31/03/2015

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Mulheres acusadas de fazer aborto exigem liberdade em El Salvador

País proíbe o procedimento em qualquer situação e criminaliza mulheres que tiveram abortos espontâneos, com penas que podem chegar a 40 anos de prisão.



Em uma penitenciária superlotada em El Salvador, Maria Teresa Rivera lembra com tristeza quando trabalhou nas caldeiras de uma fábrica têxtil para sustentar seu filho e sua sogra. As inúmeras horas expostas no calor da prancha térmica lhe renderam uma infecção nos rins que meses mais tarde a levaram a perder seu segundo filho e ser presa, acusada de ter provocado o aborto.
Apesar de seu caso estar cercado de irregularidades e não ter sido comprovado delito durante as investigações, Maria foi condenada a 40 anos de prisão, a maior sentença contra uma mulher por ter feito um aborto espontâneo que o juiz tipificou como homicídio qualificado.
Por conta da infecção nos rins, Maria Teresa fazia um tratamento médico, sem saber que estava grávida de três meses. Seu estado de saúde acabou se complicando, até que, na tarde de 24 de novembro de 2001, Maria Teresa teve um aborto espontâneo no banheiro de sua casa.
Horas mais tarde, agentes da polícia chegaram à sua casa para levá-la ao hospital. Os médicos declararam, sem muitos detalhes, que Maria Teresa havia feito um aborto, e por isso a algemaram no leito do hospital.
Maria disse que conhecia pouco as leis, porém tinha visto nos filmes que quando a polícia prende uma pessoa, ela tem o direito de ficar em silêncio e solicitar a presença de um defensor público.
“Os policiais me disseram com desdém que eu não tinha direito a um advogado por ter matado meu filho”, disse Maria Teresa, na cadeia feminina localizada na cidade de Ilopango, a Opera Mundi.
Maria Teresa foi denunciada pelos médicos que lhe atenderam após o aborto espontâneo. Estima-se que 57% das 129 denúncias de supostos abortos realizadas à polícia civil em El Salvador tenham sido feitas por profissionais de saúde.
Aos 32 anos, Maria passa seus dias bordando e defendendo-se das provocações de outras presas enquanto pensa em seu filho David, de nove anos, que não consegue vê-la nos dias de visita porque sua sogra não tem dinheiro para a viagem.
“Ele já entende que estou presa e pergunta quando eu vou voltar para casa. Apenas quero que me deem uma oportunidade para estar com meu filho, ele precisa de mim”, disse.
Após três anos de prisão, Maria Teresa tem esperanças de que seu caso seja revisto pela Justiça para que ela possa ter de volta sua liberdade.
Em busca de justiça
Em condições semelhantes estão outras 14 mulheres, que foram processadas e presas pelo suposto delito de praticar um aborto. Em janeiro, Guadalupe Vásquez e Mirna Ramírez, processadas por delitos semelhantes, conseguiram sua liberdade após revisão de seus casos. A Corte Suprema da Justiça reconheceu erros judiciais e o Congresso lhes concedeu o indulto.
El Salvador, Honduras, Nicarágua e República Dominicana são os países na América Latina que mantêm uma norma estrita, que criminaliza as mulheres que sofrem qualquer tipo de aborto.
O país da América Central aplica severas sentenças a mulheres que tiveram abortos espontâneos, complicações obstetrícias e partos extra-hospitalares. Estima-se que desde o ano 2000, aproximadamente 129 mulheres foram acusadas e presas por suspeita de prática de aborto.
El Salvador mantém desde 1998 a proibição total a qualquer tipo de aborto, incluindo casos onde mulheres e meninas correm risco de perder a vida ou tenham sofrido algum tipo de violência sexual. A pena máxima para esse crime é de 40 anos de prisão.
O advogado Dennis Muñoz, do Grupo Cidadão pela Descriminalização do Aborto Terapêutico, Ético e Eugênico, argumenta que funcionários do sistema de saúde pública converteram-se nos principais acusadores contra as mulheres que recorreram a eles em emergências, e, no entanto, foram processadas por prática de aborto.
“A grande maioria dessas mulheres não foi capaz de se defender, e o mais grave é que o sistema judicial lhes negou, em muitos casos, o auxílio de um defensor público”, mencionou o advogado.
De acordo com as organizações internacionais de direitos humanos, entre elas as Nações Unidas e a Anistia Internacional, El Salvador tem uma das leis mais atrasadas em relação aos direitos reprodutivos das mulheres.
O relatório “Al borde de la muerte” [“À margem da morte”, em tradução livre], apresentado em 2014 pela Anistia Internacional, alega que as provas que incriminam mulheres por ter praticado aborto são deficientes e pouco conclusivas. E os processos aos quais são submetidas não contam com as garantias necessárias para aplicar a justiça correspondente.

No país existem grupos conservadores de direita que se opõem a debater uma nova legislação e recusam qualquer forma de discussão sobre a prática de aborto, inclusive quando as mulheres estão em risco de morte.
Além disso, em um país onde mais de 70% das pessoas se declaram cristãs, a educação sexual é vista como um tabu.
Condenada após estupro
Mayra Figueroa também foi condenada a 30 anos de prisão por complicações obstétricas durante o parto em uma casa onde trabalhava como empregada doméstica.
Ela conta que ficou grávida em decorrência de um estupro e que nunca fez pré-natal. Sua ex-patroa a obrigou a permanecer dentro de casa para evitar que Mayra fizesse alguma denúncia, já que o estuprador era sobrinho de sua patroa.
Ela foi atendida por uma parteira contratada pela ex-patroa e, durante o parto, teve complicações obstétricas e deu à luz um natimorto.
Mayra, que na época tinha 18 anos de idade, lembra que acordou algemada na cama de um hospital e foi acusada pela médica que a recebeu no centro de saúde de ter matado seu filho.
Maria Teresa e Mayra consideram que o Estado salvadorenho as julgou injustamente ao lhes negar o acesso pleno à Justiça. Pretendem continuar exigindo indulgência para elas e para todas as mulheres que se encontram em condições semelhantes.
“Eu apenas peço que a justiça investigue bem os casos e nos devolvam nossa liberdade”, disse Mayra.

