22/10/2016

Papel da Justiça do Trabalho está em disputa nas três esferas do Poder


O papel da Justiça do Trabalho está em discussão. No Legislativo, no Executivo e dentro do próprio Judiciário existe uma disputa para definir se cabe a este ramo da Justiça proteger o trabalhador que a ele recorre ou as relações de emprego e a segurança jurídica.
As posições parecem bem definidas. Os presidentes do Tribunal Superior do Trabalho, Ives Gandra Martins Filho, e do Tribunal Superior Eleitoral, Gilmar Mendes, também ministro do Supremo Tribunal Federal, têm demonstrado que a busca pela estabilidade deve ser prioridade para a Justiça. Mas suas ações enfrentam resistência.
Na semana passada, Gilmar Mendes, suspendeu todos os processos e efeitos de decisões na Justiça do Trabalho que discutam a aplicação de acordos e convenções coletivas que já deixaram de vigorar. “Da noite para o dia, a Súmula 277 [do TST] passou de uma redação que ditava serem as normas coletivas válidas apenas no período de vigência do acordo para o entendimento contrário, de que seriam válidas até que novo acordo as alterasse ou confirmasse”, afirmou na decisão, segundo a qual a insegurança deveria ser sanada.
A reação veio em bloco: três ministros do TST assinaram artigo contestando Gilmar Mendes. Dizem os ministros Augusto César Leite de Carvalho, Lelio Bentes Corrêa e Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, em artigo publicado no site Jota: “Cabe-nos, entretanto, esclarecer que o TST, em sua competência concorrente de esgotamento da instância trabalhista, interpretou a Constituição da maneira que lhe pareceu correta e em consonância à literalidade do texto para, nos termos do que foi salientado pela AGU, encontrar o indispensável equilíbrio entre os atores coletivos da relação trabalhista, em conformidade à sua jurisprudência consolidada na Seção de Dissídios Coletivos e decantada na doutrina trabalhista”.
Projetos caros
Poucos dias antes, o presidente do TST, Ives Gandra Filho, havia retirado de tramitação 32 projetos de lei sobre a Justiça do Trabalho. Para o ministro, não era hora de pedir mais desembolsos da União, levando em conta a crise econômica do país. De acordo com o presidente do TST, a retirada dos projetos significa uma economia de R$ 1 bilhão por ano.

Associações de juízes logo reclamaram, dizendo que os projetos deveriam ser negociados com o governo e a ministra Delaíde Arantes, do TST, cassou a decisão, afirmando que o presidente da corte não teria competência para retirar de tramitação projetos aprovados pelo plenário Conselho Superior da Justiça do Trabalho e pelo Órgão Especial do TST.
Fundamental para Temer
Esse vai e vem de decisões se repete em questão considerada essencial para o governo, para uma possível reforma trabalhista: a discussão sobre se o que é negociado entre sindicatos e empresas deve prevalecer sobre o que diz a lei.

Michel Temer assumiu a presidência do país com algumas pautas prioritárias e se fosse pedido que listasse três, a resposta viria rápida: teto de gastos para o Estado, reforma da previdência e reforma trabalhista. Por enquanto, mexer nas relações de trabalho está por último. 
O ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, chegou a falar sobre alguns pontos do projeto, como contratos de trabalho por produtividade, e até  um possível aumento da jornada de trabalho mas voltou atrás após grande repercussão e não chegou a detalhar todas as medidas que pretende implementar. 
Desde que assumiu interinamente a Presidência em maio, Temer já se reuniu algumas vezes com representantes da Confederação Nacional da Indústria (CNI) para tratar das mudanças nas regras trabalhistas.
Alguns pontos na reforma são pacíficos. Permissão para terceirização em qualquer setor da empresa e estabelecer que negociações entre sindicato e as empresas devem prevalecer sobre a legislação  –  o ministro Nogueira já admitiu este segundo ponto como política visada pela sua pasta. 
Acontece que o Judiciário parece não querer mais esperar e passou a lidar com o assunto em batalhas de jurisprudência nos tribunais superiores. 
Negociem, mas nem tudo
Pela segunda vez, o Supremo Tribunal Federal decidiu que prevalece o negociado entre patrão e sindicato sobre a legislação. O ministro Teori Zavascki, do Supremo, reverteu a sentença de uma empresa que havia sido condenada a pagar horas extras no TST.

