05/12/2013

Governo da Venezuela intervém na produção e venda de veículos

O Governo da Venezuela assumirá o controle da produção e comercialização de veículos para reanimar o setor e prosseguir com a chamada “ofensiva econômica” que busca regulamentar os preços de todos os bens e serviços, conforme decretos baixados como parte dos poderes legislativos concedidos ao presidente Nicolás Maduro.
Trata-se de um plano que se manterá pelos próximos meses, e que busca resolver um dos maiores problemas enfrentados pela economia local há mais de uma década. “Os carros sairão da fábrica com o preço justo estabelecido por nós”, anunciou o presidente na noite de segunda-feira. Até o momento, o governo não estabeleceu em lei as margens máximas, mas na prática cada bem vendido não pode resultar em um lucro superior a 30%.
Esse método temeroso surgiu das inspeções no comércio ordenadas pelo gabinete de Maduro nas últimas três semanas. O governo encarou isso como um teste para ver até onde é possível controlar todos os aspectos das transações comerciais. Em vez de atacar as causas que originam a escassez de oferta, decidiu regulamentar os preços dos poucos bens que são produzidos ou importados, com o objetivo de reduzir a inflação, a qual entre janeiro e outubro acumulou 45,8%.
O setor automotivo é um dos que exibem maiores distorções. A produção local vem caindo em queda livre por uma somatória de fatores: falta de divisas preferenciais para importar autopeças, e conflitos trabalhistas decorrentes da atomização do movimento sindical venezuelano promovida pelo chavismo. A essas duas razões se agrega uma terceira, que impacta drasticamente a queda nas vendas: a proibição de que as empresas automotivas importem outros modelos de veículos para satisfazer à demanda. Se em 2007 foram vendidos 491.899 veículos, o ano de 2013 terminará com menos de 100.000 unidades vendidas, segundo estimativas. Este ano também apresenta um decréscimo no número de unidades produzidas. Entre janeiro e outubro haviam sido montados apenas 65.263 veículos, ou 29,13% a menos do que no mesmo período de 2012, quando 95.085 unidades saíram das montadoras.
O Governo acredita que suas medidas estimularão o consumo, mas desde já muitos analistas predizem uma redução mais drástica da oferta devido à incapacidade que o Governo demonstra de garantir o abastecimento, uma vez que tem uma posição dominante no mercado ou controla o processo de produção. A escassez de veículos provocou o milagre de que um carro usado, com poucos quilômetros rodados, que em outros países se deprecia imediatamente, custe muito mais do que um veículo zero quilômetro. O bem escasso é muito mais caro.
Numa sociedade degradada como a venezuelana, os clientes recorrem a todo tipo de argúcia, que aumentam o preço final das unidades. Como a demanda supera a oferta, são feitas listas enormes de compradores que, teoricamente, são atendidos na mesma ordem em que as concessionárias fazem os pedidos. Pode transcorrer mais de um ano até que se receba o carro, que não custa o mesmo que valia no momento da encomenda, por causa da inflação. O financiamento vence e é preciso renová-lo. Há quem suborne – ou pague a “vacina”, como se diz na gíria popular venezuelana – ao vendedor para ficar em primeiro na fila. As máfias aproveitam seus contatos privilegiados dentro das fábricas para revendê-los até pelo dobro do valor. Muitos contratos coletivos do setor automotivo oferecem veículos uma vez por ano aos seus trabalhadores como parte dos benefícios de contratação. Estes também são vendidos ao preço convertido pela cotação do dólar no mercado negro.
O governo está consciente de todas essas irregularidades, mas não está disposto a atacar o problema facilitando as condições para que as firmas automotivas aumentem a oferta. Num esforço para golpear essas máfias, as autoridades autorizaram a emissão anual de licenças de importação para particulares, desde que estes abram uma conta em dólares. “É uma maneira de estimular a poupança”, disse Maduro em declarações feitas nesta terça-feira, pouco antes de um apagão deixar 15 Estados venezuelanos no escuro. Cabe às montadoras informar ao Estado sua produção anual, para que este distribua as divisas estrangeiras necessárias. Na prática, isso significa um novo trâmite para obter os dólares necessários para trabalhar.
Pouco depois desses anúncios, foi divulgado um novo relatório da ONG Transparência Internacional. A Venezuela continua sendo vista como o país mais corrupto da América Latina. Numa escala de zero (totalmente corrupto) a 100 (muito transparente), o país fica na lanterna regional, com 20 pontos.

Reportagem de Alfredo Meza

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