Reportagem de Paula Rosales | Ilopango
Tradução de Mari-Jô Zilveti 
fonte:http://operamundi.uol.com.br/conteudo/reportagens/39943/mulheres+acusadas+de+fazer+aborto+exigem+liberdade+em+el+salvador.shtml
foto:http://bambaramdipadida.blogspot.com.br/2015/01/em-decisao-inedita-el-salvador-concede.html

Defendido pelo PT, financiamento de campanha 100% público só existe em um país

Em meio ao escândalo de corrupção na Petrobras (de onde recursos teriam sido desviados para financiar partidos), o PT defende hoje que as campanhas eleitorais sejam financiadas 100% por dinheiro público.
O sistema só existe em um lugar do mundo, o Butão, país que apenas em 2008 deixou de ser uma monarquia absolutista e realizou suas primeiras eleições. Conforme a BBC Brasil mostrou na semana passada, 39 países proíbem doações de empresas. No entanto, a proibição também de contribuição de pessoas físicas é uma exceção só presente no país asiático.
O financiamento público de partidos e/ou candidatos, em pequena ou larga escala, é adotado em 118 países, de acordo com um monitoramento realizado pelo Instituto Internacional pela Democracia e Assistência Eleitoral (Idea, na sigla em inglês). Em alguns deles, como México, Colômbia, Itália e Espanha, chegam a representar mais de 80% dos gastos das campanhas.
No Brasil, os partidos têm acesso a doações privadas e a recursos públicos - prevendo dificuldades de obter financiamento de empresas após a Operação Lava Jato, senadores e deputados decidiram triplicar a verba do fundo partidário neste ano, para R$ 867,56 milhões, há duas semanas.
Mas quais as vantagens e desvantagens de aumentar o financiamento público no Brasil? A BBC Brasil preparou um guia sobre o assunto. Confira abaixo.

Qual o princípio do financiamento público?

O objetivo do financiamento público é contrabalancear - ou mesmo anular - a influência do poder econômico nas eleições. Os defensores de um modelo majoritariamente ou totalmente público argumentam que doações privadas desvirtuam a democracia, pois as grandes corporações são muito mais ricas que os indivíduos e, assim, têm mais recursos para influenciar nas eleições.
O PT defende que o financiamento seja exclusivamente público, ou seja, que nem mesmo pessoas físicas possam doar. A proibição de doações de empresas também é defendida por centenas de movimentos sociais (como UNE, CUT e MST) que integram a Campanha pela Constituinte - proposta de convocação de um Assembleia exclusiva para votar uma reforma política. Mas não há consenso entre eles sobre doações de pessoas físicas.
"Para nós, o financiamento privado é a base da corrupção. Empresas de diversos setores financiam os políticos e depois cobram seus interesses no Congresso. Isso é totalmente antidemocrático porque o voto da empresa passa a valer mais que o do eleitor", afirma Paola Estrada, integrante da coordenação nacional da campanha.

Quais seriam as desvantagens?

Entre os defensores do financiamento público, há também quem aponte potenciais riscos nesse modelo. Para o Instituto Internacional pela Democracia e Assistência Eleitoral (Idea, na sigla em inglês), uma dependência excessiva de recursos públicos pode levar os políticos e seus partidos a se afastarem da sociedade.
"Quando administrado e distribuído de forma adequada, o financiamento público dos partidos políticos pode ser um bom contrapeso para doações privadas e também pode aumentar o pluralismo político. No entanto, os partidos políticos não devem perder o contato com seus eleitores, ou tornar-se excessivamente dependentes de financiamento público", nota um documento de janeiro do instituto.
O diretor da área de Partidos Políticos do Idea, Sam van der Staak, defende um modelo que equilibre recursos públicos e doações de membros dos partidos, empresas e pessoas físicas - limitadas a um teto baixo, para evitar que um grupo tenha mais peso que outro.

Como distribuir os recursos?

Outro risco do modelo de financiamento essencialmente público é dar pouco espaço para o surgimento e crescimento de novos partidos, na medida em que a distribuição dos recursos tende a ser proporcional ao tamanho das bancadas no Congresso.
Por outro lado, dividir igualmente também não é considerada a melhor maneira de distribuição. "Essa abordagem (divisão igualitária) cria o risco de que partidos sejam criados apenas para obter financiamento do Estado. Além disso, também pode ser um desperdício significativo usar recursos públicos para apoiar partidos e candidatos que não têm nenhum apoio entre o eleitorado", nota o relatório do Idea.
A opção para contornar isso, aponta o instituto, é repartir parte dos recursos públicos igualmente e parte proporcionalmente. Manter a possibilidade de doações de pessoas físicas ou mesmo de empresas, sob um limite baixo, é também uma forma de permitir que o financiamento eleitoral tenha mais dinamismo.
No Brasil, a distribuição de recursos públicos via fundo partidário se dá da seguinte forma: 5% são repartidos igualmente entre os 32 partidos existentes, e 95% são distribuídos na proporção dos votos obtidos na última eleição para a Câmara dos Deputados.

Como isso tem funcionando em outros países?

Entre os 180 países monitorados pelo Idea, apenas um tem financiamento de campanha exclusivamente público: o Butão. Essa pequena nação asiática, espremida entre China e Índia, realizou suas primeiras eleições em 2008, quando o sistema político passou de monarquia absoluta para monarquia constitucional.
Outros países, embora não adotem o modelo 100% público de financiamento, tem níveis altos de participação pública nos fundos de campanha. No México, por exemplo, 95% das campanhas às eleições presidenciais de 2012 foram bancadas com recursos do Estado. Esses índices também foram altos nos últimos anos na Colômbia (89%) e no Uruguai (80%). Em países europeus como Espanha, Bélgica, Itália e Portugal, os fundos públicos também respondem por mais de 80% dos custos das campanhas.
Existem vários modelos de distribuição desses recursos. Há países, como Alemanha, em que o Estado transfere para o partido um euro para cada euro arrecadado de doadores (prática chamada de matching funds). Já na Holanda, os repasses dependem do número de pessoas filiadas ao partido.
Na França, a lei institui um teto para os gastos de campanha, que varia de acordo com o tipo de eleição. A partir desse teto é calculado o reembolso com dinheiro público das despesas eleitorais do candidato. No caso da eleição presidencial, por exemplo, em 2012 foi definido que cada candidato poderia gastar até 16,8 milhões de euros (R$ 58,8 milhões, na cotação atual) no primeiro turno e 22,5 milhões de euros (R$ 78,75 milhões) no segundo. A título de comparação, a campanha da presidente Dilma Rousseff em 2014 consumiu R$ 350 milhões.
Na França, cada candidato que conseguisse 5% dos votos, poderia receber 50% do valor gasto em reembolso. As regras determinam que o candidato que ultrapassar o teto de gastos da campanha, não pode receber o financiamento público de parte de suas despesas. Foi exatamente o que ocorreu com o ex-presidente Nicolas Sarkozy, que teve suas contas da campanha presidencial de 2012 rejeitadas pelo Conselho Constitucional.

Quanto dinheiro público os partidos já recebem no Brasil?

Partidos políticos já recebem hoje dinheiro público no país, mas a maioria dos recursos que bancam as campanhas eleitorais vem de doações de empresas.
Nas últimas eleições, partidos e candidatos arrecadaram cerca de R$ 5 bilhões de doações privadas, quase na sua totalidade feitas por empresas. Além disso, receberam no ano passado R$ 308 milhões de recursos públicos por meio do Fundo Partidário, enquanto o tempo "gratuito" de televisão custou R$ 840 milhões aos cofres da União por meio de isenção fiscal para os canais de TV.
Em 2015, porém, haverá um salto expressivo na verba do Fundo Partidário. O Congresso aprovou neste mês que o orçamento previsto inicialmente pela União fosse triplicado, passando de R$ 289,56 milhões para R$ 867,56 milhões.
O aumento teria sido motivado pela dificuldade que os partidos estão enfrentando para se financiar após a operação Lava Jato - que investiga desvio de recursos na Petrobras - ter colocado no banco dos réus executivos de grandes empresas doadoras.
O relator do Orçamento, senador Romero Jucá (PMDB-RR), disse que o aumento refletiu uma demanda de diversos partidos e que representa um teste para a tese do financiamento público de campanha.

