As decisões da Justiça do Trabalho são as mais contestadas no
Supremo Tribunal Federal. Segundo dados do STF, 38% das Reclamações dos últimos
cinco anos foram contra decisões de magistrados trabalhistas. Nesse período o
STF recebeu 3.706 Reclamações, de acordo com levantamento encerrado em setembro
deste ano. Só o Tribunal Superior do Trabalho figura como reclamado em 406
casos, 11% do total. É de longe a corte com decisões mais contestadas, à frente
do Superior Tribunal de Justiça, com 282.
Do total de Reclamações, 30% estavam relacionados à Justiça
Comum e 11% à Justiça Federal. Os 21% restantes têm como alvo decisões e atos
de diversas instituições espalhadas pelos Três Poderes, como o próprio STF e
demais cortes de Justiça, governos estaduais e municipais, tribunais de contas,
polícia, Ministério Público, Receita Federal e autarquias.
Segundo a Constituição, é possível ajuizar uma Reclamação em
três hipóteses: descumprimento de decisão do Supremo Tribunal Federal,
usurpação de competência do STF ou descumprimento de súmula vinculante.
Dívidas com terceirizados
No caso da Justiça do Trabalho, o principal motivo de questionamento diz
respeito à responsabilidade do Estado pelas dívidas trabalhistas de empresas
contratadas pela administração pública. O ponto em discussão é o artigo 71 da
Lei de Licitações, que isenta o Estado dos encargos trabalhistas das empresas
contratadas. O parágrafo primeiro, com redação dada por lei de 1995, diz o
seguinte:
“A inadimplência do contratado, com referência aos encargos
trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a
responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou
restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o
Registro de Imóveis”.
A norma foi declarada constitucional pelo Supremo Tribunal
Federal em novembro de 2010, na Ação Declaratória de Constitucionalidade 16.
Ajuizada pelo governador do Distrito Federal, a ação questionava a Súmula 331
do Tribunal Superior do Trabalho. Ao contrário da Lei de Licitações, o
enunciado responsabilizava subsidiariamente a administração pública direta e
indireta pelos débitos trabalhistas.
A matéria era frequente na corte trabalhista, que punia a
Fazenda Pública sem discutir sua responsabilidade. Assim os órgãos públicos
entravam com sucessivas Reclamações no STF, que acabou dando um norte aos
tribunais.
“A decisão [do STF] foi expressa no sentido de afastar a
possibilidade de se impor a responsabilidade subsidiária da Fazenda Pública
como mera consequência da existência da terceirização. Isso o STF não admite”,
diz o ministro Lélio
Bentes Correa, do TST.
Na decisão do Supremo, a maioria dos ministros concordou que o
TST não poderia generalizar a aplicação do dispositivo da Lei de Licitações,
devendo investigar com rigor se a dívida trabalhista decorria de falha ou falta
de fiscalização do Estado. “O STF não pode impedir o TST de, à base de outras
normas, dependendo das causas, reconhecer a responsabilidade do poder público”,
dissera o relator do caso e então presidente do STF, ministro Cezar Peluso.
Assim a Súmula 331 recebeu uma alteração em 2011 e, desde então,
os juízes do trabalho são orientados a examinar a prova para verificar se houve
ou não conduta culposa da administração pública. As reclamações, contudo,
continuam a chegar ao STF.
Avalanche
De acordo com a série histórica do Supremo Tribunal Federal, a quantidade de
Reclamações recebidas pela corte vem crescendo ano a ano. Com alguns picos
isolados, é possível notar uma alta constante desde 1983, quando o levantamento
tem início.
Na avaliação do professor de Direito Constitucional Dimitri Dimoulis,
da Escola de Direito da FGV, uma das causas é seu uso como substituto do
Recurso Extraordinário. Com a Reforma do Judiciário, de 2004, ficou mais
difícil entrar com essa peça processual no STF, que passou a admiti-lo apenas
em caso de Repercussão Geral.
“O STF se livrou de uma montanha de processos e ganhou outra
montanha de processos”, afirma o professor. Diante da avalanche de Reclamações,
ele diz ser bastante provável que o Supremo comece a restringir, como fez com o
Recurso Extraordinário e, mais recentemente, com o Habeas Corpus Substitutivo
de Recurso Ordinário. “Eu poderia apostar que daqui a pouco o STF vai ficar tão
cheio de reclamações e vai encontrar algum mecanismo para limitá-las”, afirma.
Reportagem de Elton Bezerra

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