Em sua decisão, Zavascki disse que a Constituição prevê que as normas coletivas de trabalho podem abordar salário e jornada de trabalho e se um acordo firmado entre sindicato e empresa não passar dos limites do que é razoável, ele se sobrepõe ao que está previsto na legislação.
No entanto, logo depois da decisão do STF, o TST seguiu caminho oposto. A corte trabalhista definiu que autonomia negocial coletiva não é absoluta. O entendimento foi adotado ao se afastar um acordo coletivo que, de acordo com o tribunal, reduzia os direitos dos trabalhadores de uma usina de açúcar.
A insubordinação da corte trabalhista foi alvo de críticas. Nesta sexta-feira, Gilmar Mendes afirmou que o TST tem má vontade com as empresas. E disparou: "Esse tribunal é formado por pessoas que poderiam integrar até um tribunal da antiga União Soviética. Salvo que lá não tinha tribunal", usando um tom de brincadeira em meio à crítica.
Combate na Câmara
No Poder Legislativo, a discussão sobre os prejuízos causados pela insegurança jurídica tem ganhado espaço. Em julho, durante sessão da Comissão de Trabalho da Câmara, o deputado Nelson Marchezan Jr. (PSDB) fez um contundente discurso contra a atual estrutura sindical no Brasil e o ramo do Judiciário que lida com as questões trabalhistas.