Quanto custaria um modelo com mais financiamento público?

O PT não tem hoje uma estimativa de quanto seria o custo de um financiamento exclusivo de campanha, de acordo com a vice-presidente nacional do PT, Gleide Andrade, responsável por coordenar as discussões sobre reforma política dentro do partido. Segundo ela, isso dependerá de outras alterações que podem ser feitas no sistema eleitoral, como por exemplo modificar a forma de eleger os deputados.
"Mas uma coisa é certa: será um campanha bem mais barata do que a que temos hoje", afirmou.
Outro projeto de lei que já tramita no Parlamento - o PL 268, apresentado em 2011 como conclusão dos trabalhos de uma comissão de reforma política no Senado - sugere que o financiamento de campanha será exclusivamente público e que o valor total a ser distribuído seguirá o seguinte cálculo: total de eleitores inscritos até 31 de dezembro do ano anterior vezes R$ 7,00 a valores de janeiro de 2011.
Atualizando esse valor pela inflação até 2014 (R$ 8,40) e considerando o número de eleitores que puderam votar no ano passado (141,8 milhões), as últimas eleições teriam consumido R$ 1,2 bilhão, segundo a regra do PL 268/2011.

Aumentar o peso do financiamento público exigiria outras mudanças?

Mudar o sistema de financiamento não é algo trivial. Especialistas no assunto dizem que extinguir as doações por empresas e aumentar o peso do dinheiro público obrigaria necessariamente a alterar as regras das eleições para o Legislativo.
Claudio Abramo, ex-diretor da Transparência Brasil, diz que teria que ser adotado a eleição em lista - método em que o voto vai para o Partido, que decide qual será a ordem dos deputados e vereadores eleitos pela legenda. Tal mudança seria necessária por causa da dificuldade de distribuir e fiscalizar os recursos para todos os candidatos. Dessa forma, os partidos que centralizariam a gestão dos recursos públicos.
O filósofo e cientista político Marcos Nobre discorda da tese de que o financiamento exigiria lista fechada. "É perfeitamente possível fiscalizar (a distribuição de recursos) desde que você torne os partidos responsáveis pela atuação de cada um de seus candidatos", argumenta.

Reportagem de Mariana Schreiber
fonte:http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2015/03/150330_financiamento_butao_ms#orb-banner
foto:http://www.diariodocentrodomundo.com.br/como-funciona-o-financiamento-publico-de-campanha/

Quais doenças genéticas podemos transmitir a nossos filhos?

Cada pessoa é portadora de entre três e cinco mutações genéticas recessivas. Algumas são especialmente frequentes, como a fibrose cística (presente em uma de cada 25 pessoas) ou a atrofia muscular espinhal (uma de cada 50). Ser portador não implica sofrer da doença, nem apresentar sintomas, nem que elas tenham se manifestado antes em algum parente. Mas se acontecer a casualidade de que os dois membros do casal tenham o mesmo gene alterado, existe um risco de 25% de que os filhos padeçam da patologia. Como saber isso?
Um dos últimos serviços que oferecem os centros de reprodução assistida são os chamados teste de compatibilidade genética. Graças a esta possibilidade, qualquer casal que quiser ter descendência poderá conhecer quais mutações possui cada um deles e se existe risco de transmitir determinadas doenças (dependendo do teste, entre 200 e 600 doenças são pesquisadas). Com esta informação terão claro se podem tentar uma gravidez natural sem assumir riscos (pelo menos, os conhecidos) ou se compensa recorrer a procedimentos para esquivar as mutações, seja através de um programa de doação de gametas (embriões ou óvulos) ou submeter-se a um processo de reprodução assistida que permita estudar os embriões no laboratório e implantar aquele que não tiver herdado a doença (diagnóstico genético pré-implantacional).
Os centros de reprodução foram substituindo o lema clássico de “um embrião, uma criança” como objetivo – para evitar múltiplas gravidezes – pelo de “uma criança saudável em casa”. E procuram clientes não apenas entre pessoas com problemas de fertilidade, mas entre todos os casais preocupados com tentar aproveitar ao máximo as possibilidades que oferece a ciência e a tecnologia – especialmente os métodos de sequenciamento genético, cada vez mais baratos – para limitar a probabilidade de ter alguma destas doenças ligadas à mutação em um gene, cuja prevalência ronda o 1% dos nascimentos, segundo dados da Organização Mundial da Saúde.
Entre as patologias que podem ser evitadas está, além da fibrose cística e da atrofia muscular espinhal, a distrofia muscular de Duchenne, a síndrome de X frágil, a hemofilia, o hipotiroidismo congênito, a polipose renal recessiva, a surdez hereditária e um grupo de anemias hereditárias conhecidas como talassemias.
Diferentes colégios profissionais norte-americanos de genética (Colégio de Genética Médica dos EUA) ou de ginecologia (Colégio de Obstetras e Ginecologistas dos EUA) já aconselham este teste, independente da necessidade de ajuda para conceber.
Um dos principais laboratórios que oferece este teste é o Igenomix, que colabora com o Grupo IVI, entre outras clínicas de reprodução assistida. A empresa tem sede em Valência e também conta com laboratórios em Miami, Los Angeles, São Paulo, Milão, Nova Delhi e Dubai. Carlos Simón, responsável da empresa, explica que o teste teve uma acolhida especialmente importante nos Estados Unidos, mas também destaca o caso de Dubai, a partir de onde a empresa presta serviços para o Oriente Médio. “Ali, por causa da elevada consanguinidade pela frequência de casamentos entre familiares vimos que o número de mutações é muito elevado”, relata. Na verdade, Simón conta que tiveram que mudar o nome do teste, já que nestes países colocar o conceito de incompatibilidade pode ter sérias consequências: se um homem não pode ter filhos com sua mulher – como seria o caso, segundo uma interpretação extrema –, tem o direito de repudiá-la. O Compatibility Genetic Test foi rebatizado como Carrier Genetic Test (CGT).
Os pesquisadores do centro elaboraram um estudo com 137 casais e observaram que, com dados basicamente de pacientes espanhóis, até 7% dos casais que fizeram o teste tinham risco (25% por bebê) de ter um filho com doenças recessivas ou ligadas ao cromossomo X.
Cada laboratório desenvolveu seu próprio teste. O Igenomix tem o CGT, que oferece uma varredura para cerca de 600 doenças. O hospital Dexeus oferece o programa Q-Carrier para 215 doenças. Sistemas Genómicos, que trabalha com umas 90 clínicas de toda a Espanha, faz uma varredura de 350 doenças, “mas o importante é o nível de detecção de mutações, nós observamos mais de 33.000”, comenta Xavier Vendrell, responsável pela unidade de genética reprodutiva da empresa. O preço dos testes mais completos, afirma, está entre 700 e 800 euros.
Esses testes começaram a ser feitos nos programas de doação, tanto de esperma quanto de óvulos. “A lei obriga a analisar todos os doadores”, explica Julio Martín, do Igenomix. Desta forma, ao conhecer as características genéticas dos gametas é possível cruzar adequadamente com as do receptor para evitar a coincidência de mutações recessivas e o risco de transmitir doenças. É um procedimento já incorporado à rotina clínica.
Mas, além dos tratamentos de reprodução assistida, é cada vez mais frequente que casais que decidiram conceber de forma natural procurem os centros para solicitar este teste. “São pessoas que querem conhecer ao máximo os riscos que estão correndo”, afirma Barri, do Dexeus. “Nos Estados Unidos é mais comum, aqui vai ser cada vez mais frequente. De uns 600 pacientes que atendemos, 100 eram casais sem patologia”, explica. “Tivemos inclusive casos de solteiros que queriam saber se eram portadores de alguma mutação caso, no futuro , quisessem ter filhos”, acrescenta Xavier Vendrell.

