O excesso de cursos não significa, muito longe disso, excelência de ensino. Está mais do que na hora de aumentar o rigor na liberação de faculdades de Direito (ou de outras ciências) por outros critérios que não sejam o da qualidade
e competência do ensino.
O Ministério da Educação cancelou, na semana passada, 11 mil vagas de 136 cursos de Direito em todo o país, todos reprovados no quesito qualidade. Ao mesmo tempo transferiu quatro mil dessas vagas para escolas com melhor avaliação. São medidas preventivas, pois evitam que sete mil vagas venham a ser mal ocupadas, não necessariamente por culpa do estudante, mas de quem tinha a responsabilidade sobre elas. O número é significativo e teria um efeito devastador em qualquer outra profissão ou lugar do planeta, exceto no Brasil: as 11 mil vagas cortadas pelo MEC representam menos de 8% das vagas ocupadas nas faculdades de Direito de norte a sul do país nos últimos 5 anos.
Vejamos os números:
Em 2005, segundo os relatórios do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, 1.678.088 alunos ingressaram no ensino superior. Desses, 212.739 foram atraídos para faculdades de Direito – a terceira maior preferência do estudante brasileiro, atrás apenas dos cursos de formação de professores (503.372) e administradores de empresas (371.502). Entre os que entraram e os que já estavam matriculados, a soma chegou a fantásticos 565.705 alunos. No fim daquele ano, o país ganhou 73.323 novos bacharéis em Direito – sete vezes mais do que o número de médicos.
Em 2009, ainda segundo o censo do INPE, existiam 5.115.896 alunos matriculados no ensino superior, entre os quais 651.600 em cursos de direito. Significa que de cada 100 bancos escolares, 13 estavam ocupados por candidatos a advogados. E entre os 826.928 alunos formados em 2009, 87.523 eram de Direito – o que representa bem mais do que a soma de psicólogos (17.280), jornalistas (13.139), médicos (11.881), dentistas (8.510), economistas (6.922) e químicos (3.434), todos aptos, pelo menos em tese, a ocupar um lugar no mercado de trabalho.
Feitas as contas, são 85.895 novos matriculados entre os dois períodos ou quase 12 vezes o número de vagas efetivamente cortadas na semana passada pelo Ministério da Educação. Vale lembrar que nenhum curso foi fechado, mas apenas perdeu um punhado das vagas que possuía, de forma proporcional – quanto pior o resultado do Conceito Preliminar de Curso, maior a redução.
É como se o Direito fosse uma realidade à parte do sistema de ensino superior brasileiro. Enquanto o número total de escolas cresceu 7% nos últimos cinco anos, de 2.165 em 2005, para 2.314 em 2009, a quantidade de cursos de Direito passou de 861 para 1.096 – um aumento de 27%, proporcionalmente quatro vezes mais do que o sistema educacional brasileiro. Na comparação direta, o número de cursos de Direito só é menor do que os cursos superiores voltados para a formação de professores em todos os níveis e em todas as áreas. Não custa lembrar que em 2001 o censo do MEC registrava 426 escolas de Direito instaladas no país.
Mas os números permitem outras análises nada animadoras. O total de alunos atualmente matriculados em cursos de direito é praticamente igual ao número de advogados inscritos na OAB – 662.848 até sexta-feira passada (excluído estagiários e inscrições suplementares). É o terceiro maior contingente em todo o mundo, atrás apenas de Estados Unidos e Índia. Não demora e será o primeiro.
A rigor dá até para a OAB marcar a data e começar a organizar a festa para a sua primeira inscrição com sete dígitos. Não faltam números ou estatísticas para tornar esse trabalho mais fácil, embora tais números e estatísticas sirvam também para dificultar ainda mais o entendimento sobre o que está acontecendo nesse mercado. E o que parece mais grave: o que pode vir a acontecer.
Abaixo, como de costume, sugestões de leituras complementares aos temas acima abordados:
O autor analisa o atual modelo de ensino jurídico praticado no país, enfrentando temas como a mercantilização do ensino superior, o perfil tecnicista e a cultura jurídica essencialmente formalista, entre outros.
Partindo do significado técnico-jurídico do termo advocatio, o autor traça um panorama histórico da atividade, analisando os antecedentes na Realeza e na República, bem como suas estreitas relações com o instituto do patronato e com a arte retórica.
Um minucioso inventário de causas célebres no Brasil e do mundo, com relatos marcantes narrados por advogados e promotores.
Uma boa fonte de consulta para quem acaba de ingressar em um curso de Direito. O autor analisa e explica a estrutura do Poder Judiciário, assim como as principais funções das carreiras jurídicas, como Magistratura, Ministério Público, Polícia Judiciária e, especialmente, a advocacia.
Texto de Robson Pereira
http://www.conjur.com.br/2011-jun-06/letras-juridicas-pais-futebol-tambem-bacharelado-direito
foto: vinhedo.olx.com.br
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