"Exigem muito mais de nós, radicais, do que dos peronistas. Ninguém quer esquecer a saída precipitada do presidente Fernando de la Rua, mas a realidade é que em 2000 tivemos de nos encarregar do desastre que foi provocado por um peronista, Carlos Menem, e que os radicais causamos infinitamente menos danos a este país que o justicialismo." Ricardo Alfonsín (foto esq.), candidato da União Cívica Radical (UCR) para as eleições presidenciais de hoje (23), queixa-se de que na Argentina os peronistas se sucedem uns aos outros sem que ninguém exija que prestem contas pelas catástrofes que provocam seus antecessores. "Nós pagamos por nossos erros. O justicialismo, nunca."
Ricardo Alfonsín, que completará 60 anos em novembro, é um homem afável, com grande senso de humor, que cultiva o diálogo. Seus primeiros anúncios de campanha refletiam esse viés, mas conforme foram passando os dias e as pesquisas reduziam sua margem e colocavam a possibilidade de que perdesse o segundo lugar, sua imagem foi se tornando mais exigente e dura. "Não se enganem, no domingo o Partido Radical será o segundo, atrás de Cristina Kirchner", afirma, aborrecido. "É o governo que está empenhado em instalar a dúvida, porque sabe que conosco em primeiro lugar a oposição será mais forte", declara.
As pesquisas preveem uma briga palmo a palmo pelo segundo lugar com o candidato socialista Hermes Binner, ou talvez com algum dos dois candidatos peronistas anti-K (anti-Kirchner) que também concorrem, mas as diferenças não são tão grandes para que as coisas estejam decididas. Alfonsín admite que as eleições serão muito importantes para poder avaliar até que ponto seu partido, a UCR, triturada depois da crise de 2001, conseguiu recompor sua estrutura e criar, pelo menos, um terreno sólido a partir do qual possa construir nos próximos anos.
Que outro candidato lhe tire o segundo lugar colocaria sérios problemas de liderança dentro da UCR. "Mas tenham a segurança de que estarei presente no debate que se iniciar imediatamente depois das eleições", anuncia diante dos microfones da Rádio Continental. O candidato chegou de manhã cedo, e é o único que fica "colado" à tela do televisor vendo as imagens que anunciam a queda de Gaddafi.
Advogado, casado e com quatro filhos, Ricardo Alfonsín tem uma semelhança assombrosa com seu pai, Raúl Alfonsín, o primeiro presidente democrático depois queda da ditadura militar. Durante algum tempo, devido à morte de uma filha de 15 anos em um acidente (uma porta de vidro caiu sobre ela), o candidato esteve praticamente afastado da política. Foi outra morte, a de seu pai, e a formidável demonstração de luto dada pelos argentinos nesse dia, que o fez retomar um papel político.
Ricardo Alfonsín aceita com elegância que alguns recém-chegados queiram lhe dar lições de defesa dos direitos humanos. Ele acompanhava seu pai quando, em plena ditadura, era um dos poucos advogados capazes de pedir habeas-corpus, e esteve ao seu lado quando sentou no banco dos réus os dirigentes máximos da ditadura militar. Foi o presidente Alfonsín quem prendeu Videla, Massera e companhia e nunca os indultou, embora fosse obrigado mais tarde a editar uma Lei de Obediência Devida e Ponto Final que permitisse a anistia de cargos inferiores. Videla e Massera saíram da prisão graças ao peronista Menem, mas ninguém parece lembrar disso agora, murmura.
O candidato radical afirma que não é responsável pelo que agora aparece como um dos grandes erros dessa campanha presidencial: a ruptura de negociações entre a UCR e os socialistas para tentar uma aliança, parecida com a que funciona há anos na província de Santa Fe. O acordo a que chegou com o milionário Francisco de Narváez, candidato independente na província de Buenos Aires, fez saltar pelos ares o possível pacto com os socialistas.
"Não precisava ser assim, foi uma decisão deles", explica. Ao jornalista Victor Hugo Morales, que defende as posições do governo de Kirchner e em particular sua guerra contra o grupo de mídia Clarín, Ricardo Alfonsín lembra que o Clarín e Kirchner tiveram relações magníficas até 2009. "Creio que qualquer meio de comunicação tem o perfeito direito de dizer o que quiser, e se o que diz, ou faz, é belicoso deve responder diante da justiça", conclui. "Nós radicais defendemos a República, e não queremos que o oficialismo controle tudo, Parlamento, mídia, justiça. Isso é um verdadeiro perigo."
Reportagem de Soledad Gallego-Díaz para o jornal espanhol El País
Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/elpais/2011/10/22/ricardo-alfonsin-luta-para-manter-o-radicalismo-a-frente-da-oposicao.jhtm
foto:http://en.wikipedia.org/wiki/Ricardo_Alfons%C3%ADn
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