Reportagem de Jaime Prats
fonte:http://brasil.elpais.com/brasil/2015/03/23/ciencia/1427110143_848726.html
foto:http://revistavivasaude.uol.com.br/clinica-geral/tratamentos-para-doencas-geneticas/497/

USP recebe primeira exposição de arpilleras

A “arpillera” é uma técnica de bordado originária de Isla Negra, no Chile, e transformada em uma das principais ferramentas de denúncia da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1989).


O pátio da Faculdade de Direito de Universidade de São Paulo (USP) recebe desde a última quinta-feira (26) a exposição “Arpilleras: A denúncia bordada em agulhas, linhas e cores”.
A “arpillera” é uma técnica de bordado originária de Isla Negra, no Chile, e transformada em uma das principais ferramentas de denúncia da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1989). Essa é a primeira exposição de arpilleras tecidas coletivamente pelas mulheres atingidas por barragens do Vale do Ribeira (SP)

A exposição faz parte do projeto realizado pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) desde o início de 2013 com mulheres atingidas. Através de diversas oficinas, mais de 800 mulheres utilizaram o bordado para denunciar todas as violações de direitos humanos sofridas na construção de barragens no Brasil.

São diversas violações sofridas pelas mulheres em toda a sociedade, no caso das atingidas por barragens elas apenas se agravam. “Já está mais do que provado o aumento significativo de assédio sexual, tráfico de pessoas e prostituição nas cidades próximas aos canteiros de obras das hidrelétricas. Apesar disso, estamos provando que é possível construir a auto-organização como enfrentamento dessas injustiças”, afirmou a coordenadora estadual do MAB, Louise Lobler.

Durante a exposição, também será lançado o Dossiê, elaborado pelo SAJU (Serviço de Assessoria Jurídica Universitária) Tuíra, sobre a Violação de Direitos Humanos nas Comunidades Atingidas do Vale do Ribeira. O documento é resultado de uma parceria entre o MAB e o SAJU Tuíra, formado por estudantes de direito da universidade, que acompanharam por cerca de um ano as comunidades atingidas do Vale do Ribeira.
 
O evento também marca o lançamento do documentário “Arpilleras: bordando a resistência”. O média-metragem retratará a história de cinco mulheres atingidas de diferentes regiões do país. Cada uma, a partir de sua realidade, vai contar sua própria história e do seu lugar de origem, dentro da perspectiva de expor o impacto social e as violações de direitos humanos causada pela construção das barragens em suas comunidades, que afetam especialmente as mulheres.

A “costura” do documentário, além do fio condutor construído a partir do olhar feminino sobre as realidades de violações e também sobre a participação nas lutas, será a produção de uma arpillera. Cada uma das cinco mulheres fará uma parte da arpillera, contando para as outras a sua história dentro da técnica criada pelas mulheres chilenas.

A partir de amanhã (1º de abril), o projeto estará disponível no Catarse para financiamento coletivo. A equipe pretende arrecadar recursos para dar início às gravações.


fonte:http://www.brasildefato.com.br/node/31686
foto:http://chileabroad.gov.cl/argentina/2013/09/24/chilena-roberta-bacic-viene-como-curadora-invitada-a-la-exposicion-de-arpilleras-del-parque-de-la-memoria/

30/03/2015

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Lei do Caminhoneiro torna a profissão mais perigosa

Motoristas que paralisaram rodovias este ano conseguirão objetivo de poder trabalhar mais horas, o que pode render mais comissões e mais riscos às suas vidas.



