Sebastien Czernichow é um pesquisador francês da área de nutrição que adora a onda de leis e medidas norte-americanas contra a obesidade, de âmbito federal, estadual e municipal. Aquilo que algumas pessoas classificam de polícia alimentícia, ele chama de progresso. O nível de obesidade no seu país está se estabilizando após uma década de intervenções governamentais.
“Eu quero ser cauteloso, mas nós estamos vendo indícios de que, embora tenha havido um aumento global da obesidade, pode ser que nós tenhamos criado um ambiente protetor contra este problema na França”, diz Czernichow.
Nos Estados Unidos, a nação desenvolvida com o maior índice de obesidade do mundo, a nova lei nacional de saúde exige que as redes de restaurantes indiquem os índices calóricos em menus e cartazes, de forma similar ao que já ocorre em Massachusetts e outros Estados e cidades norte-americanos. A cruzada da primeira-dama Michelle Obama contra a obesidade colocou as companhias de refrigerantes na defensiva, fazendo com que elas criassem propagandas nas quais afirmam que estão removendo bebidas açucaradas das escolas.
No mês passado, a assembleia legislativa de Massachusetts aprovou um projeto de lei que acabará efetivamente com a venda de bebidas açucaradas e alimentos nocivos à saúde nas escolas. A prefeitura de Boston concedeu uma verba de US$ 12,5 milhões (R$ 22,9 milhões) para a luta contra a obesidade e o tabagismo, e o Estado de Massachusetts recebeu uma outra verba de US$ 633 mil (R$ 1,1 milhão) para fortalecer o programa de informação nutricional nos menus do Estado, bem como promover atividades físicas em creches e escolas.
Mas essas ainda são providências meio caóticas frente a uma epidemia generalizada de obesidade e contra um ataque de marketing das redes de fast-food e companhias de refrigerantes, que tem por alvo as crianças, e cujo valor chegou a US$ 1,6 bilhão (R$ 2,8 bilhões) em 2006, segundo um relatório da Comissão Federal de Comércio de 2008. As nossas iniciativas ainda estão bem aquém das leis e iniciativas da França, que incluem a proibição de máquinas de venda de refrigerantes nas escolas e a substituição destas por bebedouros, a adoção de rótulos de advertência quanto a alimentos prejudiciais à saúde, e a exigência de que as companhias de alimentos publiquem advertências em propagandas na televisão, no rádio e em outdoors.
As advertências dizem aos consumidores que evitem lanches, excesso de açúcar, gordura e sal, e pedem às pessoas que se exercitem. As companhias que não exibirem as advertências terão que pagar ao governo uma taxa de 1,5% sobre o custo das suas propagandas. Devido a essa taxa, poucas companhias recusam-se a publicar as advertências, diz Czernichow. Essas estratégia deveria ser cogitada nos Estados Unidos, onde o lobby dos alimentos prejudiciais à saúde até o momento conseguiu evitar a adoção em âmbito nacional das chamadas “taxas de gordura” sobre a venda de alimentos.
Dados recentes indicam que a obesidade não aumentou desde 1998 para crianças de grupos sócio-econômico mais elevado nas regiões central e ocidental da França, e que começou a estabilizar-se até mesmo para os jovens de baixa renda em 2001. Segundo um estudo publicado no ano passado no periódico “International Journal of Obesity”, e do qual Czernichow foi co-autor, esse fato foi suficientemente “encorajador” para indicar que atingiu-se uma “verdadeira estabilização” da obesidade na França. Ele afirma que as conclusões coincidem “com uma quantidade cada vez maior de informações sobre crianças francesas que estão acima do peso normal”.
Em uma entrevista, Czernichow enfatizou que só após um período de cinco e dez anos será possível determinar se a estabilização deve-se diretamente às campanhas concentradas do governo. Mas ele não diz o que teria acontecido sem essas campanhas. O nível de obesidade entre adultos na França é um terço daquele presenciado nos Estados Unidos, mas as porções de alimentos servidas nos restaurantes franceses, influenciados pelos Estados Unidos, têm aumentado.
“Eu sugiro que não se deve concentrar esforços em apenas um fator”, afirma Czernichow. “Os esforços têm que ser constantes e distribuídos por toda parte, de forma paralela ao que ocorre com relação ao tabaco, com ações na justiça, proibição do ato de fumar em locais públicos e aumento constante do preço dos cigarros. Aquele foi um sistema de ações múltiplas que apresentou efeitos cumulativos”.
Czernichow diz não saber se os Estados Unidos presenciarão tais efeitos, especialmente depois que ele comeu recentemente em restaurantes de Boston. Massachusetts é o Estado com o segundo maior índice de obesidade no país, mas, Czernichow observa: “A densidade energética da comida nos restaurantes de Massachusetts é muito elevada e as porções são enormes, não só nas redes de fast-food, mas também nos nossos restaurantes mais saudáveis que servem frutos do mar. Eu pedi peixe-espada em um restaurante, e a porção que eles me serviram seria suficiente para alimentar a mim, a minha mulher e aos meus dois filhos”.
“Eu almocei no bairro de South End. Aquilo que vocês chamam de appetizer, nós chamamos de jantar. O meu prato de salada veio transbordando. Eu falei com o garçom e ele riu porque eu achei que estava em algum tipo de reality show, com uma câmera escondida, vendo o quanto eu comeria”. Ainda que Czernichow ria, isso faz com que nós questionemos se as nossas medidas precárias surtirão efeito na luta contra a obesidade.
Reportagem de Derrick Z. Jackson para o jornal The Boston Globe
http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/boston/2010/04/21/a-guerra-contra-a-obesidade-na-franca.jhtm
foto: emforma.net
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