08/09/2012

Na África, favelas produzem hortas para combater má alimentação dos mais pobres


Nos limites de Nairóbi, em Kibera, uma das maiores favelas da África, com mais de um milhão de habitantes, pequenas hortas cresceram fora do chão, dentro de sacos resistentes. As famílias mais pobres cultivam ali repolho ou espinafre, verduras de altíssimo teor nutricional, sobretudo pelo que contêm de ferro.
Essas jardineiras em sacos, idealizadas pela associação beneficente Solidarités International, usam pouca água graças a uma mistura de pedras e terra. Desde 2007 elas alimentaram 225 mil pessoas em quatro favelas da capital queniana.
“A densidade urbana foi tão forte com a multiplicação de barracos de 9 metros quadrados, que não restou nenhum pedacinho de terra em Kibera. Para se alimentar, os habitantes eram obrigados a comprar comida no mercado e sofreram com a alta dos preços dos alimentos. Muitos ficaram subnutridos”, explica Peggy Pascal, diretora desse programa.
A engenheira agrônoma se inspirou em experiências conduzidas no Afeganistão e no Sudão. Foram instaladas estufas na favela, administradas pelos habitantes, para produzir plantas e alimentar os sacos. Mas os hortelões informais obtêm eles mesmos a terra e as pedras. Oitenta por cento da produção serve para alimentar a família, o resto é vendido e permite que se comprem outros produtos. “As pessoas aprenderam rapidamente essa técnica. Muitas são ex-moradores da zona rural. Quando elas não têm sacos, cultivam em vasos, pneus”, diz Peggy Pascal.
Agricultura e urbanização não são contraditórias. Em um relatório da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO), intitulado “Cidades mais verdes”, publicado na ocasião do Fórum Mundial Urbano organizado pela ONU, que ocorre em Nápoles até 7 de setembro, os especialistas fazem dela o elemento central do desenvolvimento das cidades, sobretudo na África, onde a urbanização é a mais rápida do mundo.
Até 2030, a população urbana na África subsaariana terá dobrado, atingindo 600 milhões de habitantes. Mais da metade dos citadinos africanos já vive em alguma favela. Seu número dobrou entre 1990 e 2010, e 43% dos citadinos do continente sobrevivem com menos de US$ 1 por dia.
A FAO estudou 31 países africanos onde experiências de agricultura urbana foram registradas. O que está em jogo é simples: garantir a segurança alimentar dos mais pobres. Isso porque a urbanização rápida caminha junto com a pobreza e o desemprego, e a desnutrição é mais elevada nas cidades do que na zona rural. Os citadinos pobres precisam comprar tudo, legumes, frutas, pão, carne, e são vulneráveis à alta dos preços. Oitenta por cento de suas rendas são dedicadas à sua subsistência.
Resultado: a dieta deles carece de vitaminas e minerais essenciais, eles se privam de frutas e legumes, evitam os alimentos mais caros em prol de alimentos industrializados baratos ricos em gordura, açúcar e sal. Assim, a pobreza na cidade rima com obesidade, diabete, câncer. Nas crianças, a falta de vitaminas pode levar à cegueira.
Segundo a FAO, nos países em desenvolvimento o consumo diário de frutas e legumes é metade da recomendação da Organização Mundial da Saúde. As mulheres pobres são as mais vulneráveis: elas amamentam duas a três vezes menos que as mulheres do campo.
Na segunda-feira (3), a ONU fez um apelo para que a horticultura seja integrada ao planejamento urbano, para que a questão da água seja abordada e para que os hortelões informais sejam treinados de forma a limitar o uso de pesticidas, usados com abundância para aumentar os rendimentos.
A agricultura e a horticultura urbanas e periurbanas, ou seja, a menos de trinta quilômetros dos centros das cidades, também são um fator de criação de empregos. Na favela de Kibera, em Nairóbi, as jardineiras em sacos geraram a profissão de vendedor de terra. Elas favorecem as relações sociais. “Antigas gangues passaram a trabalhar na fabricação de sacos,” conta Peggy Pascal. “Mães de família conseguiram cultivar até cinquenta jardineiras, criando para si uma verdadeira fonte de renda”.
Por fim, a horticultura tem vantagens ambientais. No Cairo, por exemplo, as hortas e jardins nos telhados apresentam uma temperatura 7 graus Celsius menor que a dos telhados não vegetalizados. Em outros lugares, as plantações impediram a erosão dos solos e os deslizamentos de terra.
Vital para os países em desenvolvimento, a agricultura urbana também é preconizada nas cidades do Norte, sobretudo no plano da saúde e do combate à obesidade. “No fundo, o problema é o mesmo: ter acesso a uma boa alimentação, variada, rica em frutas e legumes, privilegiar os produtores locais, reduzir os transportes e o impacto do carbono”, explica Julien Custot, coordenador do programa “Alimentos para as cidades” na FAO.
A urbanização dos países ricos resultou na formação de “desertos alimentares”, que vê bairros inteiros sendo privados de produtos frescos acessíveis. Na região de Île-de-France, segundo um estudo do conselho econômico, social e ambiental regional, 1.600 hectares de terras agrícolas estão desaparecendo em média a cada ano nos últimos trinta anos, em razão da expansão urbana. Em dez anos, quase uma em cada cinco fazendas foi fechada.

Tradutor: Lana Lim

Reportagem de Sophie Landrin
foto:vivercidades.org.br

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