Aos 62 anos, o caminhoneiro José Pedro Carneiro passava noites acordado dirigindo. Para cumprir a jornada de trabalho necessária para pagar as contas, ele abusava do uso de rebite, comprimido de anfetamina tomado para não dormir ao volante. Em 5 de janeiro deste ano, sofreu seu terceiro infarto e faleceu.
Seu filho, Alessandro Carneiro, de 38 anos, estava acordado há trinta horas quando contou a história de seu pai. Em um posto de gasolina na rodovia Dutra, em Guarulhos, admitiu que seu trabalho no volante de um caminhão é mantido graças ao uso do mesmo remédio que matou José Pedro. “Se não toma [rebite], não aguenta. Não existe isso de dirigir tanto sem tomar,” explica.
Longas jornadas, como a de Alessandro e José Pedro, explicam por que a profissão de caminhoneiro é a que mais mata no País. Foram 2.579 mortes entre 2005 e 2013, segundo dados do Ministério da Previdência Social, mais que profissões ligadas à construção civil e à energia elétrica. Em 2013, 291 caminhoneiros morreram atrás do volante, mais de dez por cento dos acidentes fatais no trabalho em todas os setores.
Esses riscos devem aumentar no dia 17 de abril, quando entra em vigor a nova Lei do Caminhoneiro. A legislação foi uma resposta ao movimento que trancou rodovias em janeiro e fevereiro deste ano. O grupo representava parte dos 2,2 milhões de caminhoneiros no País e tinha o apoio do setor agropecuário. Uma de suas principais reivindicações era trabalhar mais horas por dia.
Um movimento de trabalhadores que protesta pela extensão de sua jornada pode parecer uma contradição. A origem desse desejo é o pagamento de comissões. O profissional ganha por viagens ou pelo cumprimento de metas, como a entrega de uma carga antes de um horário estabelecido. Quanto mais rápido rodar pelas estradas, quanto mais viagens fizer, mais ele recebe.
O salário de Alessandro, por exemplo, é de 1.700 reais por mês, mas grande parte é recebida “por fora”. Ele ganha 5% do valor de cada frete pago ao seu patrão, dono de seis caminhões. Trabalhar sem dormir, diz Alessandro, significa “dois ou três mil reais” no final do mês.
Caminhoneiros se dividem sobre o aumento da jornada de trabalho. Parte deles, organizados em sindicatos, reclamam que a nova lei diminui a sua segurança. Do outro lado, caminhoneiros donos do seu próprio caminhão, os autônomos, foram a principal força favorável ao aumento, apoiados por empresários de logística e do agronegócio.
A Lei do Caminhoneiro, como é chamada a nova legislação, tira direitos adquiridos da Lei do Descanso, como é conhecida a lei anterior. A nova regra permite que o motorista dirija 12 horas em um único dia, contra dez da anterior. Além disso, o caminhoneiro só será obrigado a parar na estrada e descansar a cada cinco horas e meia. Antes, ele deveria ter intervalos de quatro em quatro horas.
A legislação antiga também obrigava o trabalhador a descansar 11 horas seguidas após cada dia de trabalho. Com a nova lei, essas 11 horas podem ser distribuídas em períodos menores. Um motorista poderá dirigir, por exemplo, após dormir somente duas ou três horas.
A segurança do trabalhador regrediu em relação à legislação anterior, segundo Renata Namekata, coordenadora do Grupo de Fiscalização do Trabalho em Transportes do Ministério do Trabalho (Getrac). “O excesso de horas na estrada aumenta a fadiga e a dificuldade de se concentrar, colocando em risco a vida do trabalhador e de outros que passam pela rodovia”.
A distância é outro fator que agrava a situação dos motoristas. Jeferson Souza Monteiro, de 38 anos, diz que a desorganização do seu trabalho o levou a se afastar da esposa e filhos, que moravam em São Paulo. “Eu fazia uma viagem para o nordeste e ficava dois, três meses rodando. Chegava em Recife, ligava para o supervisor e ele me mandava ir para Fortaleza. De lá ia até o Mato Grosso e subia para Brasília. Não voltava nunca,” lembra o motorista. “Eu pedia ao supervisor para vir embora para casa, pois queria ver minha família, meus dois filhos pequenos. Só que era difícil. Tinha que arrumar uma carga para poder levar para São Paulo.”
A pressão para dirigir o máximo e mais rápido possível é ainda maior sobre os trabalhadores autônomos, donos de seu próprio caminhão que são subcontratados por transportadoras maiores em terceirizações muitas vezes ilegais. Como recebem o frete diretamente, a relação entre pisar mais no acelerador e receber mais dinheiro é ainda mais clara.
José Pedro era um destes caminhoneiros autônomos. Alessandro lembra que a pressão para fazer viagens e pagar o financiamento do caminhão prejudicou a saúde do seu pai. “Meu pai tomava rebite para pagar o caminhão,” diz Alessandro. “Eu dizia para ele parar de fazer tanto isso, mas não tem jeito, ele tinha que pagar.”
Autônomos são cerca de 40% do total dos profissionais no País, uma frota de 861 mil caminhoneiros segundo dados da Agência Nacional de Transportes Terrestres. Estes trabalhadores, junto aos seus sindicatos, foram os mais ativos nas greves do mês de fevereiro. Desta forma, o governo atendeu outras duas das suas reivindicações: a diminuição do pedágio para caminhões vazios e a suspensão por um ano do pagamento do financiamento de caminhões junto ao BNDES.
O setor agropecuário também pressionou pela mudança da lei, que contou com o apoio de entidades do setor, como a Confederação Nacional da Agropecuária (CNA). O maior interesse do setor é de abaixar os preços do frete, responsável por escoar mais de dois terços da produção do País. Para a entidade, a lei “pode reduzir os custos de frete e o preço final dos alimentos”  e fixa regras mais  “compatíveis com a realidade do país.”
No Congresso Nacional, o projeto foi elaborado por deputados ligados ao setor. A relatoria era de Valdir Colatto (PMDB-SC), ex-líder da Frente Parlamentar Agropecuária, a bancada ruralista. O setor já pressionava contra a aprovação da Lei do Descanso, e o novo projeto teve apoio unânime da bancada de 169 congressistas.
Empresas logísticas, organizadas em sindicatos patronais, também pressionaram pela aprovação da lei. A Federação das Empresas de Transportes de Carga do Estado de Minas Gerais, por exemplo, comemorou a aprovação da lei em seu site. “A Lei atende todos os pleitos solicitados pelos caminhoneiros e transportadores. Isso comprova que com a união de forças dos sindicatos e entidades, podemos alcançar ainda mais benefícios para o setor.”
Caminhoneiros ouvidos pela reportagem tinham argumentos semelhantes aos do agronegócio e das transportadoras. “Oito horas com caminhão carregado não roda nem 400 quilômetros. Trabalhar só isso aí não tem como, é mito. E eu duvido que isso vá acontecer um dia. Se acontecer, para o Brasil, a logística não suporta,” diz o caminhoneiro autônomo Leonardo Teixeira, de 33 anos.
O discurso homogêneo entre patrões e empregados acontece devido à forma como o setor está organizado, segundo o auditor-fiscal do trabalho Ademar Fragoso Jr. “Se a remuneração é em termos de produtividade, o próprio caminhoneiro fica do lado do empregador. Ele enxerga que quanto mais ele trabalha, mais dinheiro vai ter. Então, quer dirigir, não quer ficar parado,” diz Fragoso.
Entidades e órgãos públicos se mobilizam para derrubar a nova lei, que consideram um grande retrocesso. “Esta lei é uma das maiores violações de direitos humanos já praticada pelo Congresso Nacional, e com o apoio da presidência da República” , diz o procurador do trabalho André Melatti. “O pior é ver na mídia que a lei vai beneficiar os caminhoneiros, os manifestantes nas estradas. É a lei da escravidão do caminhoneiro”.
A Federação dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários do Estado de São Paulo acredita que a mudança não atende à maioria dos caminhoneiros. Valdir Pestana, presidente da Federação, define a greve como um “locaute” para atender aos interesses dos donos de caminhões e do agronegócio.
Diante da derrota no Congresso Nacional, o Ministério Público do Trabalho e sindicatos se mobilizam para derrubar a lei no Supremo Tribunal Federal (STF). A federação promete entrar com uma ação alegando a incompatibilidade da nova lei aos direitos presentes na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho). Já o procurador Melatti pretende argumentar no STF que o Brasil não poderia retroceder em direitos sociais, conforme tratados assinados pelo País.
Alheio a essa disputa jurídica e trabalhando acima do permitido em todas as leis, Alessandro diz que a legislação “não faz diferença” na sua vida. Ele entrou na profissão influenciado pelo pai, há doze anos. Agora, busca outro emprego. “Não quero ir até o fim”.

Reportagem de Piero Locatelli, da Repórter Brasil 
fonte:http://www.cartacapital.com.br/sociedade/lei-do-caminhoneiro-torna-mais-perigosa-a-profissao-que-mais-mata-8859.html
foto:http://www.portalmetropole.com/2015/02/greve-de-caminhoneiros-e-liderada-por.html

Segregação urbana, janela para o caos

Além de submeter metrópoles à ditadura do automóvel, fenômeno terá enorme impacto ambiental nas próximas décadas, quando novo ciclo de migrações congestionará cidades.



