A lei de saúde do presidente Barack Obama (foto dir.) está impondo novas pressões sobre alguns dos hospitais em mais dificuldades, cortando ajuda que usam para pagar por atendimento de emergência para imigrantes ilegais, o que há muito é exigido que façam.
O governo federal está gastando 20 bilhões de dólares por ano para reembolsar esses hospitais, a maioria em áreas pobres urbanas e rurais, pelo tratamento de mais do que sua cota de não segurados, incluindo os imigrantes ilegais. A lei de saúde em breve cortará esse dinheiro pela metade, com base na premissa de que menos pessoas deixarão de ser não seguradas após a lei entrar em vigor.
Mas cerca de 11 milhões de pessoas atualmente vivendo ilegalmente nos Estados Unidos não são cobertas pela lei de saúde. Seus autores, buscando evitar o debate contencioso em torno da imigração, as excluíram dos benefícios da lei.
Como resultado, os hospitais da rede de segurança disseram que os cortes desferirão um golpe severo em suas finanças.
Os hospitais estão sob pressão porque muitos dos pacientes não segurados são imigrantes ilegais, e porque seus grandes pools de não segurados ou pacientes insuficientemente segurados não deverão ser reduzidos significativamente com a Lei de Atendimento a Custo Acessível, ao mesmo tempo que a ajuda federal diminui.
Os hospitais variam de públicos, como o Bellevue Hospital Center em Manhattan, até hospitais de bairro importantes, como o Lutheran Medical Center, no Brooklyn, e o Scripps Mercy Hospital, em San Diego. Eles incluem pequenos postos rurais como o Othello Community Hospital, no Estado de Washington, que recebe um fluxo constante de trabalhadores rurais que vivem no país ilegalmente.
Independente de onde estejam localizados, todos os hospitais são obrigados segundo a lei federal a tratar qualquer um que chegue ao pronto-socorro, independente de seu status de imigração.
“Esse é o gorila de 350 quilos na sala, e não apenas em Nova York - no Texas, na Califórnia, na Flórida”, disse Wendy Z. Goldstein, a presidente-executiva do Lutheran.
O Lutheran Medical Center fica no bairro Sunset Park, onde comunidades chinesas e latinas de baixa renda convergem perto da via expressa. Os hospitais não são autorizados a registrar o status de imigração dos pacientes, mas Goldstein estima que 20% dos seus pacientes são o que ela chamou de “os sem documentos - não apenas sem seguro, mas que não podem ser segurados”.
Ela disse que assessores do Congresso reconheceram que a lei de saúde reduziria o dinheiro que ajuda a pagar pelo atendimento de emergência a esses pacientes, mas relutavam em tratar do assunto.
“Eu fui informada em Washington que eles entendem que isso é um problema, mas a imigração é um assunto delicado demais para ser tocado”, ela disse.
A Lei de Atendimento a Custo Acessível cria câmaras de compensação estaduais para reduzir o custo dos planos de saúde comerciais, mas as pessoas precisam comprovar cidadania ou status de imigrante legal para participar. Elas também precisam apresentar documentação semelhante para ter direito aos benefícios do Medicaid (o seguro-saúde público para pessoas de baixa renda), que deverão ser expandidos segundo a lei.
A lei pede pelo aumento da pouco conhecida rede nacional de 1.200 centros de saúde comunitários, que fornecem atendimento primário para os necessitados, independente de seu status de imigração. Mas esse plano, que poderia potencialmente atrair mais dos não segurados, os tirando do atendimento mais caro em hospital, foi reduzido pelos cortes promovidos pelo Congresso no orçamento no ano passado.
Isso deixa hospitais como o Lutheran, que é sem fins lucrativos e dirige uma série de centros de atendimento primário há 40 anos, diante de cortes em ambos os lados.
Em um recente dia útil no pronto-socorro do Lutheran, uma mãe chinesa de dois olhava tristemente pela vigia da unidade de isolamento. A mulher tinha tuberculose e precisava de cirurgia para drenar fluido de um pulmão, disse Josh Liu, um contato com pacientes.
A doença foi descoberta durante um check-up em um centro de atendimento primário do Lutheran, onde as taxas escalonadas começam em 15 dólares. Mas a mulher, uma imigrante ilegal, não tinha como pagar pela cirurgia.
Outro paciente, um homem esquálido de 44 anos do Equador, está em Nova York há oito anos, instalando pisos de madeira, um deles no Rockefeller Center. O homem estava com medo de procurar ajuda por temer ser deportado. Finalmente, a dor em seu estômago se tornou forte demais para suportar.
O médico Daniel J. Giaccio, liderando os residentes em suas rondas, usou os furos no cinto gasto do homem para ressaltar seu diagnóstico, anemia por deficiência severa de vitamina B12. O marceneiro perdeu 13 quilos em um mês, e suas mãos e pés formigavam. Reverter o dano pode levar meses.
