Hoje, o país é um
dos três maiores exportadores globais, tem o crescimento per capita mais alto
do mundo desenvolvido e um índice de desemprego de 6,9%, bem inferior à média
da eurozona, de 11,7%.
Segundo o professor
Reint Gropp, presidente do Instituto Hall para a Investigação Econômica (IWH),
da Alemanha, o modelo germânico se diferencia de forma muito clara do
anglo-saxão dos Estados Unidos e do Reino Unido.
Mas o que faz dele
algo tão particular? Quais são os segredos de seu êxito?
"É um sistema
baseado na cooperação e no consenso mais do que na competência, e que cobre
toda a teia socioeconômica, desde o setor financeiro ao industrial e ao
Estado", explicou Gropp à BBC Mundo, serviço em espanhol da BBC.
Cooperação e
capitalismo
A chamada
"economia social de mercado" teve sua origem na Alemanha Ocidental do
pós-guerra, que estava sob o governo democrata-cristão do chanceler Konrad
Adenauer, e se manteve, desde então, como uma espécie de política de Estado.
Sebastian Dullien,
economista do Conselho Europeu de Relações Exteriores, concorda que o consenso
e cooperação estão presentes em todos as camadas da economia.
"No centro
estão os sindicatos e os patrões, que coordenam salário e produtividade com o
objetivo obter um aumento real dos rendimentos dos funcionários, além de manter
os postos de trabalho. A integração é tal que, por lei, os sindicatos estão
representados no conselho de administração, participam das decisões
estratégicas nas empresas", afirmou.
No sistema
financeiro, as cooperativas e os poderosos bancos públicos se encarregam de
fazer com que o crédito alcance a todos, não importa o tamanho da empresa ou o
quão distante ela fica de um centro econômico.
Essa filosofia
permite superar uma das limitações do sistema anglo-saxão, no qual as pequenas
e médias empresas, diferentemente das multinacionais, não têm acesso ao mercado
de capitais e muitas vezes enfrentam dificuldades para se financiar.
"Os bancos
públicos têm regras claras. Por exemplo: para favorecer o desenvolvimento
local, podem emprestar para empresas de sua área, mas não para as de outras
regiões. O governo tem representantes nestes bancos, e eles são fundamentais na
tomada de decisões. Um princípio que rege sua política de crédito é a
manutenção do emprego", afirma Gropp.
'Mittelstand'
Esse modelo está
enraizado na história germânica.
A unificação
nacional de 1871, sob Bismark, reuniu 27 territórios governados em sua maioria
pela realeza e que haviam crescido rapidamente e de forma autônoma durante a
Revolução Industrial.
Dessa
semente histórica surgem as Mittelstand (pequenas e médias empresas), que, segundo os especialistas,
formam 95% da economia alemã.
Diferentemente
do modelo anglo-saxão, centrado na maximização da rentabilidade para os
acionistas (objetivo de curto prazo), as Mittelstand são estruturas familiares com planos a longo prazo, forte
investimento na capacitação do pessoal, alto sentimento de responsabilidade
social e forte regionalismo.
"A Alemanha é
especialmente forte em empresas que têm umas 100 ou 200 pessoas. Com uma
característica adicional: apesar de seu tamanho, muitas dessas firmas competem
no mercado internacional e são exportadoras", explica Dullien.
Exportações
Como consequência, a
Alemanha tem figurado entre os três principais exportadores mundiais nas
últimas décadas, uma prova da eficácia desse sistema para competir mundialmente
com produtos tecnologicamente complexos, feitos por uma força de trabalho
altamente qualificada e bem paga.
Enquanto
o comércio mundial dominado por multinacionais que representam cerca de 60% de
toda a movimentação global, na Alemanha as Mittelstand são responsáveis por 68% das exportações.
O setor automotivo,
de maquinário, de eletrônicos e medicamentos estão entre seus pontos fortes.
Mas
isso não se deve somente às Mittelstand.
Das 2.000 empresas
com maior rendimento em todo o mundo, 53 são alemãs, entre elas marcas de
grande tradição, como Bayer, Volkswagen e Siemens.
A recuperação do
doente
Sob o peso da reunificação,
a Alemanha ganhou nos anos 1990 o apelido nada simpático de "doente da
Europa".
Era consenso que um
sistema com altos salários e forte participação sindical não poderia sobreviver
em um mundo governado por um conceito novo, a "deslocalização".
Aproveitando-se de
um mundo mais liberal e do fato de que as novas tecnologias das grandes
empresas poderiam mudar de um país para outro em busca de maior rentabilidade,
obtida com custos salariais menores, as empresas alemãs começaram a migrar pra
outros pontos do mundo.
No entanto, no
início deste século um governo social-democrata implementou uma série de
reformas, classificadas por seus concorrentes de "neoliberais", para
reativar a economia nacional.
O remédio funcionou
– a economia voltou a crescer. Mas teve um preço: aumento da pobreza, do
subemprego e do "miniemprego".
"O lado
positivo é que o sistema mostrou um alto grau de adaptabilidade. Porém, as
reformas da seguridade social e do mercado de trabalho aumentaram a pobreza e a
desigualdade", avalia Sebastian Dullien.
Futuro
Os desafios se
acumulam. No curto prazo, os problemas na China afetam as exportações. No
médio, a taxa de natalidade alemã não é suficiente para manter seu mercado de
trabalho.
Mas não se trata
unicamente de uma ameaça externa ou de uma bomba-relógio demográfica.
Um estudo do
Instituto Hall mostra que, mesmo em uma economia social de mercado, a
interdependência de bancos, empresas e governo pode possibilitar situações de
interferência política.
De acordo com a
pesquisa, os bancos do Estado emprestam consideravelmente mais durante os anos
eleitorais.
"Isso requer um modelo de governo melhor, que impeça a
interferência política. Acredito que o sistema precisa de mais liberalização,
não é possível que um banco estatal de Frankfurt não possa emprestar para outra
região", afirma Gropp, presidente do instituto.
"Estamos no meio de uma grande revolução tecnológica e a economia
alemã não está respondendo como deveria porque tem uma estrutura rígida demais.
O modelo foi excelente, mas é possível que seja anacrônico."
No entanto, pode ser que mais uma vez o sistema alemão lance mão de sua
extraordinária flexibilidade para sustentar um modelo que procura aliar
capitalismo, altos salários e plena participação da força de trabalho.
Reportagem de Marcelo Justo
fonte:https://www.blogger.com/blogger.g?blogID=2776936502431828771#overviewstats
foto:http://douglasyamagata.blogspot.com.br/2014/11/da-zona-do-euro-em-crise-alemanha.html
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