27/07/2015

América Latina nunca teve tantos jovens, mas não aproveita impulso

A população jovem da América Latina nunca tinha sido tão numerosa: 108 milhões de pessoas têm entre 15 e 24 anos. Era uma estatística previsível havia anos. Mas o futuro chegou à região e a oportunidade de aproveitar esse impulso demográfico como motor de desenvolvimento está lhe escapando das mãos. Enquanto o crescimento econômico da zona não passará de 1% este ano (quando entre 2000 e 2012 foi, em média, de 4% ao ano), os governos procuram, cada um por seu lado, alternativas para evitar a pobreza e a desigualdade entre os jovens. Diminuir a evasão escolar e incentivar o emprego digno são os objetivos prioritários das políticas públicas para essa população.
Na América Latina há trabalho para os jovens, mas boa parte desse emprego é precária. Economias incentivadas pelas atividades informais levaram a trabalhos mal remunerados e pouco protegidos. Embora a taxa de desemprego juvenil não seja alarmante, pois está em 14%, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o panorama da precariedade é patente. As estatísticas revelam que de cada 10 jovens com trabalho, 6 o desempenham sem as garantias de Seguro Social ou estabilidade para o futuro. A proliferação do trabalho informal abre uma brecha entre a população e prejudica o crescimento dos países.
O ingrediente-chave para obter qualidade no emprego é a educação. “Há uma relação direta entre o nível educacional e a probabilidade de conseguir um emprego bem remunerado”, explica Rafael de Hoyos, economista do Banco Mundial. Uma relação que alguns países latino-americanos começaram a ver com clareza. México e Chile, por exemplo, estão procurando alternativas com a reforma de seus sistemas educacionais, mas ainda se encontram em uma etapa incipiente do ajuste do modelo.
A OIT enfatiza que os jovens da região não alcançam um nível de educação médio ou superior. Apenas 35% prosseguem com seus estudos depois do ensino médio – e isso repercute em suas oportunidades para conseguir um emprego, principalmente de qualidade. Países como Argentina, Chile, Costa Rica e Cuba conseguiram ampliar sua cobertura educacional para aumentar as oportunidades de trabalho de sua juventude, mas outras nações, como Guatemala e Nicarágua, sofrem atrasos significativos.
A melhoria das condições de trabalho não só anda de mãos dadas com uma maior cobertura educacional, como também com um ensino adequado para os postos de trabalho de que o mercado necessita. Chile e Brasil se distinguiram por incluir em seus sistemas educacionais programas destinados a potencializar as competências dos jovens em detrimento dos conteúdos teóricos. A América Latina adotou sistemas de educação que não constroem valores e responsabilidades – como a pontualidade e a ordem, que podem ser úteis no posto de trabalho –, que não desenvolvem o que De Hoyos chama de educação socioemocional. Quase todos os países da região têm dificuldade para formar jovens para o emprego de uma forma que vá além das habilidades e dos ofícios, explica.
A lacuna entre os empregos precários e a educação pouco eficaz levou a um fenômeno social entre os jovens: os nemnem. Um grupo da população que não estuda e também não trabalha. O fracasso escolar se soma a essa visão de um futuro nebuloso. Na América Latina, 21,8 milhões de pessoas entre 15 e 24 anos estão nessa situação, segundo a OIT. E em vez de diminuir, esse grupo continua crescendo. Os jovens se refugiam no vazio, e a conta recairá sobre o desenvolvimento da região. “A consequência da inatividade é conhecida como ‘efeito cicatriz’ e tem efeitos duradouros. Essa é uma população com menos produtividade, que está prejudicando a potencial taxa de crescimento econômico de seus países”, opina De Hoyos.
