16/02/2017

Ainda vale a pena manter o horário de verão?

O horário de verão, que chega ao fim novamente à 0h deste domingo, divide opiniões não só da população, mas também de especialistas.
Entre os brasileiros, uns comemoram ter uma hora a mais de sol por dia, enquanto outros reclamam da imposição de adaptar a rotina duas vezes ao ano - sabe-se que o corpo humano leva ao menos 14 dias para se acostumar com o horário de verão e, enquanto isso não ocorre, problemas como falta de atenção, de memória e sono fragmentado podem ocorrer.
Especialistas em gestão de energia ouvidos pela BBC Brasil, por sua vez, concordam que a mudança de horário pode ser útil - mas há controvérsias sobre a forma como ela é aplicada e sobre transparência dos dados sobre a economia gerada.
No mundo, o horário diferenciado é adotado em 70 países - atingindo cerca de um quarto da população mundial. No Brasil, foi usado pela primeira vez no Brasil durante a gestão de Getúlio Vargas, em 1931 e 1932, mas só passou a ser adotado sem interrupções a partir de 1985, sendo regulamentado por decreto-lei apenas em 2008, no governo Luiz Inácio Lula da Silva.
A ideia por trás da medida é poupar os recursos da matriz energética no horário de pico de consumo de energia, entre 18h e 21h, quando boa parte da população chega em casa e utiliza a energia doméstica e boa parte de comércio e indústria continuam ativos.

Energia e potência

Segundo Claudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil, o horário de verão é importante não para a diminuição do consumo de energia em si, mas pela potência que a matriz energética precisa oferecer, que acaba reduzida durante esse período de quatro meses.
"A quantidade de energia que seria economizada no horário de verão é relativamente pequena porque o simples deslocamento da faixa horária de pico não significa uma economia expressiva no dia inteiro", afirmou à BBC Brasil.
A diferença, segundo ele, é na capacidade energética que precisa estar funcionando para atender à população, a chamada "demanda de ponta". Ou seja, poupa o esforço extra das usinas que estão ativas para garantir que, ao ligar o interruptor em casa, a luz irá acender.
A economia é possível porque não é necessário acionar energia extra das usinas termelétricas para garantir o abastecimento do país nos horários de pico.
"A curva de demanda diária tem um pico no final do dia, como você empurra o fim e usa mais a luz solar, ele é mais baixo, ou seja, você precisa acender menos as termelétricas e é essa economia que culmina na economia de 4,5% no horário de maior consumo", explica.
É como se o pico de potência energética oferecido à população fosse normalmente de 100, mas durante o horário de verão se transformasse em 95,5 para atender a demanda necessária.

Mais refrigeração do que iluminação

Segundo a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), agora há um problema adicional: o horário de pico de energia no país está se deslocando para as 15h devido ao uso elevado do ar-condicionado, o que provoca uma sobrecarga no sistema de energia à tarde.
Nos Estados Unidos, essa mudança do consumo já transformou o lucro gerado pelo horário de verão em prejuízo, segundo um estudo da Universidade de Santa Bárbara, na Califórnia.
A pesquisa comprovou que em 2006 houve um aumento de 1% no uso de eletricidade doméstica devido ao uso de ar-condicionado nas tardes de verão e de aquecimento durante o começo da primavera e nas manhãs de outono.
O governo brasileiro afirma que o horário de verão resultou na economia de R$ 162 milhões em seus 126 dias de duração em 2016, segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). A previsão era de R$ 240 milhões de economia.

Propaganda ou economia?

Celio Bermann, coordenador do programa de pós-graduação em energia da USP e presidente da Sociedade Brasileira de Planejamento Energético, não está muito convencido desses dados.
"Estamos sempre sujeitos ao informe com o balanço que o governo faz no final do horário de verão, sempre dando conta de uma economia na ordem de 5%. É interessante observar que esse tipo de avaliação é recorrente e invaria de ano a ano", disse à BBC Brasil.
"Isso nos faz pensar que o informe fica muito mais em função da propaganda que é feita em relação aos benefícios do horário de verão do que uma avaliação técnica mais precisa em relação ao expediente de economia de energia que ele proporciona."
De fato, de acordo com os informes anuais do ONS sobre a economia do horário de verão, a porcentagem varia entre 4 e 5% do consumo.
Entre 2015 e 2016, houve uma redução de 4,5% na demanda, o mesmo número do período referente a 2014/2015. Na edição 2013/2014, foi de 4% e, na 2012/2013, novamente de 4,5%.
Procurado pela BBC Brasil, o ONS disse que não comentaria as declarações de Bermann, nem explicaria por que a economia com o horário de verão em 2016 foi menor do que a prevista.
A reportagem também questionou o Ministério de Minas e Energia, que não se pronunciou até a publicação desta reportagem.
Sales, do Instituto Acende Brasil, acredita que os dados correspondem à realidade e que a iniciativa deve ser mantida.
"O horário de verão só acha justificativa pensando na economia no deslocamento de redução da demanda no horário de ponta. Nessa ótica, acho que é relevante", afirma.
Paulo Brack, biólogo e professor de Biociências da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), é favorável à mudança nos relógios, contanto que seja aplicada junto a outras medidas de economia energética.
"Isolado, o horário de verão não surte muito efeito. Na verdade, ele poderia ter um resultado melhor se conjugado com uma política de eficiência energética", disse.
"Gastamos um absurdo no aquecimento da água de chuveiros elétricos considerando que poderíamos usar a energia solar, aquecedores baratos, enfim, investir em uma alternativa para esse horário de pico, entre 18h e 21h, quando a maioria das pessoas toma banho."

Reportagem de Gabriela Loureiro
fonte:http://www.bbc.com/portuguese/brasil-38986824#orb-banner
foto:http://quersaberpolitica.com.br/2016/2017/02/13/termina-no-proximo-domingo-19-horario-brasileiro-de-verao/

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