Poucos negam o fato. A expansão suburbana é feia, com seus centros comercias e lojas em formas de caixa. Tampouco é muito conveniente, devido às horas dentro do carro necessárias para chegar ao trabalho. E causa estragos à natureza, com as terras de cultivo perdidas e as bacias hidrográficas comprometidas.
Então, por que a expansão suburbana, esse crescimento lento mas constante das cidades para suas áreas rurais, com forte dependência do automóvel como meio de transporte, continua se agravando? Para especialistas como Todd Litman, do Instituto de Políticas de Transporte de Victoria, na província canadense de Colúmbia Britânica, o assunto tem a ver com aquilo que os planejadores chamam de crescimento inteligente, ou a sua falta.
“Grande parte da motivação para que as famílias de classe média se mudem das cidades para os subúrbios era se distanciar das famílias de baixa renda, que não podem pagar as casas unifamiliares ou o transporte em automóvel”, apontou Litman à IPS. “Com o tempo, todos que puderam se foram, o que resultou em famílias de baixa renda econômica se concentrando nos bairros urbanos”, acrescentou.
A lista de problemas gerados por essa segregação inclui redução da produtividade agrícola e ecológica e aumento dos custos de infraestrutura, serviços públicos e transporte, do congestionamento do trânsito, dos acidentes, das emissões contaminantes, além de menor acesso dos pedestres e uma reduzida aptidão física e sanitária em geral.
De fato, uma análise publicada no dia 19 pelo Instituto Victoria e as organizações Nova Economia do Clima e LSE Cities calcula que a expansão urbana implica mais de US$ 400 bilhões em custos externos e US$ 625 bilhões em custos internos por ano, somente nos Estados Unidos. As comunidades empobrecem ainda mais e a pesquisa demonstra que essa concentração de pobreza reforça os problemas sociais, como criminalidade e drogas, o que complica as opções das crianças das cidades.
Para Litman, autor principal do estudo, “o crescimento inteligente consiste em bairros compactos com diversas opções de moradia e transporte que alojam diversos tipos de famílias, de jovens, velhos, ricos, pobres, pessoas deficientes, e cujos moradores possam escolher o modo mais eficiente para se locomover, a pé e de bicicleta para as áreas urbanas, transporte público de alta qualidade nos corredores urbanos e automóveis, considerando todos os impactos”.
“Esse tipo de desenvolvimento tende a reduzir o consumo de terra por habitante, reduz a propriedade de veículos e as viagens por pessoa, e aumenta as viagens a pé, de bicicleta e em transporte público, algo que proporciona economia e benefícios em comparação com as mesmas pessoas que vivem e trabalham em lugares distantes”, acrescentou Litman.
O problema, que antes era considerado exclusivo dos países industrializados, agora se tornou mundial, segundo a ONU Habitat. A superfície da cidade de Guadalajara, no México, cresceu uma vez e meia mais do que a população entre 1970 e 2000. O mesmo aconteceu em cidades da China, Antananarivo, capital de Madagascar, Johannesburgo, na África do Sul, e nas capitais do Egito e do México, afirma a agência.
Na América Latina, a expansão suburbana provocou graves danos em regiões ecologicamente delicadas, como Cidade do Panamá e o canal que a rodeia, Caracas e seus morros e costas adjacentes, São José da Costa Rica e seu entorno montanhoso, e em São Paulo e suas bacias hidrográficas.
“Por mais de meio século, a maioria dos países experimentou um rápido crescimento urbano e o aumento da circulação de veículos”, afirmou o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, no Informe Mundial sobre Assentamentos Humanos 2013. “Isso levou à expansão suburbana e a uma demanda maior pelo deslocamento motorizado com uma série de consequências ambientais, sociais e econômicas”, pontuou.
“O transporte urbano é uma fonte importante de emissões de gases-estufa e uma causa de problemas sanitários devido à contaminação do ar e a sonora. O congestionamento do trânsito gerado pelos sistemas de transporte insustentáveis é responsável pelos importantes custos econômicos e de produtividade para os viajantes e os transportadores”, acrescenta o informe.
Reverter essa tendência agora é fundamental. As projeções mostram que entre 1950 e 2050 a população humana quadruplicará e passará a ser 20% rural e quase 80% urbana. Um desafio importante, segundo Litman, é a percepção comum de que as cidades são ineficazes e perigosas, quando na realidade “em muitos aspectos são mais eficientes e mais seguras do que as comunidades suburbanas, e isso cresce na medida em que mais famílias da classe média se mudam para os bairros urbanos”.
Além disso, os códigos de zoneamento e as políticas de desenvolvimento costumam desestimular o desenvolvimento urbano e favorecer a expansão suburbana, e as políticas de transporte favorecem em excesso o investimento nas viagens de carro, ressaltou o especialista.
“Por exemplo, a maioria das prefeituras dedica muito mais espaço viário e financiamento ao transporte em automóveis do que ao que se faz a pé, de bicicleta ou em transporte público, e impõem requisitos mínimos de estacionamentos aos construtores, o que leva a enormes subsídios para os motoristas particulares, e é difícil mudar esses recursos para modos alternativos — inclusive porque são mais rentáveis, em geral”, destacou Litman.
O bom é que “uma parte cada vez maior de famílias de renda média quer viver em comunidades mais compactas, multimodais, frequentemente descritas com ‘”fáceis de caminhar” ou “novos bairros urbanos”, e não nas expansões urbanas”, disse Litman. “Estão dispostos a aceitar uma casa menor, querem dirigir menos e confiam mais nas viagens a pé, de bicicleta ou em transporte público, mas só podem fazê-lo se os códigos de zoneamento e as políticas de desenvolvimento as apoiarem”, enfatizou.

Reportagem de  Kitty Stapp, na Envolverde/IPS
fonte:http://outraspalavras.net/outrasmidias/capa-outras-midias/a-expansao-para-o-suburbio-cresce-como-mal-das-cidades/
foto:http://www.mundoeducacao.com/geografia/segregacao-urbana.htm

