24/08/2013

Cruzada moral da extrema-direita russa mira álcool, judeus e imigrantes

"Queremos eliminar todos os elementos antissociais", disse grupo. "Beijaço" no Brasil irá repudiar leis recentes.




A popularização do discurso da extrema-direita na Rússia vem sendo apoiada por uma cruzada moral que critica e denuncia grupos classificados como “responsáveis pela degradação moral” do país. Além dos “homossexuais e pedófilos” (sic), os ataques se estendem também a judeus e a muçulmanos do norte do Cáucaso e da Ásia Central.
“Queremos eliminar todos os elementos antissociais, digamos assim”, explicou um membro do Occupy Pedofilia que se identificou como Max Speedway.  O grupo, inspirado às avessas no Occupy Wall Street, se autodefine como movimento social e é hoje o grupo nacionalista mais popular na Rússia, com grande presença nas redes sociais. Fotos de Hitler e ataques a judeus são comuns na página administrada na rede social russa Vkontakte.


Os jovens membros, quase todos entre 15 e 25 anos, não parecem se envergonhar da controversa – para ser suave – extrema-direita russa: “Eu me simpatizo com o neonazismo, com a defesa que eles fazem da pátria e dos valores”, explica Davi “Winchester”, sem esconder seu rosto nas redes sociais.
“Eles não devem conhecer a nossa história. Como pode existir um nacionalista russo nazista? Se a pessoa é nacionalista russa, ela não pode ser nazista porque foi a Rússia que derrotou Hitler na Grande Guerra Patriótica (termo que os russos usam para a segunda parte da II Guerra Mundial). Ele são muito novos. A minha geração sabe o que foi a guerra”, conta Vera (nome fictício), de 28 anos.

Os imigrantes são também vítimas rotineiras dos grupos neonazistas. Um dos grupos associados ao Occupy Pedofilia, RosPriton, incentiva os russos a denunciar “vizinhos ilegais indesejados”.
O grupo recebe a “denúncia” e vai ao edifício onde residem imigrantes sem permissão de residência, chamam a polícia e colocam os estrangeiros em situações vexatórias.
O consumo de álcool e drogas também é criticado pela maioria dos integrantes, completando a cruzada moral russa.

“Está cientificamente provado que a sobriedade é o estado natural do homem. O álcool age rapidamente paralisando a ação neuromuscular. Álcool em sua forma pura não existe na natureza, só industrialmente”, teoriza Anton Prokofiev, um membro do grupo.
O movimento Occupy Pedofilia conta também com uma organizada rede financeira. Além do dinheiro dos “safáris” (caça aos homossexuais, que custa R$ 18 por pessoa a cada saída), o grupo vende camisetas (R$ 87), canecas (R$ 36), coleções de facas, anabolizantes e faz divulgação de lojas e diversos tipos de serviços. A página do Occupy Pedofilia já conta com quase 80 mil seguidores na rede social russa e uma página associada (Tesak contra Pedofilia) possui 163 mil membros. Tesak é o líder do grupo e sua popularidade é tamanha que há inclusive uma comunidade que pede “Tesak para presidente”.
E como se a ideologia nacionalista não fosse suficiente para atrair os jovens russos, o Occupy Pedofilia ataca também na área financeira. No cabeçalho da página do movimento, oferece-se assistência para a obtenção de empréstimos entre 40 mil rublos (R$ 3 mil) e 5 milhões de rublos (R$ 360 mil). Basta ter mais de 18 anos, ser cidadão russo e residir em Moscou ou em São Petersburgo. Na página do movimento, há também postagens com convites para participação em pirâmides financeiras, proíbidas na Rússia.

“Tesak é nosso líder, nosso guia moral, um exemplo que precisamos para a nossa juventude. Temos que fazer com que as novas gerações não bebam, pratiquem esportes e estejam no caminho certo. Deus recompensará. Nós, russos, somos ortodoxos e não queremos a tolerância do Ocidente”, relata Pavel Kondaurov, um dos participantes do movimento.

O Occupy Pedofilia já conta oficialmente com representantes em pelo menos 30 grandes cidades russas e em Kiev, capital da Ucrânia. “Nosso projeto social está crescendo muito nos últimos meses. Isso é um bom sinal”, declara Anzhey Kmitits, um dos braços direitos de Tesak.

Brasil

Através da sua página no Facebook, a Embaixada da Rússia no Brasil emitiu um comunicado tentando acalmar as críticas e a preocupação dos brasileiros sobre a situação com a comunidade LGBT na Rússia. “Discriminação de qualquer gênero é proibida na Rússia a nível constitucional de acordo com os compromissos assumidos no âmbito da ONU e disposições correspondentes da Convenção Europeia dos Direitos Humanos”, publicou a Embaixada da Rússia.
E continuou: “A lei referida proíbe somente impor atitudes sexuais não-tradicionais aos menores de idade. Isso não contradiz à Constituição russa (...) A legislação russa obriga os órgãos públicos proteger crianças de informação que possa prejudicar a saúde delas, bem como desenvolvimento espiritual”. Segundo a Embaixada russa no Brasil, as “informações sobre uma ‘campanha da violência de grande escala’ em relação às pessoas da orientação sexual nãotradicional (...) não correspondem à realidade”.
No Brasil, aconteceu ontem sexta-feira (23) um ato de repúdio às recentes leis aprovadas na Rússia. O “beijaço” ocorreu em frente ao Consulado da Rússia em Brasília, São Paulo e no Rio de Janeiro. No dia 8 de setembro, será a vez de outros inúmeras cidades do mundo se unirem em solidariedade à comunidade LGBT russa, também em frente às respectivas representações diplomáticas.


Reportagem de Sandro Fernandes

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