21/05/2013

A ciência ainda não desistiu da celulite


Apesar dos avanços das técnicas usadas para tratar o problema, ainda não há uma abordagem que acabe definitivamente com as celulites — mas isso não quer dizer que a ciência deixou de se dedicar a encontrar novos tratamentos.


A celulite aflige as mulheres desde sempre, é óbvio. Mas a preocupação com ela é um fenômeno recente. O termo foi usado e descrito pela primeira vez somente em 1920. E o primeiro estudo sobre o assunto demorou ainda mais tempo para aparecer: só em 1978, quando dois pesquisadores alemães publicaram o artigo A chamada celulite: uma doença inventada, que descreveu as características anatômicas desse problema estético, que até então era tratado como doença. Talvez por isso ainda não se tenha encontrado uma solução definitiva para os indesejados furinhos que atormentam as mulheres. Os tratamentos atuais oferecem apenas soluções temporárias, ou completamente inócuas, como alguns cremes que prometem resultados milagrosos.
Essa situação, porém, está mudando rapidamente graças à mudança no comportamento das mulheres dos países desenvolvidos. "O mundo está descobrindo o corpo. Nos Estados Unidos, por exemplo, todos os tratamentos cosméticos estão ficando muito mais comuns agora, como já acontecia, por exemplo, no Brasil. Há sete anos, as pessoas chegavam ao meu consultório em Boston e diziam estar envergonhadas por ter me procurado. Hoje, ninguém mais me diz isso", afirma, em entrevista ao site de VEJA, Matthew Avram, diretor do Departamento de Lasers e Cosmiatria do Hospital Geral de Massachusetts, filiado à Universidade Harvard, nos Estados Unidos. Autor de vários estudos sobre o assunto, Avram esteve no Brasil neste mês para participar do 25º Congresso Brasileiro de Cirurgia Dermatológica, em Campos do Jordão.
Desde então, a celulite vem ganhando cada vez mais espaço entre os pesquisadores — reflexo direto do aumento da atenção que vem recebendo de mulheres não só de países tropicais, como o Brasil, mas de todo o mundo. Não é para menos. Em entrevista ao site de VEJA, Doris Hexsel, dermatologista da Sociedade Brasileira de Cirurgia Dermatológica e autora do livroAnticelulite, lançado em 2012, diz acreditar que todas as mulheres do mundo têm ou terão algum dia celulite. Pesquisas estimam que ela atinja cerca de 80% das mulheres. 
Além da maior atenção, há outro fator que vem contribuindo para colocar a celulite em evidência: o nosso estilo de vida. "A celulite está aumentando cada vez mais, e isso se deve aos hábitos dos dias atuais. Somos mais sedentários, comemos mal, e isso contribui para agravar o problema", diz Doris Hexsel.
Tratamentos paliativos — As celulites surgem principalmente na pele das mulheres, sempre após a puberdade, especialmente nas áreas onde a gordura é acumulada no corpo e, na maioria das vezes, depois da menopausa. Embora existam fatores que agravam a celulite, como o ganho de peso e retenção de líquido, ela aparece de qualquer maneira, até mesmo entre as mais magras.
Por enquanto, as técnicas disponíveis ajudam – mas não completamente. Durante as últimas décadas, foram desenvolvidos cremes, métodos de massagens e até lasers e ultrassons que ajudam a reduzir a celulite. Porém, a realidade é que ainda não há uma técnica capaz de acabar de vez com ela. "Eu não diria que não temos nenhum tratamento contra a celulite, mas sim que os tratamentos são apenas parcialmente e temporariamente eficazes", diz Avram.
Uma das grandes dificuldades para combater a celulite está no fato de ela não ser apenas causada pelo acúmulo de gordura, o qual poderia ser resolvido simplesmente perdendo peso, mas sim envolver toda uma estrutura que há por debaixo da nossa epiderme. Sob a nossa pele, há o tecido adiposo e, abaixo dele, o músculo. A pele se liga a uma membrana que envolve o músculo por meio de septos fibrosos, estruturas incapazes de se distender e que atravessam a gordura, dividindo o tecido adiposo em "blocos". Por diversos motivos, alguns desses septos se encurtam, puxando a pele para baixo e causando os "buracos" da celulite. Também é possível que a gordura se acumule em determinadas regiões do corpo e, como os septos fibrosos não conseguem se distender, ela se projeta para fora de seu lugar de origem, causando elevações na superfície da pele, que também caracterizam a celulite.