Linchamentos virtuais

Alicia Ann Lynch, uma jovem norte-americana de 22 anos, publicou no Twitter uma fotografia onde aparecia fantasiada para uma festa de Halloween. A fantasia era de uma simplicidade que teria consequências imprevisíveis; aparecia vestida com roupas esportivas, com o rosto e os membros lambuzados de tinta vermelha, como se tivesse sangrando abundantemente, e uma legenda que rapidamente lhe garantiria um linchamento nas redes sociais: “Vítima da maratona de Boston”. A referência daquele gracejo era a bomba que, em abril de 2013, interrompeu violentamente a famosa corrida, causando três mortos, 282 feridos e a mancha indelével de um atentado terrorista na cidade. A inconsciência e o mau gosto de Lynch e a péssima ideia de publicar essa fotografia dispararam a morbidez de seus escassos seguidores no Twitter e as republicações destes fizeram com que em algumas horas a jovem recebesse milhares de insultos e mensagens de uma dureza que não admitia nenhuma réplica, como este enviado por uma vítima da trágica maratona: “Você deveria estar envergonhada. Minha mãe perdeu as duas pernas e eu quase morri”.
O linchamento virtual logo ganhou consistência real e a jovem teve que trancar-se em casa, e alguns dias mais tarde o chefe do escritório onde ela trabalhava, constrangido pela pressão das redes sociais, a despediu. Usar tal fantasia não tem nenhuma graça e publicar a fotografia é um gesto depreciável, mas o que teria acontecido com Alicia Ann Lynch se tivesse feito a mesma brincadeira, com a mesma foto, em 1970, antes da Rede? A foto teria sido vista somente por seus amigos e seu chefe dificilmente a teria despedido por essa brincadeira de mau gosto, mas de alcance exclusivamente doméstico. O caso é interessante pois evidencia como as redes sociais aumentam situações que, sem essa difusão massiva, teriam sido muito menos importantes.
Na fotografia publicada por Alicia Ann Lynch no Twitter, é preciso separar o fato de sua difusão massiva
Em 1932 foi sequestrado o bebê de Charles Lindbergh, o célebre piloto que cruzou pela primeira vez em seu avião, em 1927, o Oceano Atlântico. Lindbergh era um herói nacional e o sequestro de seu filho deixou a sociedade norte-americana apreensiva por dois meses; até que em um dia trágico o cadáver do garoto foi encontrado. Alguns meses mais tarde, quando o bebê Lindbergh continuava sendo um tema recorrente, o pintor Salvador Dalí, que havia inaugurado com muito sucesso uma exposição em Nova York, foi convidado para uma festa à fantasia na qual compareceu a fina flor da sociedade de Manhattan. Dalí e Gala, sua mulher, compareceram fantasiados, para escândalo dos convidados, de bebê Lindbergh e seu sequestrador. Aquela violenta brincadeira não foi além de aborrecer os convidados e os leitores dos jornais que publicaram a última excentricidade do pintor. Na biografia de Dalí o incidente da festa à fantasia é um episódio menor, uma brincadeira de mau gosto que se parece com a situação da jovem que se fantasiou de vítima da maratona de Boston, com a diferença de que na época de Dalí não existiam redes sociais e televisão para aumentar sua imprudência e sua brincadeira ficou nisso, em uma boutade; mas se isso tivesse acontecido neste século, Dalí provavelmente ficaria sem galeristas, teria sofrido um severo boicote e teria de agir para que sua carreira não afundasse.
Na fotografia publicada por Alicia Ann Lynch no Twitter, é preciso separar o fato de sua difusão massiva, de sua multiplicação exponencial na Rede. Mas isso, por enquanto, é complicado, porque os internautas adoram o linchamento e, sobre esta penosa pulsão tão própria do século XXI, ninguém teve tempo de criar alguma lei.
Apareceram recentemente em inglês dois ensaios sobre esse inquietante tema, que é outra dessas zonas escuras deste luminoso invento que é a Internet: So You´ve Been Publicly Shamed (Então Você Foi Envergonhado Publicamente), de Jon Ronson, e Is Shame Necessary? New Uses For An Old Tool (A Vergonha é Necessária? Os Novos Usos de uma Velha Ferramenta), de Jennifer Jacquet. Os dois ensaios tratam da dimensão contemporânea da vergonha, do desprestígio e do escárnio, que saem de proporção quando são amplificados nas redes sociais; qualquer descuido, deslize ou bobeira, que há quarenta anos teria produzido um pouco de incômodo ou um momento de rubor, hoje, esta mesma bobeira aumentada pelo Twitter ou pelo Facebook pode gerar um linchamento que arruinará a vida do engraçadinho.
Os casos de linchamento virtual, de vergonha pública massiva abundam; a todo momento os internautas lincham políticos, cantores, jogadores de futebol e banqueiros, personagens que estão permanentemente expostos ao olhar público e que, portanto, estão habituados a lidar com o ódio e o desprezo da massa tuiteira; mas o assunto muda quando o linchamento é dirigido a uma pessoa normal, que torna-se subitamente famosa como a jovem que se fantasiou de vítima da maratona de Boston, ou como o caso de Justine Sacco, um episódio emblemático que Jon Ronson esmiúça em seu livro. Sacco viajou à África do Sul para visitar alguns parentes e, enquanto embarcava no avião em Nova York, deu asas à sua loquacidade tuiteira e começou a publicar mensagens, algumas muito ofensivas, para sua modesta paróquia de 170 seguidores. Em sua escala em Londres publicou uma infeliz mensagem que mudaria sua vida: “Vou para a África. Espero não contrair AIDS. É brincadeira. Sou branca”.

Reportagem de Jordi Soler
fonte:http://brasil.elpais.com/brasil/2015/03/27/tecnologia/1427463790_681602.html
foto:http://cazzosantiagofontoura.com/2014/12/08/quando-opiniao-vira-monumento/

Empresas recuperam em contratos até 39 vezes o valor doado a políticos


“É política de boa vizinhança. Evidentemente quando você apoia um partido ou um candidato, no futuro eles vão procurar ajudá-lo”, afirmou o empresário Cristiano Kok, da empreiteira Engevix, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo. A empresa está envolvida no esquema de corrupção investigado pela Lava Jato, e um dos sócios está preso há mais de três meses. Os números parecem concordar com o argumento de Kok: o estudo ‘The Spoils of Victory’ ('Despejos da Vitória', em tradução livre), feito por pesquisadores de três universidades dos Estados Unidos, concluiu que as empresas que financiaram candidatos a deputado federal do PT nas eleições de 2006 receberam entre 14 e 39 vezes o valor doado por meio de contratos com o poder público nos anos subsequentes.
A pesquisa, publicada em 2014, cruza os dados oficiais de doações para as campanhas e os contratos obtidos pelas empresas nos anos seguintes - sem levar em conta eventuais pagamentos ilegais. Segundo os autores, não foi possível estender o estudo para Governos anteriores por falta de dados públicos confiáveis, e não foi encontrada correlação entre doações e contratos envolvendo outros partidos. “Este modelo de financiamento de campanha que favorece doadores é comum em todas as nações em desenvolvimento”, afirma Taylor Boas, professor de ciência política na Universidade de Boston e um dos autores do estudo. Para ele, isso ocorre porque nestes países o Estado de Direito tende a ser mais fraco, e o processo de orçamento público mais facilmente manipulável, assim como as licitações, ainda que nenhuma grande democracia, quer a França ou os EUA, estejam a salvo das polêmicas e escândalos envolvendo doações de campanha e influência desproporcional no processo político.
Nos países em desenvolvimento os problemas se agravam, de acordo com Boas, porque eles têm poucas leis que regulamentem as doações de campanha. "No Brasil o limite para a doação corporativa é de 2% de seu faturamento bruto anual. Isso é um valor muito alto já que estamos falando de grandes empresas", diz. A influência das grandes empresas brasileiras, com atuação internacional em especial na América Latina e na África, não se restringe às eleições brasileiras. Segundo o cientista político, “a Odebrecht foi uma das maiores doadoras para a campanha do candidato à presidência do Panamá Ricardo Martinelli em 2011”. Após a vitória do candidato a empresa obteve “o maior contrato de obra do país até então: o metrô da Cidade do Panamá”.
Quatro investigadas pela Lava Jato estão entre as maiores doadoras das bilionárias eleições brasileiras de 2014: Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS e Queiroz Galvão. Juntas, elas injetaram 353 milhões de reais nas campanhas de dezenas de candidatos e comitês partidários de várias legendas. O 'retorno' do investimento não tardou: apenas nos três primeiros meses deste ano estas empresas já receberam em pagamentos diretos do Governo Federal a quantia de 142 milhões de reais.

