O juiz espanhol Baltasar Garzón (foto esq.), absolvido ontem no caso das vítimas do franquismo após ser expulso da carreira judiciária, foi um pioneiro da "justiça universal" que ordenou a detenção do ex-ditador chileno Augusto Pinochet e atacou o grupo armado ETA.
O juiz de 56 anos foi condenado neste mês a 11 anos de desqualificação profissional por ter ordenado a gravação de conversas na prisão entre advogados de defesa e seus clientes, em um caso de corrupção que em 2009 atingiu funcionários de alto escalão do Partido Popular, que agora governa a Espanha.
Mas os sete magistrados do Supremo Tribunal absolveram nesta segunda-feira Garzón por seis votos a favor e um contra pelo crime de prevaricação (ditar uma resolução injusta tendo ciência de sua atitude) por tentar investigar os desaparecimentos ocorridos durante a Guerra Civil (1936-1939) e nos primeiros anos do franquismo, disse uma fonte judicial.
O midiático juiz de cabelos grisalhos, óculos finos e trajes impecáveis polariza boa parte da sociedade espanhola entre partidários e opositores. Dez anos depois de se tornar mundialmente famoso com a prisão em Londres de Pinochet por crimes contra a humanidade, Garzón decidiu no dia 17 de outubro de 2008 abrir um processo sobre os cerca de 114 mil desaparecidos do franquismo que acabou se voltando contra ele.
Sua tentativa foi coerente com a trajetória profissional de um juiz que, com o caso Pinochet, desencadeou um efeito dominó, já que países como Chile, Argentina e Guatemala começaram a investigar os crimes de suas ditaduras.
Não conseguiu ignorar os desaparecidos da ditadura espanhola, após ter investigado na Espanha os crimes das ditaduras argentina (1976-1983) e chilena (1973-1990), conseguindo inclusive levar a julgamento o ex-repressor argentino Adolfo Scilingo, condenado em 2005 a 1.084 anos de prisão.
Filho de um funcionário de posto de gasolina que cresceu na miséria da Espanha rural dos anos 1950, Garzón forjou sua carreira com esforço: depois de ser bolsista no ensino médio, passou pelo seminário antes de encontrar sua vocação, o direito. Nomeado em 1988 na Audiência Nacional (principal instância penal espanhola), este juiz de aparência tímida, casado e com três filhos, colecionou casos delicados, ganhando pelo caminho mais de um inimigo.
"Trabalhei contra o terrorismo, o narcotráfico, os crimes contra a humanidade e a corrupção", afirmou na quinta-feira após a divulgação de sua sentença.
"Neste trabalho, sempre cumpri com rigor as normas, defendi os direitos dos indivíduos e das vítimas em situações muito adversas", disse, denunciando uma condenação "injusta e pré-determinada".
Embora algumas de suas grandes investigações sobre o terrorismo islâmico ou os traficantes de cocaína galegos tenham sido criticadas nos tribunais, o juiz conquistou grandes êxitos em 20 anos de luta contra a organização armada independentista basca ETA.
E, apesar de ter acumulado um cargo no último governo de Felipe González (1982-1996), isso não impediu que investigasse os Grupos Antiterroristas de Libertação (GAL), grupo secreto criado nos anos 80 sob o governo socialista para eliminar fisicamente membros do ETA.
Esta investigação, que contribuiu para pôr fim ao governo de González, lhe valeu a aprovação da direita.
A mesma que se voltou contra ele por ter apoiado as negociações de 2006-2007 entre o governo socialista e o ETA, por investigar sobre o franquismo, apesar da existência de uma lei de anistia de 1977, e por descobrir em 2009 este vasto escândalo de corrupção que atingiu integrantes de alto escalão do Partido Popular. Após ser suspenso de suas funções na Audiência Nacional em maio de 2010, Garzón se "exilou", como afirmam seus parentes, primeiro como assessor da promotoria do Tribunal Penal Internacional em Haia e depois como consultor na Colômbia.
foto:veja.abril.com.br
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