Apesar de
uma grande pressão nos últimos anos, por parte de governos como EUA, Reino
Unido e da ONU, para acabar com subornos de empresas a autoridades
estrangeiras, quase nada do dinheiro pago em multas retornou para os países
onde os crimes ocorreram.
Resultados
preliminares de uma pesquisa sobre acordos com governos em centenas de casos de
suborno mostram que dos US$ 6,4 bilhões em multas, apenas US$ 185 milhões,
menos de 3%, foram destinadas à compensação dos países vítimas de corrupção.
“Países
onde os subornos foram pagos, onde os danos da corrupção ocorreram, não estão
cientes ou não estão envolvidos no processo”, disse Oliver Stolpe, um
conselheiro graduado da Stolen Asset Recovery Initiative (StAR, Iniciativa de
Recuperação de Recursos Roubados em inglês) que comandou o estudo. A StAR é um
esforço conjunto do Banco Mundial e do Escritório das Nações Unidas para Drogas
e Crimes.
Quando
empresas pagam subornos para conseguir contratos ou passar por cima de leis em
outros países, isso representa grandes perdas para os países onde os crimes
ocorrem.
Na última
década, a ONU tem tentado estancar a ferida a partir de acordos internacionais
e uma política de repressão ao suborno. Mas cada vez mais, os países natais das
empresas multinacionais, tais como EUA, Reino Unido e outros países europeus –
onde é crime corromper oficiais no exterior – têm tratado diretamente com os
acusados de praticar suborno, atingindo acordos com as empresas que evitam
processos judiciais. O resultado é que o dinheiro pago fica no país-sede da
empresa, e não no país lesado pela corrupção do seu oficial.
“Nós temos
visto nos últimos 10 anos, finalmente, alguma ação contra empresas que pagam
subornos no exterior”, diz Stolpe. “Isso se deve basicamente a esses acordos”.
Apesar do
aumento no número de processos, o uso de acordos tem deixado os países vítimas
fora da discussão. Os pesquisadores da StAR cobriram uma gama de casos
decididos entre 1999 e 2011. A pesquisa incluiu fundos confiscados, embargos de
recursos e multas.
Porém
quando um governo indicia uma empresa por violar suas próprias leis, como nos
EUA, onde o Foreign Corrupt Practices Act (Lei de Práticas Corruptas no
Exterior, em inglês) criminaliza a prática de corrupção no exterior, o país não
é obrigado a dividir as multas com países estrangeiros que foram vítimas da
corrupção.
Maud
Perdriel-Vaissiere, diretora-gerente do Sherpa, um grupo de advocacia para
vítimas de crimes econômicos sediado em Paris, diz que um sistema de
recuperação de recursos que exclui vítimas diretas de corrupção é
insustentável.
“É uma
grande injustiça”, ela diz. Para ela, a prática na realidade patrocina a
corrupção. “Se eventualmente as autoridades decidem abrir um processo contra
uma empresa, é o país onde a companhia está registrada que fica com as multas”.
A
frustração incitou a organização Socio-Economic Rights and Accountability
Project (Projeto de Direitos e Responsabilidades Socioeconômicas, em inglês),
na Nigéria, a enviar uma carta à Comissão de Títulos e Câmbio dos EUA (SEC),
demandando que o país fosse incluso em futuras negociações do tipo. A carta
requer o pagamento de “danos adequados por empresas multinacionais envolvidas
em subornos na Nigéria”. A organização apelou à SEC para incluir países vítimas
em futuros acordos em casos de suborno.
A carta
cita um caso em 2011 no qual o Departamento de Justiça americano rejeitou o
pedido da Costa Rica para restituição contra um suposto pagante de suborno,
Alcatel-Lucent. Na ocasião o departamento argumentou que “essencialmente, por
conta de altos funcionários corruptos estarem incrustrados na entidade
costarriquenha, a própria entidade é culpada como co-conspiradora, e portanto
não é qualificada à restituição sob as leis criminais dos EUA”.