Comportamento diferente

"As grandes empresas têm um comportamento diferente nas eleições proporcionais e nas majoritárias”, afirma o cientista político Wagner Pralon Mancuso, da Universidade de São Paulo. Segundo ele, nas majoritárias a tendência é que elas doem para todos os candidatos que têm chance de serem eleitos. “As empresas da Lava Jato, por exemplo, doaram quantias muito parecidas para o Aécio e para a Dilma”, diz. Reportagem do jornal O Estado de São Paulo deste domingo revela que o conjunto de 21 empresas investigadas pela Lava Jato foi responsável pela doação de 40% dos recursos privados destinados aos cofres do PT, PMDB e PSDB entre os anos de 2007 e 2013. Foram 321 milhões de reais para os diretório nacional do PT, 137,9 milhões de reais para o PSDB e 97,6 milhões de reais para o PMDB. Esses valores não levam em conta nem as doações feitas diretamente a candidatos, nem os recursos doados para as eleições no ano passado.
Quando se tratam de eleições para deputados federais e senadores, as empresas doam principalmente para candidatos com “capital político testado, que disputam a reeleição. Assim elas aumentam as chances de acerto”, afirma Mancuso. Esse comportamento dificulta a renovação do Congresso, já que os parlamentares que estão eleitos possuem uma base de financiadores já definida: 60% dos candidatos foram reeleitos em 2014.
Os parlamentares contam ainda com outro instrumento para beneficiar as empresas doadoras: as emendas orçamentárias, que segundo o site do Senado são uma possibilidade para que os congressistas possam “influir na alocação de recursos públicos em função de compromissos políticos que assumiram durante seu mandato”. Na prática, segundo Luciano Caparroz Santos, advogado especialista em Direito Eleitoral e um dos fundadores do Movimento Contra a Corrupção Eleitoral (MCCE), que esteve à frente do projeto da Ficha Limpa, as emendas são uma maneira de “favorecer doadores de campanha, oferecendo obras nos redutos eleitorais com a finalidade de agradar as empresas”. Cada parlamentar pode apresentar até 25 emendas totalizando 10 milhões de reais.
Um exemplo dessa prática irregular é o caso do ex-deputado federal João Caldas da Silva (PEN-AL), que foi condenado em 2014 pelo escândalo conhecido como a ‘máfia das ambulâncias’. O Ministério Público Federal alegou que Silva direcionava emendas orçamentárias para determinados municípios com o objetivo de favorecer empresários e companhias que doaram para sua campanha. Os preços eram superfaturados em até 120% com relação a valores de mercado, com prejuízos estimados em 110 milhões de reais para os cofres públicos.
Para o cientista político Mancuso, nem sempre o parlamentar precisa beneficiar explicitamente um doador. “Muitas vezes basta que ele peça vista [tempo para examinar] para atrasar um projeto de lei que prejudica os interesses de um doador”, afirma. Outra maneira apontada pelo professor é a apresentação de emendas a um determinado projeto de lei para beneficiar a empresa: “Muitas vezes o texto não foi nem escrito por ele. É comum vários deputados apresentarem a mesma emenda, igualzinha, enviada pela companhia interessada”. Tudo isso dentro da legalidade.
“Existem dois tipos de relação financeira entre doadores e políticos: um são os contratos oferecidos para uma empresa de obras públicas, e os outros são o financiamento”, afirma Mancuso. As companhias que não fazem obras “recebem [como moeda de troca] financiamento de bancos públicos", segundo ele. A JBS, empresa do ramo de frigoríficos, foi a maior doadora das eleições no ano passado. A empresa já recebeu, desde 2005, ao menos oito bilhões de reais em empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Social, o BNDES. A empresa alimentícia nega qualquer ligação entre as doações a políticos e os financiamentos.
Um dos resultados deste modelo corporativo de financiamento e um dos pontos centrais na discussão da reforma política, é a formação de bancadas no Congresso (grupos de parlamentares que atuam no Senado e na Câmara) para favorecer os interesses de um determinado setor do mercado. Para Santos, este é outro efeito problemático das doações: “Quando alguém vota em um determinado candidato não sabe que o cara recebeu dinheiro de determinada empresa e que vai defender os interesses da companhia”. Estes dados só estarão disponíveis semanas depois do pleito, impossibilitando que o eleitor saiba exatamente quem está financiando seu deputado ou senador.

Debate e reforma política

Desde o final de 2013 o Supremo Tribunal Federal (STF) julga uma ação da Ordem dos Advogados do Brasil que pede a proibição do financiamento eleitoral por empresas. Seis ministros foram favoráveis ao veto, mas a votação foi interrompida por dois pedidos de vista, de Teori Zavascki, que votou contra a proibição, e de Gilmar Mendes. Recentemente Mendes afirmou que não cabe ao Supremo legislar sobre o assunto, e que a matéria cabe ao Congresso. Nesta quarta, um grupo fez uma vigília diante do Supremo em Brasília pedindo que Mendes prossiga com o julgamento do tema.
O PT tem defendido o fim do financiamento privado de campanha, mas o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), já se manifestou ser contrário à extinção da modalidade. Críticos das investigações da Lava Jato tem dito que procuradores e juízes estãocriminalizando doações legais de campanha. Já um dos mais importantes pilares do caso, o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, que aderiu ao regime de delação premiada, disse em depoimento: "Doação oficial é balela". "Todas as doações oficiais, seja oficial ou não oficial, não é doação, é empréstimo".
No início de fevereiro foi instalada na Casa uma comissão especial de reforma política, cuja presidência foi oferecida por Cunha ao deputado oposicionista Rodrigo Maia (DEM-RJ). O texto que irá nortear as discussões é a Proposta de Emenda à Constituição 352/2013, escrita pelo ex-deputado Cândido Vacarezza (PT-SP), que constitucionaliza o financiamento privado de campanha.

Reportagem de Gil Alessi
fonte:http://brasil.elpais.com/brasil/2015/03/24/politica/1427231038_296730.html
foto:http://www.diariodocentrodomundo.com.br/doacoes-de-empresas-a-campanhas-eleitorais-deveriam-ser-proibidas/