País com uma das mais duras leis contra o aborto do mundo, El Salvador registra casos de mulheres que sofrem abortos espontâneos, por vezes sem saber que estavam grávidas, e são condenadas por assassinato pelo Judiciário local. A legislação entrou em vigor em 2009 e continua a receber apoio de grande parte da população, especialmente entre integrantes de grupos religiosos. Neste período, não houve qualquer tentativa de relaxamento ou revogação da lei por parte do governo.
A proibição total do aborto data de 1998, ano em que foi proibida qualquer exceção, incluindo casos de estupro e problemas de formação do bebê. Além de El Salvador, o aborto é totalmente proibido em Honduras, República Dominicana, Nicarágua e no Chile. Uma pesquisa do Grupo de Cidadãos para a Descriminalização do Aborto mostrou que, entre 2000 e 2011, a Justiça de El Salvador condenou 49 mulheres pela prática de abortos, das quais 26 foram consideradas culpadas de homicídio, com penas variando de 12 a 35 anos. Em 2012, os registros indicam ao menos mais sete condenações.
Uma vítima da restrição extrema é a jovem Glenda Xiomara Cruz, de 19 anos. Em outubro de 2012, ela foi levada a um hospital com forte dor abdominal e sangramento. Após ser atendida, ela recebeu dos médicos a informação de que estava grávida — em maio, um exame de gravidez deu resultado negativo — e que tinha perdido o bebê, com tempo de gestação entre 38 e 42 semanas. O hospital a denunciou à polícia por aborto e, quatro dias após perder o filho, ela foi indiciada por homicídio doloso.
Transferida para uma penitenciária feminina na região metropolitana de San Salvador, ela aguardou julgamento até setembro deste ano. O juiz, então, decidiu que Glenda poderia ter salvado a criança, e a condenou a dez anos de prisão, pena inferior aos 50 anos que a acusação pediu. Advogado da jovem, Dennis Muñoz Estanley afirmou que ela é mais uma vítima de um sistema que condena mulheres a partir de um pressuposto de culpa. O defensor informou que o sistema é discriminatório por condenar mulheres com complicações durante a gravidez com base em provas muito fracas.
De acordo com o estudo do Grupo de Cidadãos para a Descriminalização do Aborto, as mais de 200 mulheres denunciadas têm pouca instrução, são extremamente pobres e, normalmente, solteiras. As denúncias partem de funcionários de hospitais públicos, o que explica a razão de nenhum processo por aborto ter começado no sistema privado de saúde do país latino-americano. Outro caso que serve como exemplo é o de Maria Teresa Rivera, de 28 anos.
Ela também diz que não sabia que estava grávida e não sentiu qualquer sintoma até sentir dor súbita e sangramento, no ano passado. Maria Teresa procurou um hospital público e foi denunciada à polícia por funcionários do hospital. Mesmo com provas fracas de que teria induzido o aborto, ela foi condenada a 40 anos de prisão por homicídio doloso. A base utilizada pela acusação foi o depoimento de uma amiga da mulher, que ouviu ela dizer, 11 meses antes do aborto, que poderia estar grávida.
Morena Herrera, do Grupo de Cidadãos para a Descriminalização do Aborto, afirmou que as condenações acabaram inibindo as mulheres pobres, que deixam de procurar ajuda em casos de complicações durante a gravidez. Dados coletados pelo Ministério da Saúde em 2011 indicam que o suicídio foi a maior causa de morte entre meninas e adolescentes de 10 a 19 anos, sendo que em metade dos casos a jovem estava grávida.

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