31/03/2015

Quais doenças genéticas podemos transmitir a nossos filhos?

Cada pessoa é portadora de entre três e cinco mutações genéticas recessivas. Algumas são especialmente frequentes, como a fibrose cística (presente em uma de cada 25 pessoas) ou a atrofia muscular espinhal (uma de cada 50). Ser portador não implica sofrer da doença, nem apresentar sintomas, nem que elas tenham se manifestado antes em algum parente. Mas se acontecer a casualidade de que os dois membros do casal tenham o mesmo gene alterado, existe um risco de 25% de que os filhos padeçam da patologia. Como saber isso?
Um dos últimos serviços que oferecem os centros de reprodução assistida são os chamados teste de compatibilidade genética. Graças a esta possibilidade, qualquer casal que quiser ter descendência poderá conhecer quais mutações possui cada um deles e se existe risco de transmitir determinadas doenças (dependendo do teste, entre 200 e 600 doenças são pesquisadas). Com esta informação terão claro se podem tentar uma gravidez natural sem assumir riscos (pelo menos, os conhecidos) ou se compensa recorrer a procedimentos para esquivar as mutações, seja através de um programa de doação de gametas (embriões ou óvulos) ou submeter-se a um processo de reprodução assistida que permita estudar os embriões no laboratório e implantar aquele que não tiver herdado a doença (diagnóstico genético pré-implantacional).
Os centros de reprodução foram substituindo o lema clássico de “um embrião, uma criança” como objetivo – para evitar múltiplas gravidezes – pelo de “uma criança saudável em casa”. E procuram clientes não apenas entre pessoas com problemas de fertilidade, mas entre todos os casais preocupados com tentar aproveitar ao máximo as possibilidades que oferece a ciência e a tecnologia – especialmente os métodos de sequenciamento genético, cada vez mais baratos – para limitar a probabilidade de ter alguma destas doenças ligadas à mutação em um gene, cuja prevalência ronda o 1% dos nascimentos, segundo dados da Organização Mundial da Saúde.
Entre as patologias que podem ser evitadas está, além da fibrose cística e da atrofia muscular espinhal, a distrofia muscular de Duchenne, a síndrome de X frágil, a hemofilia, o hipotiroidismo congênito, a polipose renal recessiva, a surdez hereditária e um grupo de anemias hereditárias conhecidas como talassemias.
Diferentes colégios profissionais norte-americanos de genética (Colégio de Genética Médica dos EUA) ou de ginecologia (Colégio de Obstetras e Ginecologistas dos EUA) já aconselham este teste, independente da necessidade de ajuda para conceber.
Um dos principais laboratórios que oferece este teste é o Igenomix, que colabora com o Grupo IVI, entre outras clínicas de reprodução assistida. A empresa tem sede em Valência e também conta com laboratórios em Miami, Los Angeles, São Paulo, Milão, Nova Delhi e Dubai. Carlos Simón, responsável da empresa, explica que o teste teve uma acolhida especialmente importante nos Estados Unidos, mas também destaca o caso de Dubai, a partir de onde a empresa presta serviços para o Oriente Médio. “Ali, por causa da elevada consanguinidade pela frequência de casamentos entre familiares vimos que o número de mutações é muito elevado”, relata. Na verdade, Simón conta que tiveram que mudar o nome do teste, já que nestes países colocar o conceito de incompatibilidade pode ter sérias consequências: se um homem não pode ter filhos com sua mulher – como seria o caso, segundo uma interpretação extrema –, tem o direito de repudiá-la. O Compatibility Genetic Test foi rebatizado como Carrier Genetic Test (CGT).
Os pesquisadores do centro elaboraram um estudo com 137 casais e observaram que, com dados basicamente de pacientes espanhóis, até 7% dos casais que fizeram o teste tinham risco (25% por bebê) de ter um filho com doenças recessivas ou ligadas ao cromossomo X.
Cada laboratório desenvolveu seu próprio teste. O Igenomix tem o CGT, que oferece uma varredura para cerca de 600 doenças. O hospital Dexeus oferece o programa Q-Carrier para 215 doenças. Sistemas Genómicos, que trabalha com umas 90 clínicas de toda a Espanha, faz uma varredura de 350 doenças, “mas o importante é o nível de detecção de mutações, nós observamos mais de 33.000”, comenta Xavier Vendrell, responsável pela unidade de genética reprodutiva da empresa. O preço dos testes mais completos, afirma, está entre 700 e 800 euros.
Esses testes começaram a ser feitos nos programas de doação, tanto de esperma quanto de óvulos. “A lei obriga a analisar todos os doadores”, explica Julio Martín, do Igenomix. Desta forma, ao conhecer as características genéticas dos gametas é possível cruzar adequadamente com as do receptor para evitar a coincidência de mutações recessivas e o risco de transmitir doenças. É um procedimento já incorporado à rotina clínica.
Mas, além dos tratamentos de reprodução assistida, é cada vez mais frequente que casais que decidiram conceber de forma natural procurem os centros para solicitar este teste. “São pessoas que querem conhecer ao máximo os riscos que estão correndo”, afirma Barri, do Dexeus. “Nos Estados Unidos é mais comum, aqui vai ser cada vez mais frequente. De uns 600 pacientes que atendemos, 100 eram casais sem patologia”, explica. “Tivemos inclusive casos de solteiros que queriam saber se eram portadores de alguma mutação caso, no futuro , quisessem ter filhos”, acrescenta Xavier Vendrell.

Reportagem de Jaime Prats
fonte:http://brasil.elpais.com/brasil/2015/03/23/ciencia/1427110143_848726.html
foto:http://revistavivasaude.uol.com.br/clinica-geral/tratamentos-para-doencas-geneticas/497/

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