19/08/2012

População indígena aumenta em 205%


Os índios no Brasil somam 896,9 mil pessoas, de 305 etnias, que falam 274 línguas indígenas, segundo dados do Censo 2010 divulgado na última semana pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O número representa aumento de 205% em relação aos número de 1991, quando foi feito a primeira pesquisa nos moldes atuais. Em 91, os índios eram 294 mil e passaram a 734 mil em 2000. Além de o Censo 2010 retomar a investigação sobre as etnias dos povos, também voltou a investigar suas línguas, trabalho que ficou parado por 60 anos - mas não inclui os povos indígenas isolados.
O Censo mostra ainda que mais da metade dos índios (63,8%) vivem em área rural, outra condição que mudou em relação ao Censo de 200, quando mais da metade estavam em área urbana (52%). A pesquisa populacional aponta ainda que a maioria (57,7%) vivem em 505 territórios indígenas reconhecidos pelo governo (até dezembro de 2010, quando o Censo foi fechado). As áreas indígenas equivalem a 12,5% do território nacional, sendo a maior parte na região Norte, que também é a mais populosa em indígenas, com 342 mil índios. O contrário são as regiões Sudeste e Nordeste, onde a maioria dos índios vivem fora de suas terras tradicionais, respectivamente, 84 e 54%.
A terra indígena mais populosa é a Yanomami, que ocupa partes de Roraima e Amazonas, com 25,7 mil habitantes, o que representa 5% de todos os índios. Em número de indivíduos, os tikuna estão em primeiro, com 46 mil indivíduos, sendo que 39,3 mil vivem na terra indígena e os demais, fora; em segundo estão os guarani-kaiowá, que habitam o Mato Grosso do Sul, com 43 mil indivíduos, sendo que 35 mil vivem na terra indígena.
Apesar do contato quase permanente com o branco, o Censo revela ainda que 37,4% dos índios acima de 5 anos de idade falam línguas indígenas - outros 120 mil não conhecem mais.
Para o IBGE, o aumento na população indígena pode ser explicado pela queda na taxa de fecundidade das mulheres em áreas rurais - que caiu de 6,4 para 5,8 filhos - e processo de reconstrução das comunidades indígenas que antes estavam dispersas ou supostamente não existiam mais, como explicou o antropólogo da Universidade de Campinas (Unicamp), José Maurício Arruti.
Fora da Terra
Do total de indígenas, 379 mil estão fora das terras indígenas reconhecidas, o que para o IBGE indica a necessidade de ampliação das reservas e mostra também que há uma migração, principalmente em busca de educação e renda, aponta o instituto.
Dos 42,3% índios que não estão nas terras originais, 78,7% habitam áreas urbanas. A situação é mais comum na região Sudeste, onde 84% dos 99,1 mil índios estão fora de suas terras, principalmente em São Paulo (93%) e no Rio de Janeiro (97%). Outros estados como Goiás (96%), Sergipe (94%) e Ceará (86%) também têm percentuais elevados.
No Sudeste, há casos de índios que deixam suas terras por falta de espaço. Se sentindo apertados devido ao pequeno território, os guaranis, do sul fluminense, se desmembraram em aldeias menores. Parte foi para um antigo sítio indígena em Niterói e os demais permanecem próximos às terras Guarani Araponga, Guarani de Bracuí e Parati Mirim, somando 2,8% dos índios no estado.

Para o professor de antropologia da Universidade de Campinas (Unicamp), José Maurício Arruti, a migração econômica é uma das explicações para a quantidade de índios fora das aldeias reconhecidas, mas não o único fator. “Tem a ver também com o estabelecimento de núcleos antigos de migração (nas cidades) e com problemas territoriais na origem, que expulsam, principalmente novas gerações”, afirmou.
A presidenta da Fundação Nacional do Índio (Funai), Maria Azevedo, diz que situações diversas explicam o fato de mais de 40% dos índios estarem fora das terras originais. "Eles podem estar em áreas urbanas por vontade própria ou porque são da quarta ou quinta geração vivendo fora das aldeias indígenas. Isso tudo a gente ainda não sabe, mas vai poder estudar."
Em três unidades da federação, os índios encontrados vivem fora de aldeias - Distrito Federal (6 mil), Piauí (2,9 mil) e Rio Grande do Norte (2,5 mil). Nesses locais, não há território indígena reconhecido.

