17/08/2013

Mais obesos do mundo, mexicanos substituem culinária tradicional pela "junk food"

Estilo de vida cada vez mais sedentário e abandono do campo agravam problema, que gera custos bilionários ao Estado.

Um menino de cerca de sete anos sai com dificuldade de uma Oxxo – rede 24 horas – no centro da Cidade do México. Na mão direita, segura um pacotinho de Gansitos da marca Marinela, um dos mais conhecidos doce de chocolate do país.
Na esquerda, uma garrafa de Coca-Cola de três litros. O peso o faz pender para esse lado, além de mancar. No entanto, os detalhes são desnecessários para constatar a condição flagrante da criança, bastante obesa.
A cena descrita acima é frequente no México. Em casa e nos restaurantes o refrigerante se tornou item obrigatório para acompanhar as refeições. A comida “chatarra”, nome dado no México para “porcaria”, se transformou no pão de todo dias, acompanhando, e, muitas vezes substituindo, ingredientes mais saudáveis e tradicionais.
Não surpreendem os recentes dados da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura), que colocam o México no primeiro lugar entre os países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) por taxa de obesidade, superando pela primeira vez o país que levava a bandeira deste recorde inquietante: os Estados Unidos.
De acordo com a FAO, quase um terço dos adultos mexicanos são obesos. Segundo os dados oficiais do México, 32,8 % dos adultos estão muito acima do peso ideal, contra 31,8% dos norte-americanoss. Além disso, quase 70% dos adultos mexicanos estão acima do peso e, nos últimos dez anos, triplicou o número de crianças obesas.
Os alimentos industrializados, com muitas calorias e baixo custo, são os primeiros culpados. Se a esta mudança na alimentação somamos um estilo de vida sempre mais sedentário, o abandono do campo e da alimentação tradicional que dá lugar a uma urbanização massiva, o resultado é desalentador.

A verdade é que a comida chatarra chega até as zonas rurais. Em povos muito isolados, na Serra de Guerrero ou em comunidades de Chiapas ou Oaxaca, onde a eletricidade não chega, onde não há nem mesmo sinal de celular, locais isolados durante vários meses ao ano devido às condições proibitivas das rodovias que se transformam em pântanos durante a temporada de chuvas, chegam os inconfundíveis caminhõezinhos vermelhos da Coca-Cola, levando às comunidades centenas de garrafas de vidro.
O México tem o recorde do consumo de bebidas açucaradas, sendo o principal consumidor mundial de refrigerantes, com uma média de 163 litros por pessoa ao ano, segundo os dados da Universidade de Yale e da organização não governamental Oxfam.

Mudança dos costumes
Os supermercados se enchem cada vez mais de alimentos calóricos industrializados e de bebidas açucaradas, tirando das prateleiras frutas e verduras e alimentos mais saudáveis – abundantes no país.  Nas zonas urbanas do México, se compra cada vez mais em supermercados e lojas que vendem esses produtos e cada vez menos em mercados ou tianguis (os mercados populares tradicionais). Além disso, é grande o consumo geral de carboidratos, principalmente de tortillas e de derivados de milho ou de trigo. Parece não haver saída para o aumento da obesidade.

O paradoxo é que frutas e verduras no México são de grande qualidade e baratos. Até poucas décadas atrás, era muito comum acompanhar as refeições com sucos naturais ou águas saborizadas, preparadas com a grande quantidade de frutas que se produz todo o ano no país.
Seguem resistindo lugares populares, os lugares de “comida rápida”, que conjugam a qualidade dos ingredientes com preços econômicos. Muitas pessoas aindacomem todo dia nesses restaurantes de comida caseira, mas não é suficiente para garantir a saúde da maioria.
Foram implementadas campanhas brandas sobre o tema da saúde alimentar, mas só há poucos meses começaram a aparecer, no metrô do Distrito Federal, anúncios da campanha contra a obesidade da Secretaria de Saúde Pública, que finalmente faz as contas. O anúncio pergunta: “Você daria 12 colheres de açúcar aos seus filhos? Então por que lhes dá refrigerante?”.
Economia
Além de ser um problema de saúde, a obesidade é também um peso econômico. Calcula-se que em 2017 os problemas de obesidade terão custado ao Estado mexicano entre 70 mil e 101 milhões de pesos (de 5,4 a 7,7 bilhões de dólares).
A agua é a vilã das mesas mexicanas, como se tomá-la fosse ridículo quando há a possibilidade de beber refrigerantes a um preço tão baixo e com sabores tão doces. A desqualificação sistemática dos alimentos saudáveis é um dos elementos mais importantes no processo de aumento de peso da população.
As armas que o México importa em seu território não são apenas os AK-47 e os rifles de assalto, senão também as toneladas de alimentos e bebidas chatarras que poderiam ser bem representadas como pistolas apontadas para a cabeça de milhões de obesos.


Reportagem de Federico Mastrogiovanni 

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