18/06/2013

Protestos chamam atenção para drama de imigrantes irregulares em plantações italianas

Longas jornadas de trabalho, precarização, condições subumanas e ameaças de demissões são comuns no sul do país.



A exasperação e o protesto de centenas de trabalhadores imigrantes estrangeiros, que realizam seus trabalhos sazonais nas grandes plantações de tomate e laranja no sul da Itália, permitiram a abertura de uma pequena brecha no muro de silêncio que, durante anos, contribuiu para viabilizar essa situação de profunda degradação humana.
Extensas jornadas de trabalho sem nenhuma garantia contratual ou benefícios sociais, terceirização, precarização e flexibilidade trabalhista, condições de vida desumanas, sem nenhum direito a reclamar sob pena de ser objeto de demissão imediata, são apenas algumas das dramáticas condições em que vivem e trabalham no campo mais de 80 mil imigrantes em situação irregular.


Sobre essa situação, o site Opera Mundi conversou com Maria e Verônica, duas ativistas da Campagne in Lotta (Campanhas em Luta), uma rede de organizações territoriais que compartilham o objetivo de romper o isolamento, denunciar essa situação de trabalho semi-escravo e apoiar processos de auto-organização e defesa dos direitos fundamentais ante o silêncio complacente das autoridades nacionais.

Opera Mundi: Como surgiu a rede Campagne in Lotta?
Maria: Surgiu da união de duas experiências de apoio e solidariedade com as reivindicações de trabalhadores imigrantes no sul da Itália. Um primeiro grupo de organizações havia apoiado os protestos e a greve de 2010 de trabalhadores imigrantes em Rosarno, Calabria, que já não aguentavam as condições trabalhistas próximas à escravidão e os repetidos episódios de xenofobia. O segundo grupo havia apoiado os trabalhadores imigrantes em Nardò, Apúlia (Puglia, em Italiano), criando uma casa de trabalho onde os imigrantes viviam em condições mais aceitáveis e gozavam de diferentes serviços, em troca de reivindicar melhores condições trabalhistas e salariais.

Esse fato levou centenas de trabalhadores a proclamar uma greve em 2011, o aumento substancial do número de contratos de trabalho assinados pelos patrões e o indiciamento de dois dos grandes latifundiários da região.

Os muitos elementos comuns nos levaram a unir esforços, a nos expandir em boa parte do território nacional e a aprofundar a análise das políticas contra a imigração, tratando de romper a lógica e os mecanismos de exploração que cruzam de forma transversal o mercado trabalhista a partir do setor agrícola.

OM: Quem são essas pessoas?
Verônica: São pessoas que vêm majoritariamente do leste europeu e de diferentes países da África. São clandestinos, irregulares ou pessoas que simplesmente perderam o emprego que tinham, e o campo se converte para eles em um contendor que lhes permite sobreviver. Nesse sentido, não podemos falar de “trabalhadores agrícolas”, pois o fato de buscar trabalho nas grandes plantações e apoiar as reiteradas violações a seus direitos fundamentais não se deve a uma formação profissional, nem a capacidades técnicas, mas ao fato de que não têm nenhuma alternativa e que o que os patrões procuram é mão de obra barata.

OM: Como são as condições trabalhistas e de vida desses trabalhadores?
Maria: É a estrutura produtiva que modela as diferentes formas de exploração e violência contra os trabalhadores. Em vários lugares, há formas descontroladas de subcontratação (caporalato), nas quais uma ou mais pessoas (caporal) recolhem e contratam mão de obra não qualificada e a colocam à disposição do dono das plantações, recebendo em troca de uma quantidade de dinheiro por cada pessoa contratada. Dessa maneira, as pessoas trabalham praticamente sem horário, sem contrato, sem direitos nem prestações, sujeitas a qualquer tipo de pressão e chantagem. Ganham uma média de 25 euros diários, dos quais deve restar uma porcentagem fixa que fica com o caporal e o que lhe pagam para o transporte, a água e a alimentação.
Às vezes, o trabalho é tão intenso, que nem sequer têm tempo para comer, beber água ou ir ao banheiro. Vivem amontoados em barracas dentro das propriedades, em condições degradantes e de alto risco. E, para completar, têm que pagar por qualquer tipo de serviço, como a água para tomar banho e a água que bebem.

São lugares nos quais se perdeu a humanidade e nos quais se impõe um sistema e um modelo produtivo, que procura como reduzir gastos às custas dos trabalhadores, e nos quais o caporal é um instrumento de uma engrenagem baseada na exploração da mão de obra estrangeira, ante o desinteresse e a corresponsabilidade das instituições e a política local e nacional.


OM: Qual é a condição da mulher?
Verônica: Lamentavelmente, há uma forte presença e graves formas de prostituição, com condições piores das que se vive nas ruas, sem nenhum tipo de proteção, nem de segurança. Felizmente, já há várias organizações locais que, apesar das grandes dificuldades e da desconfiança de parte das mulheres, foram criadas para garantir certas formas de segurança sexual e prevenção de doenças.

OM: Apesar de tantas dificuldades, a rede Campagne in Lotta tem desempenhado um trabalho muito intenso nessas regiões.
Maria: Nossa presença aponta para a criação de alternativas reais para que ocorra uma mudança das relações de força entre os atores. Nesse sentido, queremos romper o isolamento, apoiar processos de auto-organização e criar pontes e condições para que haja uma reação desses setores maltratados, explorados e vilipendiados. Devemos aprofundar a análise, construir caminhos de luta com maior eficiência, com práticas de resistência e respostas mais organizadas, desmascarando as condições e as lógicas perversas de um modelo explorados que atinge a todos e todas.



Reportagem de Giorgio Trucchi
foto:Campagne in Lotta

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