"Tratar a celulite é tratar a arquitetura da gordura, e não apenas removê-la. Mesmo tirando a gordura, essa estrutura fica. Podemos remover a gordura há décadas com lipoaspiração, mas não conseguimos ainda mudar a forma como ela é organizada", diz Avram. Ou seja, para que uma abordagem seja eficaz e duradoura, é preciso agir em toda estrutura que liga pele, tecido adiposo, músculo e os septos fibrosos. "O que causa a celulite está muito abaixo da pele, então métodos usados acima dela, como lasers ou cremes, dificilmente dão resultado, pois não penetram o suficiente para resolver a celulite", afirma o médico.
Em 2008, Molly Wanner, professora de dermatologia da Faculdade de Medicina da Universidade Harvard, revisou as evidências dos resultados de tratamentos contra a celulite, tanto não invasivos quanto os invasivos. "A maioria dos estudos mostra uma melhora de 25% a 50% após vários tratamentos. Alguns pacientes apresentam uma melhora ainda menor, e os efeitos podem desaparecer com o tempo, então as pessoas precisam fazer novos tratamentos", disse Wanner em entrevista ao jornal The New York Times.
Invasivos — Pelo fato de a celulite envolver uma estrutura que existe sob a pele — e não somente o acúmulo de gordura — os tratamentos mais invasivos parecem surtir efeitos mais positivos do que os não invasivos, como cremes e ultrassons, por agirem diretamente na região onde estão os septos fibrosos, sem que exista pele como barreira.
 A subcisão é o principal método minimamente invasivo usado no Brasil para combater a celulite e é aplicado com esse objetivo há 15 anos. No procedimento, o médico faz um pequeno orifício na pele do paciente, por onde insere uma agulha que corta os septos fibrosos que puxam a pele para baixo e desencadeiam os "buraquinhos" da celulite. "Em geral, todas as lesões melhoram. Mas pode haver lesões que ficam exatamente no relevo da pele adjacente pois não foram totalmente preenchidas pelo procedimento, ficando melhores, mas não completamente", escreve Doris Hexscel em Anticelulite.
A promessa — No ano passado, o Food and Drug Administration (FDA), órgão americano que regula alimentos, remédios e equipamentos médicos, aprovou o Cellulaze, equipamento que faz, com laser, a mesma coisa que a subcisão – ou seja, rompe os septos fibrosos que puxam a pele para baixo. O aparelho apresenta, no entanto, algumas vantagens. A energia emitida pelo laser "frita" o tecido adiposo da região, liquefaz as gorduras e as elimina do organismo. O laser também estimula produção de colágeno, que ajuda a dar mais firmeza à pele flácida. No geral, é feita apenas uma sessão.
Com todos esses atributos, essa parece ser a máquina estética perfeita. Mas há ressalvas. Como todo procedimento que substitui o trabalho braçal do médico pelo laser, ele é mais caro: uma sessão de Cellulaze nos Estados Unidos custa, em média, 6.000 dólares (aproximadamente 12.000 reais) ou mais. Além disso, como a técnica é nova, é difícil prever seus resultados a longo prazo. "Até agora, a técnica se mostrou promissora, mas ainda não há casos suficientes para sabermos o quão eficaz é para o público em geral. Acho que ainda é cedo para falarmos sobre a eficácia e segurança do tratamento", diz Matthew Avram.
Os dermatologistas brasileiros esperam que até o final do ano o país já possa receber o Cellulaze, mas, segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a empresa ainda não entrou com processo de registro no país. 
Futuro — Apesar de essa ser uma técnica nova e promissora, cientistas já estão pensando em uma forma de cortar os septos fibrosos – com faz o Cellulaze e subcisão — apenas com a injeção de uma substância química. Sem lasers, sem bisturi — uma subscisão química. Porém, segundo Doris Hexsel, os testes com essa nova abordagem ainda serão iniciados, e os resultados somente serão publicados em cerca de três anos.

Reportagem de Vivian Carrer Elias


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