Em país afetado por graves secas, árdua tarefa recai sobre crianças, que chegam atrasadas ou faltam à escola.
Em muitos lugares do mundo crianças deixam de ir à escola por causa de guerras ou doenças. Mas no Níger, um país ensolarado onde a seca ocorre com frequência alarmante, a sede e consequente procura por água se tornou o principal obstáculo da educação.
As aulas na escola já tinham começado numa manhã recente quando uma procissão de crianças pequenas, todas em idade escolar, atravessou um campo seco e se aproximou de outro grupo de jovens posicionados em torno de profundos buracos no solo.
À medida que a chuva se torna escassa, a busca por água se torna cada vez mais difícil. A tarefa de conseguir água geralmente cai nas mãos das crianças do Níger, algumas de até 10 ou 11 anos. Elas montam em mulas e percorrem até 5 km depois da região de Zinder, com recipientes gigantes de plástico, alguns tão altos quanto as próprias crianças, amarrados aos lados dos animais. Quanto mais elas trabalham, mais vazias se tornam as salas de aula do Níger.
"É meu pai quem me manda fazer isso", disse Abdu Sani, 11 anos. Ele deixaria os poços lamacentos de Tapki Baban apenas às 10h, seguindo para sua escola na região rural com duas horas de atraso. Ele disse invejar as crianças que não arcam com o "dever da água", como é chamada a prática no país - a caminhada e retirada de água de poços profundos em baldes ou potes. Trata-se de um trabalho traiçoeiro, com muitas crianças perdendo o equilíbrio e caindo dentro dos poços. "Os outros alunos estão mais avançados do que eu, mas preciso pegar a água", disse Sani.
O Níger é o penúltimo país no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da Organização das Nações Unidas (ONU), e está sujeito a secas e fome. Na última década, houve três faltas de alimentos graves relacionadas com a baixa precipitação e ataques de insetos, e este ano talvez um terço da população esteja enfrentando a fome.
Nos distritos rurais em torno de Zinder, a segunda maior cidade do Níger, um terço dos estudantes abandonaram as salas de aula, que não passam de simples cabanas. "É a água que os mantêm fora da escola", disse Salissou Sahirou, um oficial da educação em Tapki Baban.
"Todas as escolas aqui estão paralisadas", disse Sylvain Musafiri, uma autoridade da ONU em Zinder.
Nas salas de aula improvisadas que se sobressaem na parca vegetação do deserto em Garin Gona, quase todas as crianças levantaram as mãos quando o professor perguntou quantas chegaram atrasadas por causa do dever de buscar água.
Oumaraou Lawali, 11 anos, explicou que havia acordado às 4h30 para andar três quilômetros em busca de água. Mais tarde, depois da aula, ele iria repetir a viagem. "À noite, estou cansado", disse ele. "Esgotado".
Muitas vezes, disse o professor, Maman Boukari, as crianças dormem na classe. Todo mundo se preocupa com a falta de água, mas são as crianças, principalmente as meninas, que cuidam da tarefa de procurar por ela.
"São meus filhos que pegam a água", disse Titi Malla Adamou, chefe da vila de Tsoungounia. "Isso é um problema para todos, do menor ao maior."
Nos poços de Tapki Baban, três irmãs confessaram que nenhuma delas havia frequentado a escola sequer um dia. "Estamos matriculadas, mas não vamos", disse Bugagi Maria, 12. "Temos que buscar água."
"Precisamos mobilizar nossos filhos", disse Yunfa Adaga, lamentando a situação. "Nossas crianças estão atrasadas na escola. Elas não estão aprendendo".
Adaga costumava gerenciar um poço público em Zinder, mas ele secou. "Vivemos e dormimos com este problema da água", disse. "Isso nos atormenta."
Reportagem de Adam Nossiter
foto:NYT
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