12/02/2012

As máfias invadem a América Central


A falta de profissionalismo das forças policiais e a fragilidade das instituições dificultam uma luta eficaz contra a insegurança e o crime organizado. Mafiosos asiáticos e latino-americanos controlam na América Central uma operação ilegal de tráfico de chineses em avião de Hong Kong para a Colômbia, passando pela França, e depois por terra ao Panamá rumo ao México e EUA. Traficantes colombianos são presos na Costa Rica ao introduzir duas toneladas de cocaína para cartéis mexicanos.
Em Honduras, pistoleiros locais assassinam um chefe antidrogas que denunciou que "faltam ovos" para combater as narcomáfias. Fugitivos colombianos atacam em um cais de uma comunidade caribenha da Nicarágua que oferece serviços logísticos para transportar entorpecentes da Colômbia para o México e os EUA.
Criminosos mexicanos e guatemaltecos são presos ao entrar na Guatemala com cargas de combustível vindos do México e El Salvador. Contrabandistas locais são presos ao penetrar ilicitamente na Costa Rica com um carregamento de bebidas compradas em lojas livres de impostos no Panamá. Um grupo de ladrões rouba 200 armas em um depósito da polícia da Costa Rica. Narcotraficantes mexicanos destroem áreas de selva na Guatemala.
E a lista de fatos criminosos cresce diariamente: a América Central é um enorme bazar clandestino no qual qualquer mafioso pode traficar seres humanos, drogas, armas, munições, combustíveis, bebidas, veículos, madeiras preciosas, espécies em perigo de extinção ou bens arqueológicos, e participar de atividades do crime organizado como o roubo de cabos telefônicos, tampas de bueiro, energia elétrica e água potável.
A América Central "enfrenta uma crise de criminalidade e insegurança que custa em média US$ 1,3 bilhão por ano", declarou recentemente o presidente de El Salvador, Mauricio Funes, ao citar um relatório do Banco Mundial. "Esses crimes foram reforçados pela presença de grupos criminosos que ano após ano aumentaram suas fileiras até se transformar em verdadeiras estruturas do crime organizado, como é o caso das 'pandillas'", afirmou Funes.
O Programa da ONU para o Desenvolvimento (Pnud) estabeleceu que na América Central existem 23 modalidades de crime organizado que operam com um impacto baixo, médio e alto. O cardápio de programas centro-americanos para combatê-lo contempla desde convênios de patrulha marítima conjunta no Pacífico e no Atlântico com os EUA e a França, até a cooperação policial da Espanha e planos de US$ 2 bilhões financiados com empréstimos externos, embora o balanço seja negativo.
Com um gasto conjunto superior a US$ 6,5 bilhões por ano para combater a violência, a insegurança prevalece, com um índice regional de mais de 33 homicídios por 100 mil habitantes: excluindo as regiões em guerra, a América Central é a mais violenta do mundo, segundo o Pnud.
O coquetel centro-americano é explosivo, já que à crise de insegurança se acrescenta uma situação de miséria e exclusão social que atinge mais da metade dos 40 milhões de habitantes da área, com uma crescente deterioração ambiental - especialmente das matas e das fontes aquíferas - e, com exceção da Costa Rica, um histórico de instituições frágeis e impunidade, além da corrupção política.
A morte continua atingindo a região, que apenas consolida seu processo de paz depois de décadas de conflitos bélicos, como os da Nicarágua (1975-1990), Guatemala (1960-1996) e El Salvador (1980-1992), e de ditaduras e regimes militares como os do Panamá (1968-1989) ou Guatemala (1954-1986).
Um estudo do Pnud identificou uma primeira lista de nove máfias de âmbito local e nacional e cujo "serviço traficado" é uma atividade criminosa de complexidade e gravidade baixas. Nesse grupo estão as organizações de roubo de cabos telefônicos, tampas de bueiros, luminárias e cabos elétricos, energia elétrica, água potável e outros serviços domiciliares "de contrabando"; telefones celulares, acessórios de veículos e peças e partes automotivas, combustíveis e lubrificantes e roubo de gado.
Em um segundo grau há seis máfias de jurisdições nacionais e transnacionais e de complexidade e gravidade médias. São os bandos dedicados a violar leis de direitos autorais (pirataria de música, filmes, livros e demais), contrabando de roupas e outros artigos, roubo e exportação e comercialização ilegal de bens culturais, tráfico de animais protegidos, comercialização ilícita de madeiras preciosas e fraudes e estelionato com cartões de crédito.
No terceiro escalão há oito máfias de entorno nacional e transnacional e de complexidade e gravidade altas: roubo de veículos, tráfico de armas de fogo, tráfico de imigrantes, comércio de seres humanos, tráfico de órgãos, tráfico interno de drogas, tráfico internacional de drogas e lavagem de dinheiro e outras atividades.
Diante da arremetida intensa do crime organizado, a resposta em Guatemala, El Salvador, Honduras e Nicarágua foi militarizar a segurança e pôr os soldados nas ruas para cumprir tarefas policiais, enquanto Costa Rica e Panamá - ambos sem exército - fortaleceram seus corpos policiais com a ajuda dos EUA, Espanha e outros países europeus.
"As máfias vieram para a América Central porque são países de quinto mundo que nunca poderão capturá-las e que eles poderão corromper, permear e fazer todos os negócios", afirmou o guatemalteco Sandino Asturias, coordenador do Centro de Estudos da Guatemala (não estatal).
Asturias disse a "El País" que "o que estamos colhendo hoje é o resultado do modelo de Estado que se implementou nos últimos 20 anos: um Estado frágil, fragmentado, sem resposta para as necessidades sociais. Hoje somos países mais desiguais".

A militarização da segurança, acrescentou, fracassou porque "são Estados pequenos, com forças de segurança pouco profissionais e não a serviço da maioria, embora com serviços de segurança privados muito fortes e grandes, mas corrompidos pelos interesses do crime organizado".
Pesquisas estatais, de fóruns internacionais e organizações não governamentais confirmaram a mistura das 23 modalidades de máfias, como ocorre com os narcotraficantes que utilizam os imigrantes ilegais para transportar drogas da América Central para o México e os EUA.

Reportagem de  José Meléndez para o jornal espanhol El País

foto:desacato.info
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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