O presidente russo, Vladimir Putin (foto esq.), apresentou nesta semana à Duma (câmara baixa do Parlamento) um projeto de lei que pretende introduzir responsabilidade penal para russos e estrangeiros que violem as leis de registro de residência.
O registro (conhecido como propiska) foi instituído ainda durante o Império Russo como uma maneira de controlar os deslocamentos no território. Com a reintrodução do passaporte interno na década de 30, a “propiska” passou a ser um carimbo nesse documento, constando o endereço residencial.
Até hoje os russos têm dois passaportes – um para viagens ao exterior e outro interno (onde figura a propiska). Em 1993, a “propiska” foi abolida como termo, mas o registro de residência permanente foi mantido, apesar de já não haver um controle efetivo. Putin quer que o registro passe a ser controlado e que haja uma punição para os que descumpram a lei.
O projeto apresentado à Duma indica que as multas para os que estiverem vivendo em um apartamento sem o registro oficial devem ser entre dois e três mil rublos (135 e 200 reais) para o inquilino e entre dois e cinco mil rublos (135 e 335 reais) para o proprietário. Em Moscou e São Petersburgo, as duas maiores cidades do país, as penalizações seriam entre 100% e 150% mais altas do que no restante da Rússia.
O projeto de lei pretende ainda cobrar multas de até 500 mil rublos (aproximadamente 33 mil reais), que também podem ser transformadas em uma pena de prisão de até três anos, para os cidadãos russos, estrangeiros ou apátridas que se inscreverem em uma residência utilizando documentação falsa. A lei cita o caso de milhares de pessoas que se registram todos os anos na Rússia em casas onde não vivem realmente. Somente em 2011, foram contabilizadas 300 mil pessoas com registro ilegal.
As agências de registro de residência eram muito comuns na Rússia até princípios de 2010, antes do atentado no metrô moscovita que deixou 40 mortos e mais de 100 feridos em março. As agências registravam os interessados em endereços inexistentes ou até mesmo em edifícios reais, sem informar ao proprietário ou com a conivência do mesmo monetariamente recompensada.
Após os atentados, muitas agências foram fechadas e o serviço passou a ser feito de maneira mais discreta e por internet. Na página propiska.net, por exemplo, é possível comprar o registro em Moscou por 6,5 mil rublos (435 reais) por um período de seis meses e 75 mil rublos (5 mil reais) para ter o documento durante cinco anos.
“O problema da lei é que todo mundo agora estaria ilegal. Quando alugamos um apartamento, o dono dificilmente faz o registro na casa. Ou moramos na cidade onde nascemos ou teremos problemas penais”, reclama Ilya (nome fictício), que deixou um povoado na Sibéria há treze anos para tentar a sorte em Moscou. O amigo Sacha também tem medo de que a nova lei acabe com o seu sonho de estudar e trabalhar na capital russa: “Sou de Vladivostok (extremo oriente da Rússia) e alugo um apartamento em Moscou. Não tenho a ‘propiska’ aqui. Ser russo não é suficiente para morar na Rússia. Patético. Estamos de volta à União Soviética”.
A “propiska” na cidade de residência muitas vezes é exigida por empregadores, que só contratram quem tem registro de domício na mesma região. Além disso, o emplacamento de carros só pode ser feito no local onde a pessoa tem a residência oficial, ou seja, o endereço da “propiska”.
Se um russo de alguma cidade da Sibéria comprar um carro em Moscou, por exemplo, ele deverá dirigir milhares de quilômetros até a cidade onde está registrado para poder formalizar o registro do carro. Só assim poderá dirigir em Moscou. A nova lei pode complicar ainda mais a rígida máquina burocrática russa.
Estrangeiros também têm que se registrar
Turistas que visitam a Rússia por mais de sete dias também devem fazer o registro. Os principais hotéis fazem o documento gratuitamente, mas albergues da juventude e hotéis menores cobram para registrar o hóspede. O valor ronda os mil rublos (65 reais).
[Cópia de uma "propiska]
“Todos nós turistas e estrangeiros residentes sabemos que devemos fazer este registro, mas não é simples. A maioria dos meus amigos russos também está registrada fora da capital e muitos fizeram reformas nas suas casas sem alterar o documento oficial. Registrar uma nova pessoa na casa poderia despertar a curiosidade do governo e eles teriam que pagar multas e mais impostos na residência”, explica um francês que preferiu não se identificar.
Apesar de não ser exigida pela Imigração quando o turista deixa o país, o papel pode ser solicitado por policiais nas ruas do país.
Muitos russos acreditam que esta medida tem como real finalidade controlar a florescente oposição. “O Kremlin quer registrar cada passo, cada movimento que damos. Não podemos exercer o nosso direito à liberdade de se mover pelo país. [A medida] aumenta a burocracia e pode ser usada contra dissidentes políticos, além de criar mais uma maneira para que pessoas indesejáveis sejam punidas. Oficialmente, a punição será por falta administrativa, mas o sentido real é poder penalizar qualquer pessoa”, explica o psicólogo Valera Ledenev.
Outros acreditam que a lei é somente uma nova maneira de extorsão. “Duvido que essa lei seja levada a sério. O que vai acontecer todos nós já sabemos – aumentar a corrupção. Os policiais vão ter mais uma maneira de conseguir dinheiro dos cidadãos”, conta o estudante de História Aleksey Gusevechenko.
O polêmico projeto foi apresentado pessoalmente pelo presidente Putin, sendo então considerado prioridade pela câmara baixa do Parlamento. Putin garante que “a nova legislação não impedirá que um cidadão russo viva em qualquer parte do território do país”.
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Reportagem de Sandro Fernandes
fonte:http://operamundi.uol.com.br/conteudo/noticias/26524/putin+propoe+lei+para+punir+russos+que+nao+sejam+registrados+no+domicilio+correto.shtml
foto:e29backroad.blogspot.com
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