O sal, quem diria, parece ter virado uma parte importante da água. Pelo menos quando se trata do mercado de águas minerais na Grande São Paulo, onde elas faturaram R$ 200 milhões no primeiro semestre, valor 17,3% maior que no mesmo período de 2011, segundo a Nielsen.
Duas das principais marcas, Bonafont e Minalba travam um acirrado duelo por consumidores que, na capital paulista, parecem levar muito a sério o teor de sódio contido em cada garrafa.
A Bonafont, produzida pela francesa Danone, chegou ao mercado em 2008 (ela é distribuída em SP e no sul de Minas). De lá para cá então, passou a investir alto – no mercado, fala-se em R$ 45 milhões por ano – em propaganda. Os anúncios quase sempre destacavam o baixo teor de sódio, um dos componentes do sal de cozinha. A Bonafont tinha, então, 0,34 mg/l de sódio. Tomar água reduziria o "inchaço" provocado pela retenção de líquido, que tem o sal como vilão, diziam os comerciais.
Bastou para que a marca saltasse, em quatro anos, para o topo das vendas na capital paulista, com 20% do mercado. "Ela consegui estabelecer um diferencial para se destacar num mercado em que os consumidores não costumam pedir pela marca", diz Adalberto Viviani, da consultoria especializada Concept. A Minalba, feita pelo grupo cearense Edson Queiroz, que é líder nacional (tem 12% do mercado brasileiro, com os rótulos Minalba e Indaiá), passou a perder terreno na cidade.
A água vendida pela Bonafont vem de uma fonte em Jacutinga, Minas Gerais. Mas, como a quantidade de sódio depende de fatores naturais, que podem variar, a Bonafont agora tem 1,2 mg/l de sódio. É muito menos que a Crystal, da Coca-Cola (30,4 mg/l), ou que a Lindóya (10,7 mg/l). A Minalba, porém, percebeu que tinha uma vantagem que poderia ser melhor propagandeada: só 0,9 mg/l de sódio.
Há três meses, a marca passou a anunciar – em revistas, sites de internet e pontos de venda – que tinha menos sódio que as concorrentes, além de destacar os supostos benefícios disso. "Reduzindo o sódio, você tira o inchaço, tira a retenção de líquido e tira até aquela calça do armário que não cabia mais", dizia o material. "Foi suficiente para estabilizar a nossa participação de mercado em São Paulo, que vinha caindo", diz Rogério Tavares, gerente comercial da Minalba. "A questão do sódio, com certeza, é fundamental para os consumidores da cidade", afirma.
Mas, no final de setembro, a fabricante cearense teve de suspender os anúncios. A Danone havia entrado com uma representação no Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária), afirmando que se tratava de propaganda enganosa. "A água, por si só, não é capaz de ajudar na retenção de líquido e muito menos de acabar com a retenção de líquido ou inchaço", diz a peça de acusação da marca francesa.
Para a Minalba, o argumento é contraditório. "A Bonafont foi a primeira a propagandear os benefícios da água com menos sódio, chegou à liderança em São Paulo por causa disso", afirma Tavares. Já a Bonafont diz que as propagandas que fazia - repare na sutileza - incentivavam o consumo de água em geral para reduzir a retenção de líquido, e então indicava beber a marca.
O Conar expediu uma liminar que suspendeu as propagandas da Minalba, até que o mérito fosse julgado. A decisão deve sair em novembro. Vale lembrar que, em 2008, a própria Bonafont foi alvo de uma denúncia parecida no Conar. A Schin afirmava que a marca "transmitia a ideia que elimina a gordura e substâncias nocivas do organismo, gerando a falsa noção de emagrecimento". Na ocasião, o órgão deu razão à Danone, deixando as propagandas no ar.
A Minalba decidiu mudar o material publicitário mesmo antes do julgamento. Agora, a marca ainda divulga que tem menos sódio, mas não fala nada sobre os supostos benefícios disso. "Basta dizer que temos menos sódio, os benefícios já estão na cabeça do consumidor", acredita Tavares.
Em nota enviada para a redação, a Danone contemporiza a disputa. "A Danone Águas Brasil destaca como positivos os investimentos na comunicação para fomentar o crescimento do mercado nacional de água mineral desde que pautada pelos princípios norteadores do Código de Autorregulamentação Publicitária. A Empresa reitera seu compromisso com uma comunicação clara, verdadeira e precisa (...) e posiciona a marca BONAFONT como uma opção", diz o comunicado.
No mais, o consumidor não tem tantos motivos para se preocupar com o sódio na água. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda o consumo diário de 2.000 miligramas (mg) de sódio por pessoa. Alguém que tome por dia dois litros de uma água com 30 mg/l de sódio estará ingerindo somente 60 mg de sódio, ou seja, 3% do consumo diário recomendado. Para comparação, a Coca-Cola Zero tem 140 mg/l de sódio – e uma campanha que não tinha nada a ver com isso, mas com nomes escritos na latinha, também foi muito eficiente no aumento das vendas.
Mas o duelo não termina aqui. A Minalba vai contra-atacar em nova frente: em vez de sódio, quer mudar o foco para a origem da água. Na próxima campanha, a frase é: "Nossa água vem de Campos de Jordão, e a sua?". Isso porque, enquanto toda produção da marca vem da cidade serrana, conhecida pelo ar puro e pela natureza preservada, a concorrente agora tem uma fonte em Itapecerica da Serra, na região metropolitana de São Paulo – conhecida, bem, pelo oposto. A fonte passou a ser usada pela Danone em 2011, para as embalagens de 10 e 20 litros, que têm 4,11 mg/l de sódio.
Para Tavares, da Minalba, essa concorrência toda é positiva e eleva o nível do produto. "A briga ruim não é com a Danone, mas com as águas regionais menores, que têm uma enormidade de sódio e são donas de 64% do mercado nacional", diz. Mesmo elogiando, aproveita para dar uma última cutucada na concorrente: "a água deles é boa, mas não é a melhor".
Reportagem de Pedro Carvalho e Dubes Sonego
foto:revistamergulho.com.br
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