04/10/2012

Notícias do julgamento do mensalão



O ministro Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal, votou ontem (3/10), pela condenação de José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares (foto acima) por entender que estes corromperam parlamentares através da organização e execução de um esquema criminoso de compra de apoio político na Câmara dos Deputados, em 2003, no governo do presidente Lula.
Além dos três ex-dirigentes do PT, o relator da Ação Penal 470, o processo do mensalão, condenou os réus Marcos Valério, Ramon Hollerbach, Cristiano Paz, Rogério Tolentino e Simone Vasconcelos pela mesma imputação. Joaquim Barbosa absolveu o prefeito de Uberaba (MG), Anderson Adauto — então ministro dos transportes à época dos fatos descritos pela denúncia — por não estar certo sobre a participação dele no esquema. O ministro também absolveu a ré Geiza Dias, não por estar convencido de sua inocência, mas por conta de decisão prévia do Plenário, que a absolveu na ocasião do julgamento de outros itens da denúncia.
Barbosa ocupou mais de dois terços do tempo do seu voto apenas tratando dos fatos imputados ao ex-chefe da Casa Civil, José Dirceu. Para o relator, Dirceu “controlava os destinos da empreitada criminosa” e “detinha o domínio final do fato”, executando, assim,  "os atos de controle, execução e garantia” do esquema de compra de apoio de parlamentares.
“Considero impossível acolher a tese de que José Dirceu simplesmente não sabia que Marcos Valério vinha fazendo pagamentos a parlamentares da base aliada”, disse.
O ministro relator ainda se referiu  ao esforço da defesa de Dirceu “de desqualificar os depoimentos do corréu Roberto Jefferson", principal testemunha que dá conta do vínculo de José Dirceu com os fatos descritos pelo Ministério Público Federal. Para Joaquim Barbosa, os depoimentos de Jefferson são “extremamente verossímeis” uma vez que “o próprio José Dirceu admitiu que Marcos Valério participou de reunião na Casa Civil com o presidente do Banco Espírito Santo", instituição financeira privada de Portugal.
O relator citou ainda como evidência da participação de Dirceu no esquema o “caráter clandestino privado dessas reuniões, apesar de serem realizadas nas dependências do Executivo brasileiro, ou seja, no Palácio do Planalto”, observou.
O ministro relator disse também que "as defesas de Delúbio e Valério tentaram blindar Dirceu para tornar mais plausível a tese do caixa dois", afirmou. “Só depois de descobertos os pagamentos”, disse o relator,  “é que confessaram terem participado dos encontros”.
Joaquim Barbosa voltou a se referir à viagem feita por Marcos Valério, seus colaboradores e políticos da base aliada do governo a Portugal, em 2003, em que os réus alegam ter sido motivada por conta da aquisição pelo grupo português da Telemig e por outros interesses secundários. O relator observou que Marcos Valério, além de encontrar com o presidente da Portugal Telecom, Miguel Horta e Costa, e de “reiterados encontros" com dirigentes de empresas do país, foi também recebido pelo ministro das comunicações de Portugal, Antonio Mexia.
“Marcos Valério falava, de fato, em nome de José Dirceu, e não como um pequeno e desconhecido publicitário de Minas Gerais. Era o seu broker”, afirmou Barbosa. “A viagem ficou comprovada e o contexto impede que se acolha a superficial explicação da defesa de Valério”, acrescentou.
O relator referiu-se também ao fato de a ex-mulher de José Dirceu, Ângela Saragosa, obter um  empréstimo de R$ 42 mil no Banco Rural e ganhar um emprego no banco BMG. Novamente, o ministro Joaquim Barbosa atacou os argumentos da defesa de Dirceu, que afirma que o réu não teve participação nem conhecimento do empréstimo e que sua ex-mulher foi apresentada a  Marcos Valério pelo então assessor da Casa Civil, Silvio Pereira, um dos fundadores do PT. Para o relator, somente uma “inédita convergência de coincidências” sustentaria a versão da defesa.
Quanto a José Genoino, Barbosa citou depoimentos do ex-secretário do PTB, Emerson Palmieri, e de outras testemunhas que atestam que cabia ao réu articular as promessas de vantagens indevidas, executadas posteriormente por Delúbio Soares e Marcos Valério. No caso específico de Delúbio, o relator afirmou que os autos provam que era seu papel indicar a Marcos Valério os beneficiários das quantias. “Delúbio detinha o comando final acerca de quem deveria receber os valores, os beneficiários da engenharia criminosa efetuada por Marcos Valério”, disse.
Além de responsabilizar Marcos Valério e seus sócios, o relator afirmou que o advogado  do grupo, Rogério Tolentino, teria se encontrado com José Janene, então presidente do PTB, já falecido, e  sócios da corretora Bônus Banval, tomando, assim, parte no crime de corrupção ativa.
