Após dois anos de discussão, a Câmara dos Deputados aprovou ontem o projeto de lei que muda a distribuição dos royalties do petróleo entre Estados, municípios e governo federal no Brasil.
O petróleo gera grandes riquezas para os governos de diferentes formas – através de impostos sobre a venda do produto ou através de lucros das companhias petrolíferas, nos casos em que o governo tem alguma participação na empresa ou até o seu controle acionário total.
Além de impostos e lucros, a principal fonte de riqueza para muitos governos são os royalties. No caso do Brasil, os royalties são 15% do valor produzido.
Em tese, os royalties são apenas uma compensação paga a Estados e municípios produtores para cobrir diferentes custos relacionados à exploração dos recursos naturais, como investimentos em infraestrutura e danos ambientais.
Mas, como o petróleo é considerado um patrimônio nacional, a questão dos royalties ganha contornos estratégicos que determina como os países lidam com suas riquezas naturais.
Cada nação tem formas diferentes de tratar os royalties.
No Brasil, o governo tentou inovar ao incluir no Projeto de Lei a destinação obrigatória de 100% dos royalties do petróleo para gastos com educação. No entanto, este item foi derrubado pelos deputados da Câmara. Já na Noruega, os royalties são investidos em um fundo especial que tem como objetivo pagar as aposentadorias da população no futuro.
Brasil
No Brasil, Estados e municípios terão direito a quase 80% dos royalties, pela proposta aprovada na terça-feira.
O regime de distribuição de royalties do petróleo brasileiro começou a ser repensado depois da descoberta de grandes reservas na camada pré-sal do litoral brasileiro. O debate foi dominado por uma questão: quanto da riqueza do petróleo pertence aos Estados e municípios produtores, e quanto pertence ao resto do Brasil?
Em 2010, deputados propuseram a "Emenda Ibsen", que ignorava as regiões produtoras e tratava todos os Estados da federação da mesma forma. No entanto, a proposta foi vetada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Dois anos depois, a questão ainda está sendo discutida. Os políticos chegaram a uma fórmula progressiva – que gradualmente vai retirando recursos dos Estados produtores e da União, e repassando mais dinheiro para os demais Estados e municípios brasileiros.
No último mês, o debate ganhou outra dimensão. O relator da proposta, Carlos Zarattini (PT-SP), incluiu uma reivindicação da presidente Dilma Rousseff de que 100% dos royalties do petróleo devem ser investidos em educação.
O objetivo da medida era cumprir uma regra do Plano Nacional de Educação, que exige que o Brasil invista 10% do seu PIB em educação. No entanto, esse item da proposta foi derrubado pelos deputados.
O texto que foi aprovado na terça-feira permite que Estados e municípios gastem nas seguintes áreas: infraestrutura, educação, saúde, segurança, erradicação da miséria, cultura, esporte, pesquisa, ciência e tecnologia, defesa civil, meio ambiente, mitigação das mudanças climáticas e tratamento de dependentes químicos.
A proposta aprovada no Congresso ainda precisa ser sancionada pela presidente.
Noruega
A Noruega descobriu suas reservas no fim dos anos 1960. O governo ganha dinheiro através de impostos sobre o petróleo, e não de royalties. Desde os anos 1990, as receitas vão para o Fundo do Petróleo, que, em 2006, foi rebatizado de Fundo de Pensão Global do Governo.
O modelo é único no mundo. O governo pode gastar por ano apenas 4% dos recursos do petróleo em seu orçamento. O restante fica guardado no fundo e será usado no futuro para lidar com dois problemas já previstos pelos noruegueses: o alto custo das aposentadorias (decorrente do envelhecimento da população) e a escassez nas receitas do petróleo (que é um recurso finito).
Ainda não houve decisão política de quando esses recursos serão sacados. Em casos de emergência, ele está disponível imediatamente.
Enquanto isso, o dinheiro é investido no mercado de ações e em títulos de governos. A Noruega se orgulha de investir apenas em "práticas éticas" – o que exclui comprar ações de companhias de tabaco ou empresas suspeitas de empregar trabalho infantil.
Recentemente, a fórmula de investimento foi alvo de críticas no país. Em 2008, quando estourou a crise financeira mundial, o fundo perdeu 23% do seu valor, quando as bolsas desabaram em todo o mundo.
Venezuela
A receita do petróleo, gerada por impostos e lucros, é a base da economia venezuelana. Segundo a entidade Council of Foreign Relations, baseada em Washington, os ganhos com petróleo correspondem à metade das receitas do governo.
Desde que o presidente Hugo Chávez chegou ao poder, em 1998, o petróleo ganhou mais importância na economia venezuelana. Em 2006, o governo assumiu o controle majoritário dos projetos de exploração liderados por companhias estrangeiras.
Em 2005, foi criado o Fundo Nacional de Desenvolvimento que, em seu estatuto, é uma "empresa para otimizar os investimentos produtivos e sociais". O dinheiro é gasto em projetos de infraestrutura, saúde, ambiente, energia, defesa, indústrias básicas, educação e agricultura.
Uma crítica recorrente que é feita a esse modelo é a falta de transparência, com analistas reclamando que não é possível saber exatamente tudo que está sendo financiado com o dinheiro do petróleo.
Outro problema é que o orçamento do governo e a economia venezuelana acabam dependentes do preço do barril do petróleo. Chávez argumenta que os gastos sociais ajudaram a reduzir a desigualdade do país para o menor índice da história.
Estados Unidos
Os royalties do petróleo – 12% da produção – são pagos diretamente ao Tesouro americano e a alguns fundos de cunho ambiental.
Em 1995, durante o governo de Bill Clinton, os Estados Unidos resolveram abrir mão da cobrança de royalties para novos projetos de exploração de petróleo offshore no Golfo do México.
A ideia da lei Deep Water Royalty Relief Act era estimular alguns novos investimentos em uma área considerada de risco financeiro para os investidores. Os projetos que se encaixam nessa lei não pagam royalties nos primeiros 87,5 milhões de barris produzidos. Também existe um teto na cobrança quando o preço do barril sobe demais nos mercados.
Em 2011, após o desastre ambiental do Golfo do México e em meio a pressões para o governo americano reduzir o seu déficit público, o presidente Obama e os democratas propuseram no Congresso um projeto chamado Close Big Oil Tax Loopholes Act – que acabava com a isenção de royalties.
No entanto, a proposta acabou derrotada pelos republicanos.
Reportagem de Daniel Gallas
foto:pandora.jor.br
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