24/04/2010

Reflexões sobre o Judiciário no governo Lula

 O governo do presidente Lula ainda tem alguns meses pela frente, mas como estamos em ano eleitoral e em anos assim tudo fica meio "esquisito", para usar uma palavra mais amena, então está na hora de uma reflexão sobre os oito anos desta administração. A economia vai bem obrigada, o consumo cresce, a fome diminuiu no País, no entanto a educação e a saúde pública poucos avanços tiveram, a violência urbana também não foi combatida como se esperava, assim como não foram cumpridos outros itens que compunham o programa de governo divulgado durante a campanha, como a reforma tributária, por exemplo. Também não saiu do papel a reforma da Previdência nem do Judiciário, apontada como uma das prioridades do governo ainda no  primeiro mandato do presidente Lula.  
Para a maioria da população, de forma simplista, reformar o Judiciário é tornar a Justiça mais ágil, mais acessível e mais justa. E ela está absolutamente certa, o problema está em como fazer isto.  O governo Lula deu alguns passou nesta direção. Criou, dentro do Ministério da Justiça, a Secretária de Reforma do Judiciário com a missão de fazer um levantamento global da estrutura do Judiciário e a partir daí apresentar um diagnostico da situação e propostas de mudança.
E em 2004 foi aprovada a Emenda Constitucional nº. 45 que ficou conhecida como a “reforma do Judiciário” deste governo e que estava em tramitação há 13 anos. Não promoveu mudanças substancias na estrutura do Judiciário, mas aumentou as possibilidades de ação deste Poder e abriu as portas para uma verdadeira ( e tão almejante) reforma do Judiciário. Vale destacar as seguintes alterações provocadas por esta emenda:
1) são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação (art. 5.º, LXXVIII, e art. 7.º da EC n. 45/2004).
2) a previsão do real cumprimento do princípio de acesso à ordem jurídica justa, estabelecendo-se a Justiça Itinerante e a sua descentralização, como a autonomia funcional, administrativa e financeira da Defensoria Pública Estadual (arts. 107, §§ 2.º e 3.º; 115, §§ 1.º e 2.º; 125, §§ 6.º e 7.º; 134, § 2.º; 168, e art. 7.º da EC n. 45/2004).
3) a possibilidade de se criar varas especializadas para a solução das questões agrárias. (art. 126, caput).
4) a "constitucionalização" dos tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos, desde que aprovados pelo quorum qualificado das emendas constitucionais (art. 5.º, § 3.º).
5) a submissão do Brasil à jurisdição do Tribunal Penal Internacional (TPI), cuja criação tenha manifestado adesão (art. 5.º, § 4.º).
6) a federalização de crimes contra direitos humanos (art. 109, V-A e § 5.º).
7) previsão do controle externo da Magistratura por meio do Conselho Nacional de Justiça, como a criação de ouvidorias para o recebimento de reclamações (arts. 52, II; 92, I-A, e § 1.º; 102, I, "r"; 103-B, e art. 5.º da EC n. 45/2004).
8) previsão do controle externo do MP por meio do Conselho Nacional do Ministério Público, como a criação de ouvidorias para o recebimento de reclamações (arts. 52, II; 102, I, "r"; 130-A e art. 5.º da EC n. 45/2004).
9) A ampliação de algumas regras mínimas a serem observadas na elaboração do Estatuto da Magistratura (art. 93).
10) ampliação da garantia de imparcialidade dos órgãos jurisdicionais (art. 95, par. ún., IV e V, e 128, § 6.º).
11) previsão de que as custas e os emolumentos sejam destinados exclusivamente ao custeio dos serviços afetos às atividades específicas da Justiça, fortalecendo-a, portanto (art. 98, § 2.º).
12) regulação do procedimento de encaminhamento da proposta orçamentária do Judiciário e solução em caso de inércia. (art. 99, §§ 3.º, 4.º e 5.º).
13) a extinção dos Tribunais de Alçada, passando os seus membros a integrar os TJs dos respectivos Estados e uniformizando, assim, a Justiça (art. 4.º da EC n. 45/2004).
14) transferência de competência do STF para o STJ no tocante à homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias (art. 102, I, "h" (revogada); 105, I, "i", e art. 9.º da EC n. 45/2004).
15) a ampliação da competência do STF para o julgamento de recurso extraordinário quando se julgar válida lei local contestada em face de lei federal (art. 102, III, "d", e 105, III, "b").
