20/08/2012

Sob críticas, Austrália vai reabrir centros de detenção para imigrantes ilegais


Em matéria de imigração ilegal, os trabalhistas no poder na Austrália acabam de operar uma surpreendente reviravolta. Apesar das críticas de organizações de direitos humanos, o governo da primeira-ministra Julia Gillard decidiu por fim reabrir dois campos de detenção em pequenas ilhas do Pacífico, em Papua-Nova Guiné e em Nauru. Ele enviará para lá os refugiados interceptados enquanto tentavam chegar até a Austrália, particularmente através da Indonésia, em condições perigosas.
Essa política, conhecida pelo nome de “Pacific Solution” e conduzida pelo conservador John Howard entre 2001 e 2007, após a crise do Tampa – um navio norueguês que teve acesso recusado às águas territoriais australianas depois de socorrer 438 clandestinos afegãos - , havia sido abandonada pelos trabalhistas quando eles chegaram ao poder em 2008.
Mas, na última terça-feira (14), Gillard voltou atrás. As chegadas de refugiados, a maior parte do Afeganistão, do Sri Lanka e do Irã, não pararam e o discurso da oposição criticando a frouxidão das autoridades encontrou certa simpatia entre a população. “Não é mais hora de política, agora é hora de agir”, declarou a primeira-ministra, antes de um debate no Parlamento.
Na véspera, ela havia recebido as recomendações da comissão de especialistas criada em junho para resolver o impasse. Os senadores haviam acabado de rejeitar uma proposta de lei sobre a reabertura de um centro de detenção em Nauru e um acordo com a Malásia, alegando que esse país, que não assinou a convenção das Nações Unidas sobre os refugiados, não poderia oferecer uma proteção adequada.
A comissão emitiu no total 22 recomendações, entre elas a reabertura de dois centros no exterior, mas também o apelo por uma maior cooperação regional, explicando que tentou buscar uma solução “firme, mas não insensível”, “realista, mas não idealista”, “guiada pelo senso de humanidade e pela justiça”.
Em dez anos, 964 refugiados morreram tentando chegar até a Austrália, sendo 604 deles desde outubro de 2009. “É inaceitável que não se faça nada. Por isso nós propusemos uma nova abordagem, que seja global, integrada e justa”, afirmou um dos especialistas. Na terça-feira, as autoridades anunciavam que pelo menos três barcos que transportavam mais de 150 pessoas foram interceptados.
Na quarta-feira (15), a câmara baixa do Parlamento aprovou a lei e os senadores deverão fazer o mesmo, em razão do apoio da maioria trabalhista e da oposição. Esta última não deixou de criticar as hesitações do governo. Gillard afirmou que espera poder reabrir os dois centros daqui a um mês. Além disso, uma equipe de reconhecimento militar foi enviada na última sexta-feira (17).
No entanto, a mudança de postura dos trabalhistas foi criticada com veemência pelas associações de defesa de direitos humanos, que haviam criticado no passado as condições de detenção dos refugiados e a demora dos procedimentos no governo Howard.
O Conselho dos Refugiados da Austrália, que reúne ONGs e cidadãos, recebeu com “uma decepção profunda” a decisão de ter de recorrer novamente aos centros de detenção no exterior. “O que estamos vendo”, opinou Nick Riemer, porta-voz de outra ONG, a Refugee Action Coalition, “é um retorno à crueldade e à desumanidade das políticas do passado”.
Para Ben Saul, diretor do centro de direito internacional da Universidade de Sydney, a Austrália – um destino atraente na região, por ser um dos raros países da Ásia-Pacífico a ter uma tradição de receptividade – “está longe de ser invadida pelos refugiados, que são somente alguns milhares por ano”. Segundo números oficiais, em 2011, 4.565 pessoas chegaram clandestinamente a bordo de 69 barcos. De janeiro a agosto de 2012, foram 7.629 delas, a bordo de 11 embarcações. Além disso, entre julho de 2010 e junho de 2011, mais de 6.300 teriam chegado de avião.
“A Austrália evidentemente pode fazer mais”, afirma Saul ao “Le Monde”. “A solução não é punir os refugiados que vêm aqui os enviando ao exterior enquanto examinam sua situação em uma situação de incerteza em pequenas e pobres ilhas do Pacífico, mas sim de lhes oferecer uma proteção independentemente da maneira como eles vieram, pelo menos até que o número daqueles que vêm se torne impossível de administrar”.
Mas o Conselho dos Refugiados da Austrália comemorou a recomendação do grupo de especialistas de se aumentar a cota de entradas de refugiados de 13 mil para 20 mil ao ano e de chegar até 27 mil em cinco anos, ao mesmo tempo em que buscam uma maior cooperação com os países da região, especialmente a Indonésia e a Malásia.

Tradutor: Lana Lim

Reportagem de François Bougon
foto:refunitebrasil.wordpress.com

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