“Este é um caso severo de perda sensorial”, disse Giaccio. “Geralmente nós descobrimos mais cedo.”
Em alguns Estados, incluindo Nova York, os hospitais que atendem imigrantes ilegais em casos de risco de vida podem pedir pagamento caso a caso, de um programa conhecido como Medicaid de emergência. Mas o programa tem muitas restrições e não compensará os cortes no pool de US$ 20 bilhões, disseram executivos de hospital.
Os grupos que defendem políticas de imigração mais restritivas disseram que concordam que os cortes no fundo de US$ 20 bilhões representam um fardo. Eles disseram que os hospitais obviamente têm o dever de fornecer atendimento de emergência para todos, inclusive para os imigrantes ilegais.
“Eu meio que gosto de viver em uma sociedade que não deixa as pessoas morrerem nos degraus do pronto-socorro”, disse Mark Krikorian, diretor executivo de um desses grupos, o Centro para Estudos de Imigração, em Washington.
Mas ele disse que a resposta está no cumprimento das leis, de modo que os imigrantes ilegais deixem o país, não ampliando a cobertura de saúde.
“Não há solução ideal para o problema, a não ser reduzir a população ilegal”, ele disse. “Incorporar os imigrantes ilegais nas câmaras de compensação de saúde ou no atendimento de saúde pago diretamente pelos contribuintes dá legitimidade à presença deles.”
O governo Obama disse que a Lei de Atendimento a Custo Acessível apoia os hospitais da rede de segurança de outras formas, apontando para medidas que aumentam os pagamentos pelo atendimento primário e dão bônus por melhorias na qualidade.
“Nós estamos dando passos importantes para tornar a saúde mais barata e acessível para milhões de americanos”, disse Erin Shields Britt, uma porta-voz do Departamento de Saúde e Serviços Humanos, em uma mensagem por e-mail. “A reforma da saúde não é lugar para consertar nosso sistema quebrado de imigração.”
Com a imigração ilegal sendo um dos temas da campanha presidencial, muitos políticos continuam evitando discutir os cortes.
Os hospitais no Estado de Nova York agora recebem US$ 2,84 bilhões dos US$ 20 bilhões do país para despesas hospitalares não seguradas.
Esse fundo começará a encolher em 2014 de acordo com a lei, e cairá para US$ 10 bilhões em 2019.
“É um momento difícil para discutir essa questão, porque há antipatia demais contra novos imigrantes”, disse Alan Aviles, presidente da Health and Hospitals Corp.
A empresa dirige os hospitais públicos da cidade de Nova York, que trataram 480 mil pacientes não segurados no ano passado, com uma estimativa de que 40% deles eram imigrantes ilegais. As mesmas preocupações assombram o minúsculo Othello Community Hospital, no rural Condado Adams no Estado de Washington, onde é o único hospital em um raio de quilômetros.
No ano passado, o Estado começou a exigir que os participantes em um plano de saúde básico que ele oferece comprovassem que são cidadãos ou moradores legais.
Como consequência, 4 mil dos 4.400 pacientes no centro de atendimento primário próximo, a maioria trabalhadores rurais imigrantes, perderam sua cobertura, deixando Othello mais financeiramente vulnerável quando essas pessoas precisam de atendimento de emergência.
Na região central da Califórnia, Harry Foster, diretor da Family HealthCare Network, outro centro de atendimento primário, chamou a Lei de Atendimento a Custo Acessível de uma “espada de dois gumes”.
Muitos cidadãos de baixa renda agora não contam com plano de saúde pago pelo empregador, e o setor de saúde já está disputando aqueles que terão cobertura segundo a lei. Mas ninguém está competindo para tratar aqueles que ela deixa de fora, ele disse.
“Nós receberemos cada vez mais desses pacientes”, ele disse, estimando que 40% dos moradores da área são trabalhadores rurais imigrantes ilegais. “Mas financeiramente, nós não podemos atender todos os pacientes não segurados da área, excluindo todos os demais, e sobreviver.”
De muitas formas o Lutheran, um hospital centenário que reformou uma fábrica fechada para servir como seu centro nos anos 60, tem sido um protótipo do novo modelo da lei: coordenando o atendimento primário e preventivo para melhorar os resultados de saúde, ao mesmo tempo contendo os custos. Mas ele deverá perder US$ 25 milhões com os cortes.
“Essa é uma consequência indesejada da lei”, disse Goldstein, a presidente-executiva do hospital. “Mas até agora ninguém está fazendo nada para resolver isso.”
Reportagem de Nina Bernstein
Tradutor: George El Khouri Andolfato
foto:domtotal.com

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