16) a criação do requisito da repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso para o conhecimento do recurso extraordinário. (art. 102, § 3.º).
17) a adequação da Constituição, no tocante ao controle de constitucionalidade, ao entendimento jurisprudencial já pacificado no STF, constitucionalizando o efeito dúplice ou ambivalente da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) e Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) como o seu efeito vinculante. (art. 102, § 2.º; 103, IV e V; revogação do § 4.º do art. 103 e art. 9.º da EC n. 45/2004).
18) ampliação da hipótese de intervenção federal dependendo de provimento de representação do Procurador-Geral da República para, além da já existente ADI Interventiva (art. 36, III, c.c. 34, VII),
19) criação da Súmula Vinculante do STF (art. 103-A e art. 8.º da EC n. 45/2004).
20) A aprovação da nomeação de Ministro do STJ pelo quorum de maioria absoluta dos membros do SF (art. 104, parágrafo único).
21) previsão de funcionamento no STJ (art. 105, par. ún., I e II).
22) no âmbito trabalhista: ao aumento da composição do TST de 17 para 27 Ministros, deixando-se de precisar convocar juízes dos TRTs para atuar como substitutos; b) em relação ao sistema de composição, reduziram-se as vagas de Ministros do TST oriundos da advocacia e do Ministério Público do Trabalho; c) fixação do número mínimo de sete juízes para os TRTs; d) modificação da competência da Justiça do Trabalho; e) previsão da criação da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, este último deverá ser instalado no prazo de 180 dias; f) a lei criará varas da Justiça do Trabalho, podendo, nas comarcas não abrangidas por sua jurisdição, atribuí-las aos Juízes de Direito, com recurso para o respectivo Tribunal Regional do Trabalho; g) previsão de criação, por lei, do Fundo de Garantia das Execuções Trabalhistas, integrado pelas multas decorrentes de condenações trabalhistas e administrativas oriundas da fiscalização do trabalho, além de outras receitas (arts. 111, §§ 1.º, 2.º e 3.º (revogados); 111-A; 112; 114; 115 e arts. 3.º, 6.º e 9.º da EC n. 45/2004).
23) fixação de novas regras para a Justiça Militar (art. 125, §§ 3.º, 4.º e 5.º).
24) diminuição do quorum de votação para a perda da garantia da inamovibilidade de 2/3 para a maioria absoluta (art. 128, § 5.º, I, "b").
25) ampliação da garantia de imparcialidade dos membros do MP (art. 128, § 5.º, II, "e", "f", e § 6.º).
Ou seja, as mudanças foram várias e relevantes. Certamente abriram caminho para outras transformações necessárias para o funcionamento adequado do Judiciário brasileiro. Porém, uma em especial e pela qual temos lutando arduamente já há muitos anos, e que no nosso entendimento seria fundamental tanto para a atuação do Judiciário quanto para sua efetiva e eficaz aproximação com a sociedade, não foi contemplada. Estamos falando de uma capacitação dos operadores de Direito tendo como base a educação holística que tem como um de seus pilares o documento da Unesco que afirma que “a guerra nasce no espírito do Homem, logo é no seu espírito que devem ser erguidas as defesas da paz”. Ou seja, a educação é um caminho vital para alcançar a paz e como afirma o educador Pierre Weil “ educar para a paz assume um caráter de urgência nesta época conturbada. Nos últimos anos, milhares de pesquisas têm sido realizadas no mundo visando a descobrir quais os verdadeiros fatores desencadeadores da agressividade, da violência e das guerras”.
Sem uma capacitação constante e que tenha uma grade multidisciplinar humanística, não será possível mudar a cultura do litígio pela da paz e consequentemente, a conciliação nos conflitos nunca será a primeira opção. As mudanças ocorridas são válidas, importantes e estamos convictos da sua eficácia, no entanto, ainda estão longe de atender as reais necessidades da sociedade que clama por Justiça e uma Justiça que clama para não ser contaminada por disputas políticas de poder, que clama pela valorização dos seus operadores, que clama pelo respeito dos governantes da Nação.

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