Quanto ao réu absolvido pelo relator, Anderson Adauto, Barbosa afirmou não estar convencido de que ele teria atuado no pagamento de propina ao deputado do PTB Romeu Queiroz e viabilizado a compra de apoio político de parlamentares do PTB por intermédio de Roberto Jefferson.
Na sequência do voto do relator, o revisor da Ação Penal 470, começou a votar sobre o bloco final do sexto capítulo da denúncia. O ministro Ricardo Lewandowski  votou pela absolvição de José Genoíno, ex-presidente do PT, pela acusação de corrupção ativa. O revisor também não poupou críticas ao Ministério Público, dizendo que a denúncia em relação a Genoíno e diversos outros réus foi paupérrima em muitos pontos e generalizou as condutas para tentar comprovar fatos que não foram provados.
Em seu voto, o ministro tratou mais das acusações contra José Genoíno. E bateu forte na denúncia do Ministério Público: “Sempre com o devido respeito ao valoroso trabalho do parquet”. Segundo Lewandowski, a denúncia foi vaga, genérica, omissa e não conseguiu individualizar a conduta imputada a Genoíno. “Não se pode condenar alguém pelo simples fato de ele ocupar um cargo”.
Segundo a denúncia, José Genoíno participou do esquema de compra de apoio político no Congresso Nacional por conta de dois avais que deu a empréstimos feitos pelo PT juntos aos bancos Rural e BMG. E por ter participado de reuniões com integrantes do Partido Progressista (PP). “Não há nada ilegal em uma reunião entre o presidente de um partido e membros de outro partido. Não podemos criminalizar a política. Se uma reunião entre partidos for ilegal, podemos fechar país”, afirmou Lewandowski.
Nesse ponto, o ministro voltou a criticar o Ministério Público. Segundo ele, a denúncia diz apenas que houve a reunião em que Genoíno tratou da compra de apoio parlamentar: “Onde está o quando, onde, porque, quanto? Em nenhum momento o Ministério Público apontou para quem Genoíno teria oferecido propina. Assim fica fácil para o Ministério Público”. De acordo com Lewandowski, o MP “não conseguiu, nem de longe, apontar de modo concreto” as condutas imputadas a José Genoíno.
Sobre os avais dados pelo ex-presidente do PT aos empréstimos, o revisor lembrou o depoimento de Genoíno, que afirmou que dar o aval era sua “obrigação estatutária”. O ministro também distribuiu aos colegas uma pasta com dois documentos. Um deles mostra que o PT quitou a dívida junto ao Banco Rural.
O relator, Joaquim Barbosa, pediu a palavra para observar que a dívida foi quitada sete anos depois, e só após o processo estar em pleno curso. Barbosa disse que a "tradição" do Banco Rural, de dar empréstimos fraudulentos, faz com que ele não leve “nada desse banco a sério”. Diferentemente do que aconteceu nas outras sessões, Lewandowski não deixou a discussão se estender e retomou o voto depois de dizer que o fato é que o empréstimo foi quitado.
O outro documento distribuído pelo revisor aos colegas mostra que o empréstimo tomado pelo PT no BMG é alvo de uma ação judicial em outra instância. Ou seja, não pode ser levado em consideração neste caso. “O que não está nos autos, não está no mundo”, afirmou o ministro.
O revisor ainda observou que, até onde se saiba, o ex-deputado José Genoíno “sempre foi um deputado ideológico, não fisiológico”. A conclusão de Lewandowski foi a de que “à luz das provas dos autos, a acusação revelou-se frágil e especulativa. Paupérrima”.
A parte mais esperada de seu voto, em relação à acusação contra o ex-ministro-chefe da Casa Civil de Lula, José Dirceu, ficou para hoje (4/10). Mas Lewandowski já votou pela absolvição do advogado Rogério Tolentino, da funcionária da SMP&B Geiza Dias, e do ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto.
O revisor votou pela condenação dos publicitários Marcos Valério, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach, da funcionária da SMP&B Simone Vasconcelos e do ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares. Ricardo Lewandowski não se estendeu sobre as condutas do chamado núcleo publicitário, que já foram bastante debatidas nos dois meses de julgamento. Em relação a Delúbio Soares, o revisor afirmou que ele foi um “personagem onipresente” no esquema de pagamento a parlamentares do Congresso Nacional.
“Embora a denúncia seja um pouco dúbia, ao longo da instrução criminal ficou comprovado que Delúbio Soares agia com plena desenvoltura junto com Marcos Valério. Foram os dois grandes articuladores desse esquema criminoso de repasse de verbas para parlamentares e políticos”, afirmou.

Reportagem de Rafael Baliardo e Rodrigo Haidar
foto:180graus.com

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