie Dickelé, psicóloga relatora do parecer. O comitê de ética aponta para "situações de abuso por parte dos assistentes como as chantagens das quais eles mesmos podem ser vítimas".
Em compensação, o CCNE recomenda às autoridades públicas que "promovam o treinamento de enfermeiros e terapeutas tanto na questão da sexualidade quanto no questionamento ético" e que "apoiem as pesquisas e iniciativas existentes: certos diretores de estabelecimentos médicos avançaram bastante em projetos experimentais que consistem particularmente em ajudar casais formados por pessoas deficientes a se estabelecer em meios regulares."
Decepcionados, mas não realmente surpresos com esse parecer: assim se resumiu o sentimento daqueles que lutam pela instauração da assistência sexual.
"Esse parecer se alinha com a política francesa para a prostituição", lamenta o filósofo Norbert Campagna, autor de "La Sexualité des handicapés: faut-il seulement la tolérer ou aussi l"encourager?" ["A sexualidade dos deficientes: deve-se somente tolerá-la ou também encorajá-la?", Ed. Labor et Fibes, 2012]. "No entanto, o acompanhamento sexual tem um papel fundamental no acesso à sexualidade para essas pessoas que não têm as mesmas possibilidades que os outros."
Para Pascale Ribes, presidente da associação CH(s)OSE, é a "raiva" que prevalece: "Associar a prostituição à assistência sexual é um falso debate", diz. "Por que tanta prudência?", pergunta Sheila Warembourg, sexóloga membro do Coletivo Handicaps et Sexualités, que afirma que a assistência sexual é uma necessidade real para alguns de seus pacientes. Ela também insiste no necessário treinamento dos assistentes sexuais.
Entre os que se opõem à assistência sexual, o parecer do CCNE foi bem recebido. Maudy Piot, presidente da associação Femmes pour le dire, femmes pour agir (FDFA), diz estar "radiante".
"É preciso atender ao sofrimento afetivo e sexual dessas pessoas, mas a assistência sexual não é a solução certa", ela afirma. "Para nós, isso é similar à prostituição no sentido de que se trata de vender seu corpo." Assim como a FDFA, a associação Mouvement du Nid luta pela abolição da prostituição. Seu secretário-geral, Grégoire Thery, também invoca a "dignidade da pessoa deficiente", para se opor à instauração da assistência sexual. "Ela reforça a discriminação", diz. "As pessoas deficientes têm direito à mesma vida afetiva e sexual que as outras."
"Nossa proposta não era tomar partido, mas sim fornecer o máximo possível de elementos de reflexão", garante François Beaufils, professor de pediatria, também relator do parecer do comitê de ética. Essa reflexão cabe ainda ao governo, que por fim poderá se apoderar de um debate prometido durante a campanha presidencial pelo candidato François Hollande, mas até então cuidadosamente evitado.
"A reflexão sobre a vida afetiva, sentimental e sexual das pessoas em situação de deficiência deve ocorrer," afirma Marie-Arlette Carlotti, ministra delegada encarregada das pessoas deficientes e do combate à exclusão. "É uma questão legítima que deve ser estudada de maneira ponderada. O debate não deve se resumir somente à questão dos assistentes sexuais."

Reportagem de Camille Hamet e Claire Rainfroy
Tradutor: Lana Lim

fonte:http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/lemonde/2013/03/13/franca-debate-assistencia-sexual-para-pessoas-com-deficiencia.htm
foto:http://hdw.eweb4.com/out/599014.html

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