REFORMA JÁ
Julgar sem ira*
Não há paixão que tanto abale a integridade dos julgamentos quanto a cólera. Ninguém hesitaria em punir de morte o juiz que, por cólera, houvesse condenado o seu criminoso; por que será mais permitido aos pais e aos professores açoitar as crianças e castigá-las estando encolerizados? Isso já não é correcção: é vingança. O castigo faz papel de remédio para as crianças; e toleraríamos um médico que estivesse animado e encolerizado contra o seu paciente?
Nós mesmos, para agir bem, não deveríamos pôr a mão nos nossos serviçais enquanto nos perdurar a cólera. Enquanto o pulso nos bater e sentirmos emoção, adiemos o acerto; as coisas na verdade vão parecer-nos diferentes quando estivermos calmos e arrefecidos: agora é a paixão que comanda, é a paixão que fala, não somos nós. Através dela as faltas parecem-nos maiores, como os corpos no meio do nevoeiro. Quem tiver fome faça uso de alimento; mas quem quiser fazer uso do castigo não deve sentir fome nem sede dele. E, além disso, as punições que se fazem com ponderação e discernimento são muito mais bem aceites e com melhor proveito por quem as recebe. De outra forma, ele não considera que foi condenado justamente, por um homem movido por ira e fúria; e para jutificar-se alega os gestos anormais do seu senhor, o afogueamento do rosto, os insultos inusitados e essa sua agitação e precipitação temerária.
* Michel de Montaigne, in 'Ensaios'
Não somos juízes das ações alheias nem ocupamos nosso precioso tempo procurando as falhas (humanas, demasiadamente humanas) dos outros para apontá-las indiscriminadamente e de forma precipitada, apenas para termos a sensação de que somos diferentes e superiores. Não, este tipo de comportamento realmente não está entre aqueles que adotamos para a nossa conduta diária. No entanto, também não podemos nos abster de expressar nosso desapontamento frente as denúncias recentemente divulgadas envolvendo membros do Judiciário de Minas Gerais. Não estamos aqui para atirar a primeira pedra nem para condenar sem dar chance de defesa a quem estiver sendo acusado. Mas diante dos fatos apresentados não podemos evitar o sentimento de desapontamento e de medo da vulnerabilidade a que estão expostas instituições tão nobres como o Judiciário e processos como o da reforma do CPC, que significa tanto para a nação e seus cidadãos. Para onde caminha a humanidade? Me recuso a aceitar que seja pela estrada do individualismo, dos interesses pessoais e da ganância. Preciso, até por uma questão de sobrevivência, acreditar que fatos como os recentemente veiculados na mídia, são apenas desvios que não têm força suficiente para eliminar os desejos de paz, ética e compaixão clamados pela sociedade.
Por isso terminamos este texto como começamos: REFORMA JÁ!
foto: radioboanoticia.com.br
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