Casas prometidas por Dilma
Rousseff e Sérgio Cabral não saem do papel e valor gasto com aluguel social
passa de 86 milhões de reais, sem evitar mortes.
Antes mesmo de recolher corpos,
os gestores públicos têm, na ponta da língua, uma explicação para as tragédias
na Região Serrana do Rio: chove muito, mais que o esperado. O “esperado” para
este mês em Petrópolis, segundo a Defesa Civil do Estado do Rio, era de 270 milímetros
de chuva. Em algumas áreas, como no bairro Quitandinha, entre o domingo e a
segunda-feira foi registrado acúmulo de 390 milímetros. Na tarde de segunda,
quando o número de mortos já se aproximava de duas dezenas (o número total é de 27 mortos), o governador Sérgio
Cabral anunciou a liberação de 3 milhões de reais para remediar os danos
da tragédia. Para as vítimas das chuvas deste mês - e para os que sobreviveram
à tragédia de 2011 - o discurso soou como a velha cantilena de outros verões.
Quando a chuva varreu as
cidades de Petrópolis, Nova Friburgo e Teresópolis na madrugada de 12 de
janeiro de 2011, soterrando mais de 1.000 pessoas em questão de algumas horas,
as promessas também vieram com rapidez. Em Teresópolis, seria construído o
bairro Parque Ermitage, com a instalação de 1.655 unidades habitacionais e
quarenta unidades comerciais, além de um parque público. Em Petrópolis, o
bairro Mosela seria brindado com 112 novos apartamentos e quatro unidades de
comércio. Nova Friburgo, onde a chuva foi mais impiedosa, ganharia 4.309 casas,
oitenta unidades comerciais e um espaço para a instalação de quarenta unidades
industriais.
A situação, passados dois anos,
é a seguinte: em Teresópolis, 3.580 famílias recebem o aluguel social, a
maioria por causa do temporal de janeiro de 2011 e parte devido às chuvas de
abril de 2012. O município é responsável pelo pagamento de 780 famílias, e o
governo do estado desembolsa 500 reais para cada uma das 2.800 famílias que
recebem o aluguel social. Em Petrópolis, 876 famílias recebem o aluguel social,
segundo a secretaria estadual de Assistência Social. Em Nova Friburgo, 2.700
famílias recebem o benefício. Essa gente toda espera, há dois anos, pulando de
casa em casa. Alguns resolveram a seu modo: voltaram para áreas interditadas
exatamente pelo risco de deslizamento ou alagamento.
Segundo o relatório publicado
pela Comissão de Acompanhamento da Recuperação da Região Serrana do Rio de
Janeiro, elaborado pela Assembleia Legislativa do estado e publicado em
dezembro de 2012, por mês são gastos 3,6 milhões de reais com o pagamento do
aluguel social a 7.479 famílias – as 7.236 das três cidades e outras espalhadas
pelo estado. Desde a catástrofe de 12 de janeiro, o montante ultrapassou a casa
dos 86,4 milhões de reais. Com esse dinheiro seria possível construir mais de
1.515 casas populares. Até agora, nenhuma saiu do papel.
“O programa de reconstrução
como um todo está bem aquém do desejado”, resume o deputado estadual Luiz Paulo
Correa da Rocha (PSDB), presidente da CPI que investigou as causas da tragédia
de 2011. “A única ação concreta foi a instalação das sirenes de alerta. A
grande dificuldade ainda é encontrar terrenos para a construção das casas”,
reconhece.
A presidente Dilma Rousseff
afirmou, da Itália, que uma parte do problema é a insistência de algumas
famílias para permanecer em locais perigosos. “Nós temos um sistema de
prevenção, o problema é que muitas vezes as pessoas não querem sair”, analisou.
“E é uma situação muito difícil, porque choveu quase o tanto que chove um ano
em certas regiões do Brasil”, disse a presidente, insistindo na corrente que
torna as chuvas de verão uma “novidade” para o poder público.
Em Teresópolis, o quadro atual
é desanimador em relação às 1.655 unidades habitacionais que seriam construídas
pela parceria entre governos estadual e federal. Segundo a secretária municipal
de Desenvolvimento Social de Teresópolis, Maria das Graças dos Santos, depois
de dois anos, a obra ainda vai começar. “O prazo para quando começarem a
construir é de pelo menos um ano”, explica. Ou seja: não há perspectiva de
melhora para o verão de 2014.
Segundo a Secretaria de Obras
do estado do Rio de Janeiro, órgão responsável pelas ações na Região Serrana, o
grande obstáculo é encontrar terrenos apropriados para a construção das casas.