Não-Índios nas aldeias
O estudo do IBGE mostra também que mais de 30 mil pessoas declaradas não-índias habitam as 505 terras indígenas que foram reconhecidas pelo governo até dezembro de 2010. A maioria desses não-índios está na região Nordeste - somente em Pernambuco, 18,6 mil pessoas moram nas terras da etnia Fulni-Ô, que tem um total de 23,8 mil indivíduos. A concentração de não-índios nessa terra é em parte explicada pela proximidade com a cidade de Águas Belas, que tem uma história específica que remonta ao século 18, quando o aldeamento foi criado para proteger os índios de serem dizimados (a terra indígena tornou-se um bairro do município).
Em Mato Grosso, das 46,5 mil pessoas vivendo em terras indígenas, 2,1 mil também não se declararam indígenas e podem ser tanto agricultores como pessoas que trabalham nas aldeias, segundo o IBGE. No estado, o número mais alto foi verificado na Terra Indígena (TI) Maraiwatsede, onde 1,8 mil índios convivem com 407 não índios. Na TI São Domingos do Jacapari e Estação chamou a atenção o fato de a maioria de seus habitantes não se declarar indígena - mais de 2,12 mil pessoas se disseram não-índias, contra 623 indivíduos dos povos originais.
Analfabetismo
Mesmo com redução, o analfabetismo entre indígenas, tanto em relação ao português, quanto de sua língua de origem, foi considerado alto de acordo com os números do Cento 2010, principalmente na área rural. Os dados na área urbana mostram que entre índios com mais de 15 anos, o índice passou de 26,1% para 23,3% entre 2000 e 2010, acompanhando a redução da taxa de analfabetismo da população brasileira como um todo, que caiu de 12,9 para 9,6%. Já na área rural, o índice de analfabetos chega a 32,4%, o que representa 3 a cada 10 indígenas.
A pesquisa do IBGE também explica que fora das terras indígenas as oportunidades de educação são maiores por causa da alta oferta de escolas. Por outro lado, nas aldeias, "a oferta é sensivelmente reduzida em função de fatores, como o geográfico e a dificuldade de acesso", registra o relatório do instituto.
Na avaliação do estudioso da população indígena e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), João Pacheco Oliveira, os dados revelam a necessidade de mais políticas públicas de educação focadas na diversidade dos povos. Segundo ele, sem escolas indígenas nas aldeias, crianças enfrentam processo “traumático de aprendizado". "É uma situação completamente traumática aprender a escrever em uma outra língua sem dominá-la. Por isso, o processo é mais lento, mesmo nas escolas indígenas. Os que estão fora vão para as escolas dos 'brancos' e se incorporam do jeito que é possível", destacou acrescentando que o analfabetismo é uma categoria etnocêntrica em relação aos índios.
Outra diferença entre os índios da cidade e do campo é o número daqueles com certidão de nascimento, 90,6% e 38,4%, respectivamente. Ao todo, a proporção de índios com registro civil é 67,8%, abaixo da média da população não índia que têm o documento, 98,4%.
Línguas
O IBGE mostra também que 37,4% dos brasileiros indígenas acima de 5 anos de idade falam 274 línguas próprias - 6 mil deles falam mais que uma única língua. A fluência maior foi verificada naqueles que vivem em terras indígenas reconhecidas - fora delas, o índice de falantes cai para 12,7%. O português é ignorado por 130 mil indígenas (17,5%).
O Censo aponta que as regiões com maior percentual de línguas indígenas são a Norte e a Centro-Oeste. A Região Nordeste, com menor número de terras reconhecidas, apresentou menor proporção de falantes de língua indígenas, o que pode ser resultado da colonização. "O Nordeste foi a primeira área de desembarque dos colonizadores no país que proibiram os índios de falar suas línguas e impuseram a escravidão. Foi essa região que recebeu a frota de Cabral, que teve a primeira capital, os primeiros engenhos", lembrou o  professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), João Pacheco de Oliveira.
Para a presidente da Funai, Maria Azevedo, já existe um esforço de valorização da língua indígena por meio da educação. Os dados inéditos do Censo 2010, que há 60 anos não investigava línguas indígenas, favorecerão estratégias para manter essa valorização em prática. "Os dados dão instrumentos para que os próprios indígenas possam reivindicar políticas com relação às suas línguas", disse.
Para a pesquisa, o IBGE contou com uma lista de mais de 500 nomes de etnias, catalogados por especialistas e pela Fundação Nacional do Índio (Funai). Ao fazer as entrevistas, o instituto encontrou representantes de povos que se supunham desaparecidos, como os Tamoios, tradicionais do Sudeste, e confirmou a prevalência de outros, como os Charruás, no Sul, possivelmente oriundos da Argentina.
Os dados mostram que nas áreas reconhecidas, os índios têm mais condições de manter ou recuperar sua cultura original e de maior organização social tradicional.

Foto:mocidadeadce.blogspot.com

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