25/05/2010

Educação para paz - III




A história da educação no Brasil começa no período colonial e está ligada a Companhia de Jesus. Quinze dias após chegarem ao Brasil, em 1549, liderados pelo padre Manoel da Nóbrega, os jesuítas fundaram em Salvador a primeira escola elementar brasileira e o primeiro professor foi o religioso Vicente Rodrigues. A providência inicial foi alfabetizar os índios, pois caso contrário não seria possível convertê-los na fé cristã.
Em 1570 os jesuítas já tinham criado cinco escolas elementares e três colégios, no Rio de Janeiro, em Pernambuco e na Bahia, seguindo sempre a pedagogia da Europa. Eles permaneceram por aqui até 1759, quando foram expulsos, uma das conseqüências das reformas pombalinas que pregavam o ensino laico e público e não mais atrelado a religião. Foi a primeira grande ruptura da educação brasileira, pois há mais de dois séculos o ensino seguia o método implantando e estruturado pelos jesuítas. A educação a partir de então deixava de servir a igreja para servir aos interesses do Estado.
É oportuno reproduzir o que afirma Bello[1] (2001) sobre a educação no Brasil após as mudanças pombalinas:
Portugal logo percebeu que a educação no Brasil estava estagnada e era preciso oferecer uma solução. Para isso instituiu o "subsídio literário" para manutenção dos ensinos primário e médio. Criado em 1772 o “subsídio” era uma taxação, ou um imposto, que incidia sobre a carne verde, o vinho, o vinagre e a aguardente. Além de exíguo, nunca foi cobrado com regularidade e os professores ficavam longos períodos sem receber vencimentos a espera de uma solução vinda de Portugal.
Os professores geralmente não tinham preparação para a função, já que eram improvisados e mal pagos. Eram nomeados por indicação ou sob concordância de bispos e se tornavam "proprietários" vitalícios de suas aulas régias.
O resultado da decisão de Pombal foi que, no princípio do século XIX, a educação brasileira estava reduzida a praticamente nada. O sistema jesuítico foi desmantelado e nada que pudesse chegar próximo deles foi organizado para dar continuidade a um trabalho de educação.

Com a vinda da família real para o Brasil em 1808 parecia que a educação ganharia um novo destaque na vida nacional. Mas não foi bem assim, apesar da criação da Biblioteca Nacional, das Academias Militares e Escolas de Direito e Medicina. A educação continuou em um plano secundário. Em 1822 D. Pedro I proclama a Independência do Brasil e o país ganha sua primeira Constituição que no seu art. 179 dizia que a "instrução primária é gratuita para todos os cidadãos”.
Novamente é Bello (2001)[2] quem relata qual foi a trajetória da educação no Brasil até a Proclamação da República em 1889:
Em 1823, na tentativa de se suprir a falta de professores institui-se o Método Lancaster, ou do "ensino mútuo", onde um aluno treinado (decurião) ensinava um grupo de dez alunos (decúria) sob a rígida vigilância de um inspetor.
Em 1826 um Decreto institui quatro graus de instrução: Pedagogias (escolas primárias), Liceus, Ginásios e Academias. Em 1827 um projeto de lei propõe a criação de pedagogias em todas as cidades e vilas, além de prever o exame na seleção de professores, para nomeação. Propunha ainda a abertura de escolas para meninas.
Em 1834 o Ato Adicional à Constituição dispõe que as províncias passariam a ser responsáveis pela administração do ensino primário e secundário. Graças a isso, em 1835, surge a primeira Escola Normal do país, em Niterói. Se houve intenção de bons resultados não foi o que aconteceu, já que, pelas dimensões do país, a educação brasileira perdeu-se mais uma vez, obtendo resultados pífios.
Até a Proclamação da República, em 1889 praticamente nada se fez de concreto pela educação brasileira. O Imperador D. Pedro II, quando perguntado que profissão escolheria não fosse Imperador, afirmou que gostaria de ser "mestre-escola". Apesar de sua afeição pessoal pela tarefa educativa, pouco foi feito, em sua gestão, para que se criasse, no Brasil, um sistema educacional.

