Instituições de caráter privado mas sem fins lucrativos passam a ser regulamentadas em nova modalidade.
Nem privadas, nem públicas. Popularmente conhecidas como universidades comunitárias, instituições privadas sem fins lucrativos, e que atendem outros critérios administrativos, agora estão regulamentadas em uma terceira modalidade. A Lei 12.881\2013 foi sancionada pela presidente Dilma Rousseff em novembro e as define como Instituições Comunitárias de Educação Superior (ICES). Antes da lei, essas instituições não podiam concorrer a editais de órgãos públicos, então destinados apenas às públicas.
A novidade também permite que as ICESs recebam recursos orçamentários do governo. Para ser qualificada como uma ICES é preciso estar constituída em forma de associação ou fundação de direito privado, ter seu patrimônio pertencente à sociedade civil ou poder público, não visar o lucro, aplicar integralmente seus recursos em suas atividades, possuir transparência administrativa e, em caso de extinção, destinar seu patrimônio a uma instituição pública ou congênere, além de desenvolver ações para a comunidade. A qualificação deve ser solicitada ao MEC.
Fruto do Projeto de Lei da Câmara (PLC) 1\2013, de autoria da Ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, na época deputada, a nova lei cria um terceiro modelo de instituição de ensino superior, distinto das públicas e privadas. Para a ministra, o contexto em que a lei foi aprovada é de valorização da educação pública de qualidade, possibilitando que o governo valorize instituições que não visam o lucro. “São instituições que foram constituídas com o objetivo de servir às comunidades em que estão inseridas e sempre foram importantes para preencher lacunas geográficas onde o Estado não chega”, ressalta.
Como a classificação não existia antes da criação da lei, não há estimativa oficial de quantas instituições preenchem hoje todos os requisitos. Há apenas o número máximo de instituições que podem solicitar o reconhecimento da nova categoria, com base em um dos principais requisitos estabelecidos pela nova lei, não visar o lucro: hoje são 1.119 instituições de ensino superior privadas sem fins lucrativos cadastradas no MEC. Desse universo, as instituições com administração ligada a empresas ou famílias não serão consideradas comunitárias.
Papel social
Reitor da comunitária Universidade do Vale do Itajaí (Univali), Mário Cesar dos Santos, conta com uma avaliação criteriosa do MEC para que não sejam aprovadas instituições que queiram se aproveitar da modalidade para obter recursos públicos. “A lei já criou mecanismos capazes de limitar que instituições se aproveitem da classificação”, observa. O reitor também ressalta a importância do modelo para a educação brasileira. “As instituições comunitárias mantém várias clínicas de atendimento social, hospitais, postos de saúde e trabalhos sociais de extensão, além de forte inserção social com os inúmeros programas de bolsas de estudos. A nova lei permitirá que essas instituições captem e apliquem mais recursos em favor da coletividade”. A Univali recebeu, no dia 27 de novembro, a Presidente da República, Dilma Rousseff, em uma cerimônia que marcou o ato de criação e regulamentação das ICESs.
Segundo o pró-reitor de planejamento da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc) e um dos idealizadores e relatores da proposta em suas várias etapas, João Pedro Schmidt, as universidades que já se dizem comunitárias há muitos anos se sentiam prejudicadas porque a legislação brasileira as considerava como um tipo de instituição privada. “Ao possibilitar o repasse de recursos públicos às comunitárias, a lei viabiliza que as mesmas cumpram melhor seu papel social. A previsão do governo é que, nos próximos anos, a educação passe a contar com alguns bilhões de reais a mais a cada ano, provenientes dos recursos do petróleo. Com a lei, podemos disputar uma fatia dos novos recursos”, diz.
Em relação à forma que serão repassados os recursos do governo para as universidades comunitárias que mais precisam, Schimidt afirma que atualmente a lei não engloba diferenciações. “É uma lei feita para lidar com o segmento no geral, fortalecendo o modelo comunitário. Não induz ao auxílio de quem estiver precisando mais. Com sua regulamentação, aspectos nesse sentido podem ser incluídos”. Ele ressalta ainda que o fato de as instituições comunitárias poderem concorrer nos editais não vai tirar os recursos das públicas. "Entendemos perfeitamente que as públicas necessitam de investimentos”, afirma. “A lei também permite a criação de programas do governo específicos voltados às comunitárias. Quando forem criados, aí sim o governo poderá definir recursos específicos para o setor, mas ainda não há essa previsão”, complementa.
Origem
Para o secretário executivo da Associação Brasileira das Universidades Comunitárias (Abruc), José Carlos Aguilera, o maior beneficiário da implementação legislativa será a juventude que deseja acessar ensino de qualidade. As instituições comunitárias tiveram sua origem no interior dos Estados, em locais distantes das capitais, onde a sociedade se organizava para ofertar a educação para a região. “Com o modelo, a oferta dos serviços de educação irá melhorar, pois a lei prevê uma relação maior com o estado brasileiro. Além disso, as instituições continuarão precisando estar bem colocadas nos indicadores de qualidade de ensino”, conclui.
Atualmente, existem aproximadamente 130 instituições associadas na Abruc, distribuídas em quatro segmentos: o Consórcio das Universidades Gaúchas (Comung); a Associação Catarinense de Fundações Educacionais (Acafe); a Associação Nacional de Educação Católica (Anec) e a Associação Brasileira de Instituições Educacionais Evangélicas (Abiee).
De acordo dados de Schimidt, os estados brasileiros que mais possuem instituições comunitárias são Rio Grande do Sul e Santa Catarina. O primeiro, abriga 15 instituições que integram o Comung, totalizando cerca de 206 mil estudantes, mais de 50% do total de universitários gaúchos, e empregando cerca de 9 mil professores e 10 mil técnicos administrativos. Já em Santa Catarina, as 16 universidades integrantes da Acafe, correspondem a mais de 1500 mil alunos, cerca de 60% dos universitários do estado.
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