Um
porta-voz do Departamento de Justiça negou-se a comentar esta história.
Charles
Monteith, chefe da Consultoria Legal e Processual do Basel Institute’s
International Centre for Asset Recovery, disse que os EUA e outros países
geralmente relutam em repatriar o dinheiro às nações onde a corrupção ainda é
descontrolada. “Existem problemas em retornar o dinheiro a governos que são
envolvidos em corrupção. Esta é o ponto crucial”.
Além
disso, há uma série de questões legais. Em alguns países, para se devolver
recursos roubados necessita-se de uma vítima particular a ser mencionada – o
que é impossível em casos onde o tesouro nacional é quem foi saqueado.
“O sistema
de repatriação precisa ser mais simples. E precisa ser universalmente aceito”,
diz Monteith.
Akaash
Maharaj, secretário-geral da Global Organization of Parliamentarians Against
Corruption (GOPAC), diz que acordos feito por governos diretamente com as
empresas deveriam ser suspensas até que “todo dinheiro possível de ser
identificado seja retornado a seus donos de direito”. Seu grupo está pedindo
que a ONU estabeleça metas executáveis sobre casos de corrupção. O pedido pode
ser votado ainda este ano na Conferência de Estados Participantes da Convenção
das Nações Unidas contra a Corrupção.
POUCO DO DINHEIRO VOLTA PARA CASA
Mesmo
entre casos já encerrados, muito pouco dos recursos roubados no mundo acabam
voltando para os cofres dos países de origem.
Em 2003,
140 países assinaram a Convenção das Nações Unidas contra Corrupção, que
estabeleceu meios legais para nações recuperarem recursos perdidos por conta de
corrupção. Mas a convenção ainda está aquém de seus objetivos.
De acordo
com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), dentro de
uma estimativa de US$ 1,2 bilhão em recursos congelados entre 2006 e 2009,
apenas US$277 milhões foram recuperados pelos países de origem.
Um
relatório recente da StAR indicou que a quantia recuperada em recursos
ilegalmente obtidos em um período de 15 anos soma apenas 5 bilhões de dólares,
uma ninharia comparada ao prejuízo sofrido por países em desenvolvimento por
causa da corrupção todos os anos – entre US$ 20 milhõese e US$ 40 milhões,
segundo estimativas da StAR.
Christian
Larson, gerente de programa de Governança Econômica no secretariado da
Organização para Segurança e Cooperação na Europa, diz que promotorias e
agências de força policial têm regras que permitem que recursos recuperados
sejam usados para cobrir algumas de suas despesas. “Quando países contratam
firmas privadas para ajudar com recuperação de recursos, muito do dinheiro vai
para o pagamento dos profissionais que ajudaram a achar e confiscá-lo”.
Países
requerentes reclamam que, quando se chega ao final dos procedimentos legais em
torno da recuperação de recursos roubados, muito pouco do dinheiro é recuperado
de fato, comenta Larson.
Heather
Lowe, advogado e diretor de assuntos governamentais da organziação Global
Financial Integrity, explica que o sistema atual depende de Tratados de Mútua
Assistência Legal, que exigem que países requerentes de recursos roubados façam
pedidos muito detalhados aos bancos. E os países onde o dinheiro está exigem
evidências claras, tais como números de contas de bancos e a quantia exata do
montante suspeito. Cada país tem seus próprios padrões, e países em
desenvolvimento geralmente não possuem acesso a este nível de detalhe.
Segundo
Maharaj, a quantidade de dinheiro perdido no mundo a cada ano para a corrupção
poderia pagar 10 vezes todas as prioridades em termos de combate à pobreza,
seca, desigualdade de gênero, ambiente e outras metas de desenvolvimento que a
ONU comprometeu-se a atingir em 2015. Para ele, “a falha em repatriar estes
recursos provavelmente mata mais pessoas todo ano que guerras e fome juntas”.
Reportagem de Chad Bouchard
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