Cada vez que a taxa de nemnemaumenta 1%, registra-se uma redução de 7% nos salários médios dos jovens, segundo um estudo do Banco Mundial. Cerca de 70% dos nemnem são mulheres. Os governos latino-americanos trabalham a todo vapor para evitar a evasão escolar precoce, a grande causadora desse grupo de inativos. Países como Bolívia, Paraguai e Equador lutam contra altas taxas de evasão no ensino médio. Outros utilizam os denominados programas de transferências condicionadas – ajudas para combater a pobreza e evitar que os jovens abandonem seus estudos –, como o Prospera (no México) e o Bolsa Família (no Brasil).
Novas empresas
Os jovens da América Latina encontraram oportunidades de trabalho por meio do empreendimento, um fenômeno que está em alta na região e consegue dar impulso, principalmente, à juventude que tem ganhos médios. As empresas recém-nascidas geram empregos que costumam ser maior qualidade que os demais. Abrir um negócio próprio é quase um salto no vazio, afirma De Hoyos. “Isso está associado a um grande risco e é uma opção viável para aqueles que têm acesso ao capital.”
“Se você sai da universidade sem ter um pouco de experiência, é quase impossível encontrar chamba [trabalho]”, comenta Juan Antonio Rivas, um arquiteto de 24 anos que decidiu abrir um escritório próprio ao terminar seus estudos. As novas empresas criadas por jovens geram trabalhos para outros jovens e, ao mesmo tempo, representam para os empreendedores uma oportunidade de aprendizado que eles dificilmente teriam durante os estudos. “Há uma diferença abismal entre o que você aprende na escola e a realidade. É você que tem de pagar por seus erros, você se torna duas vezes mais responsável”, assinala Mauricio Gobera, sócio de Rivas, de 26 anos.
O peso da violência
A seção policial do jornal La Prensa da Honduras mostra a foto de dois jovens – de 18 e 21 anos. Franklin Pérez e Jester López foram detidos pela polícia de San Pedro Sula acusados do homicídio de um menino de 11 anos. A imagem do jornal mostra adolescentes desafiantes que não se envergonham de confessar seu delito. Honduras tem a taxa de homicídios mais alta da região: 100 homicídios para cada 100.000 habitantes.
A Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) indica que as mortes de jovens entre 15 e 29 anos na região se devem principalmente a homicídios, acidentes e suicídios. Representam 6% das mortes que ocorrem na América Latina. O futuro da juventude em alguns países, principalmente na América Central, nem mesmo existe. “Uma grande proporção desses jovens não chega à idade adulta porque eles morrem vítimas da violência”, explica Andrés Villaveces, pesquisador do Banco Mundial.
Pobreza
Diversos fatores em seu ambiente acentuam sua vulnerabilidade ante a violência, entre eles a falta de oportunidades de futuro e a existência de grupos criminosos que perpetuam sua presença por meio da população mais jovem. A Cepal estima que 30,3% dos jovens latino-americanos vivem em situação de pobreza e 10,1% em franca indigência. Nicarágua, Paraguai e Honduras preocupam os especialistas por ter comunidades com os mais altos índices de violência.
“A maioria da população na América Latina é jovem. Quando em um país os jovens crescem em um ambiente – e são testemunhas – de violência, têm maior probabilidade de reproduzir essas condutas. A falta de oportunidades de trabalho e educação é a porta de entrada para que haja maior probabilidade de que eles sejam vítimas ou autores de violência”, afirma Villaveces.
A prevenção é primordial para que esses jovens não entrem no círculo da violência, reconhece o especialista. Cidades como São Paulo e Bogotá conseguiram reduzir suas taxas de criminalidade – de 80 para 18 homicídios para cada 100.000 habitantes – graças a programas de controle do álcool e das armas de fogo. Essas cidades conseguiram melhorar o ambiente no qual os mais jovens se desenvolvem. “É necessário desenvolver políticas que criem uma necessidade desejável em cada país, porque é preciso lidar com as próprias desigualdades da América Latina”, aponta o pesquisador do Banco Mundial.

Reportagem de Sonia Sorona
fonte:http://brasil.elpais.com/brasil/2015/07/22/internacional/1437565216_070158.html
foto:http://ojoadventista-mundo.blogspot.com.br/2010/08/la-juventud-perdida-de-latinoamerica.html

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