Durante a fase da primeira República (1889-1929) a educação brasileira  passou pela reforma de Benjamin Constant que visava além de um ensino laico a gratuidade da escola primária, o que já estava previsto na Constituição. Além disso, outro objetivo da reforma era substituir a “predominância literária” – defendida pelos positivistas, pela cientifica.
Outras reformas ao longo destas primeiras décadas da Republica: em 1901 o Código Epitácio Pessoa inclui a lógica entre as matérias e exclui biologia, sociologia e moral; a reforma João Luiz Alves que inclui no currículo escolar a matéria Moral e Cívica “com a intenção de tentar combater os protestos estudantis contra o governo do presidente Arthur Bernardes” e além destas, ocorrem reformas estaduais na educação por todo o país. Bello[3] (2001) diz o seguinte especificamente sobre a Reforma Rivadávia Correa de 1911:

(...) pretendeu que o curso secundário se tornasse formador do cidadão e não como simples promotor a um nível seguinte. Retomando a orientação positivista, prega a liberdade de ensino, entendendo-se como a possibilidade de oferta de ensino que não seja por escolas oficiais, e de freqüência. Além disso, prega ainda a abolição do diploma em troca de um certificado de assistência e aproveitamento e transfere os exames de admissão ao ensino superior para as faculdades. Os resultados desta Reforma foram desastrosos para a educação brasileira.

A segunda República, de 1930 a 1936, marca a entrada do Brasil no mundo capitalista da produção, o que exigia que o país tivesse uma mão-de-obra capacitada para exercer funções especificas e atender as exigências da parque industrial em expansão. Em 1930 é criado o Ministério da Educação e em 1931 o governo provisório por meio de decretos organiza o ensino secundário e as universidades brasileiras que ainda não existiam. Três anos depois a nova Constituição do Brasil dispõe que a educação é direito de todos e deve ser oferecida pela família e pelo poder público. Neste mesmo ano é criada a Universidade de São Paulo, a USP.
O Estado Novo começa em 1937 e vai até 1945. Mais uma vez é pertinente o que revela Bello (2001)[4] sobre este período da história do país:
Refletindo tendências fascistas é outorgada uma nova Constituição em 1937. A orientação político-educacional para o mundo capitalista fica bem explícita em seu texto sugerindo a preparação de um maior contingente de mão-de-obra para as novas atividades abertas pelo mercado. Neste sentido a nova Constituição enfatiza o ensino pré-vocacional e profissional.
Por outro lado propõe que a arte, a ciência e o ensino sejam livres à iniciativa individual e à associação ou pessoas coletivas públicas e particulares, tirando do Estado o dever da educação. Mantém ainda a gratuidade e a obrigatoriedade do ensino primário. Também dispõe como obrigatório o ensino de trabalhos manuais em todas as escolas normais, primárias e secundárias.

Em 1942, por iniciativa do Ministro Gustavo Capanema, são reformados alguns ramos do ensino. Estas Reformas receberam o nome de Leis Orgânicas do Ensino, e são compostas por Decretos-lei que criam o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI e valoriza o ensino profissionalizante.
O ensino ficou composto, neste período, por cinco anos de curso primário, quatro de curso ginasial e três de colegial, podendo ser na modalidade clássico ou científico.

Com o fim do Estado Novo e o início da Nova República (1946-1963) é adotada no Brasil uma Constituição mais liberal e democrática. O reflexo disso na educação é a determinação da obrigatoriedade do ensino primário e a União fica incumbida de fornecer as diretrizes para o ensino em todo o País. Em 1946 é criado o SENAC, Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial.
E neste mesmo ano é formada uma comissão para elaborar a reforma geral da educação no Brasil, a Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional. As discussões se prolongam por 13 anos e no final foi promulgada a Lei 4.024, em 20 de dezembro de 1961, na qual segundo Bello prevaleciam “as reivindicações da Igreja Católica e dos donos de estabelecimentos particulares de ensino no confronto com os que defendiam o monopólio estatal para a oferta da educação aos brasileiros”.
No entanto outras iniciativas importantes para a educação aconteceram neste mesmo período. É possível citar entre elas a criação na Bahia em 1950 do Centro Popular de Educação que deu início a idéia de escola-classe e escola-parque; em 1961 o educador Paulo Freire começa uma campanha de alfabetização de adultos e em 1962 é criado o Plano Nacional de Educação e o Programa Nacional de Alfabetização inspirado no Método Paulo Freire.
Com o golpe militar de 1964 a educação no Brasil sofre um retrocesso, pois para os golpistas o ensino no país servia unicamente para formar comunistas e subversivos. Ao mesmo tempo em que aumentava o número de universidades no País, professores eram presos, torturados, mortos e obrigados a deixar o Brasil. O mesmo acontecia com estudantes. A União Brasileira dos Estudantes (UNE) é proibida de funcionar e o Decreto-lei 477 emudece alunos e mestres. Bello (2001)[5] relata um pouco mais sobre este período nefasto da história brasileira:
Para acabar com os "excedentes" (aqueles que tiravam notas suficientes para serem aprovados, mas não conseguiam vaga para estudar), foi criado o vestibular classificatório.
Para erradicar o analfabetismo foi criado o Movimento Brasileiro de Alfabetização – MOBRAL, aproveitando-se, em sua didática, do expurgado Método Paulo Freire. O MOBRAL propunha erradicar o analfabetismo no Brasil... Não conseguiu. E, entre denúncias de corrupção, acabou por ser extinto e, no seu lugar criou-se a Fundação Educar.
É no período mais cruel da ditadura militar, onde qualquer expressão popular contrária aos interesses do governo era abafada, muitas vezes pela violência física, que é instituída a Lei 5.692, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1971. A característica mais marcante desta Lei era tentar dar a formação educacional um cunho profissionalizante.

