10/02/2012

Haitianos que buscam o Brasil definham na Amazônia peruana


Quase 300 haitianos que fugiram da pobreza de sua terra natal devastada por um terremoto estão presos há um mês na Amazônia peruana, onde uma porta para o que viam como uma vida melhor no Brasil foi fechada abruptamente.

Em sua maioria educados e na faixa dos 20 anos, eles se refugiaram em uma igreja na cidade peruana de Inapari, depois que o Brasil colocou policiais federais ao longo da fronteira no começo de janeiro para conter uma onda de imigração ilegal.

Os 273 haitianos em Inapari venderam tudo o que tinham e pagaram altas somas a agentes de viagem inescrupulosos para viajar de avião ao Peru, passando pelo Panamá ou pelo Equador. Eles planejavam entrar por terra no Brasil, onde a economia em expansão já atraiu 4,5 mil haitianos depois do terremoto ocorrido há dois anos. Mas, ao chegar, descobriram a fronteira fechada.

"Não temos dinheiro e estamos muito longe do Haiti...pedimos apenas que o Brasil nos deixe entrar", disse Joniel Clervil, de 22 anos, falando no inglês que aprendeu na universidade antes de a tragédia de janeiro de 2010 colocar fim aos seus estudos.

Sem dinheiro, o grupo depende das doações de arroz e feijão provenientes da cidade brasileira do outro lado da fronteira, Assis Brasil. Não está claro se eles poderão ficar no Brasil ou no Peru ou se serão deportados.

Na tentativa de controlar a entrada e desestimular os "coiotes" que se aproveitam dos imigrantes, a presidente Dilma Rousseff disse durante uma visita ao Haiti no dia 1o de fevereiro que o Brasil emitirá 100 vistos humanitários por mês em Porto Príncipe nos próximos cinco anos, ao mesmo tempo em que reforçará a segurança na fronteira.

O Brasil também disse que concederá vistos humanitários a todos os haitianos que já estão no país, mas que os futuros imigrantes serão barrados na fronteira a menos que obtenham vistos apropriados antes de deixar o Haiti.

VISTO EXIGIDO PELO PERU

O presidente peruano, Ollanta Humala, tentou ajudar a fechar o que o governo considera uma rota de tráfico humano ao assinar um decreto no mês passado exigindo que os haitianos obtenham visto de turista antes de entrar no Peru.

Os haitianos retidos no Peru saíram de seu país antes de as mudanças entrarem em vigor e agora se encontram no limbo burocrático. Os governos afirmam que terão uma reunião na semana que vem na qual decidirão o futuro dos haitianos.

O Brasil tem a maior economia da América Latina e, em razão do crescimento econômico dos últimos cinco anos e uma política externa mais assertiva, agora enfrenta um problema típico do primeiro mundo como local que atrai imigrantes em busca de trabalho. Cada vez mais, ele é visto como uma alternativa aos Estados Unidos, que aumentaram as deportações de imigrantes sem documentação durante a pior recessão econômica desde a Segunda Guerra Mundial.

"O Brasil passa por essa mudança. Apenas recentemente se tornou atraente para a imigração e isso pode ser um motor para iniciar uma política de migração planejada", disse Eleanor Sohnen, do Migration Policy Institute, com sede em Washington.

O padre peruano Rene Salizar disse que a restrição do Brasil era inevitável. Ele afirmou que tem havido uma corrente constante de haitianos na fronteira depois que o terremoto de 7 graus de magnitude matou 300 mil pessoas e deixou 1,5 milhão de desabrigados no Haiti há dois anos.

"Eu vi isso começar há mais de um ano. Grupos de entre cinco e 20 chegavam diariamente", afirmou Salizar, que providenciou para que os haitianos ficassem na igreja da cidade, que também é sua casa.

Os laços do Brasil com o país mais pobre das Américas cresceram depois que ele liderou uma missão de paz da Organização das Nações Unidas (ONU) no Haiti em 2004, como parte de uma iniciativa mais ampla para se posicionar como líder global.

COMPROMISSO BRASILEIRO

"O Brasil tem o compromisso de ajudar o povo haitiano e o seu país...isso inclui os haitianos que querem trabalhar no Brasil - desde que seja dentro de um limite que possa ser absorvido pelo mercado de trabalho", disse Carlos Alfredo Lazary Teixeira, embaixador do Brasil no Peru.

"O que não vamos parar de fazer é combater os coiotes. Muitos cidadãos brasileiros foram vítimas dos coiotes na fronteira do México com os Estados Unidos."

Nos anos 1980 e 1990, centenas de milhares de brasileiros mudaram-se para o exterior para fugir do caos econômico interno. Na última década, porém, muitos brasileiros começaram a voltar para casa, junto com uma onda crescente de imigrantes de outros países.

Luiz Bassegio, que dirige uma instituição de caridade para imigrantes no Brasil, estima que o número de imigrantes ilegais no país subiu cerca de 25 por cento nos últimos dois anos, para 800 mil - embora não haja dados oficiais disponíveis.

Histórias sobre a abundância de empregos - especialmente na construção civil, enquanto o Brasil se prepara para sediar a Copa do Mundo em 2014 e as Olimpíadas em 2016 - levaram haitianos a agências de viagens clandestinas que lhes prometiam a entrada no Brasil por 3 mil dólares.

"Meu pai vendeu a nossa casa para me mandar trabalhar no Brasil. Meu irmão está dormindo na rua", disse Charlemond Angelet, de 21 anos, espantando os mosquitos que infestam Inapari na temporada das chuvas na Amazônia. Os primos dele já estão no Brasil.

Muitos haitianos afirmaram que perderam centenas de dólares e foram pressionados a pagar por "informação" sobre a viagem de ônibus de três dias de Lima até a cidade brasileira na fronteira.

Para passar o tempo, os haitianos ficam no único cyber café de Inapari, que tem apenas 1,2 mil habitantes, ou jogam futebol com adolescentes brasileiros.

"Minha mãe vendeu tudo que tinha para pagar essa viagem", disse Esther Pierre, de 26 anos, no idioma crioulo. "Se eu voltar agora, como vou ajudar minha família?"

Reportagem de Caroline Stauffer
foto:comercialhortolandia.com

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