28/01/2013

O que poderia ter evitado a tragédia em Santa Maria?


Negligência, superlotação, falta de fiscalização, estrutura deficiente e uso de pirotecnia. Essas são algumas das hipóteses que, somadas, teriam contribuído para a tragédia da madrugada do último domingo na boate Kiss, em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, na qual morreram pelo menos 231 pessoas.
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Outras 106 continuam hospitalizadas, pelo menos 16 em estado grave. Famosa por abrigar festas universitárias, a boate era ponto de encontro de estudantes e tinha capacidade máxima para 2 mil pessoas.
Este é o segundo incêndio mais fatal da história do Brasil. A pior tragédia deste tipo ocorreu em 1961 no Grande Circo Brasileiro, em Niterói, quando 503 pessoas perderam a vida. A BBC Brasil conversou com especialistas que elencaram possíveis fatos que poderiam ter culminado na tragédia, a partir da análise de depoimentos de testemunhas e autoridades locais. Confira.
Possível superlotação
A boate Kiss informava ter capacidade máxima para receber 2 mil pessoas. Não se sabe ao certo quantas pessoas estavam no interior do estabelecimento no momento do incêndio.
No entanto, a pedido da BBC Brasil, especialistas calcularam em 1,3 mil pessoas a lotação máxima da casa, com base em seus 650 metros quadrados de área.
O cálculo leva em conta até duas pessoas por metro quadrado, número limite para locais como casas noturnas, conforme previsto nas normas da ABNT, que regem a normalização técnica no país.
"A lotação de um estabelecimento dependerá de sua área útil e de sua finalidade. Isso é verificado pelos bombeiros mediante inspeção", explicou Ivan Ricardo Fernandes, engenheiro civil e capitão do Corpo de Bombeiros do Paraná.
"Antes disso, entretanto, o proprietário precisa ter contratado um engenheiro a quem caberá, como responsável técnico, definir a capacidade máxima do local com base, entre outras coisas, nas normas de segurança contra incêndio", acrescentou.
Possível falta de fiscalização
Para especialistas, tanto a Prefeitura quanto os bombeiros podem ter falhado ao não verificar, por meio de vistorias, se a casa noturna de Santa Maria se adequava às normas determinadas pela legislação.
"O que mais vemos nessas tragédias é o não cumprimento das normas. Prefeitura e bombeiros precisam atuar em conjunto com um trabalho de fiscalização profunda", disse à BBC Brasil Luiz Antonio Cosenza, presidente da Comissão de Análises e Prevenção de Acidentes do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio de Janeiro (Crea-RJ).
Segundo Cosenza, as vistorias ajudam a reduzir o número de acidentes. Somente no ano passado, lembrou ele, cerca de 90% de todos os acidentes relacionados à construção civil no Rio de Janeiro foram causados por falta de manutenção.
"Cabe aos órgãos responsáveis interditar o local em caso de descumprimento da lei, assim como responsabilizar o proprietário e o locatário por qualquer risco que o estabelecimento possa apresentar", disse Cosenza.
"Se realmente só havia uma saída de emergência, por que este estabelecimento estava funcionando?", questionou Fernandes.
Eles, entretanto, alertaram para o baixo efetivo tanto da Prefeitura como do Corpo de Bombeiros - órgãos responsáveis pela fiscalização deste tipo de estabelecimento - o que dificultaria a fiscalização diária.
"Tanto bombeiros quanto Prefeitura padecem com a falta de pessoal. Isso invabiliza o trabalho dos órgãos responsáveis pela prevenção de acidentes", afirmou Fernandes.
Possíveis deficiências estruturais
Em entrevista à BBC Brasil, o ex-bancário Alberto Tessmer, que presenciou o incêndio e ajudou no resgate das vítimas, afirmou que só havia uma única área de escape na boate, a mesma pela qual o público entrava na casa noturna.
Além disso, segundo ele, não havia "qualquer sinal" de iluminação de emergência - que, em caso de incidentes, servem para indicar a rota de fuga mais rápida.
Tessmer acrescentou ainda que muitas pessoas teriam confundido a aparência de uma porta dentro da casa noturna, que dava acesso aos banheiros, a de uma possível saída de emergência.
Para especialistas, a hipótese pode fazer sentido, uma vez que, em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, o capitão Edi Paulo Garcia, da Brigada Militar, contou ter tirado cerca de "180 corpos de vítimas" dos banheiros.
Segundo Fernandes, do Corpo de Bombeiros do Paraná, tais circunstâncias evidenciam a precariedade de estrutura da casa noturna.
"Considerando a área útil e a atividade do local, seriam necessárias pelo menos duas saídas de emergência, que, juntas, deveriam somar 7 metros de largura", explicou Fernandes.
"Além disso, ainda segundo as normas da ABNT, a distância máxima a ser percorrida até a área de escape deveria ser de 30 metros", acrescentou.
Segundo relatos de testemunhas, a única porta de saída media em torno de 2 metros de largura por 2 metros de altura.
Uso de pirotecnia
Segundo relatos de testemunhas, um dos integrantes da banda Gurizada Fandangueira, que se apresentava na madrugada do último domingo, acendeu um sinalizador em meio a performance.
As faíscas teriam atingido o isolamento acústico do teto e desencadeado rapidamente o incêndio, que não pôde ser controlado.
A pirotecnia era comum nas apresentações do grupo. No site de compartilhamento de vídeos YouTube, por exemplo, apresentações antigas da banda revelam o uso dos fogos de artifício semelhantes aos que foram usados na boate Kiss.
"No entanto, os donos da casa noturna nem os organizadores da festa deveriam ter dado permissão à essa prática, uma vez que, consideradas as características do espaço, ela é proibida e pode causar grandes riscos", disse Wengrover.

Reportagem de Luís Guilherme Barrucho
fonte:http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/01/130128_causas_tragedia_incendio_santa_maria_especialistas_lgb.shtml





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