Com o início do processo de redemocratização do Brasil, a partir de 1986, a discussão da educação ganha uma amplitude maior, não ficando mais restrita ao universo das salas de aula. O tom é mais político e atrai a contribuição de mentes pensantes de diversas áreas da intelectualidade brasileira.
O País ganha uma nova Constituição e em 1992 é aprovado o projeto do senador Darcy Ribeiro para uma nova LDB, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, oito anos após ter sido apresentada pelo deputado Octávio Elísio.
Chegando ao século XXI. Em 2008 a educação do Brasil ocupava o 80º lugar no ranking da Unesco, utilizado para monitorar  o cumprimento de metas pelos países para melhorar o nível da educação. De acordo com o relatório da organização[6] o Brasil está “no grupo dos países intermediários, que caminham para atingir as metas”. Entre os problemas, segundo o levantamento da Unesco, estão “as altas taxas de reprovação, evasão escolar, analfabetismo e o baixo desempenho dos alunos brasileiros em avaliações internacionais”.
Ainda segundo o documento “a América Latina e o Caribe são responsáveis por 3,5% das crianças do mundo inteiro que estão fora da escola. O Brasil é o único país com mais de 500 mil crianças fora da escola”. No entanto, o relatório afirma também que este problema “não impedirá o Brasil de cumprir as metas até 2015”.
Durante o mandato do presidente Lula a educação – uma das prioridades do seu programa de governo apresentado nas duas eleições presidenciais que ele venceu – segundo alguns de seus críticos, “perdeu o foco” e mesmo para muitos de seus aliados ficou bem aquém do esperado.
 Apesar das críticas, nestes seis anos de governo, o presidente Lula reduzia de 29% para 19% a parcela da população fora da escola , sendo que no nível básico o percentual chegou a 2,8% em 2005. O Prouni (Programa Universidade Para Todos) é considerado o maior programa de bolsas de estudo da história da educação no Brasil. Em 2005 foram 112 mil bolsa em 1.412 instituições em todo o país. O governo já anunciou que irá investir na criação de mais nove universidades públicas, incrementando assim o acesso à educação gratuita.
No entanto, estas ações – evidentemente que positivas – não foram suficientes para mudar de fato a “cara” da educação no Brasil. O sucateamento das das universidades federais, verba insuficiente para pesquisas, educadores desmotivados por inúmeros problemas que atingem as salas de aulas das escolas públicas, alunos que aprendem ler sem compreender. Talvez algumas transformações possam começar sem a interferência do governo e por isso mesmo ter mais agilidade e efetividade. Este estudo aspira poder contribuir para este movimento.

[1] BELLO, José Luiz de Paiva. Educação no Brasil: a história de rupturas. Disponível em http://www.pedagogiaemfoco.pro.br/heb14.htm. Acesso em setembro de 2009.
[2] Idem Op. Cit. Nota 7.
[3] Idem Op. Cit. Nota 7.

[4] Idem Op. Cit. Nota 7.

[5] Idem Op. Cit. Nota 7.

[6]  Relatório da Unesco. Educação no Brasil ocupa o 80º lugar em ranking da Unesco. Disponível em http://www.metodista.br/sala-de-imprensa/boletim_digital/clipping-educacao/educacao-no-brasil-ocupa-80a-posicao-em-ranking-da-unesco/. Acesso em setembro de 2009.

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