Marchezan Jr. começou questionando a ideia de se criar mais um imposto sindical e criticou o processo de eleição nos sindicatos, que em sua visão faz com que os líderes perpetuem interesses próprios ao invés de defender o trabalhador. “É estrutura arcaica, onde os presidentes trabalham para se reeleger, então atendem lá interesse de 30 diretores de determinados setores. De interesse do trabalhador não tem absolutamente nada”, disse (leia abaixo o discurso completo).
Com o sistema de sindicato único e contribuição compulsória, o valor pago por 12.757.121 trabalhadores é dividido, hoje, por 10.926 entidades, segundo dados do Ministério do Trabalho e da Previdência Social, mesmo sem que elas efetivamente representem tais empregados, conforme apontado pela revista eletrônica Consultor Jurídico. Reportagem recente mostra a criação de um falso sindicato, no qual um empresário tentava usar um ex-empregado seu como laranja, prometendo, entre outras coisas, um salário de R$ 10 mil.
O deputado defendeu que nem sindicato e nem Justiça do Trabalho garantem emprego, mas sim o empreendedor e uma sociedade em desenvolvimento. “O resto é balela!”, bradou.
Por meio de exemplos, criticou o excesso de benefícios reservados para os servidores: “Nós aqui geramos 16 mil empregos na Câmara. E o nosso trabalhador aqui ganha até R$ 30 mil por mês e tem auxílio refeição e tem auxílio creche de R$ 800 por mês. Enquanto nós temos analfabetos espalhados por todo o Brasil. A cobertura do ensino infantil é quase que vergonhosa, em quase todos os municípios. Mas quem ganha 30 mil por mês, tem auxilio creche aqui, em todo o Judiciário e em todo o Ministério Público”.
O discurso terminou com uma análise de o Estado é grande e toma renda do trabalhador e com um conselho: “É importante que a gente comece a defender aqui o interesse de quem paga o nosso salário, que é o trabalhador, porque esse é o menos comentado e ultimamente tem sido comentado e defendido nesse parlamento”.
Leia o discurso completo do deputado Nelson Marchezan Jr.:
Presidente serei breve. O ministro já saiu, o autor do projeto já saiu, o requerente da audiência também. 
Mas eu acho extremamente válido o debate, o debate que aqui foi feito em alto nível. Embora na maioria das vezes a gente fale aqui de interesse que não são dos trabalhadores e nem dos cidadãos. A gente fala em interesses de sindicatos patronais, sindicato dos trabalhadores, da Justiça do Trabalho, fala até em uma nova contribuição para o trabalhador fazer, para financiar mais sindicatos. 
Mas o interesse mesmo do trabalhador aqui, ele fica de uma forma viçosa assim, escapa entre as mãos quando a gente fala em medidas de proteção do emprego. Ora, que medida de proteção do emprego? Por acaso esse sindicato que garante emprego? Por acaso a Justiça do Trabalho, esse parlamento aqui garante emprego? O que garante emprego é empreendedor. O que garante emprego, quem bota o seu dinheiro, sua iniciativa, sua força de trabalho e gera trabalho. É isso que garante emprego. É uma sociedade em desenvolvimento, é isso que garante emprego. E o resto é balela!
E aqui a grande parte de todos nós, inclusive eu aqui, vivemos com um dinheiro de quem gera o emprego e deixa de gerar emprego. E com dinheiro do trabalhador, que tem menos emprego. Dinheiro do salário de todos nós aqui. Na remuneração de todo nós aqui. De uma estrutura arcaica, desde da sindical dos empregadores arcaica, onde os presidentes trabalham para se reeleger, então atendem lá interesse de 30 diretores de determinados setores e a sindical dos trabalhadores que nem se fala, que é um horror. De interesse do trabalhador não tem absolutamente nada. 
E ai entramos numa Justiça do Trabalho, por favor, uma Justiça do Trabalho, deputado Orlando, que no ano passado conseguiu entregar aos reclamantes R$ 8 bilhões e meio, mas que vai custar este ano R$ 17 bilhões. Vamos fechar a Justiça do Trabalho e dar o dobro que os trabalhadores estão pedindo. Essa é uma regra matemática básica. Fechamos a Justiça do Trabalho, pegamos R$ 17 bilhões, em vez de dar R$ 8 bilhões do ano passado, a gente dá lá o dobro. Vai dá mais que o dobro para cada demanda de trabalhador brasileiro.
Ou será que a Justiça do Trabalho, pode se dizer que a Justiça do trabalho que gera emprego? Nós aqui geramos 16 mil na Câmara. 16 mil, se pegar do Senado então, é um horror. E o nosso trabalhador aqui presidente, o nosso trabalhador que ganha R$ 15 mil por mês, R$ 20 mil por mês, R$ 30 mil por mês, ele tem auxílio refeição e tem auxílio creche, o nosso trabalhador, de R$ 800 por mês. 
Enquanto nós temos analfabetos aqui no Brasil, espalhados por todo o Brasil. A cobertura do ensino infantil é quase que vergonhosa, em quase todos os municípios. Mas quem ganha 30 mil por mês, tem auxilio creche aqui, em todo o Judiciário e em todo o Ministério Público.
E nós estamos reunidos aqui para falar do interesse do trabalhador? Eu, sinceramente, acho os discursos às vezes aqui bonitos, bem intencionados, mas fora da realidade. Juiz do trabalho tem 20 dias de recesso, 60 dias de férias, vende seus dias de férias, ganha 5 mil de auxílio moradia para morar, onde tem obrigação legal de morar e mora há 30 anos lá. E é o Juiz que garante o emprego do trabalho? Meu Deus do céu... 
E aí eu ouvi alguém dizer que o inimigo não é o setor público, o inimigo é tudo que é imposto ao cidadão, o imposto que sustenta os sindicatos dos trabalhadores e dos empregadores, o imposto que paga este custo do legislativo e o custo do Judiciário mais alto do mundo. E o segundo colocado deputado Wolney, estou falando da América do Norte, da Europa. Ele é quatro vezes mais barato que nosso Judiciário. E não é culpa do setor público.
Por um acaso a crise brasileira de um setor público que toma 40% do que é do trabalhador, 40%! E tem um déficit em R$ 170 bilhões e a culpa da crise não é do setor público... E quem garante emprego no Brasil é a Justiça do Trabalho, o parlamento e esses sindicatos aqui que querem aumentar a sua Contribuição. 
Por favor, é importante que a gente comece a defender aqui o interesse de quem paga o nosso salário, que é o trabalhador, porque esse é o menos comentado e ultimamente tem sido comentado e defendido nesse parlamento. 
Muito obrigado.

Reportagem de Marcos de Vasconcellos e Fernando Martines
fonte:http://www.conjur.com.br/2016-out-22/papel-justica-trabalho-disputado-tres-esferas-poder
foto:http://pebinhadeacucar.com.br/justica-do-trabalho-promove-mutirao-para-garantir-pagamento-de-dividas-trabalhistas/

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