03/11/2011

Condenado a pagar R$ 940 mil a família, arcebispo critica juízes no RS

O arcebispo de Porto Alegre, Dom Dadeus Grings, lançou uma carta contra o Judiciário na última segunda-feira (31) depois de ter sido condenado a indenizar uma família de São João da Boa Vista, em São Paulo, por danos morais. O valor da indenização é de R$ 940 mil.
Segundo informações da arquidiocese, o processo é da década de 1990, quando Dom Dadeus posicionou-se a favor de uma obra da prefeitura de Mogi Guaçu (SP), que pretendia desapropriar o imóvel da família. Ele afirmou que os advogados da família não “deixavam a impressão de lisura”.
A família foi à justiça pedindo indenização pela ofensa, que foi concedida. Segundo a arquidiocese, a ação foi encerrada e não cabe mais recurso. O valor deve ser pago pelo arcebispo e pela Diocese de São João da Boa Vista, onde ele foi bispo de 1991 a 2000.
De acordo com o processo, a condenação inicial em 2007 era de R$ 15 mil para cada parte condenada, um total de R$ 30 mil, acrescido de juros, e mais 10% do valor como honorários. Em segunda instância, o Tribunal de Justiça de São Paulo aumentou a indenização para R$ 150 mil cada. O cálculo atualizado da quantia, até agosto de 2011, era de R$ 936.348,87.
Dom Dadeus classificou a decisão como “agressão”, “arbitrária” e “impraticável”. O arcebispo convocou uma entrevista coletiva em que afirmou não ter recursos para pagar a soma. “Porque amei a justiça e odiei a corrupção, fui condenado pelo Judiciário brasileiro”, afirmou.

Veja a carta a seguir:

JUDICIÁRIO INVADE JURISDIÇÃO DA IGREJA

Dom Dadeus Grings, Arcebispo de Porto Alegre

Chegou ao fim mais um capítulo da agressão do Judiciário contra a Igreja Católica. Após 16 anos de tramitação, o Tribunal de Justiça de São Paulo condenou-me, juntamente com a Diocese de S. João da Boa Vista, onde fui Bispo de 1991 a 2000, a pagar uma indenização, por danos morais, no montante de R$ 940.000,00, reforçando o que se chama de “indústria das indenizações”, com bases totalmente arbitrárias e impraticáveis. Volta à mente a questão dos precatórios! Que cidadãos recorram ao Judiciário para dirimir suas questões é de direito, mas que o Judiciário não distinga o certo e do errado, a verdade da falsidade, não tenha critérios objetivos para julgar e, principalmente, não reconheça os limites de sua jurisdição nem siga os acordos internacionais, põe toda a sociedade em risco. O problema da corrupção no Brasil tem sua base exatamente ali, no Judiciário. Todos sabem disso, nas poucos têm coragem de denunciá-lo! Nossa Presidente começou a faxina no Executivo. Quando será a vez do Judiciário, onde o problema é muito mais grave?
Eis o fato: Na década de 90, no Município de Mogi Guaçu, SP, concluiu-se um clamoroso processo judiciário que, por razões que chamei de falta de lisura, demorou mais de 10 anos. Sob ameaça de intervenção, foi decretada uma indenização milionária, dez vezes acima do real.
Diante da calamidade pública, alguns cidadãos recorreram a mim, como Bispo da região. – Lembre-se o provérbio que, diante de problemas insolúveis, se manda queixar-se ao Bispo - Trouxeram-me o volumoso processo, que li estarrecido. Escrevi, em conseqüência, diversos artigos, fazendo ponderações em defesa do Município. Não agi em causa própria. Em reconhecimento o Município outorgou-me, solenemente, o título de Cidadão. A sociedade aplaudiu minha intervenção. A família envolvida, porém, me entregou pessoalmente, na Igreja da Imaculada, uma carta, declarando-se atingida, mesmo que não a tivesse nomeado. Respondi, em carta particular, reconhecendo ser justo reivindicar o que de direito, mas não dez vezes mais. Tinha em mãos o relatório das dificuldades das negociações. Adverti que seus advogados, com suas invectivas, “não me deixavam a impressão de lisura”. Por esta expressão, nesta carta não publicada, sou condenado a pagar R$ 940.000,00, a título de danos morais. É justo?
Era obrigação minha, de pastor, orientar a referida família e chamar a atenção aos desvios. Ela, pelos vistos, passou a carta aos seus advogados que, a partir de então, começaram a me atacar, tanto por jornais como pelo rádio e televisão, culminando num duplo processo. Chegaram a afirmar que eu poderia ser condenado de dois a três anos de prisão, provocando celeuma entre a população, que, em conseqüência, promoveu um ato público de desagravo em meu favor. Tive, por isso, que esclarecer a opinião pública.
O judiciário, em nenhum momento, examinou a lisura dos advogados, para ver se a impressão que eu tivera era correta.. O judiciário nunca procurou investigar acerca dos ataques que os advogados dirigiram contra mim e as calúnias que proferiram. Se sofreram “danos morais”, foi pelas agressões e pelo processo que eles promoveram contra ao Bispo e a Diocese. Desde o início, o Judiciário se mostrou parcial, em defesa de “sua gente”.
O montante da indenização ultrapassa qualquer bom senso. Vê-se que os juízes estão desligados da realidade. Os ministros da Igreja católica não recebem salários polpudos, como eles, nem amealham fortunas.
O que, porém, leva a dizer um redondo e sonoro não à sentença condenatória e dar um basta aos desmandos do Judiciário é sua invasão no campo da jurisdição da Igreja. O Judiciário não reconhece seus limites. Em primeiro lugar, os juízes bem sabiam que os querelantes buscavam lucro fácil. Alexandre Jobim classifica a indústria da indenização como “artimanha de algumas pessoas para ganhar dinheiro” E por incrível que pareça, obtêm, com facilidade, o aval do Judiciário. Arrolaram a Diocese para garantir o dinheiro, com o objetivo de arrancá-lo do povo católico. Com isto reconheceram, publicamente, que estavam invadindo a missão específica da Igreja e não de um cidadão particular. O Judiciário se joga, pois, diretamente contra a Igreja. Contraria frontalmente sua missão profética de se pronunciar sobre questões de ordem social e moral. Na verdade o Judiciário quer silenciar a Voz da Igreja frente ao bem comum, como tenta com a imprensa, para acobertar a corrupção no país.
Em segundo lugar, os juízes acintosamente não respeitaram o Acordo entre a Santa Sé e o Brasil, assinado solenemente em Roma, no dia 13 de novembro de 2008, já ratificado pelo Congresso nacional. Trata-se de um acordo internacional, de respeito mútuo das competências. Não pode ser desrespeitado impunemente.
Não posso, por coerência e dever de consciência, acatar esta sentença inválida e desrespeitosa porque contrária aos requisitos do direito nacional e internacional, como intromissão – e não é a primeira – nos assuntos internos e na competência da Igreja. Estou disposto a dar a vida por esta causa. Se me quiserem prender – conforme o Advogado querelante há 14 anos preconizava, - estou às ordens. Só assim o mundo saberá quanto nosso Judiciário é corrupto e arbitrário.
Diante da gravidade do assunto escreverei nova cartilha para apontar as mazelas do Judiciário e assim colaborar na sua urgente reforma. Ou o Brasil muda o Judiciário ou o Judiciário acaba corrompendo o Brasil. Parafraseando S. Gregório VII, posso dizer: “porque amei a justiça e odiei a corrupção, fui condenado pelo Judiciário brasileiro”. Deus nos proteja e guarde!
Apelo para o Supremo Tribunal de Jesus Cristo, o Justo Juiz!


fonte:http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=visualiza_noticia&id_caderno=23&id_noticia=74026

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