Embora em abril de 2011, três meses depois da tragédia, Vicente de Paula
Loureiro, subsecretário de Urbanismo Regional e Metropolitano da secretaria
estadual de Obras, tenha dito que essas áreas já estavam definidas, tudo indica
que a situação real era um pouco diferente. Em 2011, Loureiro estava mais
otimista. “Os locais que avaliamos têm capacidade para receber cerca de 7.000
unidades”, observou em 2011. “Temos recursos para fazer 6.000, através do
Governo Federal, e mais 1.000, referentes a doações das empresas. Estamos ainda
averiguando áreas para conseguir avançar mais, pois a demanda pode ser maior,
já que ainda precisaremos tirar algumas famílias de áreas de risco”.
Quase dois anos depois de
garantir que todos os desabrigados da Região Serrana estariam “morando em suas
novas residências até o fim de 2012”, Loureiro trabalha com uma nova data: o
segundo trimestre de 2013 – isso para a entrega das primeiras unidades. Em vez
da construção de 7.235 imóveis, como divulgado anteriormente, agora são
prometidas apenas 4.702 residências. Encontrar o terreno é só a primeira fase
da resolução do problema. “Após a escolha dos terrenos, é necessário aguardar o
trâmite burocrático e os impasses jurídicos para a desapropriação dos terrenos
disponíveis”, avisa a secretaria. Só depois é possível realizar os
procedimentos para “a escolha das empresas que construirão as unidades
habitacionais”.
Burocracia
– Para Antônio Fagundes, subsecretário de
Assistência e Desenvolvimento Social e Trabalho de Nova Friburgo, “a boa
vontade esbarra na burocracia”. Em 2011, no comando de um dos sessenta abrigos
de Nova Friburgo, ele enfrentava representantes dos ministérios públicos, de
entidades ligadas aos Direitos Humanos e de instituições responsáveis por
menores infratores para garantir o mínimo de conforto aos desabrigados. “Hoje,
temos que vencer a burocracia da Caixa Econômica, dos governos estadual e
federal e dos órgãos ambientais”, diz.
Em junho de 2011, Dilma
Rousseff assinou um chamamento público para a construção de 6.874
empreendimentos na região (6.641 unidades habitacionais, 188 unidades
comerciais e 45 industriais), além de contratos para a recuperação e
reconstrução de pontes e contenção de encostas das áreas afetadas. A presidente
anunciou também a revitalização de toda a rede de transporte, drenagem,
abastecimento de água, esgoto, pavimentos, coleta de lixo e energia.
Enquanto
no Japão a rodovia que liga Ibaraki a Tóquio,
destruída no tsunami de 2011, demorou seis dias para ser reconstruída, as
pontes da região serrana continuam implorando por socorro há 798 dias. Das
quase 100 pontes que sofreram algum tipo de dano, apenas onze tiveram as obras
de recuperação concluídas. “Em 30 dias foram restabelecidos a maioria dos
acessos, devolvendo à população o direito de ir e vir”, explica a Secretaria de
Obras. “Foram construídos caminhos alternativos e pontes provisórias, retomando
o transporte público e o escoamento da produção agrícola”. Como não é raro no
Brasil, o provisório corre sério risco de tornar-se definitivo.
Para tentar justificar tamanha
demora, a secretaria informa que “a grande magnitude da tragédia alterou o
curso e a vazão dos rios, impossibilitando a utilização de estudos existentes,
o que não permitiu que as obras contratadas pudessem ser realizadas em 180
dias, que é o prazo das contratações emergenciais”. Além das onze pontes
concluídas, o governo promete reconstruir outras 52. Desse total, nove estão em
fase de conclusão. O resto permanece no estágio de “elaboração de projetos”.
Investimentos
– Segundo a Secretaria de Obras, serão
investidos mais de 2,2 bilhões de reais na Região Serrana do Rio, sendo 1,6
bilhão de reais de recursos federais e 600 milhões de reais de recursos
estaduais – dinheiro que será aplicado em “ações emergenciais para a retomada
da normalidade das cidades, pagamento de aluguel social, obras de contenção de
encostas, dragagem de rios, reconstrução de pontes, construção de moradias,
entre outros”.
Embora
as promessas sejam bem mais contidas agora,
o montante é três vezes o que foi anunciado nos meses que se sucederam à
tragédia. Em junho de 2011, Dilma Rousseff anunciou um investimento de 699,12
milhões de reais, sendo 351,24 milhões de reais do Orçamento Geral da União,
277,87 milhões de reais do estado do Rio e 40 milhões de reais da iniciativa
privada.
Reportagem de Branca
Nunes, Cecília Ritto e Pâmela Oliveira
fonte:http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/governo-atrasa-construcao-de-casas-e-expoe-moradores-da-regiao-serrana-a-novas-tragedias
foto:http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2013/03/18/chuva-deixou-650-desabrigados-em-petropolis-diz-governador-do-rio.htm
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