Artigo de Adriana Silveira Paes de Barros, advogada especialista em direito do trabalho do Mesquita Barros Advogados.
O Ministério do Trabalho e Emprego vem, ao longo dos anos, atuando em operações conjuntas com o Ministério Público do Trabalho e, muitas vezes com apoio da Polícia Federal, na fiscalização das condições de trabalho nas empresas urbanas e rurais nos variados ramos de negócio, com a finalidade de se averiguar a existência de trabalho escravo.
Caso constatado o descumprimento de obrigação relacionada com a saúde e segurança do trabalhador, inúmeros autos de infração são lavrados. Como na legislação trabalhista não há tipificação legal, o auditor fiscal faz constar no corpo do auto a existência de submissão dos trabalhadores a condições degradantes ou análogas à de escravo. Ocorrendo tal situação a empresa deve se utilizar dos recursos administrativos para se defender das autuações, pois o mero pagamento das multas não evita as consequências desastrosas que destas podem advir.
O problema decorre da ausência de norma conceitual acerca da caracterização do trabalho escravo, ficando a critério dos fiscais, subjetivamente, essa caracterização e a declaração nos autos de infração lavrados.
Nesse entendimento, a constatação de jornadas “exaustivas”, que extrapolem duas horas extras por dia, ausência ou concessão reduzida de intervalo para refeição, pagamento de salário em valor insuficiente para a subsistência já seria o bastante para caracterizar o trabalho escravo.
Na área rural, os fiscais inspecionam as instalações sanitárias, estruturas dos alojamentos, transporte dos trabalhadores, áreas de vivência, além de outras questões previstas na NR-31, aplicáveis especificamente ao trabalhador rural.
Além de se tratar de análise subjetiva pelos auditores, porque não há em nosso ordenamento jurídico a definição de trabalho escravo ou condição análoga à escravidão, o MTE sequer seria competente para lavrar autos de infração neste sentido, porque a única previsão está no artigo 149 do Código Penal. Assim, a competência para a averiguação e declaração de trabalho escravo caberia exclusivamente ao Juízo Criminal.
A partir da lavratura dos autos de infração, e quando verificado pelo fiscal o suposto trabalho escravo, o nome da empresa é divulgado no site da Repórter Brasil, tornando pública a verificação da fiscalização, antes de se esgotar os meios de defesa administrativa.
Com a publicação no Diário Oficial da decisão administrativa mantendo a subsistência dos autos, o nome da empresa é inserido no Cadastro de Empregadores da Portaria Interministerial n. 2/2011, chamado de “lista suja”, publicada semestralmente no “site” do MTE, reforçando a publicidade já concretizada com a divulgação no“Repórter Brasil”.
As consequências da inclusão do nome da empresa na lista são desastrosas. O empregador será tachado por crime previsto no artigo 149 do Código Penal, por órgão incompetente. Sofrerá, ainda, com a perda de acesso a recursos financeiros, vedação de recebimento de isenções e incentivos fiscais, impossibilidade de acesso a linhas de crédito, impedimento de contratar com o Poder Público Federal, além do constrangimento na relação com clientes e fornecedores, diante da repercussão negativa da sua imagem.
De outro lado, algumas empresas vêm se comprometendo com a assinatura do “Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo”. Em decorrência, acabam assumindo compromissos que resultam em restrições comerciais, como a vedação da contratação por parte dos signatários de empresas prestadoras de serviços ou de pessoas que, na cadeia produtiva, se utilizem de trabalhadores em condições degradantes ou que praticam atos que caracterizam o trabalho escravo.
Assim, as empresas signatárias são proibidas de contratar empresas que sofreram autuação por parte do MTE com a constatação de trabalho escravo.
Considerando o princípio da ampla defesa e do contraditório, as empresas devem se valer das medidas judiciais cabíveis, a depender do caso específico, com o ajuizamento de ação declaratória, visando a desconstituir os autos de infração, ações cautelares e/ou mandado de segurança, com pedido de liminar para evitar a inscrição do nome na lista suja ou a sua exclusão quando já houver sido publicada a lista.
Daí a necessidade de se regulamentar mediante norma conceitual a definição contemporânea de trabalho escravo, que atualmente está a cargo do entendimento subjetivo do agente fiscal e na Portaria 2 do MTE, a inscrição na lista suja.
Diante da insegurança jurídica decorrente da inexistência de legislação específica sobre o assunto, o ideal é que as empresas, principalmente as que assinaram o “Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo”, promovam constantes melhorias e adequações nas condições de trabalho, com base nas Normas Regulamentadoras do MTE, evitando autuações que constem a caracterização de trabalho escravo e os reflexos maléficos decorrentes da inclusão do nome na lista suja.
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